domingo, 11 de março de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 385 - DAS PROVAS - Do Depoimento Pessoal - VARGAS, Paulo S.R.


CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 385 - VARGAS, Paulo S.R.
PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XII  – DAS PROVAS - Seção IV – Do Depoimento Pessoal - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 385. Cabe à parte requerer o depoimento pessoal da outra parte, a fim de que esta seja interrogada na audiência de instrução e julgamento, sem prejuízo do poder do juiz de ordená-lo de ofício.

§ 1º. Se a parte, pessoalmente intimada para prestar depoimento pessoa e advertida da pena de confesso, não comparecer ou, comparecendo, se recusar a depor, o juiz aplicar-lhe-á a pena.

§ 2º. É vedado a quem ainda não depôs assistir ao interrogatório da outra parte.

§ 3º.  O depoimento pessoal da parte  que residir em comarca, seção ou subseção judiciária diversa daquela onde tramita o processo poderá ser colhido por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, o que poderá ocorrer, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento.

Correspondência no CPC/1973, art 343, §§ 1º e 2º, e art. 344, parágrafo único, com a seguinte redação:

Art. 343. Quando o juiz não o determinar de ofício, compete a cada parte requerer o depoimento pessoal da outra, a fim de interrogá-la na audiência de instrução e julgamento.

§ 1º e 2º. § 1º. A parte será intimada pessoalmente, constando do mandado que se presumirão confessados os fatos contra ela alegados, caso não compareça ou, comparecendo, se recuse a depor. § 2º. Se a parte intimada não comparecer, ou comparecendo, se recusar a depor, o juiz lhe aplicará a pena de confissão.

Art. 344. (parágrafo único). Este referente ao § 2º do art. 385 do CPC/2015. É  defeso, a quem ainda não depôs, assistir ao interrogatório da outra parte.

§ 3º. Sem correspondência no CPC/1973.

1.    CONCEITO

O depoimento pessoal é espécie de prova oral, sendo conceituado como o testemunho das partes em juízo sempre que requerido expressamente pela parte contrária ou pelo juiz. É importante colocar as partes diretamente diante do juiz, sem o filtro criado pelos advogados quando elaboram suas razões. Muitas vezes, inclusive, o depoimento pessoal pode mostrar que as coisas não se deram exatamente como narrado pelo advogado na petição inicial ou contestação.

            Apesar de constituir-se em testemunho da parte, o depoimento pessoal não se confunde com a prova testemunhal, em razão dos sujeitos que prestam as declarações em juízo. Somente poderão prestar depoimento pessoal os sujeitos que figurem na relação jurídica processual como partes na demanda. Dessa forma, tanto o autor quanto o réu poderão prestar depoimento pessoal, assim como os terceiros intervenientes que assumem a posição de parte na demanda. O assistente simples, por não ser parte na demanda, mas mera parte no processo, não presta depoimento pessoal, sendo ouvido como testemunha.

            Também não se confunde o depoimento pessoal com a prova pericial, ainda que as partes tenham amplo conhecimento técnico sobre a matéria fática debatida no processo. Enquanto a prova pericial deve ser conduzida por um terceiro desinteressado na solução do processo (até mesmo porque se for interessado, deverá ser afastado do encargo), o depoimento pessoal será sempre prestado por sujeito diretamente interessado no resultado do processo. Aponte-se, ainda, para a possibilidade de o perito ser chamado para prestar esclarecimentos em audiência, o que poderá fazer oralmente. Ainda assim, em razão do sujeito que produz a prova, não se confundirá com o depoimento pessoal prestado por uma das partes.

            Tradicionalmente, o depoimento pessoal era visto pela doutrina como meio de prova que tinha como único e exclusivo objetivo a confissão. Tal ponto de vista se justifica na circunstância de que os sujeitos que produziam essa espécie de prova eram sempre os maiores interessados na solução da demanda, não havendo assim a imparcialidade e o compromisso com a verdade que dão credibilidade à prova oral. Dessa forma, o depoimento pessoal não poderia servir para favorecer a parte que o prestava; pelo contrário, quando a parte afirmasse fatos que lhe favorecessem, deveria o depoimento ser encarado com reservas, diante do nítido interesse da parte envolvida no litígio.

