CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art. 789 a 796
CAPÍTULO V – DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL
– VARGAS, Paulo. S. R.
LIVRO II – DO
PROCESSO DE EXECUÇÃO
TÍTULO I – DA EXECUÇÃO EM GERAL – CAPÍTULO
V – DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL - vargasdigitador.blogspot.com
Art 789. O
devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de
suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.
Correspondência no CPC/1973, art 591,
com o mesmo teor.
1. OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL
A
responsabilidade patrimonial é indiscutivelmente instituto de direito
processual, compreendida como a possibilidade de sujeição de um determinado
patrimônio à satisfação do direito substancial do credor. Por outro lado, a
obrigação é instituto de direito material, representado por uma situação
jurídica de desvantagem. Contraída a obrigação, uma parte tem o dever de
satisfazer o direito da outra, e quando isso não ocorre surge a dívida,
instituto atinente ao direito material. Também existe a responsabilidade
patrimonial para o caso de inadimplemento, ou seja, quando a dívida não é
satisfeita voluntariamente pelo devedor, surge a possibilidade de sujeição do
patrimônio de algum sujeito – geralmente o próprio devedor – para assegurar a
satisfação do direito do credor na execução. Em razão dessa distinção, fala-se
que a obrigação é estática, gerando uma mera expectativa de satisfação,
enquanto a responsabilidade patrimonial é dinâmica, representada pela forma
jurisdicional de efetiva satisfação do direito.
A distinção
é interessante e ganha importância sempre que existe dívida e não
responsabilidade e vice-versa. Tome-se como exemplo a dívida de jogo, situação
em que existe a dívida, mas o patrimônio do devedor não responde por sua
satisfação. É certo que existe dívida, tanto que se houver quitação voluntária
não caberá ação de repetição de indébito, mas não haverá responsabilidade
patrimonial do devedor derivada do inadimplemento. Por outro lado, por exemplo,
em determinadas situações expressamente previstas em lei, o sócio pode ter seu
patrimônio afetado por uma dívida da sociedade, justamente por ter responsabilidade
patrimonial, mesmo que o devedor seja outrem (no caso a sociedade).
Registre-se
que o fiador, apesar de não ser o devedor principal, é considerado coobrigado
perante o credor no plano do direito material, de forma que passa mesmo no
plano do direito material a ter responsabilidade primária pela satisfação do
crédito. Nesse caso, a questão da responsabilidade patrimonial só terá
interesse diante da existência ou não do benefício de ordem, preferindo-se
anteriormente o patrimônio do devedor principal ao do fiador, o que cria uma
singular responsabilidade patrimonial primária subsidiária. No plano
material, entretanto, ambos são considerados obrigados perante o credor,
devendo nesse caso se falar em responsabilidade patrimonial primária subsidiária
do fiador. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.242. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
2. BENS QUE RESPONDEM PELA SATISFAÇÃO NA EXECUÇÃO
O art 789
do CPC tenta fixar, com redação rica em dubiedade e pobre em clareza, quais os
bens que respondem dentro do patrimônio do responsável pela satisfação da
dívida. O primeiro equívoco do dispositivo legal é indicar que os bens do
devedor respondem, quando na realidade são os bens do responsável patrimonial
que respondem pela satisfação da dívida. O problema maior, entretanto, é
ausência de indicação clara do momento presente, única forma de
determinar quais são os bens passados e futuros.
Considerando-se
que o momento presente é o do surgimento da obrigação, restaria indevidamente
“congelado” todo o patrimônio do responsável patrimonial, ainda que em valor
muito superior ao da dívida. Não seria prudente a aquisição de bens do
responsável patrimonial nessas condições, porque, mesmo mantendo-se em seu
patrimônio bens suficientes para a satisfação da obrigação, aqueles que
tivessem sido alienados no lapso temporal compreendido entre o surgimento da
obrigação e da execução continuariam a responder pela dívida. A insegurança
generalizada nos negócios jurídicos e as dificuldades na transferência de
patrimônio são razões suficientes para afastar esse entendimento.
Por outro
lado, não é correto dar-se simplesmente como momento presente o de instauração
de execução, excluindo-se da responsabilidade patrimonial todos os bens que
existiam no patrimônio do obrigado à época do surgimento da obrigação e que no
momento da execução já tenham sido transferidos. A razão é óbvia: bastaria ao
abrigado dilapidar todo o seu patrimônio antes da execução, frustrando a
satisfação do direito do credor. Esse entendimento, como claramente se nota,
incentivaria as fraudes contra o credor, diminuindo ainda mais as expectativas
de satisfação por meio da execução.
A melhor
interpretação do texto legal é aquela que dá como momento inicial a ser considerado
para fixação dos “bens presentes” o da instauração do processo executivo e para
bens futuros aqueles que forem adquiridos durante o seu trâmite, não se
excluindo, entretanto, “bens passados” alienados em fraude, quando então
importará o momento em que foi contraída a obrigação. Fala-se, então, em bens
passados, que não estão mais no patrimônio do executado no momento da
propositura da demanda, mas que respondem ainda assim por suas obrigações,
sempre que tiver ocorrido a alienação em fraude, além dos bens futuros,
adquiridos após a constituição da dívida e mesmo após a propositura da
execução. Outra forma de dizer exatamente o mesmo é entender-se por “bens
presentes” aqueles existente à época do surgimento da dívida e “bens futuros”
todos os que forem adquiridos até a satisfação do direito do credor, salvo os
bens alienados nesse período sem fraude. (Daniel Amorim Assumpção Neves,
p. 1.243. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
LIVRO II – DO
PROCESSO DE EXECUÇÃO
TÍTULO I – DA EXECUÇÃO EM GERAL – CAPÍTULO
V – DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL - vargasdigitador.blogspot.com
Art 790. São
sujeitos à execução os bens:
I – do sucessor a título singular,
tratando-se de execução fundada em direito real ou obrigação reipersecutória;
II – do sócio, nos termos da lei;
III – do devedor, ainda que em poder
de terceiros;
IV – do cônjuge ou companheiro, nos
casos em que seus bens próprios ou de sua meação respondem pela dívida;
V – alienados ou gravados com ônus
real em fraude à execução;
VI – cuja alienação ou gravação com
ônus real tenha sido anulada em razão do reconhecimento, em ação autônoma, de
fraude contra credores;
VII – do responsável, nos casos de
desconsideração da personalidade jurídica.
Correspondência no CPC/1973, art 592 e
incisos com a seguinte redação:
Art 592. Ficam sujeitos à execução os
bens:
I – do sucessor a título singular,
tratando-se de execução fundada em direito real ou obrigação reipersecutória;
II – do sócio, nos termos da lei;
II – do devedor, quando em poder de
terceiros;
IV – do cônjuge, nos casos em que os
seus bens próprios, reservados ou de sua meação respondem pela dívida;
V – alienados ou gravados com ônus
real em fraude de execução.
Demais itens, sem correspondente no
CPC/1973.
1. RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL SECUNDÁRIA
É o
patrimônio do devedor que geralmente responde por sua dívida, mas em algumas
situações específicas, mesmo aquele que não participou da relação de direito
material obrigacional se vê responsável por sua satisfação. Seguindo as lições
de Liebman, a doutrina nacional qualifica tal situação como “responsabilidade
executória secundária”, prevista no art 790 do CPC. Dessa forma, a
responsabilidade patrimonial do devedor é primária, enquanto nas situações
previstas em lei, a responsabilidade do sujeito que não é obrigado (plano do
direito material) é secundária. (Daniel Amorim Assumpção Neves,
p. 1.244. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
2. BENS DO SUCESSOR A TÍTULO SINGULAR
O art 790,
I, do CPC, além das ações fundadas em direito real, também tutela a “obrigação
reipersecutória”. Essa espécie de obrigação é objeto de um processo no qual se
pleiteia a restituição de bens que estejam fora do patrimônio do autor, ou em poder
de terceiros. Trata-se de ação que tende a pedir a restituição daquilo que é do
autor ou do que é devido a ele, e se ache fora de seu patrimônio.
