segunda-feira, 16 de abril de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 496 - Da Remessa Necessária – Vargas, Paulo S. R.



CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO - Art. 496 - Da Remessa NecessáriaVargas, Paulo S. R.


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção III – Da Remessa Necessária - vargasdigitador.blogspot.com

Art 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I – proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.

§ 1º. Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.

§ 2º. Em qualquer dos casos referidos no § 1º, o tribunal julgará a remessa necessária.

§ 3º. Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:

I – 1.000 (mil salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – 500 (quinhentos) salários-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;

III – 100 cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações de direito público.

§ 4º. Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:

I – súmula de tribunal superior;

II – acórdão proferido pelo Supremo tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

III – entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

IV – entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa.

Correspondência no CPC 1973, art 475, com a seguinte redação e ordem:

Art 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senal depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I – proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e fundações de direito público;

II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art 585, VI).

§ 1º. Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação, não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.

§ 2º. Sem correspondência no CPC/1973.

§ 2º. Este referente ao § 3º do CPC/2015. Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a sessenta salários-mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.

§ 3º. Este referente ao § 4º e inciso I do CPC/2015. Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Superior Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente.

Demais incisos sem correspondência no CPC/1973.

1.     NATUREZA JURÍDICA

É pacífico, na doutrina, o entendimento de que o reexame necessário não tem natureza recursal, não se devendo admitir expressões como “apelação ex offício”, “recurso de ofício” ou “recurso obrigatório”.

          São varias as razões para que o reexame necessário, previsto pelo art 496 do CPC não seja considerado um recurso: (i) ausência de voluntariedade: o recurso é um ônus processual, sendo que a sua existência depende de expressa manifestação de vontade da parte, por meio de sua interposição. A vontade de parte, portanto, é determinante, sendo a voluntariedade um princípio recursal, derivado do princípio dispositivo. O reexame necessário, conforme se depreende do próprio nome, nada tem de voluntário, porque sua existência decorre de expressa manifestação da lei, sendo irrelevante a vontade das partes e mesmo do juiz, que será obrigado a ordenar a remessa dos autos ao Tribunal e, não o fazendo proporcionará a avocação dos autos por seu presidente (art 496, § 1º, do CPC); (ii) o reexame necessário não é dialético, porque não existem reações nem contrarrazões, cabendo ao Tribunal tao somente analisar os atos praticados até a sentença. Como consequência logica, também não haverá contraditório; (iii) a previsão de um prazo de interposição é característica de todo e qualquer recurso, o que não ocorre com o reexame necessário, que deverá existir sempre que as condições assim exigirem, independentemente de eventual demora do processo chegar ao Tribunal; (iv) o reexame necessário, apesar de estar previsto em lei federal (CPC), não se encontra previsto como recurso (princípio da taxatividade); (v) a legitimação recursal regulada pelo art 996 do atual Livro do CPC (partes, terceiro prejudicado e Ministério Público) não se aplica ao reexame necessário, instituto cuja “legitimidade” é do juízo, que determina a remessa do processo ao Tribunal.

          Registre-se que, apesar de não poder ser considerado uma espécie de recurso, aplica-se ao reexame necessário um instituto tipicamente recursal: a proibição da reformatio in pejus. Dessa forma, a Fazenda Pública não poderá ter sua situação no processo piorada em decorrência do julgamento do reexame necessário, sendo que, na pior das hipóteses para a Fazenda Pública, sua situação manter-se-á inalterada (Súmula 45/STJ). Além disso, aplica-se, ao reexame necessário, a regra do art 932, IV e V, do atual CPC, admitindo-se seu julgamento monocrático pelo relator. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 826/827. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    CONCEITO DE REEXAME NECESSÁRIO

Segundo previsão do art 496, I, do CPC, a sentença proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e suas respectivas autarquias e fundações de direito público, bem como a que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal (havendo acolhimento de exceção e executividade em vez de embargos do devedor, por analogia, aplica-se o dispositivo legal (Informativo 544/STJ: 2ª Turma, REsp 1.415.602/CE, rel. Min. Herman Benjamin, j. 22.05.2014, DJe 20.06.2014), somente produzirá efeitos após sua confirmação pelo Tribunal. Trata-se do instituto do reexame necessário, que pela letra da lei, é confirmação pelo Tribunal. Trata-se do instituto do reexame necessário que pela letra da lei, é condição impeditiva da geração de efeitos da sentença proferida nas condições previstas pelo dispositivo legal mencionado.

