sábado, 3 de março de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - DAS PROVAS - Art. 373 - VARGAS, Paulo S.R. – DAS PROVAS - vargasdigitador.blogspot.com


CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 373 - VARGAS, Paulo S.R.
PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XII  – DAS PROVAS - Seção I – Disposições gerais
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Art. 373. O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito:
II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito,  do autor.
§ 1º. Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa, relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput, ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
§ 2º. A decisão prevista no § 1º deste artigo não pode gerar situação em que a  desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.
§ 3º.  A distribuição diversa do ônus da prova também pode ocorrer por convenção das pares, salvo quando:
I – recair sobre direito indisponível da parte;
II – tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
§ 4º. A convenção de que trata o § 3º pode ser celebrada antes ou durante o processo.
Correspondência no CPC/1973 no art. 333, com a seguinte redação e forma:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito  do autor.
§§ 1º e 2º.  Sem correspondência no CPC/1973.
§ 3º. Correspondente ao Parágrafo único do art. 333 com a seguinte redação: É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:
I - Recair sobre direito indisponível da parte;
II – tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
§ 4º. Sem correspondência no CPC/1973.

1.    ÔNUS DA PROVA

A doutrina comumente divide o estudo do instituto do ônus da prova em duas partes; a primeira chamada de ônus subjetivo da prova, e a segunda de ônus objetivo. No tocante ao ônus subjetivo da prova, analisa-se o instituto sob a perspectiva de quem é o responsável pela produção de determinada prova (“quem deve provar o quê”), enquanto no ônus objetivo da prova, o instituto é visto como uma regra de julgamento a ser aplicada pelo juiz, no momento de proferir a sentença, no caso de a prova se mostrar inexistente ou insuficiente. No aspecto objetivo, o ônus da prova afasta a possibilidade de o juiz declarar o non liquet diante de dúvidas a respeito das alegações de fato em razão da insuficiência ou inexistência de provas. Sendo obrigado a julgar e não estando convencido das alegações de fato, aplica a regra do ônus da prova.
            O ônus da prova é, portanto, regra de julgamento, aplicando-se para as situações em que, ao final da demanda, persistem fatos controvertidos não devidamente comprovados durante a instrução probatória. Trata-se de ônus imperfeito porque nem sempre a parte que tinha o ônus da prova e não a produziu será colocada num estado de desvantagem processual, bastando imaginar a hipótese de produção de prova de ofício ou ainda de a prova ser produzida pela parte contrária. Mas também é regra de conduta das partes, porque indica a elas quem potencialmente será prejudicado diante da ausência ou insuficiência da prova.
            Como já afirmado, o ônus da prova, em seu aspecto objetivo, é uma regra de julgamento, aplicando-se somente no momento final da demanda, quando o juiz estiver pronto para proferir sentença. É regra que se aplica apenas no caso de inexistência ou insuficiência da prova, uma vez que, tendo sido a prova produzida, não interessando por quem, o princípio não se aplicará. Trata-se do princípio da comunhão da prova (ou aquisição da prova), que determina que, uma vez tendo sido a prova produzida, ela passa a ser do processo, e não de quem a produziu. Dessa forma, o aspecto subjetivo só passa a ter relevância para a decisão do juiz, se ele for obrigado a aplicar o ônus da prova em seu aspecto objetivo, diante de ausência ou insuficiência de provas, deve indicar qual das partes tinha o ônus de provar e colocá-la numa situação de desvantagem processual. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 656. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    SISTEMAS DE DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA

Há dois possíveis sistemas de distribuição do ônus da prova entre autor e réu. O sistema estático tem as regras de distribuição previamente determinadas pelo legislador, de forma que o caso concreto é irrelevante para se definir ser o ônus probatório do autor ou do réu. Já no sistema de distribuição dinâmica do ônus da prova, não existe norma legal que proteja a prior e de forma abstrata a distribuição do ônus entre autor e réu, cabendo ao juiz, no caso concreto, realizar tal distribuição, tomando como critério a maior facilidade da parte em se desincumbir do ônus ou seja, terá, o ônus, a parte que tenha maior facilidade na produção da prova.
            O sistema brasileiro é híbrido, já que tem regras fixas previstas no art. 373, I e II do CPC, mas que podem ser modificadas, com a redistribuição – inversão da regra legal – pelo juiz no caso concreto, nos termos do § 1º do mesmo dispositivo legal. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 656. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    DISTRIBUIÇÃO ESTÁTICA

Segundo a regra geral estabelecida pelos incisos do art. 373 do CPC, cabe ao autor o ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito, ou seja, deve provar a mat´ria fática que traz em sua petição inicial e que serve como origem da relação jurídica deduzida em juízo. Em relação ao réu, também o ordenamento processual dispõe sobre ônus probatórios, mas não concernentes aos fatos constitutivos do direito do autor. Naturalmente, se desejar, poderá tentar demonstrar a inverdade das alegações de fato feitas pelo autor por meio de produção probatória, mas, caso não o faça, não será colocado em situação de desvantagem, a não ser que o autor comprove a veracidade de tais fatos. Nesse caso, entretanto, a situação prejudicial não se dará em consequência de ausência de produção de prova pelo réu, mas sim pela produção de prova pelo autor.
Caso o réu alegue, por meio de defesa de mérito indireta, um fato novo, impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, terá o ônus de comprová-lo. Por fato impeditivo entende-se aquele de conteúdo negativo, demonstrativo de ausência de algum dos requisitos genéricos de validade do ato jurídico como, por exemplo, a alegação de que o contratante era absolutamente incapaz quando celebrou o contrato. Fato modificativo é aquele que altera apenas parcialmente o fato constitutivo, podendo ser da alteração subjetiva, ou seja, referente aos sujeitos da relação jurídica (como ocorre, por exemplo, na cessão de crédito) ou objetiva, ou seja, referente ao conteúdo da relação jurídica (como ocorre, por exemplo, na compensação parcial). Fato extintivo é o que faz cessar a relação jurídica original, como a compensação numa ação de cobrança. A simples negação do fato alegado pelo autor não acarreta ao réu o ônus da prova.
O ônus da prova carreado ao réu pelo art. 373, II, do CPC só passa a ser exigido no caso concreto na hipótese de o autor ter se desincumbido de seu ônus probatório, porque só passa a ter interesse na decisão do juiz a existência ou não do fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, após se convencer da existência do fato constitutivo de seu direito. Significa dizer que, se nenhuma das partes se desincumbir de seus ônus, no caso concreto, e o juiz tiver que decidir com fundamento na regra do ônus da prova, o pedido do autor será julgado improcedente. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 656/657. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA

O Código de Processo Civil inovou quanto ao sistema de distribuição dos ônus probatórios, atendendo corrente doutrinária que já vinha defendendo a chamada “distribuição dinâmica do ônus da prova”. Na realidade, criou-se um sistema misto: existe abstratamente prevista em lei uma forma de distribuição, que poderá ser no  caso concreto modificada pelo juiz. Diante da inércia do juiz, portanto, as regras de distribuição do ônus da prova no novo diploma processual continuarão a ser as mesmas do CPC/1973.
            Mesmo antes da consagração legislativa, o Superior Tribunal de Justiça deu início à aplicação dessa forma dinâmica de distribuição do ônus da prova em ações civis por danos ambientais (Informativo 418/STJ, 2ª Turma, REsp 1.060.753/SP, rel. Ministra Eliana Calmon, j. 1º.12.2009, DJ 14.12.2009) e também na tutela do idoso, em respeito aos arts. 2º, 3º e 71 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), no que asseguram aos litigantes maiores de 60 anos facilidade na produção de provas e a efetivação concreta desse direito (STJ, 1ª Turma, RMS 38.025/BA, rel. Min. Sérgio Kukina, j. 23.09.2014, DJe 01.10.2014). no entanto, já existem decisões recentes que adotam a tese de forma mais ampla, ora valendo-se de interpretação sistemática da nossa legislação processual, inclusive em bases constitucionais (STJ, 3ª Turma, EDcl no REsp 1.286.704/SP, rel. Nancy Andrighi, j. 26.11.2013, DJe 09.12.2013), ora admitindo a flexibilização do sistema rígido de distribuição do ônus probatório diante da insuficiência da regra geral (STJ, 4ª Turma, AgRg no AREsp 216.315/RS, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 23.10.2012, DJe 06.11.2012).
            O CPC adota e3ssa forma dinâmica de distribuição do ônus da prova. Conforme já mencionado, apesar de o art. 373 em seus dois incisos repetir as regras contidas no art. 333 do CPC/1973, o § 1º permite que o juiz, nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa, relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, atribua, em decisão fundamentada e com respeito ao princípio do contraditório, o ônus da prova de forma diversa.
            Consagra-se, legislativamente, a ideia de que deve ter o ônus da prova a parte que apresentar maior facilidade em produzir a prova e se livrar do encargo. Como essa maior facilidade dependerá do caso concreto, cabe ao juiz fazer a análise e determinar qual o ônus de cada parte no processo. Registre-se que, diante da omissão do juiz, as regras continuaram a ser aplicadas como sempre foram sob a égide do CPC/1973, ou seja, caberá ao autor o ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito e ao réu, os fatos impeditivos, modificativos e extintivos.
            Como se pode notar, o sistema brasileiro passou a ser misto, sendo possível aplicar ao caso concreto o sistema flexível da distribuição dinâmica do ônus da prova como o sistema rígido da distribuição legal. Tudo dependerá da iniciativa do juiz, que não estará obrigado a fazer distribuição do ônus probatório de forma diferente daquela prevista na lei.
            Interessante e elogiável a vedação a essa inversão, contida no § 2º do dispositivo ora comentado, proibindo-a sempre que posa gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. A norma é elogiável porque a técnica de distribuição dinâmica da prova não se presta a tornar uma das partes vitoriosa por onerar a parte contrária com encargo do qual ela não terá como se desincumbir. A nova sistemática de distribuição do ônus da prova serve para facilitar a produção da prova, e não para fixar a priori vencedores e vencidos. Nesse sentido, interessante decisão do Superior Tribunal de Justiça quanto à inversão prevista no art. 6º, VIII, do CDC (STJ, 4ª Turma, REsp 720.930/RS, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 20.10.2009, DJe 09.11.2009).
            Apesar de o art. 373, § 1º, do CPC prever a possibilidade de o juiz atribuir o ônus da prova “de modo diverso” naturalmente a regra trata da inversão do ônus da prova, até porque, sendo este distribuído entre autor e réu, o modo diverso só pode significar a inversão da regra legal. Tanto assim que o dispositivo expressamente se refere aos casos previstos em lei como uma das hipóteses da fixação “de modo diverso”, e esses casos são justamente os de inversão do ônus da prova. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 657/658. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

5.    INVERSÃO CONVENCIONAL

A inversão convencional decorre de um acordo de vontades entre as partes, que poderá ocorrer antes ou durante o processo, nos termos do § 4º do art. 373 do CPC. Essa forma de inversão tem duas limitações previstas pelo § 3º do artigo suprarreferido, que prevê a nulidade dessa espécie de inversão quando: (i) recair sobre direito indisponível da parte; (ii) tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito. Essa segunda limitação legal é aplicável nas hipóteses de inversão do ous probatório diante da alegação de fato negativo indeterminado, cuja prova é chamada pela doutrina de “prova diabólica”
            Note-se que não é difícil a prova de um fato negativo determinado, bastando para tanto a produção de prova de um fato positivo determinado incompatível logicamente com o fato negativo. O problema é o fato negativo indeterminado (fatos absolutamente negativos), porque nesse caso é até possível a prova de que a alegação desse fato é falsa, mas é impossível a produção de prova de que ela seja verdadeira (STJ, 3ª Turma, REsp 422.778/SP, rel. Min. Castro Filho, rel. para acórdão rel. Mis. Nancy Andrighi, j. 19.06.2007, DJ 27.08.2007). Registre-se, entretanto que o Superior Tribunal de Justiça já entendeu que a prova de má-fé da parte contrária seria prova diabólica (STJ, 3ª Turma, AgRg no AREsp 533.403?MS, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 18/06/2015, DJe 04/08/2015), sendo que, nesse caso, a prova pode ser extremamente difícil, mas certamente não é impossível. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 658/659. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