A redação
do dispositivo legal mantida pelo CPC (art 593, I, do CPC/1973) manteve as
principais dúvidas referentes ao âmbito de sua aplicação, em especial, qual a
sua ligação com o art 792, I, do CPC, que considera fraude à execução a
alienação ou oneração de bens quando sobre eles pender ação fundada em direito
real ou com pretensão reipersecutória.
Parcela
doutrinária defende uma distinção temporal entre os dois dispositivos,
entendendo que, havendo a alienação judicial durante a fase de conhecimento, se
aplicará o art 792, I, do CPC, enquanto se alienação ocorrer após a prolação da
sentença, aplicar-se-á o art 790, I, do CPC. Tal distinção parece gerar uma
situação paradoxal, dado que, havendo a alienação após o reconhecimento da
obrigação em sentença, parece clara também a ocorrência da fraude à execução,
de forma que também a essa hipótese seria aplicável o art 792, I, do CPC.
Diante
dessa crítica, parcela da doutrina busca uma distinção entre os dois
dispositivos legais mencionados, afirmando que o art 790, I, do CPC deve ser
aplicado exclusivamente ao sucessor a título singular por sucessão causa
mortis, hipótese na qual notoriamente não se poderia falar em fraude à
execução, sendo, portanto, inaplicável o art 792, I, do CPC. A divergência
doutrinária, entretanto, não gera consequências práticas relevantes, porque,
independentemente da tese adotada, todos concordam que a transferência do bem
não impede a prática de atos executivos em favor do credor.
Crítica
antiga na doutrina diz respeito à falsa impressão de que o dispositivo legal
transmite, qual seja a de que todo o patrimônio do terceiros adquirente do bem
objeto da ação real ou obrigação reipersecutória responde pela dívida. A
interpretação literal leva à falsa conclusão de que os bens do sucessor a
título singular ficam sujeitos à execução, quando na realidade a
responsabilidade patrimonial secundária desse terceiro estará limitada ao
próprio bem que era objeto da demanda, jamais sendo crível que possa responder
com outros bens de seu patrimônio. (Daniel Amorim Assumpção Neves,
p. 1.244. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
3. BENS DO SÓCIO, NOS TERMOS DA LEI
A
responsabilidade primária pelas dívidas da sociedade empresarial é naturalmente
da própria sociedade, e somente de forma excepcional responderão seus sócios
por tais dívidas com os seus próprios patrimônios. Tal aspecto é uma das
consequências da personalidade jurídica própria da sociedade, que não se
confunde com a de seus sócios. Segundo o art 790, II, do CPC, o sócio responde
com o seu patrimônio pela satisfação da dívida da sociedade empresarial nos
termos da lei, sendo possível encontrar em leis de diferentes naturezas essa
responsabilidade secundária.
Nas leis
societárias é possível a criação de regras que criem a responsabilidade
patrimonial do sócio, existindo atualmente determinadas espécies de sociedade,
nas quais o sócio responde com o seu patrimônio pelas dívidas da sociedade em
qualquer situação de inadimplemento. É o caso da sociedade em nome coletivo
(art 1.039 do CC) e do sócio comanditado na sociedade em comandita simples (art
1.045, caput, do CC). Ocorre, entretanto, que nesse caso não parece ser
a responsabilidade dos sócios secundária, porque o texto legal é claro ao
prever uma solidariedade passiva entre o sócio e a sociedade pelas dívidas
contraídas por essa. Parece tratar-se, portanto, de responsabilidade
primária subsidiária. O mesmo fenômeno verifica-se nas hipóteses de
sociedade irregular e de sociedade de fato, nas quais a responsabilidade do
sócio é solidária e ilimitada (art. 990 do CC).
Outra situação em que o sócio poderá responder
pelas dívidas da sociedade se dá quando ocorre desconsideração da personalidade
jurídica (disregard doctrine), consagrada no art 50 do CC, no art 28 do
CDC, e em outras diversas normas presentes em legislação extravagante. Existem
duas espécies de desconsideração da personalidade jurídica: (a) teoria menor,
que se dá pela simples prova de insolvência diante de tema referente ao direito
ambiental (art 4º da Lei 9.605/1988) ou ao direito do consumidor (art 28, § 5º,
da Lei 8.078/1990) (STJ, 4ª Turma, REsp 1.111.153/RJ, rel. Min. Luís Felipe
Salomão, j. 06.12.2012, DJe 04.02.2013; STJ, 3ª Turma, AgRg no Ag 1.342.443/PR,
rel. Min. Massami Uyeda, j. 15.05.2012, DJe 24.05.2012); (b) teoria maior, que
exige o abuso de gestão, ou seja, quando a sociedade é utilizada como
instrumento de fraude pelos sócios, referindo-se o ar 50 do CC expressamente a
“desvio de finalidade ou confusão patrimonial” (STJ, 3ª Turma, REsp
1.311.857/RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 13/05/2014, DJe 02/06/2014), não
bastando, portanto, a mera inadimplência da pessoa jurídica STJ, 4ª Turma, AgRg
no AREsp 588.587/RS, rel. Min. Raul Araújo, j. 21/05/2015, DJe 22/06/2015).
O Superior
Tribunal de Justiça reconhece a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica entre empresas do
mesmo grupo econômico (Informativo 513/STJ, 4ª Turma, AgRg no REsp
1.229.579-MG, rel. Min. Raul Araújo, j. em 18.12.2012), bem como a desconsideração
da personalidade jurídica inversa (Informativo 440/STJ, 3ª Turma, REsp
948.177/MS, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 22.06.2010, DJ 03.08.2010), inclusive
atribuindo legitimidade ativa para tal pedido à companhia prejudicada em sua
meação pela fraude, ainda que na condição de sócia minoritária na sociedade
empresarial (Informativo 533/STJ, 3ª Turma, REsp 1.236.916/RS, rel Min. Nancy
Andrighi, j. 22.10.2013, DJe 28.10.2013). são interessantes posicionamentos que
partem da ratio das normas que consagram em nosso ordenamento a
desconsideração da personalidade jurídica para emprega-la extensivamente.
Interessante
também, notar que, uma vez realizada a desconsideração da personalidade
jurídica, não haverá qualquer restrição de a execução contra os sócios ser
limitada às suas quotas sociais, de forma que qualquer dos sócios poderá
responder pela integralidade da dívida, independentemente de sua participação
societária (informativo 463/STJ, 3ª Turma, REsp 1.169.175/DF, rel. Min. Massami
Uyeda, j. 17.02.2011, DJe 04.04.2011).
Qualquer
que seja a razão para responsabilizar secundariamente o sócio, haverá a
possibilidade do exercício do direito do benefício de ordem art 596, §
1º, do CPC/1973), podendo o sócio indicar bens da sociedade para que respondam
à satisfação da dívida antes que seus bens sejam atingidos.
