CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO
- Art. 371 - VARGAS, Paulo S.R.
PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO
DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM –
CAPÍTULO XII – DAS PROVAS - Seção I –
Disposições gerais
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Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos
autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na
decisão as razões da formação de seu convencimento.
Correspondência
no art. 131 do CPC/1973 com a seguinte redação: o juiz apreciará livremente a
prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não
alegados pelas partes, mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe
formaram o convencimento.
1.
MEIOS
DE VALORAÇÃO DA PROVA
Existem diferentes formas de
valoração da prova, ou seja, sistemas consagrados pelo legislador ou pelo
direito consuetudinário que devem guiar o juiz na distribuição da carga de
convencimento que cada prova terá, no caso concreto, para a formação de seu
convencimento. (Daniel Amorim Assumpção
Neves, p. 648. Novo Código de Processo
Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
2.
ORDÁLIAS
E JUÍZOS DE DEUS
Atualmente não se fala mais
em ordálias (ou juízos de Deus), sistema probatório no qual a valoração de
provas era fundada em desafios físicos – como atravessar uma fileira de brasa
ou se despejar óleo quente – em consultas aos deuses. De fato, tais “meios de
prova” nada provam, demonstrando tão somente uma ainda incipiente técnica
processual, se é possível qualificar tal sistema de técnico. O desenvolvimento
do processo, e da própria humanidade, com a desvinculação do direito da
religião, demonstrou, de forma clara, o absurdo de tais atividades, sendo que o
sistema das ordálias tem importância meramente histórica. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 648. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
3.
PROVA
LEGAL (PROVA TARIFADA)
No sistema de prova legal,
ou prova tarifada, a carga probatória já vem pré-estabelecida em norma escrita,
tornando o juiz um simples matemático, que somava as provas produzidas para
verificar a ocorrência dos fatos alegados. Nesse sistema, valendo a prova testemunha
1 ponto, a documental, 2 pontos e a confissão, 3 pontos, basta ao juiz somar a prova
produzida e declarar vitorioso aquele que somar um maior número de pontos. Obviamente
que tal sistema não é adequado, privilegiando a quantidade da prova, e não sua
qualidade. Como se verá, entretanto, tal sistema não foi totalmente abandonado
por nosso ordenamento, ainda que atualmente exista apenas de forma excepcional.
O sistema da prova tarifada tinha como ponto central a
total ausência de liberdade ao juiz na valoração da prova, pouco importando seu
convencimento no caso concreto, já que era obrigado a seguir o estabelecido em
lei no tocante à carga de convencimento das provas. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 648/649. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
4.
LIVRE
CONVENCIMENTO (PERSUASÃO ÍNTIMA)
O sistema diametralmente
oposto ao da prova tarifada é chamado de sistema do livre convencimento ou
persuasão íntima, no qual a liberdade do juiz é plena, também peca pelo excesso.
Nesse sistema, vale tão somente o convencimento íntimo do juiz, que não se vê
obrigado a justificar suas escolhas, podendo até mesmo julgar contra a prova
produzida caso assim lhe pareça correto. Como se nota, os extremos de nenhuma
liberdade e de liberdade plena ao juiz na valoração da prova criam sistemas de
valoração viciados. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 649. Novo Código de
Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
5.
LIVRE
CONVENCIMENTO MOTIVADO (PERSUASÃO RACIONAL)
No sistema da persuasão
racional, também conhecido pelo princípio do livre convencimento motivado, o
juiz é livre para formar seu convencimento, dando às provas produzidas o peso
que entender cabível em cada processo, não havendo uma hierarquia entre os
meios de prova. Isso, claramente, não significa que o juiz possa decidir fora
dos fatos alegados no processo, mas sim que dará, aos fatos alegados, a devida
consideração diante das provas produzidas.
Em tese, portanto, não há uma hierarquia pré-estabelecida
da carga probatória dos meios de prova. Diante dessa regra, não seria possível
afirmar que um meio de prova é mais importante do que outro, ou que seja
insuficiente para demonstrar a ocorrência de determinado fato. É possível, por
exemplo, que num determinado processo a prova testemunhal desbancasse a prova
pericial, o até mesmo a confissão. (Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 649. Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed.
Juspodivm).
6.
