CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO
- Art. 372 - VARGAS, Paulo S.R.
PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO
DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM –
CAPÍTULO XII – DAS PROVAS - Seção I –
Disposições gerais
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Art.
372.
O juiz poderá admitir a
utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que
considerar adequado, observado o contraditório.
Sem
correspondência no CPC/1973
1.
PROVA
EMPRESTADA
A regra concernente à
produção da prova é que esta se realize dentro do processo em que será
utilizada como meio de convencimento do juiz. Em determinados casos,
entretanto, em respeito ao princípio da economia
processual, é possível aplicar no processo prova já produzida em outro
processo, em fenômeno conhecido por “prova emprestada”. A utilização de prova
já produzida em outro processo responde aos anseios de economia processual,
dispensando a produção de prova já existente, e também da busca da verdade possível,
em especial quando é impossível reproduzi-la.
Não existe prova emprestada documental, porque se a prova
é documental, basta a extração de uma cópia do processo de origem e juntada no
processo de destino. Tratar-se-á, tanto num como noutro, de prova documental. A
prova emprestada deve ter natureza de prova oral ou pericial no processo de
origem, sendo documentada em termo de audiência ou em laudo pericial, que será
juntado no processo de destino. Tratar-se á de prova atípica, com conteúdo oral
ou pericial e forma documental.
O empréstimo de provas não encontra limitação pela
natureza do processo ou mesmo pela Justiça na qual a prova foi produzida. É
possível o empréstimo entre processos em trâmite em diferentes Justiças, como
também é admissível o empréstimo de provas colhidas em processo criminal para o
processo cível, não havendo, nesse caso, a necessidade de se aguardar o
trânsito em julgado do processo penal (informativo 536/STJ: 1ª Turma, AgRg no
AResp 24.940/RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 18.02.2014, DJe
24.02.2014). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 652. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016.
Ed. Juspodivm).
2.
RESPEITO
AO CONTRADITÓRIO
Apesar de inegável
importância da possibilidade aberta às partes de se aproveitarem de prova já
produzida em outro processo, há corrente doutrinária que afirma ser
imprescindível que a prova tenha sido produzida entre as mesmas partes, sob
pena de infração ao princípio do contraditório. A lição deve ser admitida com
reservas.
Parece correto entender que o contraditório é o limite da
utilização da prova emprestada, sendo inclusive nesse sentido o art. 372 do
CPC, mas esse limite deve ser analisado no caso concreto, sendo admissível que
a parte que não participou da produção da prova pretenda utilizá-la contra a
parte que o fez. O contraditório é justamente a conjugação da informação + possibilidade de reação + poder de
influência, e caso a parte abra mão dessa reação, nada haverá de irregular
ou viciado. Imagine-se uma ação civil pública movida pelo Ministério Público
contra uma empresa de petróleo em razão de poluição ambiental em alguma região
litorânea. A perícia realizada é francamente favorável ao Ministério Público,
indicando a poluição e a responsabilidade da empresa. Caso os pescadores da
localidade tenham ações individuais contra a empresa poluidora cobrando seus
prejuízos em razão do mesmo fato, é inegável que poderão emprestar a prova
pericial produzida em processo do qual não participaram.
O Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade de
admitir o empréstimo de prova mesmo diante de difenteça das partes no processo
de origem e de destino da prova, afirmando que o essencial é o respeito ao
contraditório e não à identidade subjetiva das duas demandas (informativo 532/STJ: Corte Especial,
EREsp 617.428/SP, REl. Min. Nancy Andrighi, j. 04.06.2014, DJe 17.06.2014).
Outra situação-limite interessante é aquela na qual a
prova produzida em outro processo simplesmente não pode mais ser produzida,
como no caso do falecimento de uma testemunha ou do perecimento do bem que
serviria de objeto da perícia. Nesse caso, o juiz se verá diante de um choque
inevitável de princípios: qualidade de prestação jurisdicional (com a
utilização da prova em seu convencimento) e o contraditório (com a
impossibilidade da parte que não participou da produção da prova de realmente
reagir contra a sua formação). A solução, nesse caso, se dá por meio da
aplicação da regra da proporcionalidade,
pesando, o juiz, os interesses envolvidos e buscando a melhor solução com o
fito de gerar o menor prejuízo possível às partes.
Na hipótese de direitos transindividuais (difusos e
individuais homogêneos), é possível que o Ministério Público instaure inquérito
civil anteriormente à propositura de demanda judicial. Trata-se de procedimento
administrativo facultativo de legitimidade exclusiva do Ministério Público, com
o objetivo de colher elementos de convicção para embasar eventual propositura
da ação coletiva, celebração de compromissos de ajustamento de conduta ou até
mesmo para evitar ações sem fundamento sério. No inquérito civil,
invariavelmente, o contraditório não é respeitado, de forma a serem repetidas,
em juízo, todas as provas já produzidas em tal procedimento. De qualquer forma,
no caso de a prova ser de impossível produção no momento do processo, ou ainda
ser muito onerosa a produção probatória, o juiz, sempre, à luz do princípio do
livre convencimento motivado, poderá utilizar as provas produzidas no inquérito
civil para formar o seu convencimento.