A
desconsideração da personalidade jurídica se desenvolve, ao menos em regra, por
meio de incidente processual regulamentado pelos arts. 133 a 137 do CPC. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.245/1.246. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
4. BENS DO DEVEDOR, AINDA QUE EM PODER DE TERCEIROS
Tal disposição é absolutamente desnecessária porque
o local ou com quem estejam os bens não interfere na sua propriedade. Assim
sendo, os bens permanecem no patrimônio do devedor, respondendo por suas
obrigações, esteja onde estiver e com quem estiver. Estando o bem penhorado no
exercício de posse contratual legítima, como é o caso da locação, o adquirente
do bem se sub-roga na posição do executado, devendo respeitar o contrato de
locação até a sua extinção. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.246. Novo Código de
Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
5.
BENS
DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO NOS CASOS EM QUE OS SEUS BENS PRÓPRIOS, RESERVADOS
OU DE SUA MEAÇÃO RESPONDEM PELA DÍVIDA
A primeira situação possível no tocante ao tema ora
enfrentado é a constituição de dívida por ambos os cônjuges ou companheiros.
Note-se que a constituição da dívida, fenômeno de direito material, antecede ao
próprio processo, daí falar em parte em sentido material. Celebrado contrato por
marido e mulher ou companheiros, e gerado o inadimplemento, são ambos devedores
no plano material, e, como tais, ambos poderão ser demandados na ação
competente para o ressarcimento do credor, tendo responsabilidade patrimonial
primária.
Registre-se, nesse momento, a nova realidade
trazida pelos arts 1.643 e 1.644 do CC, normas criadoras de especial espécie de
solidariedade entre os cônjuges, apontando para a responsabilidade primária
daquele que, apesar de não fazer parte da relação de direito material, responde
como se dela tivesse sido integrante. Trata-se da dívida contraída para compra
de coisas necessárias à economia doméstica ou de empréstimos para a aquisição
de tais coisas. Nessas dívidas existe solidariedade entre os cônjuges, que têm
no plano processual responsabilidade primária.
Sendo ambos os cônjuges ou companheiros devedores e
tendo responsabilidade patrimonial primária, haverá uma similaridade entre os
sujeitos da relação de direito material e os sujeitos da relação de direito
processual, sendo dispensadas aos cônjuges ou companheiros as defesas típicas
de parte (embargos à execução, exceção de não executividade, objeção de não
executividade). Não é possível falar em embargos à execução, exceção de não
executividade, objeção de não executividade). Não é possível falar em embargos
de terceiro, dada a condição de devedores (parte no sentido material) e
executados (parte no sentido processual) de ambos os cônjuges.
Questão interessante pode ser suscitada quando o
credor, apesar da inegável qualidade de parte em sentido material de ambos os
cônjuges ou companheiros, deixa de colocar um deles no polo passivo da
execução, uma vez que ao credor, diante de dívida solidária, é possível a
escolha de quais devedores (ou devedor) pretende ver compondo o polo passivo. E
nesse caso, somente figurando um dos cônjuges no polo passivo, que posição
assumiria o outro diante da penhora de um bem imóvel, sendo imprescindível sua
intimação?
Para determinada corrente doutrinária, o cônjuge ou
companheiro não executado é um “terceiro”, pois, não tendo sido incluído pelo
exequente no polo passivo da execução, não faz parte da relação jurídica
processual, e, sendo uma mera intimação exigida em razão da penhora – e não
citação -, continua a ser considerado terceiro na relação processual, a par de
sua condição de titular da relação de direito material. Tal conclusão,
entretanto, se mostra equivocada. O simples fato de o cônjuge ou companheiro
ser parte no sentido material e, mais que isso, constar do título executivo,
faz com que, apesar de não indicado na petição inicial da execução, ao
ingressar na demanda, o faça como parte, e jamais como terceiro, qualidade incompatível
com sua presença na relação de direito material, consolidada no título
executivo.
Uma vez contraída a dívida apenas por um dos
cônjuges ou um dos companheiros, somente ele será o devedor e terá legitimidade
para figurar no polo passivo da execução. É curioso que, ainda que o outro
cônjuge ou companheiro não seja parte no sentido material, pode perfeitamente ser
parte no campo processual, bastando para tanto que o exequente o inclua no polo
passivo da execução. Evidentemente que a não participação do cônjuge ou
companheiro no endividamento no plano material lhe retira a legitimidade de
figurar como executado numa ação judicial, mas o simples fato de ter sido
acionado já o torna parte no sentido processual. Parte ilegítima, mas ainda
assim parte.
Não é isso, entretanto, o que rotineiramente
acontece, considerando que nesses casos o credor, atento à relação de direito
material, ingressa com demanda executiva contra o cônjuge ou companheiro que
deve ser considerado parte no sentido material e parte legítima no sentido
processual. Os problemas começam a surgir a partir do momento em que um bem
imóvel do casal é penhorado, já que esse caso se deve aplicar o previsto no art
842 do CPC, que exige a intimação do cônjuge não devedor.
Há corrente doutrinária que defende o entendimento
de que nada pode ser pedido contra o cônjuge ou companheiro meramente intimado,
pois ele não se torna parte na demanda, servindo a intimação somente para
permitir eventuais reações desse terceiro. Sua legitimidade para embargar à
execução com a alegação de matérias típicas de devedor decorre da especial
natureza da relação jurídica que envolve os cônjuges ou companheiros. A ideia é
de que a derrota do cônjuge executado influenciará negativamente de forma tão
profunda a família que, para evitar essa geração certa e inevitável de efeitos
maléficos, permite a lei que o cônjuge ou companheiro não devedor, mesmo não
sendo parte e não defendendo direito próprio, possa auxiliar o cônjuge
executado, evitando assim sua derrota e os efeitos maléficos sobre a condição
primeiramente dele, e depois, por via reflexa, de toda a entidade familiar. E,
sendo terceiro, naturalmente tem legitimidade também para os embargos de
terceiro.
Já tive a oportunidade de defender esse
entendimento, mas em reflexões posteriores percebi meu equívoco. Parece mais
acertada a parcela doutrinária que defende que com a intimação prevista no art
843 do CPC – que para alguns inclusive se trata de citação – o cônjuge ou
companheiro passa a ser parte no processo de execução, numa espécie de
litisconsorte ulterior (STJ, Corte Especial, EREsp 306.465/ES, rel. Min.
Laurita Vaz, j. 20/03/2013, DJe 04/06/2013), daí advindo sua legitimidade
extraordinária (defenderá em nome próprio o interesse do outro cônjuge) para
ingressar com embargos do devedor. A legitimidade desse cônjuge ou companheiro
não devedor de também ingressar com embargos de terceiro decorre da especial
situação criada com sua intimação, por meio da qual o cônjuge torna-se
simultaneamente parte e terceiro, justificando-se esse duplo papel nos
diferentes títulos jurídicos que fundamentam sua dupla atuação no processo.
Apesar de parte na execução, sua legitimação extraordinária não permite que
seus bens sejam afetados pela demanda, o que legitima o ingresso de embargos de
terceiro (art 674, I, § 1º, do CPC).
É pacífica a doutrina e jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça quanto ao entendimento de que o cônjuge ou companheiro não
devedor tem legitimidade para os embargos à execução e embargos de terceiro, o
que parece confirmar o entendimento de condição simultânea de parte e terceiro
desse sujeito (Súmula 134/STJ: “Embora intimado da penhora em imóvel do casal,
o cônjuge do executado pode opor embargos de terceiro para defesa de sua
meação”). Apesar de poder ingressar com embargos á execução e embargos de
terceiro, tanto os prazos como as matérias de cada uma dessas ações devem ser
respeitados (STJ, 1ª Turma, REsp 740.331/RS, rel. Min. Luiz Fux, j. 14.11.2006,
DJ 18.12.2006). Os embargos à execução devem ser opostos no prazo de 15 dias da
juntada do mandado de citação cumprido aos autos, cabendo ao cônjuge ou
companheiro não devedor alegar as matérias típicas de defesa do executado (art
917 do CPC), enquanto os embargos de terceiro poderão ser interpostos até cinco
dias após a arrematação, adjudicação ou remição (art 675 do CPC), versando
exclusivamente sobre a proteção da meação.
