CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO
- Art. 496 - Da Remessa Necessária – Vargas,
Paulo S. R.
PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO
DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM –
CAPÍTULO XIII – DA SENTENÇA E DA COISA
JULGADA – Seção III – Da Remessa Necessária - vargasdigitador.blogspot.com
Art
496. Está sujeita
ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada
pelo tribunal, a sentença:
I – proferida contra a União, os
Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e
fundações de direito público;
II – que julgar procedentes, no todo
ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1º. Nos casos previstos neste
artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos
autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal
avocá-los-á.
§ 2º. Em qualquer dos casos referidos
no § 1º, o tribunal julgará a remessa necessária.
§ 3º. Não se aplica o disposto neste
artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor
certo e líquido inferior a:
I – 1.000 (mil salários-mínimos para a
União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
II – 500 (quinhentos) salários-mínimos
para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de
direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;
III – 100 cem) salários-mínimos para
todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito
público.
§ 4º. Também não se aplica o disposto
neste artigo quando a sentença estiver fundada em:
I – súmula de tribunal superior;
II – acórdão proferido pelo Supremo
tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos
repetitivos;
III – entendimento firmado em
incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
IV – entendimento coincidente com
orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público,
consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.
Correspondência no CPC 1973, art 475,
com a seguinte redação e ordem:
Art 475. Está sujeita ao duplo grau de
jurisdição, não produzindo efeito senal depois de confirmada pelo tribunal, a
sentença:
I – proferida contra a União, o
Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e fundações
de direito público;
II – que julgar procedentes, no todo
ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art
585, VI).
§ 1º. Nos casos previstos neste
artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação, não
o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.
§ 2º. Sem correspondência no CPC/1973.
§ 2º. Este referente ao § 3º do
CPC/2015. Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o
direito controvertido, for de valor certo não excedente a sessenta
salários-mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução
de dívida ativa do mesmo valor.
§ 3º. Este referente ao § 4º e inciso
I do CPC/2015. Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença
estiver fundada em jurisprudência do plenário do Superior Tribunal Federal ou
em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente.
Demais incisos sem correspondência no
CPC/1973.
1. NATUREZA
JURÍDICA
É
pacífico, na doutrina, o entendimento de que o reexame necessário não tem
natureza recursal, não se devendo admitir expressões como “apelação ex offício”, “recurso de ofício” ou “recurso
obrigatório”.
São varias as razões para que o reexame
necessário, previsto pelo art 496 do CPC não seja considerado um recurso: (i)
ausência de voluntariedade: o recurso é um ônus processual, sendo que a sua existência
depende de expressa manifestação de vontade da parte, por meio de sua interposição.
A vontade de parte, portanto, é determinante, sendo a voluntariedade um
princípio recursal, derivado do princípio dispositivo. O reexame necessário,
conforme se depreende do próprio nome, nada tem de voluntário, porque sua existência
decorre de expressa manifestação da lei, sendo irrelevante a vontade das partes
e mesmo do juiz, que será obrigado a ordenar a remessa dos autos ao Tribunal e,
não o fazendo proporcionará a avocação dos autos por seu presidente (art 496, §
1º, do CPC); (ii) o reexame necessário não é dialético, porque não existem
reações nem contrarrazões, cabendo ao Tribunal tao somente analisar os atos
praticados até a sentença. Como consequência logica, também não haverá
contraditório; (iii) a previsão de um prazo de interposição é característica de
todo e qualquer recurso, o que não ocorre com o reexame necessário, que deverá
existir sempre que as condições assim exigirem, independentemente de eventual
demora do processo chegar ao Tribunal; (iv) o reexame necessário, apesar de
estar previsto em lei federal (CPC), não se encontra previsto como recurso (princípio da taxatividade); (v) a legitimação
recursal regulada pelo art 996 do atual Livro do CPC (partes, terceiro
prejudicado e Ministério Público) não se aplica ao reexame necessário,
instituto cuja “legitimidade” é do juízo, que determina a remessa do processo
ao Tribunal.
