quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Das Provas - Art. 372 - VARGAS, Paulo S.R.



CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 372 - VARGAS, Paulo S.R.
PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XII  – DAS PROVAS - Seção I – Disposições gerais
vargasdigitador.blogspot.com

Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.

Sem correspondência no CPC/1973

1.    PROVA EMPRESTADA

A regra concernente à produção da prova é que esta se realize dentro do processo em que será utilizada como meio de convencimento do juiz. Em determinados casos, entretanto, em respeito ao princípio da economia processual, é possível aplicar no processo prova já produzida em outro processo, em fenômeno conhecido por “prova emprestada”. A utilização de prova já produzida em outro processo responde aos anseios de economia processual, dispensando a produção de prova já existente, e também da busca da verdade possível, em especial quando é impossível reproduzi-la.
            Não existe prova emprestada documental, porque se a prova é documental, basta a extração de uma cópia do processo de origem e juntada no processo de destino. Tratar-se-á, tanto num como noutro, de prova documental. A prova emprestada deve ter natureza de prova oral ou pericial no processo de origem, sendo documentada em termo de audiência ou em laudo pericial, que será juntado no processo de destino. Tratar-se á de prova atípica, com conteúdo oral ou pericial e forma documental.
            O empréstimo de provas não encontra limitação pela natureza do processo ou mesmo pela Justiça na qual a prova foi produzida. É possível o empréstimo entre processos em trâmite em diferentes Justiças, como também é admissível o empréstimo de provas colhidas em processo criminal para o processo cível, não havendo, nesse caso, a necessidade de se aguardar o trânsito em julgado do processo penal (informativo 536/STJ: 1ª Turma, AgRg no AResp 24.940/RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 18.02.2014, DJe 24.02.2014). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 652. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    RESPEITO AO CONTRADITÓRIO

Apesar de inegável importância da possibilidade aberta às partes de se aproveitarem de prova já produzida em outro processo, há corrente doutrinária que afirma ser imprescindível que a prova tenha sido produzida entre as mesmas partes, sob pena de infração ao princípio do contraditório. A lição deve ser admitida com reservas.
            Parece correto entender que o contraditório é o limite da utilização da prova emprestada, sendo inclusive nesse sentido o art. 372 do CPC, mas esse limite deve ser analisado no caso concreto, sendo admissível que a parte que não participou da produção da prova pretenda utilizá-la contra a parte que o fez. O contraditório é justamente a conjugação da informação + possibilidade de reação + poder de influência, e caso a parte abra mão dessa reação, nada haverá de irregular ou viciado. Imagine-se uma ação civil pública movida pelo Ministério Público contra uma empresa de petróleo em razão de poluição ambiental em alguma região litorânea. A perícia realizada é francamente favorável ao Ministério Público, indicando a poluição e a responsabilidade da empresa. Caso os pescadores da localidade tenham ações individuais contra a empresa poluidora cobrando seus prejuízos em razão do mesmo fato, é inegável que poderão emprestar a prova pericial produzida em processo do qual não participaram.
            O Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade de admitir o empréstimo de prova mesmo diante de difenteça das partes no processo de origem e de destino da prova, afirmando que o essencial é o respeito ao contraditório e não à identidade subjetiva das duas demandas (informativo 532/STJ: Corte Especial, EREsp 617.428/SP, REl. Min. Nancy Andrighi, j. 04.06.2014, DJe 17.06.2014).
            Outra situação-limite interessante é aquela na qual a prova produzida em outro processo simplesmente não pode mais ser produzida, como no caso do falecimento de uma testemunha ou do perecimento do bem que serviria de objeto da perícia. Nesse caso, o juiz se verá diante de um choque inevitável de princípios: qualidade de prestação jurisdicional (com a utilização da prova em seu convencimento) e o contraditório (com a impossibilidade da parte que não participou da produção da prova de realmente reagir contra a sua formação). A solução, nesse caso, se dá por meio da aplicação da regra da proporcionalidade, pesando, o juiz, os interesses envolvidos e buscando a melhor solução com o fito de gerar o menor prejuízo possível às partes.
            Na hipótese de direitos transindividuais (difusos e individuais homogêneos), é possível que o Ministério Público instaure inquérito civil anteriormente à propositura de demanda judicial. Trata-se de procedimento administrativo facultativo de legitimidade exclusiva do Ministério Público, com o objetivo de colher elementos de convicção para embasar eventual propositura da ação coletiva, celebração de compromissos de ajustamento de conduta ou até mesmo para evitar ações sem fundamento sério. No inquérito civil, invariavelmente, o contraditório não é respeitado, de forma a serem repetidas, em juízo, todas as provas já produzidas em tal procedimento. De qualquer forma, no caso de a prova ser de impossível produção no momento do processo, ou ainda ser muito onerosa a produção probatória, o juiz, sempre, à luz do princípio do livre convencimento motivado, poderá utilizar as provas produzidas no inquérito civil para formar o seu convencimento.
            O art. 372 do CPC se limita a exigir o respeito ao contraditório no empréstimo da prova, não esclarecendo em que termos tal princípio deve ser respeitado. Ao não prever expressamente se o contraditório exigido diz respeito ao processo de origem, de destino, ou a ambos, a divergência doutrinária e a tendência  jurisprudencial já existentes, não devem sofrer alterações na vigência do Novo Código de Processo Civil.
            Quanto ao respeito ao contraditório na prova emprestada, o Enunciado 52 do FPPC indica que “para a utilização da prova emprestada, faz-se necessária a observância do contraditório no processo de origem, assim como no processo de destino, considerando-se que, neste último, a prova mantenha a sua natureza originária”. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 652/653. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    VALORAÇÃO DA PROVA EMPRESTADA