          O conceito legal deve ser visto com reservas porque a sentença pode gerar efeitos, ainda que pendente de reexame necessário, conforme demonstra de forma cabal o art 14, §§ 1º e 3º, da Lei 12.016/2009. O reexame necessário, portanto, não impede necessariamente a geração de efeitos da sentença, mas tao somente seu trânsito em julgado, sendo mais adequado afirmar que o reexame necessário é condição impeditiva da geração do trânsito em julgado, e não da eficácia da sentença. Na realidade, o efeito suspensivo do reexame necessário segue os efeitos da apelação: se o recurso tiver tal efeito o reexame necessário também o terá, e se o recurso não tiver o reexame necessário, não impedirá a geração imediata de efeitos da sentença.

          O conceito extraído da interpretação literal do caput do art 496 do CPC é incorreto e isso fica claro quando se analisam os §§ 1º e 3º do art 14 da Lei 12.016/2009. Toda sentença concessiva de ordem no mandado de segurança está sujeita ao reexame necessário, não sendo, inclusive, aplicáveis, nesse caso, as exceções consagradas nos §§ 3º e 4º do art 496 do CPC (STJ, 2ª Turma, REsp 1.274.066?PR, rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 01.12.2011, DJe 09.12.2011; STJ, 1ª Turma, REsp 934.286/MT, rel. Min. Teori Albino Zavaski, j. 17.06.2008, DJe 26.06.2008). por outro lado, de tal sentença cabe execução provisória, salvo quando versar sobre as matérias que não admitem ser concedidas por meio de liminar no mandado de segurança.

          Como se pode notar, uma sentença sujeita ao reexame necessário é imediatamente eficaz, situação incompatível com o conceito legal consagrado no art 496, caput, do CPC. Por isso, insisto que o impedimento gerado pelo reexame necessário não diz respeito aos efeitos da sentença, mas ao seu trânsito em julgado. Quanto aos efeitos, o reexame necessário segue o que estiver determinado em lei para apelação: se tal recurso tiver efeito suspensivo, também terá o reexame necessário, mas, faltando tal previsão, o duplo grau obrigatório não impede a geração de efeitos da sentença. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 827/828. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    CABIMENTO

O § 1º do art 496 do CPC comete um erro primário, em alteração equivocada do § 1º do art 475 do CPC/1973. Segundo o texto vigente, havendo ou não apelação, o juiz remeterá os autos do processo ao tribunal em segundo grau, enquanto no texto projetado essa remessa só ocorrerá se for ultrapassado o prazo de apelação sem sua interposição. Pelo dispositivo legal, portanto, se houver apelação, não haverá necessidade de reexame necessário. Há duas críticas ao dispositivo legal.

          Como o art 496, § 1º, do CPC afirma apenas que a não iinterposição de apelação dentro do prazo leva à remessa necessária, sem especificar de qual das partes é a apelação não interposta, é possível concluir que, havendo sucumbência reciproca e sendo interposta apelação pela parte contrária à Fazenda Pública, não haverá reexame necessário. E se a parcela de sucumbência da Fazenda Pública puder ser tipificada numa das hipóteses dos incisos do art 496 do CPC analisado?