Nos embargos de terceiro será discutida a
responsabilidade secundária do cônjuge ou companheiro não devedor, que existirá
sempre que o produto da dívida tiver beneficiado o casal ou a família. Caso
reste comprovado que não houve tal benefício, o cônjuge não devedor não terá
responsabilidade patrimonial, preservando, assim, sua meação, nos termos do art
843 do CPC. O Superior Tribunal de Justiça entende que o ônus da prova de
beneficiados pelo produto da dívida é do credor, salvo na hipótese de aval
concedido pelo cônjuge devedor, hipótese na qual caberá ao cônjuge não devedor
demonstrar que a dívida não reverteu em benefício do casal ou da família (STJ,
3ª Turma, AgRg no Ag 702.569/RS, Rel. Min. Vasco Della Giustina, j. 25.08.2009,
DJe 09.009.2009).
Apesar dessa nítida distinção – procedimental e
material – entre as duas espécies de embargos (execução e de terceiro),
admite-se, com fundamento nos princípios da economia processual e da instrumentalidade
das formas, o uso de um embargo por outro, desde que respeitados os
requisitos formais. Dessa forma, nenhum impedimento haverá ao cônjuge ou companheiro
não devedor em alegar em sede de embargos à execução a defesa da meação. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.246/1.248. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
6. BENS ALIEINADOS OU GRAVADOS COM ÔNUS
REAL EM FRAUDE DE EXECUÇÃO
O art 790, V, do CPC prevê hipótese de fraude à
execução, espécie de fraude patrimonial, como fonte de responsabilidade
patrimonial. Tem sentido a inclusão do dispositivo porque ao ato praticado em
fraude à execução é válido, mas ineficaz perante o credor, de forma que o
adquirente do bem, mesmo não sendo o devedor, responderá com ele pela obrigação
exequenda. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.248. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
7. BENS CUJA ALIENAÇÃO OU GRAVAÇÃO COM
ÔNUS REAL TENHA SIDO ANULADA EM RAZÃO DO RECONHECIMENTO, EM AÇÃO AUTÔNOMA, DE
FRAUDE CONTRA CREDORES
No inciso VI do artigo 790 do CPC vem a previsão da
sujeição de bens cuja alienação ou gravação com ônus real tenha sido anulada em
razão do reconhecimento, em ação autônoma de fraude contra credores. Como se
pode notar do dispositivo legal, o legislador consagra o entendimento de se o ato
de fraude contra credores anulável, preferindo parcela da doutrina que defende
o previsto no Código Civil em detrimento de outra corrente doutrinária que
entende ser o ato ineficaz.
Justamente em razão da tomada de posição na
polêmica a respeito da natureza do vício do ato prático em fraude contra
credores é curiosa a previsão do art 790, VI, do CPC. Sendo o ato anulado o bem
retorna ao patrimônio do devedor, de forma que passa a responder por suas
obrigações, mas não por meio de responsabilidade secundária, já que o
responsável patrimonial nesse caso é o devedor. O dispositivo só teria sentido
se o ato fosse considerado ineficaz, porque nesse caso o bem de propriedade do
adquirente, que obviamente não é devedor, responderia pelas obrigações deste. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.248. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
8. BENS DO RESPONSÁVEL, NOS CASOS DE
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
Nos termos do art 790, VII, do CPC é responsável
secundário o responsável pela dívida da sociedade empresarial na hipótese da
desconsideração de sua personalidade jurídica. Pode surgir questionamento a
respeito da necessidade desse dispositivo legal já que a responsabilidade
patrimonial do sócio já está consagrada no art 790, II, do CPC (cópia do art
592, II, do CPC/1973).
Entendo que o dispositivo foi criado visando as
espécies atípicas de desconsideração da personalidade jurídica criadas pelo
Superior Tribunal de Justiça, porque tanto na desconsideração entre sociedades
do mesmo grupo econômico, como na desconsideração inversa a responsabilidade
patrimonial secundária não é do sócio, não sendo tais situações, portanto,
contempladas no inciso II do art 790 do CPC.
Outra interpretação possível é deixar que o inciso
II do art 790 do CPC, cuide de toda responsabilidade patrimonial de sócio que
não derive da desconsideração da personalidade jurídica, enquanto o inciso VI
do mesmo dispositivo cuidaria de todas as espécies de desconsideração da
personalidade jurídica. É viável, e quem sabe para aqueles que estudarão
somente o novo diploma processual, sem se preocupar com o passado, parece até a
solução mais lógica. Mas será o reconhecimento tácito que durante toda a
vigência do CPC/1973 não havia regra de responsabilidade patrimonial secundária
de sócio em razão da desconsideração da personalidade jurídica. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.248. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
LIVRO II – DO
PROCESSO DE EXECUÇÃO
TÍTULO I – DA EXECUÇÃO EM GERAL – CAPÍTULO
V – DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL - vargasdigitador.blogspot.com
Art 791. Se a execução tiver por objeto obrigação de que seja
sujeito passivo o proprietário de terreno submetido ao regime do direito de
superfície, ou o superficiário, responderá pela dívida, exclusivamente, o
direito real do qual é titular o executado, recaindo a penhora ou outros atos
de constrição exclusivamente, o direito real do qual é titular o executado,
recaindo a penhora ou outros atos de constrição exclusivamente sobre o terreno,
no primeiro caso, ou sobre a construção ou a plantação, no segundo caso.
§ 1º.
Os atos de constrição a que se refere o caput serão averbados separadamente na
matrícula do imóvel, com a identificação do executado, do valor do crédito e do
objeto sobre o qual recai o gravame, devendo o oficial destacar o bem que
responde pela dívida, se o terreno, a construção ou a plantação, de modo a
assegurar a publicidade da responsabilidade patrimonial de cada um deles pelas
dívidas e pelas obrigações que a eles estão vinculadas.
§ 2º.
Aplica-se, no que couber, o disposto neste artigo à enfiteuse, à concessão de
uso especial para fins de moradia e à concessão de direito real de uso.
Sem
correspondência no CPC/1973.
1. BEM SUJEITO AO REGIME DO DIREITO DE SUPERFÍCIE
O direito real de superfície, regulamentado pelos
arts 1.369 a 1.377 do CC é uma concessão – gratuita ou onerosa – atribuída pelo
proprietário a outrem do direito de construir ou de plantar em seu terreno, por
tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no
Cartório de Registro de Imóveis.
A partir do momento da constituição do direito de
superfície passam a existir dois direitos reais sobre o imóvel, conforme bem
apontado pelo Enunciado 321 da CJF: “Os direitos e obrigações vinculados ao
terreno e, bem assim, aqueles vinculados à construção ou à plantação formam
patrimônios distintos e autônomos, respondendo cada um de seus titulares
exclusivamente por suas próprias dívidas e obrigações, ressalvadas as fiscais decorrentes
do imóvel”.
O art 791 do CPC, que não tem correspondente no
diploma processual revogado, trata da penhora sobre bem imóvel sujeito ao
regime do direito de superfície, reafirmando a autonomia entre o direito de
propriedade e o direito de superfície. No caput do dispositivo ora
analisado está estabelecido que, se a execução tiver como objeto obrigação de
que seja sujeito passivo o proprietário de terreno submetido ao regime do
direito de superfície os atos de constrição devem se limitar à penhora do
terreno, enquanto que, sendo o obrigado o superficiário, a penhora deve recair
sobre construção ou plantação.