            Ocorre, entretanto, que o contato pessoal do juiz com as partes pode, em razão da aplicação do livre convencimento motivado do juiz, esclarecer alguns fatos que não tenham chegado ao seu conhecimento, somente após o filtro do patrono que subscreve as peças processuais. Não seria absurdo, portanto, imaginar uma situação em que o depoimento pessoal favoreça a parte que o prestou, devendo o juiz, entretanto, sempre levar em consideração o interesse direto da parte em se sagrar vitoriosa na demanda. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 681/682. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    PEDIDO DA PARTE CONTRÁRIA E DETERMINAÇÃO DE OFÍCIO
Criticava o CPC/1973 por não distinguir com exatidão dois meios de provas diferentes o depoimento pessoal, pedido pela parte contrária, e o interrogatório, determinado de ofício pelo juiz. No Código atual, com a expressa previsão do art 385, caput, que expressamente consagra a possibilidade de o juiz determinar de ofício o depoimento pessoal, não existe mais o interrogatório, que deixou de ser meio de prova, transformando-se em forma de produção do depoimento pessoal. Acredito que a medida tenha sido salutar, considerando ser prática quase inexistente a realização de interrogatório no processo civil.

            O dispositivo ora comentado prevê ainda como legitimado ao pedido de produção de depoimento pessoal a parte contrária, ou seja, o autor tem legitimidade para pedir o depoimento do réu e vice-versa. A parte, portanto, não pode pedir seu próprio depoimento pessoal. Mas também os terceiros intervenientes podem requerer o depoimento pessoal dos sujeitos processuais que se encontrem em posição processual contrária àquela que assumem no processo.

            O Ministério Público tem atuação no processo civil como parte ou como fiscal da ordem jurídica. Nas situações em que funciona como parte, não surgem  maiores questionamentos, seguindo-se a regra geral que permite o requerimento para o depoimento pessoal da parte contrária. Quando atua como fiscal da ordem jurídica, não é possível falar em parte contrária, mas ainda assim o Ministério Público pode requerer o depoimento pessoal de ambas as partes, ainda que omissa a lei nesse sentido. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 682/683. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    DEPOENTE

No tocante ao sujeito responsável pelo depoimento pessoal, será sempre pessoa física inclusive no caso de ser parte no processo pessoa jurídica, quando o depoimento pessoal será tomado de seu representante legal ou de preposto devidamente constituído com poderes para confessar. No depoimento pessoal, vigora o princípio da pessoalidade e indelegabilidade, tratando-se de ato personalíssimo (STJ, 3ª Turma, REsp 623.575-RO, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 18.11.2004, DJ 15.03.2005). registre-se a existência de parcela doutrinária que, mesmo sendo a parte uma pessoa física, entende ser possível o depoimento pessoal por meio de procurador com poderes específicos para confessar, com o que não se concorda, mesmo sendo a parte incapaz, em razão da natureza personalíssima do ato.

            A possibilidade de procuradores deporem pessoalmente em juízo, no lugar da parte, abriria a possibilidade de sujeitos imbuídos de má-fé indicarem para seu lugar pessoas com maior poder de persuasão, não para dizer necessariamente a verdade, mas sim na tentativa de ludibriar o juiz a respeito da matéria fática da demanda. Apesar de o juiz ser considerado um “detector de mentiras humano”, em razão da sucessivas audiências de que participa, essa é uma situação que não pode ser descartada, sendo o melhor entendimento aquele que aponta para a possibilidade (ato personalíssimo) do depoimento pessoal. Tal regra não deve ser excepcionada nem mesmo quando a parte for incapaz, não devendo se admitir que o depoimento pessoal seja colhido por meio de seu representante legal.