Registre-se que, apesar de não poder
ser considerado uma espécie de recurso, aplica-se ao reexame necessário um
instituto tipicamente recursal: a proibição da reformatio in pejus. Dessa forma, a Fazenda Pública não poderá ter
sua situação no processo piorada em decorrência do julgamento do reexame necessário,
sendo que, na pior das hipóteses para a Fazenda Pública, sua situação manter-se-á
inalterada (Súmula 45/STJ). Além disso, aplica-se, ao reexame necessário, a
regra do art 932, IV e V, do atual CPC, admitindo-se seu julgamento monocrático
pelo relator. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 826/827. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
2. CONCEITO DE REEXAME NECESSÁRIO
Segundo
previsão do art 496, I, do CPC, a sentença proferida contra a União, o Estado,
o Distrito Federal, o Município e suas respectivas autarquias e fundações de
direito público, bem como a que julgar procedentes, no todo ou em parte, os
embargos à execução fiscal (havendo acolhimento de exceção e executividade
em vez de embargos do devedor, por analogia, aplica-se o dispositivo legal
(Informativo 544/STJ: 2ª Turma, REsp 1.415.602/CE, rel. Min. Herman Benjamin,
j. 22.05.2014, DJe 20.06.2014), somente produzirá efeitos após sua confirmação pelo
Tribunal. Trata-se do instituto do reexame necessário, que pela letra da lei, é confirmação
pelo Tribunal. Trata-se do instituto do reexame necessário que pela letra da
lei, é condição impeditiva da geração de efeitos da sentença proferida nas condições
previstas pelo dispositivo legal mencionado.
O conceito legal deve ser visto com
reservas porque a sentença pode gerar efeitos, ainda que pendente de reexame necessário,
conforme demonstra de forma cabal o art 14, §§ 1º e 3º, da Lei 12.016/2009. O reexame
necessário, portanto, não impede necessariamente a geração de efeitos da
sentença, mas tao somente seu trânsito em julgado, sendo mais adequado afirmar
que o reexame necessário é condição impeditiva da geração do trânsito em
julgado, e não da eficácia da sentença. Na realidade, o efeito suspensivo do
reexame necessário segue os efeitos da apelação: se o recurso tiver tal efeito
o reexame necessário também o terá, e se o recurso não tiver o reexame necessário,
não impedirá a geração imediata de efeitos da sentença.
O conceito extraído da interpretação literal
do caput do art 496 do CPC é
incorreto e isso fica claro quando se analisam os §§ 1º e 3º do art 14 da Lei
12.016/2009. Toda sentença concessiva de ordem no mandado de segurança está
sujeita ao reexame necessário, não sendo, inclusive, aplicáveis, nesse caso, as
exceções consagradas nos §§ 3º e 4º do art 496 do CPC (STJ, 2ª Turma, REsp
1.274.066?PR, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 01.12.2011, DJe 09.12.2011;
STJ, 1ª Turma, REsp 934.286/MT, rel. Min. Teori Albino Zavaski, j. 17.06.2008,
DJe 26.06.2008). por outro lado, de tal sentença cabe execução provisória,
salvo quando versar sobre as matérias que não admitem ser concedidas por meio
de liminar no mandado de segurança.
Como se pode notar, uma sentença
sujeita ao reexame necessário é imediatamente eficaz, situação incompatível com
o conceito legal consagrado no art 496, caput,
do CPC. Por isso, insisto que o impedimento gerado pelo reexame necessário não diz
respeito aos efeitos da sentença, mas ao seu trânsito em julgado. Quanto aos
efeitos, o reexame necessário segue o que estiver determinado em lei para apelação:
se tal recurso tiver efeito suspensivo, também terá o reexame necessário, mas,
faltando tal previsão, o duplo grau obrigatório não impede a geração de efeitos
da sentença. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 827/828. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
3. CABIMENTO
O § 1º do art
496 do CPC comete um erro primário, em alteração equivocada do § 1º do art 475
do CPC/1973. Segundo o texto vigente, havendo ou não apelação, o juiz remeterá
os autos do processo ao tribunal em segundo grau, enquanto no texto projetado
essa remessa só ocorrerá se for ultrapassado o prazo de apelação sem sua interposição.
Pelo dispositivo legal, portanto, se houver apelação, não haverá necessidade de
reexame necessário. Há duas críticas ao dispositivo legal.
Como o art 496, § 1º, do CPC afirma
apenas que a não iinterposição de apelação dentro do prazo leva à remessa necessária,
sem especificar de qual das partes é a apelação não interposta, é possível concluir
que, havendo sucumbência reciproca e sendo interposta apelação pela parte
contrária à Fazenda Pública, não haverá reexame necessário. E se a parcela de sucumbência
da Fazenda Pública puder ser tipificada numa das hipóteses dos incisos do art
496 do CPC analisado?