6.    “INVERSÃO” LEGAL

A inversão legal vem prevista expressamente em lei, não exigindo o preenchimento de requisitos legais no caso concreto. Os exemplos dessa espécie de inversão do ônus probatório são encontrados no Código de Defesa do Consumidor: (a) é ônus  do fornecedor provar que não colocou o produto no mercado, que ele não é defeituoso ou que houve culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros pelos danos gerados (art. 12, § 3º, do CDC); (b) é ônus do fornecedor provar que o serviço não é defeituoso ou que há culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro nos danos gerados (art. 14, § 3º, do CDC); (c) é ônus do fornecedor provar a veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária que patrocina (art. 38 do CDC).
            Na realidade, nesses casos nem é precisamente correto falar-se em inversão porque na realidade o que se tem é uma regra legal específica em sentido contrário à regra legal genérica de distribuição do ônus da prova. Tanto assim que o juiz não inverterá o ônus da prova no caso concreto, limitando-se a aplicar a regra específica se no momento do julgamento lhe faltar prova para a formação de seu convencimento. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 659. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

7.    INVERSÃOJUDICIAL

A inversão judicial foi a mais afetada pelo atual CPC, deixando de ser uma forma de inversão reservada a poucas hipóteses previstas em lei, como no art. 6º, VIII, do CDC e na hipótese de haver indícios de agiotagem, nos termos da MP 2.172-32/2001, imputando-se ao credor a responsabilidade pela comprovação da regularidade jurídica da cobrança (Informativo 482/STJ: 3ª Turma, REsp 1.132.741/MG; rel. Min. Massami Uyeda, j. 06.09.2011, DJe 16.09.2011).
            A partir da previsão do § 1º do art. 373 do CPC, a inversão judicial, que ocorre por meio de prolação de uma decisão judicial, que será fruto da análise do preenchimento dos requisitos legais, passou a ser regra geral do Direito, de forma que em toda relação jurídica de direito material levada a juízo será possível essa inversão em aplicação da teoria, agora consagrada legislativamente, da distribuição dinâmica do ônus da prova.
            Cabe, diante desse novo cenário, analisar se as antigas normas específicas de inversão judicial do ônus da prova tornaram-se obsoletas, podendo inclusive se falar em eventual revogação tácita.
            É seguro afirmar que a motivação – senão única ao mesmo principal – de tais previsões era a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, atribuindo-se, no caso concreto, o ônus para a parte mais preparada para dele se desincumbir. Na hipótese de indícios de agiotagem, é mais fácil ao apontado como agiota provar que não se trata do que aponta tais indícios do que para a vítima provar que houve o crime. O mesmo se diga da hipossuficiência do consumidor exigida no art. 6º, VIII, do CDC, de natureza técnica, ou seja, de acesso à prova.
            Nas relações consumeristas, entretanto, é preciso lembrar que existem dois requisitos para inversão do ônus da prova que, segundo a doutrina majoritária, são alternativos, bastando a presença de um deles para que se legitime a inversão do ônus probatório. Dessa forma, ainda que não presentes as condições de hipossuficiência técnica, que legitimaria a aplicação da distribuição dinâmica do ônus da prova ao caso concreto, mas sendo verossímeis as alegações do consumidor, a inversão será justificável. O art. 6º, VIII, do CDC, portanto, sobrevive, ainda que parcialmente, diante do novo Código do Processo Civil. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 659/660. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