Nos termos do art. 372 do CPC, o juiz do processo de destino atribuirá à prova emprestada a carga valorativa que entender adequada à situação concreta, aplicando-se ao caso o disposto no art. 371 do Novo Código. Significa dizer que o empréstimo se restringe à prova, sendo a valoração da prova um ato personalíssimo do juiz, não pode ser objeto de empréstimo. Assim, mesmo a prova que não convenceu o juiz do processo de origem pode convencer o juiz do processo de destino e vice-versa.
            A prova emprestada para que possa ser valorada pelo juízo de destino não pode ter sido anulada no processo de origem. A análise sobre a regularidade formal da prova oral ou pericial é exclusiva do juízo que a produz, de forma que sendo anulada tal prova no processo de origem, mesmo que o juiz do processo de destino entenda não haver razão legal para tal anulação, não poderá utilizá-la como prova emprestada. Afinal, a valoração só deve ser realizada de prova formalmente perfeita.
            Como já tive oportunidade de defender, entendo que o contraditório não é imprescindível ao empréstimo da prova, que deve ser admitida, ainda que em situações excepcionais, mesmo que ausente o princípio do contraditório. Mas quanto à valoração da prova emprestada, acredito que o contraditório tenha um papel de extrema relevância, já que quanto mais o contraditório for respeitado, maior será a carga probatória das provas produzidas, em razão de sua maior confiabilidade. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 653/654. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    PROVA PRODUZIDA EM OUTRO PROCESSO

Há no art. 372 do CPC uma novidade que promete gerar polêmica. Nos termos do dispositivo legal, há previsão no sentido de que a prova deve ser produzida em processo para poder ser emprestada.
            O aproveitamento das provas colhidas em sede de inquérito civil para fundamentar decisão da ação coletiva é entendimento tranquilo no Superior Tribunal de Justiça, ainda que com uma série de importantes – e nem sempre justificáveis – limitações. É corrente, por exemplo, o entendimento de que as provas colhidas no inquérito civil têm eficácia probatória relativa para fins de instrução da ação civil pública (STJ, 2ª Turma, REsp 1.280.321/MG, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 06.03.2012, DJe 09.03.2012).
            É tranquila a admissão de documentos juntados aos autos do inquérito civil. As mesmas decisões, entretanto, só dão valor à prova testemunhal colhida no inquérito civil por terem sido repetidas na esfera judicial, o que mostra claramente a resistência à aceitação das provas oral e pericial exclusivamente produzidas no inquérito civil (STJ, 1ª Turma, AgRg no AREsp 113.436/SP, rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 10.04.2012, DJe 18.05.2012, STJ, 2ª Turma, REsp 401.472/RO, rel. Min. Herman Benjamin, j. 16.06.2010, DJe 27.04.2011).
            Por outro lado, existem decisões que somente afastam as provas colhidas no inquérito civil se houver contraprova de hierarquia superior, ou seja, produzida sob a vigilância do contraditório. Entendo absolutamente correta a decisão, porque descarta a possibilidade de desconsiderar a prova simplesmente por não ter sido produzida pelo crivo do contraditório, mas ao mesmo tempo alerta que tal princípio empresta à prova produzida sob seu crivo uma maior carga de convencimento, conforme já defendido (STJ, 2ª Turma, REsp 849.841/MG, rel. Min. Eliana Calmon, j. 28.08.2007, p. 216; STJ, 2ª Turma, REsp 644.994/MG, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 17.02.2005, DJ 21.03.2005, p. 336).
            O Superior Tribunal de Justiça também entende cabível a utilização de prova produzida em inquérito policial em ação civil pública, desde que produzida dentro da legalidade (STJ 5ª Turma, RHC 52.209/RS, rel. Min. Jorge Mussi, j. 20.11.2014, DJe 27.11.2014).
            Não sendo o inquérito civil ou policial um processo, mas um procedimento investigativo, uma previsão expressa que condiciona o empréstimo da prova à sua produção em outro processo é promessa certa de polêmica. Particularmente, entendo que a novidade legislativa não será suficiente para alterar a atual jurisprudência. O caminho mais simples, ainda que tecnicamente incorreto, Será afirmar que a prova não está sendo tecnicamente emprestada, mas somente aproveitada na ação judicial, de forma a ser inaplicável o art. 372 do CPC. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 654/655. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

Nenhum comentário:

Postar um comentário