O art. 372 do CPC se limita a exigir o respeito ao
contraditório no empréstimo da prova, não esclarecendo em que termos tal
princípio deve ser respeitado. Ao não prever expressamente se o contraditório
exigido diz respeito ao processo de origem, de destino, ou a ambos, a
divergência doutrinária e a tendência jurisprudencial já existentes, não devem
sofrer alterações na vigência do Novo Código de Processo Civil.
Quanto ao respeito ao contraditório na prova emprestada,
o Enunciado 52 do FPPC indica que “para a utilização da prova emprestada,
faz-se necessária a observância do contraditório no processo de origem, assim
como no processo de destino, considerando-se que, neste último, a prova
mantenha a sua natureza originária”. (Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 652/653. Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed.
Juspodivm).
3.
VALORAÇÃO DA PROVA EMPRESTADA
Nos
termos do art. 372 do CPC, o juiz do processo de destino atribuirá à prova
emprestada a carga valorativa que entender adequada à situação concreta,
aplicando-se ao caso o disposto no art. 371 do Novo Código. Significa dizer que
o empréstimo se restringe à prova, sendo a valoração da prova um ato
personalíssimo do juiz, não pode ser objeto de empréstimo. Assim, mesmo a prova
que não convenceu o juiz do processo de origem pode convencer o juiz do
processo de destino e vice-versa.
A prova emprestada para que possa
ser valorada pelo juízo de destino não pode ter sido anulada no processo de
origem. A análise sobre a regularidade formal da prova oral ou pericial é
exclusiva do juízo que a produz, de forma que sendo anulada tal prova no
processo de origem, mesmo que o juiz do processo de destino entenda não haver
razão legal para tal anulação, não poderá utilizá-la como prova emprestada.
Afinal, a valoração só deve ser realizada de prova formalmente perfeita.
Como já tive oportunidade de
defender, entendo que o contraditório não é imprescindível ao empréstimo da
prova, que deve ser admitida, ainda que em situações excepcionais, mesmo que
ausente o princípio do contraditório. Mas quanto à valoração da prova
emprestada, acredito que o contraditório tenha um papel de extrema relevância,
já que quanto mais o contraditório for respeitado, maior será a carga
probatória das provas produzidas, em razão de sua maior confiabilidade. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 653/654. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
4.
PROVA PRODUZIDA EM OUTRO PROCESSO
Há
no art. 372 do CPC uma novidade que promete gerar polêmica. Nos termos do
dispositivo legal, há previsão no sentido de que a prova deve ser produzida em
processo para poder ser emprestada.
O aproveitamento das provas colhidas
em sede de inquérito civil para fundamentar decisão da ação coletiva é entendimento
tranquilo no Superior Tribunal de Justiça, ainda que com uma série de
importantes – e nem sempre justificáveis – limitações. É corrente, por exemplo,
o entendimento de que as provas colhidas no inquérito civil têm eficácia
probatória relativa para fins de instrução da ação civil pública (STJ, 2ª
Turma, REsp 1.280.321/MG, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 06.03.2012, DJe
09.03.2012).
É tranquila a admissão de documentos
juntados aos autos do inquérito civil. As mesmas decisões, entretanto, só dão
valor à prova testemunhal colhida no inquérito civil por terem sido repetidas
na esfera judicial, o que mostra claramente a resistência à aceitação das
provas oral e pericial exclusivamente produzidas no inquérito civil (STJ, 1ª
Turma, AgRg no AREsp 113.436/SP, rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 10.04.2012,
DJe 18.05.2012, STJ, 2ª Turma, REsp 401.472/RO, rel. Min. Herman Benjamin, j.
16.06.2010, DJe 27.04.2011).
Por outro lado, existem decisões que
somente afastam as provas colhidas no inquérito civil se houver contraprova de
hierarquia superior, ou seja, produzida sob a vigilância do contraditório.
Entendo absolutamente correta a decisão, porque descarta a possibilidade de
desconsiderar a prova simplesmente por não ter sido produzida pelo crivo do
contraditório, mas ao mesmo tempo alerta que tal princípio empresta à prova
produzida sob seu crivo uma maior carga de convencimento, conforme já defendido
(STJ, 2ª Turma, REsp 849.841/MG, rel. Min. Eliana Calmon, j. 28.08.2007, p.
216; STJ, 2ª Turma, REsp 644.994/MG, rel. Min. João Otávio de Noronha, j.
17.02.2005, DJ 21.03.2005, p. 336).
O Superior Tribunal de Justiça
também entende cabível a utilização de prova produzida em inquérito policial em
ação civil pública, desde que produzida dentro da legalidade (STJ 5ª Turma, RHC
52.209/RS, rel. Min. Jorge Mussi, j. 20.11.2014, DJe 27.11.2014).
Não sendo o inquérito civil ou
policial um processo, mas um procedimento investigativo, uma previsão expressa
que condiciona o empréstimo da prova à sua produção em outro processo é
promessa certa de polêmica. Particularmente, entendo que a novidade legislativa
não será suficiente para alterar a atual jurisprudência. O caminho mais
simples, ainda que tecnicamente incorreto, Será afirmar que a prova não está
sendo tecnicamente emprestada, mas somente aproveitada na ação judicial, de
forma a ser inaplicável o art. 372 do CPC. (Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 654/655. Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed.
Juspodivm).
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