O § 1º do dispositivo prevê que os atos de
constrição no caso analisado serão averbados separadamente na matrícula do
imóvel, no Registro de Imóveis, com a identificação do executado, do valor do
crédito e do objeto sobre o qual recai o gravame, devendo o Oficial destacar o
bem que responde pela dívida, se o terreno ou a construção ou a plantação, de
modo a assegurar a publicidade da responsabilidade patrimonial de cada um deles
pelas dívidas e obrigações que a eles estão vinculadas. O objeto do dispositivo
é claramente individualizar a responsabilidade patrimonial do proprietário e do
superficiário. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.250. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
2. OUTROS DIREITOS REAIS AUTÔNOMOS
O § 2º do art 791 do CPC prevê que a
responsabilidade patrimonial limitada ao titular do direito de propriedade e do
direito de superfície, com o reconhecimento de sua autonomia, também se aplica
à enfiteuse, à concessão de uso especial para fins de moradia e a concessão de
direito real de uso. A premissa é a mesma: a autonomia desses direitos reais
diante do direito de propriedade.
Dessa forma, sendo executado o proprietário,
somente o terreno responderá pela satisfação do direito do exequente, enquanto
que, sendo executado o titular dos direitos reais descritos no art 791, § 2
º, do CPC,
somente esses direitos poderão ser penhorados. (Daniel Amorim Assumpção Neves,
p. 1.250/1.251. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por
artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
LIVRO II – DO
PROCESSO DE EXECUÇÃO
TÍTULO I – DA EXECUÇÃO EM GERAL – CAPÍTULO
V – DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL - vargasdigitador.blogspot.com
Art 792. A
alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução:
I – quando sobre o bem pender ação
fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória, desde que a pendência
do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver;
II – quando tiver sido averbada, no
registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art 828;
III – quando tiver sido averbado, no
registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial
originário do processo onde foi arguida a fraude;
IV – quando, ao tempo da alienação ou
da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência;
V – nos demais casos expressos em lei.
§ 1º. A alienação em fraude à execução
é ineficaz em relação ao exequente.
§ 2º. No caso de aquisição de bem não
sujeito a registro, o terceiro adquirente tem o ônus de provar que adotou as
cautelas necessárias para a aquisição, mediante a exibição das certidões
pertinentes, obtidas no domicílio do vendedor e no local onde se encontra o
bem.
§ 3º. Nos casos de desconsideração da
personalidade jurídica, a fraude à execução verifica-se a partir da citação da
parte cuja personalidade se pretende desconsiderar.
§ 4º. Antes de declarar a fraude à execução,
o juiz deverá intimar o terceiro adquirente, que, se quiser, poderá opor
embargos de terceiro, no prazo de 15 (quinze)dias.
Correspondência no CPC/1973, art 593,
na seguinte ordem e redação:
Art 593. Considera-se em fraude de
execução a alienação ou oneração de bens:
I – quando sobre eles pender ação
fundada em direito real:
II – (Este referente ao inciso IV do
art 792, ora analisado, do CPC/2015) - quando, ao tempo da alienação ou
oneração, corria contra o devedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência;
III – (Este referente ao inciso V do
art 792, ora analisado, do CPC/2015) – nos demais casos expressos em lei.
Demais itens, sem correspondência no
CPC/1973
1. HIPÓTESES LEGAIS DE FRAUDE À EXECUÇÃO
O art 792
do CPC prevê em seus quatro primeiros incisos quatro situações que
configurariam fraude à execução, sendo tal rol meramente exemplificativo em
razão do previsto em seu último inciso (“nos demais casos previstos em lei”). O
dispositivo é sofrível, confundindo, ao menos em dois incisos (II e III),
fraude à execução com a presunção absoluta de ciência erga omnes da
situações do bem objeto de fraude, e repetindo redações do revogado art 593 do
CPC/1973.
Na
realidade o único requisito para que haja fraude à execução é ciência do
devedor da existência de ação judicial em trâmite promovida contra ele, que
tenha como objeto direito ou indireto a dívida, que será frustrada
patrimonialmente em razão da alienação ou de oneração de bens de seu
patrimônio. Ou seja, para que ocorra fraude à execução é preciso a ciência de existência
de ação que verse, ainda que indiretamente, sobre a dívida e o eventus damni.
O inciso IV
do art 792 do CPC, que substancialmente repete a redação do art 593, II, do CPC
1973, prevê haver fraude à execução na oneração ou alienação quando, ao tempo
da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo
à insolvência. É o dispositivo que mais se aproxima do conceito de fraude à
execução, mas ainda assim com sérios equívocos.
Primeiro, é
importante esclarecer a confusa redação do artigo legal ora analisado. Não é a
demanda que deve ser capaz de levar o devedor à insolvência, e sim o ato de
alienação – gratuita ou onerosa – de seu patrimônio. Assim, se, no momento em
que é proposta uma ação cobrando R$50.000,00, o devedor possuir um patrimônio
de R$500.000,00, poder-se-ia imaginar não ser aplicável o dispositivo
comentado, já que nunca essa ação será capaz de levar o devedor à insolvência.
Ocorre, entretanto, que, se alienar bens no valor de R$480.000,00, já não mais
conseguirá honrar o crédito cobrado, restando em insolvência e sendo
caracterizada a fraude à execução.
Segundo, a
ação apontada no dispositivo ora comentado não é necessariamente de execução,
sendo plenamente admissível que o ato de fraude à execução ocorro na constância
do processo/fase de conhecimento, de processo cautelar antecedente e da ação
probatória autônoma. Nesse caso, a previsão legal fica ainda mais sem sentido.
Não é preciso muito esforço hermenêutico para se concluir que a única ação/fase
capaz de gerar insolvência é a execução, o que inadequadamente afastaria a
amplitude interpretativa sugerida e já consagrada.
Registre-se
que, mesmo sendo possível ocorrer fraude à execução durante qualquer espécie de
processo, ela é reconhecida somente na execução, mesmo que perpetrada antes
desse processo ou fase procedimental. O reconhecimento da fraude à execução
terá caráter declaratório, com eficácia ex tunc (desde o momento em que
a fraude ocorreu).
Terceiro, a
configuração de fraude à execução não depende apenas do trâmite da ação
judicial, mas, como ato de desrespeito à própria função jurisdicional do
Estado-juiz, da ciência do devedor da existência de ação judicial capaz de
leva-lo à insolvência a depender da dilapidação patrimonial. Fraude à execução,
portanto, somente se configura após a inequívoca ciência do demandado acerca da
existência de ação judicial, por meio da citação, sendo os atos fraudulentos
cometidos antes desse momento processual considerados, em regra, como fraude
contra credores.
A necessidade
de citação do demandado em ação judicial dá-se em razão da necessidade de eu
tenha ciência da demanda judicial. Dessa forma, apesar de não ser a regra
geral, pode o credor provar que, apesar da inexistência de citação, o demandado
já tinha ciência inequívoca da existência da ação, quando então se poderá
configurar a fraude à execução. O mais importante, nesse tema, é a prova de que
o demandado tinha plena ciência da existência de processo judicial movido
contra ele quando alienou bens de seu patrimônio. Os três primeiros incisos do
art 792 do CPC dão bons exemplos de registros e averbações que podem anteceder
a citação do devedor e que se prestam a dar ciência a ele da existência do
processo em trâmite.
Conforme já
afirmado, apesar dos sérios equívocos do inciso IV do art 792 do CPC, ele é o
que mais se aproxima do conceito clássico de fraude à execução.