SISTEMA
ATUAL DE VALORAÇÃO DE PROVAS
Ainda que o nosso sistema de
valoração seja o do livre convencimento motivado do juiz, a ausência de
hierarquia entre os meios de prova, entretanto, não é regra absoluta em nosso
ordenamento. Tomem-se, como exemplo, as hipóteses de presunção legal absoluta e
as excepcionais vedações pontuais a determinados meios de prova, resquícios do
sistema da prova tarifada.
Também os arts. 215 e 225 do CC, com a indicação da prova
plena no caso de escritura pública e das reproduções mecânicas. A ideia de
prova plena agride frontalmente o princípio do livre convencimento motivado,
não devendo ser entendida como regra absoluta, mas como simples parâmetro para
a decisão judicial. Admitir que a veracidade que decorre da fé pública do
oficial público é absoluta, é incorrer em grave equívoco, tratando-se de
presunção relativa, podendo obviamente ser afastada por meio de outras provas produzidas
(Informativo 541/STJ: 3ª Turma, REsp
1.438.432-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 22.04.2014, DJe 19/05/2014). Dessa
forma, apesar da previsão expressa do Código Civil, é mantido, sem alterações,
o sistema de apreciação da força probatória dos instrumentos públicos e das
reproduções mecânicas (arts. 405 e 422 do CPC atual).
Note-se que o sistema do livre convencimento motivado
deixa o juiz parcialmente livre na apreciação da prova. Se o peso probatório
deve ser dado pelo juiz no caso concreto, não pode livremente decidir sobre tal
carga probatória, devendo obrigatoriamente motivar sua decisão. Nesse sentido,
o disposto no art. 479 deste código do CPC, que afirma não estar o juiz
adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos
ou fatos provados nos autos (Informativo
519/STJ), 4ª Turma, REsp 1.095.668-RJ, rel. Min. Luiz Felipe Salomão, j.
12.03.2013). Até mesmo a confissão deve receber a carga devida no caso
concreto, podendo perfeitamente ser enfrentada por outras provas produzidas nos
autos. Dará, portanto, a carga probatória que entender cabível, mas deverá
motivar sua decisão exteriorizando as razões pelas quais deu maior força probatória
a uma prova produzida em detrimento de outra. (Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 649/650. Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed.
Juspodivm).
7.
O
NOVO CPC EXTIRPOU O SISTEMA DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO?
Entendo que o novo CPC
manteve o sistema de valoração do livre convencimento motivado, anteriormente
previsto no art. 131 do CPC/1973 e atualmente consagrado no art. 371 do novo
livro, não me impressionando com a supressão do ordenamento processual a todas
as referencias ao termo livre convencimento e a outras expressões em sentido
parelho.
Há certa confusão nesse entendimento porque o sistema de
livre convencimento motivado tradicionalmente é vinculado à parte fática da
decisão, de forma que as novas exigências de fundamentação quanto à parte
jurídica não têm aptidão para alterar o sistema de valoração de provas adotado
por nosso sistema processual.
Afirmar que a mudança legislativa leva ao respeito às
decisões dos tribunais superiores ou a exigência de que o juiz enfrente todas
as questões arguidas pelas partes demonstram bem a confusão entre a valoração
da prova e a fundamentação jurídica da decisão.
Não há como discordar da corrente doutrina que ensina
nunca ter existido discricionariedade do juiz quanto à prova, não sendo razoável
se concluir que o princípio do “livre convencimento” legitimaria exame
irracional das provas produzidas, tendo servido apenas para se contrapor ao
sistema da prova tarifada. Por isso, discordo que a mudança legislativa teria
afastado uma discricionariedade na valoração da prova, que em meu entendimento
já não existia na vigência do CPC/1973.
E nesses termos, o livro atual não traz qualquer
novidade, porque continua o juiz livre – no sentido de não estar condicionado à
valoração abstrata feita por lei – a dar a carga de convencimento a cada meio
de prova no caso concreto.
Também não concordo com corrente doutrinária que defende
que a mudança legislativa estabeleceu o dever do juiz de apreciar não a prova
que livremente escolher, mas todo o conjunto probatório existente nos autos. O sistema
do livre convencimento jamais admitiu tal exclusão de provas da fundamentação
do juiz, exigindo, inclusive, que o juiz confrontasse todas as provas
produzidas para formar seu convencimento.
