MANUAL
DE PROCESSO PENAL – FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO – 9ª Edição - Editora Saraiva – NOÇÕES
PRELIMINARES – PRINCÍPIO DA INADMISSIBILIDADE DAS PROVAS OBTIDAS POR MEIOS
ILÍCITOS - PROVA ILÍCITA POR DERIVAÇÃO -
VARGAS DIGITADOR
Princípio
da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos
Até o advento da
Constituição de 1988 não havia, em nosso país, qualquer regra impeditiva de se
produzir em juízo “prova obtida através de transgressões a normas de direito
material”. Apenas o art. 233 do CPP. Agora, contudo, toda e qualquer prova,
obtida por meios ilícitos, não será admitida em juízo. É como soa o inc. LXI do
art. 5º da Constituição de outubro de 1988. Assim, uma busca e apreensão ao
arrepio da lei, uma audição de conversa privada por interferência mecânica de
telefone, microgravadores dissimulados, uma interceptação telefônica, uma
gravação de conversa, uma fotografia de pessoa ou pessoas em seu círculo
íntimo, uma confissão obtida por meios condenáveis, como o famoso “pau-de-arara”,
o “lie detector” e, enfim, toda e
qualquer prova obtida ilicitamente, seja em afronta à Constituição, seja em
desrespeito ao direito material ou processual, não será admitida em juízo.
Sem embargo, parece-nos que
se deve respeitar o critério da proporcionalidade do direito tedesco, tão bem
expresso na súmula 50 das Mesas de Processo Penal da USP, segundo a qual “podem
ser utilizadas no processo penal as provas ilicitamente colhidas, que beneficiem
a defesa”. Na verdade, se a proibição da admissão das provas ilícitas está no
capítulo destinado aos direitos fundamentais do homem, parece claro que o
princípio visa a resguardar o réu. Sendo assim, se a prova obtida por meio
ilícito é favorável à Defesa, seria um não-senso sua inadmissibilidade. É que
entre a liberdade e o direito de terceiro sacrificado deve pesar o bem maior,
no caso a liberdade, pelo menos como decorrência do princípio do favor libertatis. Sobre o tema, Ada
Pelegrini Grinover, Liberdades públicas e
processo penal, São Paulo Revista dos Tribunais, 1982.
Prova
ilícita por derivação.
A inadmissibilidade a que
vimos de nos referir não se restringe apenas às provas obtidas ilicitamente,
mas, inclusive, às ilícitas por derivação. Diz-se a prova ilícita por derivação
quando, embora recolhida legalmente, a autoridade, para descobri-la, fez
emprego de meios ilícitos. Os americanos usam da expressão fruits of the poisonous tree (frutos da árvore envenenada). Mediante
tortura (conduta ilícita), obtém-se informação da localização da res furtiva, que é apreendida
regularmente. Mediante escuta telefônica (prova ilícita), obtém-se informação
do lugar em que se encontra o entorpecente, que, a seguir, é apreendido com
todas as formalidades legais... Assim, a obtenção ilícita daquela informação se
projeta sobre a diligência de busca e apreensão, aparentemente legal,
mareando-a, nela transfundindo o estigma da ilicitude penal.
Aliás, a Suprema Corte tem
sufragado (por maioria de votos) a tese da inadmissibilidade das provas
ilícitas por derivação (informativo STF
n. 36, de 21-11996, e 30, de 15-5-1996). Na verdade, se a comprovação do
fato for obtida única e exclusivamente por meio de prova ilícita, a desvalia da
prova é absoluta, total. Pode até suceder de a Polícia, mediante procedimento
ilícito (escuta telefônica sem prévia permissão judicial), conseguir descobrir
certa quantidade de droga com traficante. Nem por isso, malgrado a gravidade do
fato, deve ser desrespeitada a nossa Lei Fundamental. E quem for contrário a
esse entendimento deverá, antes de mais nada, passar uma esponja no texto da
nossa Lei Maior, a qual inadmite a prova obtida ilicitamente. Note-0se mais: a
vingar compreensão diversa, chegar-se-á àquele absurdo já anotado por Alejandro
Carrio: aqueles que têm como função
interpretar e aplicar a lei – os juízes – vão embasar um decreto condenatório
em prova obtida mediante a prática de outro crime... (Garantias constitucionales, Buenos Aires. Ed. Hammurabi, 1997, p.
157). Fazemos, contudo, uma restrição: se a comprovação do fato ocorrer,
também, por outro meio probatório completa e absolutamente desvinculado da
prova obtida ilicitamente, esta não pode nem deve contaminar o processo.
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