Com considerável boa vontade pode-se
interpretar que a apelação mencionada no dispositivo legal é da Fazenda
Pública, só havendo reexame necessário na hipótese de ela não interpor o
recurso. Contudo, ainda assim o dispositivo é problemático porque,
historicamente, a apelação da Fazenda Pública nunca impedir o reexame necessário
por duas razões: o recurso pode ser parcial, enquanto o reexame necessário é
sempre total, e o recurso pode não ser admitido por vício formal, enquanto o
reexame necessário não corre esse risco, sendo sempre julgado pelo tribunal de
segundo grau. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 828. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
4. EXCEÇÕES
AO CABIMENTO
Não basta a sucumbência
da Fazenda Pública para que a sentença esteja sujeita ao reexame necessário, já
que existem previsões legais que expressamente excepcionam o duplo grau obrigatório
mesmo diante da derrota fazendária.
Segundo o § 3º do dispositivo ora
analisado, não haverá duplo grau obrigatório quando a condenação ou o proveito econômico
obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a mil salários-mínimos para
União, e as respectivas autarquias e fundações de direito público, quinhentos
salário-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias
e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos
Estados, cem salários-mínimos para todos os demais municípios e respectivas
autarquias e fundações de direito público.
Como se pode notar, o valor mínimo de sucumbência
da Fazenda Pública para que a sentença esteja sujeita ao reexame necessário foi
alterado substancialmente, passando dos sessenta salários –mínimos previstos no
art 475, § 2º do CPC/1973 para até mil salários-mínimos a depender do caso
concreto.
E buscou-se uma gradação de valores a
depender da pessoa jurídica de direito público sucumbente. A ideia é boa, mas
sua execução deve gerar incongruências lógicas relevantes porque não foi levado
em consideração o status econômico do
ente público, o que deve mais importar quando se trata de rever
obrigatoriamente a sentença que lhe gera uma sucumbência econômica. Há municípios,
no Brasil, mais ricos que Estados, e nesse caso há evidente incongruência lógica
em dispensar o reexame necessário para o ente mais rico até cem salários-mínimos
e em até quinhentos para o mais pobre. Essa situação se intensifica quando
comparados municípios que são capitais de Estado e outros que, apesar de não serem
capitais, são mais ricos que aqueles. As gradações são sempre difíceis, embora
muito mais justas que um valor fixo para toda e qualquer pessoa jurídica de
direito público. O problema é fazer gradações que não levam em consideração o
elemento essencial que a justifica.
Sendo a condenação ilíquida, o
Superior Tribunal de Justiça entende cabível o reexame necessário, porque é
melhor correr o risco de um reexame desnecessário do que afastá-lo quando era
cabível (Súmula 490/STJ “A dispensa de reexame necessário, quando o valor
da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários-mínimos,
não se aplica a sentenças ilíquidas”). Como o valor só será conhecido depois
desse momento procedimental, corre-se menos risco em realizar o reexame necessário.
O § 4º do art 496 do CPC dispensa o
reexame necessário em razão de sentença fundamentada em jurisprudência
consolidada dos tribunais superiores. A dispensa, nesse caso, fundamenta-se na
desnecessidade de um controle obrigatório pelo segundo grau de jurisdição quando
o juiz prolator da sentença torna-se um porta-voz avançado dos tribunais
superiores e aplica seu consagrado entendimento como fundamento de sua decisão.
Segundo o dispositivo, não há reexame necessário
se a sentença estiver fundada em súmula de tribunal superior (I), acórdão
proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em
julgamento de recursos repetitivos (II), entendimento firmado em incidente de
resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência (III).
Interessante novidade implementada pelo
Código de Processo Civil quanto à dispensa do reexame necessário é a inclusão,
como causa de afastamento do duplo grau obrigatório, de entendimento
coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio
ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa
(art 496, § 4º, IV, do CPC). Nesse caso, a Fazenda Pública não apela da sentença
porque a decisão será fundada em entendimento interno pacificado, não havendo
mesmo qualquer sentido em sujeitá-la ao duplo grau obrigatório.
Também não será cabível o reexame necessário
nos Juizados Especiais em razão do previsto nos arts 13 da Lei 10.259/2001 e 11
da Lei 12.153/2009.
Nessas circunstâncias, a remessa do
processo ao Tribunal dependerá da regular interposição do recurso de apelação pela
Fazenda Pública, admitindo-se o trânsito em julgado da sentença já em primeiro
grau de jurisdição, no caso de não haver o recurso voluntário. (Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 828/829. Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed.
Juspodivm).
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