            Conforme já afirmado, tratando de pessoa jurídica, o depoimento pessoal deveria em tese ser realizado por meio de seu representante legal. Ciente da enorme dificuldade que tal exigência ocasionaria a grandes empresas, frequentemente clientes do Poder Judiciário no sentido de que se tivessem que enviar seus representantes legais para todas as audiências em que fosse requerido seu depoimento pessoal, jamais teria número suficiente de representantes para todos os processos, abre-se a possibilidade da representação por meio de preposto com poderes especiais para confessar e com conhecimento da matéria fática do processo (STJ, 3ª Turma, REsp 191.078/MA, rel. Min. Ari Pargendler, j. 15.09.2000, DJ 24.10.2000). o preposto não precisa manter vínculo empregatício com a pessoa jurídica, conforme expressamente previsto no art 9º, § 4º, da Lei 9.099/1995, em regra aplicável também ao processo em trâmite perante a Justiça Comum. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 683. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    OITIVA EM AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO

A produção da prova divide-se em duas fases: preparação e realização. A preparação da prova antecede a audiência de instrução, constituindo-se na intimação da parte para que compareça em juízo sob pena de confesso. Tal intimação, obrigatoriamente pessoal, pode se realizar tanto por correio como por oficial de justiça, preferindo-se sempre que possível, a primeira forma, por ser mais rápida, simples e barata. A realização se dá na audiência de instrução e julgamento, seguindo basicamente a forma prescrita para a oitiva das testemunhas, com a diferença de que no depoimento pessoal, o patrono da parte que depõe não pode lhe fazer perguntas. Primeiro as perguntas do juiz, depois as perguntas do advogado da parte contrária e, por fim, as perguntas do Ministério Público, quando funcionar no processo como fiscal da ordem jurídica.

Apesar de o momento adequado para a produção do meio de prova ora analisado ser a audiência de instrução e julgamento, admite-se excepcionalmente que o depoimento pessoal seja prestado em outro momento processual. No caso de a parte residir em outra comarca, será realizada a prova por meio de carta precatória, e a exemplo da prova testemunhal, caso não possa comparecer à sede do juízo, por enfermidade, idade avançada, ou qualquer outro obstáculo material intransponível, a prova será produzida fora da audiência. O mesmo se diga da parte considerada autoridade de elevado nível (art 454 do CPC), que será ouvida em lugar e horário por ela escolhidos. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 683/684. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

5.    CONFISSÃO TÁCITA

O depoimento pessoal pode gerar diferentes efeitos, dependendo da presença da parte na audiência de instrução – momento propício para a produção desse meio de prova -, de sua postura em tal audiência e de seus conhecimentos efetivos acerca dos fatos discutidos na demanda judicial.

            Sempre que for requerido o depoimento pessoal da parte, deverá ela ser intimada pessoalmente do ato processual a ser praticado, não bastando a mera intimação de seu patrono que, afinal, não será o responsável pelo depoimento pessoal. Além da intimação pessoa, deverá constar do mandado que se presumirão confessados os fatos contra ela alegados no caso de não comparecimento ou de recusa injustificável em depor (art 385, § 1º, do CPC), devendo a intimação ser realizada com antecedência mínima a não surpreender a parte depoente.

            Triste notar que o art 385, § 1º, do CPC ora comentado, a exemplo do que fazia o art 343, § 2º, do CPC/1973, mantém a confissão tácita gerada pela postura de ausência ou silêncio do depoente à ideia de pena, como se um meio de prova pudesse ter natureza de sanção processual, mais uma ótima oportunidade perdida de melhorar a redação do Novo Código de Processo Civil.

            A presença da parte em audiência não é um dever processual, sendo inadmissível a aplicação de qualquer espécie de sanção pelo seu não comparecimento. O depoimento é um ônus da parte, que, não se desincumbindo dele, se colocará numa situação processual de desvantagem. Assim, diferentemente da testemunha devidamente intimada, não deverá ser conduzida coercitivamente à presença do juiz, sendo também inconcebível a tipificação de crime de desobediência. Há, entretanto, importante efeito processual derivado da ausência da parte devidamente intimada para depor pessoalmente em juízo: a confissão tácita, dando-se por verdadeiros os fatos alegados pela outra parte e contrários ao interesse da parte ausente.

            Não basta, entretanto, que a parte simplesmente compareça em juízo, devendo responder as perguntas que lhe são feitas pelo juiz e pelo advogado da parte contrária. O silêncio da parte, negando-se a responder as perguntas, ou o fazendo evasivamente, gera a mesma consequência de sua ausência na audiência, dando o juiz os fatos alegados pela parte contrária como confessados. O silêncio não gerará tal consequência nos casos previstos pelo art 388 do CPC atual, situações em que o depoente poderá silenciar sem que os fatos perguntados sejam tidos por confessados.