8.    MOMENTO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA

Na inversão convencional e legal, não surge problema quanto ao momento de inversão do ônus da prova; na primeira, estará invertido o ônus a partir do acordo entre as partes, e na segunda, a inversão ocorre desde o início da demanda. Na hipótese judicial, entretanto, a inversão dependerá de uma decisão judicial fundada no preenchimento dos requisitos legais, e o momento da prolação dessa decisão não é tema pacífico na doutrina.
            Apesar de ser regra de julgamento, só se aplicando ao final do processo, e isso somente no caso de inexistência ou insuficiência de prova, existem casos nos quais, em respeito ao princípio do contraditório, o juiz deve, já no saneamento do processo, se manifestar sobre eventual inversão da regra geral, sendo nesse sentido a previsão do art. 357, III, deste Livro, perceba-se que o juiz não estaria nesse momento invertendo o ônus da prova, regra que até mesmo pode nem ser utilizada caso a instrução probatória convença amplamente o juiz. O que o juiz fará é apenas sinalizar às partes que, no caso de necessidade de aplicação da regra, o fará de forma invertida, e não conforme previsto como regra geral em nosso estatuto processual.
            Para que o réu não seja surpreendido com a inversão quando já finalizada a instrução probatória, entendo que, em respeito ao princípio do contraditório, a sinalização de possível inversão – se necessário for – deve ser feita expressamente já na decisão saneadora (Informativo 469/STJ: 1ª Seção, REsp 802.832/MG, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13.04.2011, DJe 23.09.2011). parece não considerar tal circunstancia a parcela doutrinaria e jurisprudencial que, firma na ideia de que ônus da prova é uma regra de julgamento, entende que somente no momento da sentença o juiz deve se manifestar a respeito do tema (STJ, 3ª Turma, REsp 422.778/SP, rel. Mis. Castro Filho, rel. para acórdão rel. Min. Nancy Andrighi, j. 19.06.2007, DJ 27.08.2007).
            Não parece correto o entendimento porque desconsidera a realidade de que o ônus da prova também funciona como uma regra de conduta, desprezando-se a realidade forense de que a parte que não tem o ônus probatório não realizará a prova, porque corre o risco de que ela seja contrária ao seu interesse. E nem se fale que a parte deve produzir a prova independentemente de ter o ônus probatório porque a preocupação em descobrir a verdade possível nem sempre é das partes, mas sim do juiz. O juiz busca a justiça no processo, as partes buscam a vitória, obviamente, dentro da boa-fé e lealdade processual.
            O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que, sendo o ônus da prova uma regra de instrução, sua inversão dever preceder à fase probatória, sendo realizada de preferência no saneamento do processo ou, quando excepcionalmente realizada após esse momento procedimental, deverá ser reaberta a instrução para a parte que recebe o ônus da prova caso pretenda produzir provas (STJ, 2ª turma, AgRg no REsp 1.450.473/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 23.09.2014, DJe 30.009.2014, STJ, 3ª Turma, REsp 1.395.254/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 15.10.2013, DJe 29.11.2013; STJ, 2ª Seção, EREsp 422.778/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Rel. p/acórdão Min. Maria Isabel Gallotti, j. 29.02.2012, DJe 21.06.2012).
            Esse entendimento, que sempre me pareceu mais adequado, prevaleceu no novo Código de Processo Civil, mais precisamente no art. 373, § 1º, que exige do juiz, sempre que inverter o ônus da prova, que dê oportunidade á parte para se desincumbir do ônus que lhe tenha sido atribuído. Significa que, em respeito ao contraditório, a parte terá amplo direito à produção da prova, de modo que não parece interessante que essa inversão ocorra somente no momento de prolação de sentença, sob pena de ofensa ao princípio da economia processual. Parece ser mais vantajoso que no momento de saneamento do processo o juiz já sinalize a forma de aplicação da regra do ônus da prova, caso essa aplicação realmente se faça necessária no caso concreto. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 660/661. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).


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