Aparentemente
nos demais incisos do art 792 do CPC o legislador inovou ao prever hipóteses de
fraude à execução que dispensam qualquer outro requisito que não aquele
previsto no dispositivo legal. Ou seja, passa a admitir fraude à execução
independentemente do eventus damni.
O inciso I
do dispositivo legal é necessário porque prevê uma espécie de fraude à execução
singular, dissociada do eventus damni. É o único elogio que se pode
fazer ao dispositivo legal. A fraude nesse caso não depende da insolvência do
devedor, mas tão somente da alienação ou da oneração do bem imóvel (ação
fundada em direito real) ou bem móvel (pretensão reipersecutória). Haverá
fraude à execução nesse caso porque sendo o objeto da execução determinado,
frustra-se a satisfação do direito do exequente por um ato de má-fé do devedor.
Ou seja, o devedor frauda a execução.
O art 792,
I, do CPC, entretanto, cria um requisito injustificável para que exista fraude
à execução na hipótese ora analisada: a averbação da pendência do processo no
registro público, se houver. Aqui há uma confusão indevida, porque mesmo sem a
averbação é possível que haja fraude à execução, desde que o devedor, à época
da alienação ou da oneração do bem, tivesse ciência da existência da ação. A
averbação nesse caso é somente uma forma de se criar uma presunção absoluta de
ciência erga omnes da existência da ação – inclusive do devedor – e não
um requisito indispensável para que haja fraude à execução.
Essa
confusão consagrada no inciso I do art 792 do CPC é também notada nos dois
incisos seguintes. Segundo o inciso II haverá fraude à execução quando tiver
sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução. E nos
termos do inciso III a fraude à execução ocorrerá quando tiver sido averbado,
no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial
originário onde foi arguida a fraude. Os dispositivos seguiram a mesma equivocada
técnica adotada pelo art 54 da Lei 13.097/2015.
Insista-se,
nos dois dispositivos ligais o que se tem são medidas adotadas pelo credor para
a criação de uma presunção absoluta de ciência erga omnes da situação do
bem. Serve para provar a ciência do devedor da existência do processo e para
afastar suposta boa-fé do terceiro adquirente. Não são, entretanto, requisitos
indispensáveis para que haja fraude à execução.
Nesses
casos, havendo a situação tipificada em lei haverá fraude à execução,
independentemente do eventus damni, mas mesmo sem tal tipificação poderá
haver fraude à execução se for demonstrada a ciência do executado da existência
do processo e a alienação ou oneração do bem levar ou agravar sua insolvência.
Já na
vigência do CPC/1973 a melhor doutrina entendia que tendo ocorrido penhora,
arresto, depósito ou qualquer outra espécie de constrição judicial, o bem
passava a estar vinculado diretamente e de forma individualizada à demanda
judicial da qual emanou o ato constritivo. Dessa maneira, a alienação ou
oneração mostrava-se em total e absoluto desrespeito à função jurisdicional.
Tal gravidade afasta o preenchimento de qualquer requisito, de forma que a mera
alienação ou oneração de bem constrito judicialmente já é suficiente para a
configuração dessa espécie de fraude, mesmo sem o eventus damni. Os
incisos II e III do CPC apenas ampliaram esse entendimento para a averbação da
execução e para a hipoteca judiciária. (Daniel Amorim Assumpção Neves,
p. 1.252/1.254. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por
artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
2. ATO INEFICAZ
A doutrina
nesse pondo é pacífica em aceitar que o ato cometido em fraude à execução é
válido, porém ineficaz perante o credor, ou seja, o ato não lhe é oponível,
sendo nesse sentido o § 1º do art 792 do CPC. Faltou dizer que a oneração
também. Na realidade, o melhor teria sido dizer que o ato praticado em fraude à
execução é ineficaz.
Não é
necessário o ingresso de qualquer ação judicial por parte do credor (como
ocorre no caso de fraude contra credores), bastando uma mera petição no
processo já pendente para que o juiz reconheça a fraude. A exceção fica por
conta de alegação de fraude à execução após a alienação judicial do bem, quando
será necessário o ingresso de ação anulatória, inclusive com a formação de
litisconsórcio necessário entre o adquirente e as partes do processo no qual
ocorrer a alienação judicial (Informativo 494/STJ, 3ª Turma, REsp 1.219.093-PR,
Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 27.03.2012, DJe 10.04.2012). (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.254. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
3. TERCEIRO ADQUIRENTE DE BOA-FÉ
Importante
característica da fraude à execução é a dispensa de prova do elemento subjetivo
do consilium fraudis, pouco importando se havia ciência ou não de que o
ato levaria o devedor à insolvência. A intenção fraudulenta nesse caso é
presumida, sendo irrelevante para os fins de configuração de fraude se o ato é
real ou simulado, de boa ou má-fé. A prova do eventus damni,
evidentemente, é indispensável (STJ, 3ª Turma, AgRg no Ag 1.057.724/SP, rel.
Min. Sidnei Beneti, j. 27.10.2009, DJe 06.11.2009).
O Superior
Tribunal de Justiça, entretanto, entende que o terceiro adquirente de boa-fé
deve ser protegido, não havendo ineficácia no ato praticado em fraude à
execução se o adquirente demonstrar sua boa-fé no negócio jurídico (STJ, 1ª
Turma, Resp 638.664/PR, rel. Min. Luiz Fux, j. 07.04.2005, DJ 02.05.2005). Dessa
forma, apesar de tal dispensa, para considerar ineficazes os atos de disposição
ou oneração, exige-se que o adquirente saiba da existência da ação ou apresente
razões que demonstrem ser impossível ignorá-la, tais como o registro da ação
perante o cartório de imóveis, ampla divulgação na imprensa etc.
O entendimento
encontra-se consagrado pela Súmula 375/STJ, que estabelece que o reconhecimento
da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova
de má-fé do terceiro adquirente, cabendo ao credor o ônus da prova de que o
terceiro adquirente tinha ciência de que havia a constrição ou demanda contra o
vendedor capaz de leva-lo à insolvência (Informativo 395/STJ, 3ª Turma, REsp
804.044-GO, rel. Min. Nancy Andrighi, rel. p/acórdão Massami Uyeda, j.
19.05.2009, DJ 04;08.2009).
Prestigiou-se nesse entendimento sumulado a milenar parêmia de que a
boa-fé se presume e a má-fé se prova (Informativo 551/STJ, Corte Especial, Resp
956.943/PR, rel. originária Min. Nancy Andrighi, rel. p/acórdão Min. João
Otávio de Noronha, j. 20.08.2014, DJe 1º.12.2014).
Apesar de o
entendimento consagrado no verbete sumular mencionar apenas o registro da
penhora, o que efetivamente interessa é a eficácia erga omnes gerada
pela inclusão da existência do processo ou da situação do bem em algum
registro. Assim, além do registro da penhora, também as averbações e registros
previstas nos três primeiros incisos do art 792 do CPC. E também o protesto da
sentença previsto no art 517 do atual CPC.
Entendo que
o entendimento está parcialmente superado pela previsão contida no § 2º do art
792 do CPC. A questão é apenas se definir a abrangência dessa superação
parcial. Nos termos do dispositivo legal mencionado, no caso de aquisição de
bem não sujeito a registro, o terceiro adquirente tem o ônus de provar que
adotou as cautelas necessárias para a aquisição, mediante a exibição das
certidões pertinentes, obtidas no domicílio do vendedor.