            Teoricamente, o silêncio gerado pela ignorância quanto ao fato alegado em juízo não deveria ser considerado como recusa em responder. Não tendo a parte conhecimento do fato alegado pela parte contrária, não haverá, em tese, confissão, já que nesse caso o silêncio não é fruto de má-fé, mas sim de desconhecimento sobre a matéria fática, sendo impossível forçar alguém a responder sobre o que não sabe. Essa regra, entretanto, só deve ser aplicada para os casos em que o desconhecimento seja justificável, o que deve ser apurado no caso concreto. No caso de prepostos indicados pela pessoa jurídica, parcela de doutrina e até mesmo algumas decisões judiciais apontam para a confissão de preposto que, embora regularmente esteja representando a pessoa jurídica, desconhece por completo os fatos alegados.

            Tal entendimento, entretanto, deve ser visto como todo o cuidado necessário para evitar injustiças com a pessoa jurídica, em especial nos casos envolvendo fatos passados muito remotos. Tome-se como exemplo uma ocorrência em uma determinada agência bancária, envolvendo problemas de ingresso do cliente pela porta giratória. No caso de o evento ter ocorrido há poucos meses e a instituição financeira indicar como preposto gerente de outra agência, que nada sabe do ocorrido, é justificável a confissão. Outra situação bem diferente, se dá quando o fato ocorreu há muitos anos e todos os funcionários da agência à época já não compõem mais o quadro de funcionários da instituição financeira. Decretar a confissão, nesse segundo caso, não é o mais adequado porque a pessoa jurídica tomou todas as diligências possíveis para levar à audiência um patrono que tivesse conhecimento dos fatos. Cobra-se do j7uiz, portanto, a análise do caso concreto, verificando se seria possível à pessoa jurídica enviar preposto qualificado a responder às perguntas. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 684/685. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

6.    VEDAÇÃO DE PARTE QUE AINDA NÃO DEPÔS ASSISTIR DEPOIMENTO DA PARTE CONTRÁRIA

Quando ambas as partes forem intimadas para depor pessoalmente e comparecerem à audiência, o autor será ouvido antes, devendo o réu se ausentar dar sala de audiência para não ter conhecimento desse depoimento quando for depor. Após o depoimento do autor, será realizado o depoimento do réu, não havendo necessidade de o autor se retirar da sala de audiências. Caso somente uma das partes seja submetida ao depoimento pessoal, a outra não será retirada da sala de audiências. A tomada de depoimento pessoal das partes é a primeira atividade instrutória da audiência, com exceção dos casos em que o perito é chamado para prestar esclarecimentos, quando será o primeiro a ser ouvido antes do autor. Se ambas as partes estiverem advogando em causa própria, o juiz indicará um advogado dativo para o réu com a única tarefa de acompanhar o depoimento pessoal do autor. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 685. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).


7.    VIDEOCONFERÊNCIA

Há no § 3º do art 385 do CPC uma interessante novidade, passando o ordenamento a admitir que o depoimento pessoa seja realizado por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens quando o depoente residir em foro diverso daquele em que tramita o processo. Realmente não compreendo por que o legislador não utiliza o gênero foro, preferindo exaurir as espécies – comarca, seção e subseção judiciária -, mas confesso que na prática em nada importa a exótica opção. Pelo menos o legislador deixou de associar como sinônimos “foro” e “comarca”, lembrando que o Código de Processo Civil também regulamenta o processo na Justiça Federal.

            A previsão legal não dispensa a expedição de carta precatória, porque o depoimento deverá ser prestado no fórum da comarca em que residir a parte, de forma que ambos os foros – deprecante e deprecado – deverá estar devidamente equipados para ser possível a aplicação prática do dispositivo legal ora analisado. Quiçá um dia teremos a possibilidade de a parte prestar o depoimento de sua própria casa ou local de trabalho, como parte, juiz e patronos participando do ato num mesmo ambiente virtual. Mas não é isso que prevê o art 358, § 3º, do atual Livro do CPC. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 685/686. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

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