Por outro lado, decisões proferidas com base em
expressões vazias tais como “conforme a prova dos autos”, “diante do robusto
conjunto probatório formado pela parte”, “as provas produzidas pela parte não
deixam margem a dúvida”, além de nada terem a ver com as técnicas de valoração
das provas, são nulas. Eram nulas na vigência do CPC/1973 e são nulas na vigência
do Livro atual.
Na realidade, o legislador perdeu excelente oportunidade
de criar mecanismos mais efetivos de controle à valoração da prova pelo juiz,
sendo insuficiente para esse fim a fundamentação quanto às opções valorativas. É
preciso reconhecer que a exigência de fundamentação da valoração probatória não
é suficiente para evitar arbítrios judiciais, e que é preciso melhores meios de
controle da atividade jurisdicional nesse âmbito.
Como se pode notar de simples leitura do § 1º, do art.
489 do CPC, nenhuma das exigências quanto à fundamentação da decisão diz
respeito à valoração das provas e, por consequência, à decisão da parte fática
da demanda. Insisto mais uma vez que se perdeu uma ótima oportunidade de
fazê-lo, mas não há como querer criar aquilo que não está previsto. Se nenhuma exigência
quanto à fundamentação da parte fática da demanda está prevista no dispositivo
legal, exatamente como ele poderia modificar o atual sistema de valoração das
provas?
Uma excelente forma de controle, que poderia ter sido
acrescida ao princípio do livre convencimento motivado pelo Atual Código de
processo Civil é o que Malatesta chamou de sociabilidade
do convencimento que busca afastar a valoração de apreciações subjetivas do
juiz. Para o jurista, a valoração deve
ser a mesma que seria realizada por qualquer outra pessoa racional, o
tradicionalmente chamado “homem médio”, devendo o juiz se convencer da mesma
forma como seria convencida qualquer pessoa.
No mesmo sentido, as lições de Carlos Alberto Álvaro de
Oliveira ao afirmar que a valoração da prova deve respeitar as expectativas do
ambiente a que se dirige, de forma que a decisão proferida se mostre
convincente ou pelo menos aceitável. Afirma, corretamente o jurista que o juiz
deve, em sua valoração da prova, buscar o consenso mais generalizado possível da
sociedade em que inserida, proferindo uma decisão que atenda às expectativas
sociais.
São lições que me agradam imensamente porque a valoração
das provas diz respeito aos fatos da demanda, o que, portanto, não exige
qualquer conhecimento jurídico para ser feita. Significa dizer que qualquer
pessoa racional, ainda que sem formação jurídica, tem capacidade de valorar a
prova, em situação obviamente diferente daquela verificada na interpretação e
aplicação do direito objetivo ao caso concreto.
Como a valoração da prova não é essencialmente uma atividade
jurisdicional sob a perspectiva do conhecimento do Direito, cabe ao juiz se
portar como se portaria qualquer pessoa racional em seu lugar. A motivação
quanto aos fatos, portanto, não é livre, mas guiada e vigiada pela percepção
social do que se espera que o juiz faça em termos de valoração.
Não pode, por exemplo, o juiz ignorar um laudo pericial
de DNA juntado aos autos afirmando ser descrente na ciência. Como também não
pode “fundamentar” sua decisão afirmando que não levará as testemunhas em consideração
porque o ser humano não merece confiança. Até se pode dizer que, nesses casos,
o juiz justificou suas opções valorativas da prova, mas é manifesto que tal “fundamentação”
não pode ser admitida. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 650/651. Novo Código
de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
8.
PRINCÍPIO
DA COMUNHÃO DE PROVAS
Nos termos do art. 371 deste
CPC, o juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito
que a tiver promovido. A valoração, portanto, independe da prova ter sido
requerida pelas partes, pelo Ministério Público como fiscal da ordem jurídica
ou determinada de ofício pelo juiz. Até porque, o que interessa na valoração é
o resultado da prova e não o responsável pela sua promoção.
Segundo o princípio da comunhão das provas, adotado pelo
direito processual brasileiro, a prova produzida é prova do processo, de forma
que, após sua produção, em nada interessa quem foi o responsável por ter
arroladoa testemunha, juntado o documento aos autos ou pela realização da
perícia. Sendo prova do processo, não tem dono, devendo ser todas as provas
valoradas da mesma forma. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 651/652. Novo Código
de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
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