          Com considerável boa vontade pode-se interpretar que a apelação mencionada no dispositivo legal é da Fazenda Pública, só havendo reexame necessário na hipótese de ela não interpor o recurso. Contudo, ainda assim o dispositivo é problemático porque, historicamente, a apelação da Fazenda Pública nunca impedir o reexame necessário por duas razões: o recurso pode ser parcial, enquanto o reexame necessário é sempre total, e o recurso pode não ser admitido por vício formal, enquanto o reexame necessário não corre esse risco, sendo sempre julgado pelo tribunal de segundo grau. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 828. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    EXCEÇÕES AO CABIMENTO

Não basta a sucumbência da Fazenda Pública para que a sentença esteja sujeita ao reexame necessário, já que existem previsões legais que expressamente excepcionam o duplo grau obrigatório mesmo diante da derrota fazendária.

          Segundo o § 3º do dispositivo ora analisado, não haverá duplo grau obrigatório quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a mil salários-mínimos para União, e as respectivas autarquias e fundações de direito público, quinhentos salário-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados, cem salários-mínimos para todos os demais municípios e respectivas autarquias e fundações de direito público.

          Como se pode notar, o valor mínimo de sucumbência da Fazenda Pública para que a sentença esteja sujeita ao reexame necessário foi alterado substancialmente, passando dos sessenta salários –mínimos previstos no art 475, § 2º do CPC/1973 para até mil salários-mínimos a depender do caso concreto.

          E buscou-se uma gradação de valores a depender da pessoa jurídica de direito público sucumbente. A ideia é boa, mas sua execução deve gerar incongruências lógicas relevantes porque não foi levado em consideração o status econômico do ente público, o que deve mais importar quando se trata de rever obrigatoriamente a sentença que lhe gera uma sucumbência econômica. Há municípios, no Brasil, mais ricos que Estados, e nesse caso há evidente incongruência lógica em dispensar o reexame necessário para o ente mais rico até cem salários-mínimos e em até quinhentos para o mais pobre. Essa situação se intensifica quando comparados municípios que são capitais de Estado e outros que, apesar de não serem capitais, são mais ricos que aqueles. As gradações são sempre difíceis, embora muito mais justas que um valor fixo para toda e qualquer pessoa jurídica de direito público. O problema é fazer gradações que não levam em consideração o elemento essencial que a justifica.

          Sendo a condenação ilíquida, o Superior Tribunal de Justiça entende cabível o reexame necessário, porque é melhor correr o risco de um reexame desnecessário do que afastá-lo quando era cabível (Súmula 490/STJ “A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários-mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas”). Como o valor só será conhecido depois desse momento procedimental, corre-se menos risco em realizar o reexame necessário.

          O § 4º do art 496 do CPC dispensa o reexame necessário em razão de sentença fundamentada em jurisprudência consolidada dos tribunais superiores. A dispensa, nesse caso, fundamenta-se na desnecessidade de um controle obrigatório pelo segundo grau de jurisdição quando o juiz prolator da sentença torna-se um porta-voz avançado dos tribunais superiores e aplica seu consagrado entendimento como fundamento de sua decisão.

          Segundo o dispositivo, não há reexame necessário se a sentença estiver fundada em súmula de tribunal superior (I), acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos (II), entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência (III).

          Interessante novidade implementada pelo Código de Processo Civil quanto à dispensa do reexame necessário é a inclusão, como causa de afastamento do duplo grau obrigatório, de entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa (art 496, § 4º, IV, do CPC). Nesse caso, a Fazenda Pública não apela da sentença porque a decisão será fundada em entendimento interno pacificado, não havendo mesmo qualquer sentido em sujeitá-la ao duplo grau obrigatório.

          Também não será cabível o reexame necessário nos Juizados Especiais em razão do previsto nos arts 13 da Lei 10.259/2001 e 11 da Lei 12.153/2009.

          Nessas circunstâncias, a remessa do processo ao Tribunal dependerá da regular interposição do recurso de apelação pela Fazenda Pública, admitindo-se o trânsito em julgado da sentença já em primeiro grau de jurisdição, no caso de não haver o recurso voluntário. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 828/829. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

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