O sentido a
ser dado a “bem não sujeito a registro” definirá a abrangência do dispositivo
legal. Se for considerado sob uma ótica abstrata, significará bens que nunca
poderão ser objeto de registro, simplesmente porque não existe cadastro daquela
espécie de bem, como ocorre com a maioria dos bens móveis. Nesse caso pouco
importará se o bem já está penhorado. Se for considerado sob uma ótica concreta,
significará, além dos bens impossíveis de serem registrados por ausência de
cadastro, aqueles bens que poderiam ser registrados, mas que no caso concreto
não podem pela simples razão de não terem ainda sido penhorados. Nesse caso o
exequente só teria o ônus da prova se por descaso – ou qualquer outro motivo –
tiver deixado de registrar a penhora.
Em minha
percepção a termo deve ser interpretado sob a ótica concreta, porque a premissa
da distribuição do ônus da prova da boa ou má-fé do terceiro que pratica ato em
fraude à execução ser do exequente ou do terceiro independe da espécie de bem,
mas sim de sua penhora ter sido registrado ou, ainda quando possível, ter o
exequente deixado de realizar tal registro.
Tanto o
entendimento sedimentado na Súmula 375/STJ como a noviça previsão do art 792, §
2º, do CPC não devem abalar a singular realidade existente quanto às dívidas
fiscais. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento no sentido de que o
enunciado da súmula não se aplica às execuções fiscais em razão do previsto no
art 185 do CTN, de forma que, na hipótese de crédito tributário em favor da
Fazenda Pública, os atos de alienação fraudulenta serão considerados fraude à
execução desde a inscrição do débito na Dívida Ativa (STJ, 1ª Seção, REsp
1.141.990/PR, rel. Min. Luiz Fux, j. 10.11.2010, DJe 19.11.2010). (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.254/1.256. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
4. INCIDÊNCIA DO ART. 54 DA LEI 13.907/2015
Não abala
minhas conclusões o art 54 da Lei 13.097/2015, em especial em razão de seu
parágrafo único. Enquanto o caput do dispositivo sugere uma solução
absoluta em benefício do terceiro adquirente, o parágrafo único volta a
consagrar a distinção entre terceiro de boa-fé e de má-fé, tutelando apenas o
primeiro deles.
Prevê o
dispositivo ora comentado que os negócios jurídicos que tenham por fim
constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes
em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido
registradas ou averbadas na matrícula do imóvel as informações previstas em
seus três incisos: (I) registro de citação de ações reais ou pessoais
reipersecutórias; (II) averbação, por solicitação do interessado, de constrição
judicial, do ajuizamento de ação de execução ou de fase de cumprimento de
sentença, procedendo-se nos termos previstos do art 615-A da Lei 5.869, de 11
de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil (substituído pelo art 828 do
atual CPC); (III) averbação de restrição administrativa ou convencional ao gozo
de direitos registrados, de indisponibilidade ou de outros ônus quando
previstos em lei; e (IV) averbação, mediante decisão judicial, da existência de
outro tipo de ação cujos resultados ou responsabilidade patrimonial possam
reduzir seu proprietário à insolvência, nos termos do inciso II do art 593 da
Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil (substituído
pelo art 792, IV, do CPC).
A
conjugação do caput e dos incisos do art 54 da Lei 13.097/2015 sugere
claramente que sem o registro ou a averbação nas hipóteses previstas em lei o
terceiro adquirente estaria sempre protegido. Seria algo como: “não está no
registro não está no mundo”. Essa interpretação, entretanto, incorre no mesmo
equívoco dos incisos II e III do art 792 do CPC, de confundir a existência de
fraude à execução com as diferentes formas de se gerar eficácia erga omnes
da situação do bem e, assim, afastar a alegação do terceiro de ter atuado de
boa-fé.
O
entendimento é corroborado pelo parágrafo único do art 54 da Lei 13.097/2015,
ao prever que não poderão ser opostas situações jurídicas não constantes da
matrícula no Registro de Imóveis, inclusive para fins de evicção, ao terceiro
de boa-fé que adquirir ou receber em garantia direitos reais sobre o imóvel,
ressalvados o disposto nos arts. 129 e 130 da Lei 11.101, de 9 de fevereiro de
2005, e as hipóteses de aquisição e extinção da propriedade que independam de
registro de título de imóvel.
A
interpretação a contrário sensu que deve ser feita desse dispositivo
legal é que se não podem ser opostas situações jurídicas não constantes da
matrícula no Registro de Imóveis ao terceiro de boa-fé que adquirir ou receber
em garantia direitos reais sobre o imóvel, é porque podem ser opostas ao terceiro
de má-fé. Ou seja, mesmo que não haja qualquer registro na matrícula do imóvel,
sua alienação ou oneração ainda poderá ser considerada em fraude, desde que
comprovada a má-fé do terceiro adquirente. (Daniel Amorim Assumpção Neves,
p. 1.256/1.257. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por
artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
5. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
o art 137
deste Código de Processo Civil prevê que, sendo acolhido o pedido de
desconsideração, a alienação ou oneração de bens, havida em fraude de execução,
será ineficaz em relação ao requerente. Como se pode notar do dispositivo
legal, somente após o acolhimento do pedido de desconsideração haverá fraude à
execução, em previsão que aparentemente contraria com o disposto no art 792, §
3º, do CPC, que estabelece haver fraude à execução nos casos de desconsideração
da personalidade jurídica a partir da citação da parte cuja personalidade se
pretende desconsiderar.
Essa
contrariedade foi minha primeira impressão, mas numa análise mais cuidadosa
entendo viável a convivência dos dois dispositivos legais. Para tanto deve se
entender que o art 137 do CPC não prevê o termo inicial da fraude à execução,
limitando-se a afirmar que somente haverá tal espécie de fraude se o pedido de
desconsideração for acolhido. A questão do termo inicial de tal fraude,
portanto, seria resolvida exclusivamente pelo § 3º do art 792 do CPC.
E esse
dispositivo não parece ter fixado o termo inicial mais adequado ao prever que
haverá fraude à execução a partir da citação da parte cuja personalidade se
pretende desconsiderar. Não se trata, portanto, da citação dos “réus” no
incidente de desconsideração da personalidade jurídica, mas sim do demandado
originário Enunciado 52 da ENFAM: “A citação a que se refere o art 792, § 3º,
do CPC/2015 (fraude à execução) é a do executado originário, e não aquela
prevista para o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art 135
do CPC/2015)”.
O que,
entretanto, não parece o mais correto, porque nesse caso cria-se uma presunção
absoluta de ciência dos sujeitos que serão atingidos pela desconsideração da
personalidade jurídica que não deveria existir. A norma protege o credor, mas
deixa o terceiro em grande risco, bastando pensar na hipótese de um terceiro
adquirir um imóvel sem qualquer gravame, de vendedor sem qualquer restrição,
mas que venha muito tempo depois a ser atingido pela desconsideração da
personalidade jurídica. É realmente legitimo falar-se nesse caso de fraude à
execução?
O
legislador teria sido mais técnico se tivesse se aproveitado do disposto no art
134, § 1º, do CPC ora analisado, que prevê a comunicação da instauração do
incidente de desconsideração da personalidade jurídica ao distribuidor para as
anotações devidas. Nesse momento os nomes dos sujeitos que poderão ser afetados
pela desconsideração se tornarão públicos, sendo esse o momento mais adequado
para se configurar a fraude à execução. Infelizmente, entretanto, não foi essa
a opção do legislador. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.257. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
6. CONTRADITÓRIO
Doutrina
minoritária defende a exigibilidade de uma sentença transitada em julgado em
processo de conhecimento com ampla possibilidade de defesa do terceiro
adquirente e do devedor alienante, única forma de preservação do devido
processo legal. Parece mais adequado entender que o contraditório se estabelece
incidentalmente, exigindo-se a oitiva do terceiro adquirente antes de acolhida
a alegação de fraude à execução.
Contrariando
o que atualmente ocorre na praxe forense, o § 4º do art 792 do CPC prevê que,
antes de ser declarada a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro
adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no prazo de 15
dias.
A praxe
forense mostra que o juiz não intima o terceiro da alegação de fraude à
execução, em posição que encontra respaldo na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça (STJ, 4ª Turma, AgRg no REsp 1.182.385/RS, rel. Min. Luís
Felipe Salomão, j. 06/1102014, DJe 11/11/2014; STJ, 3ª Turma, AgRg no REsp
1.459.831/MS, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 21.10.2014, DJe 28/10/2014.
Contra: STJ, 4ª Turma, RMS 29.697/RS, rel. Min. Raul Araújo, j. 23.04.2013, DJe
01.08.2013), antes acolhendo o pedido e determinando a penhora do bem e somente
depois disso o intima do ato de constrição de judicial, abrindo-lhe a
oportunidade de ingressar com embargos de terceiro.
Parece não
haver dúvida de que a nova disciplina afasta o contraditório diferido utilizado
atualmente. Segundo o dispositivo, o terceiro é intimado do pedido do
exequente, podendo ingressar com embargos de terceiro em 15 dias. Concluo que o
terceiro não pode simplesmente se manifestar nos autos, devendo ingressar com
embargos de terceiro preventivo. Pela lógica do sistema o juiz não pode
determinar a penhora do bem antes do prazo de 15 dias, nem durante o trâmite
dos embargos de terceiro.
E é
justamente nesse ponto que a regra não parece ser a mais adequada, postergando
em demasia o ato de constrição judicial. Nesse caso parece ser um exagero
exigir o contraditório tradicional, ainda mais quando a reação do demandado se
desenvolve por meio de uma ação incidental (embargos de terceiro).
Questão
relevante que deve ser enfrentada é a consequência de o terceiro não ingressar com os embargos de terceiro no
prazo de 15 dias previsto pelo art 792, § 4º, do CPC. Acredito que o prazo se
preste apenas a permitir ao terceiro evitar a constrição judicial enquanto se
defende da alegação de ter praticado ato em fraude à execução. Significa dizer
que o prazo previsto no art 665 do CPC não é afastado nesse caso, podendo o
terceiro se valer de tal prazo, bem mais extenso, caso não tenha ingressado com
os embargos de terceiro preventivos para evitar o ato de constrição judicial.
Registro
entendimento em sentido contrário consagrado no Enunciado 54 da ENFAM: “A
ausência de oposição de embargos de terceiro no prazo de 15 (quinze) dias
prevista no art 792, § 4º, do CPC/2015 implica preclusão para fins do art 675
Icaput, do mesmo código” e Enunciado 191 do FPPC: “O prazo de quinze dias
para opor embargos de terceiro, disposto no § 4º do art 792, é aplicável
exclusivamente aos casos de declaração de fraude à execução; os demais casos de
embargos de terceiro são regidos pelo prazo do caput do art 675.” (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.257/1.258. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
LIVRO II – DO
PROCESSO DE EXECUÇÃO
TÍTULO I – DA EXECUÇÃO EM GERAL – CAPÍTULO
V – DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL - vargasdigitador.blogspot.com
Art 793. O
exequente que estiver, por direito de retenção, na posse de coisa pertencente
ao devedor não poderá promover a execução sobre outros bens senão depois de
excutida a coisa que se achar em seu poder.
Correspondência no CPC/1973, art 594,
com o mesmo teor, somente mudando o termo “exequente” por “credor”.
1. DIREITO DE RETENÇÃO
O
dispositivo legal cria um interessante direito de preferência à penhora de bens
do devedor que já estejam em poder do exequente no momento da execução. Alguns
contratos de garantia, tais como os de penhor e caução, geralmente levam à
transmissão física da posse do bem dado em garantia, sendo que nesses casos o
princípio da menor onerosidade justifica que sejam esses bens os primeiros a
responder pela execução. Não teria sentido invadir o patrimônio do devedor,
dele retirar outros bens e continuar a manter os bens dados em garantia na
posse do credor, o que demandaria para sua recuperação a adoção de medidas
judiciais.
A
preferência criada pelo art 793 do CPC, entretanto, pode ceder na hipótese de o
exequente indicar outros bens à penhora e o executado com esse pedido concordar,
hipótese na qual caberá ao exequente a devolução imediata da coisa do executado
que esteja em seu poder.
É preciso
registrar que a regra do art 793 do CPC não limita a responsabilidade
patrimonial do executado, tão somente cria um benefício de excussão a seu
favor, de forma que, não sendo os bens que estejam em poder do exequente
suficientes para a satisfação da obrigação, naturalmente a penhora e futura
expropriação poderão alcançar outros bens do executado. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.259. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
LIVRO II – DO
PROCESSO DE EXECUÇÃO
TÍTULO I – DA EXECUÇÃO EM GERAL – CAPÍTULO
V – DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL - vargasdigitador.blogspot.com
Art 794. O
fiador, quando executado, tem o direito de exigir que primeiro sejam executados
os bens do devedor situados na mesma comarca, livres e desembargados,
indicando-os pormenorizadamente à penhora.
§ 1º. Os bens do fiador ficarão
sujeitos à execução se os do devedor, situados na mesma comarca que os seus,
forem insuficientes à satisfação do direito do credor.
§ 2º. O fiador que pagar a dívida
poderá executar o afiançado nos autos do mesmo processo.
§ 3º. O disposto no caput não se
aplica se o fiador houver renunciado ao benefício de ordem.
Correspondência no CPC/1973, art 595,
caput e parágrafo único, na ordem e redação a seguir:
Art 595. (Este referente ao caput e §
1º, do art 794 do CPC/2015, ora analisado). O fiador, quando executado, poderá
nomear à penhora bens livres e desembargados do devedor. Os bens do fiador
ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes á
satisfação do direito do credor.
Parágrafo
único. (Este referente ao § 2º, do art 794 do CPC/2015, ora analisado). O
fiador, que pagar a dívida, poderá executar o afiançado nos autos do mesmo
processo.
Demais itens sem correspondente.
1. DIREITO DO FIADOR AO BENEFÍCIO DE ORDEM
O art 794
do CPC consagra o direito do fiador conhecido como “benefício de ordem”, que
permite ao fiador indicar na execução bens do devedor antes que seus próprios
bens sejam atingidos pelos atos executivos, desde que os bens do devedor
situados na mesma comarca que os seus forem insuficientes á satisfação do
direito do exequente. A nomeação dos bens do devedor, na realidade, pode
ocorrer tanto de forma preventiva, antes de seu patrimônio ser atingido, ou de
forma repressiva, quando o pedido será de substituição do bem penhorado. Como o
fiador é meramente coobrigado perante o credor, mas não é devedor, é natural
que exista a preferência legal, sendo a responsabilidade patrimonial do fiador
primária subsidiária. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.260. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
2. SUB-ROGAÇÃO
Mesmo tendo
o fiador o direito abstrato ao benefício de ordem, não se deve desprezar a
impossibilidade, jurídica ou material, de exercê-lo no caso concreto. O fiador,
por exemplo, pode não localizar bens no patrimônio do devedor, ou ainda
localizar bens já gravados ou que estejam localizados em outra comarca, sendo
nesse caso inaplicável a preferência do patrimônio do devedor nos termos do art
794, caput, do CPC.
Nesses
casos será mesmo o patrimônio do fiador que responderá pela satisfação do
direito do credor, se sub-rogando em seus direitos, ou seja, passando a ser o
credor do devedor, podendo executá-lo por cumprimento de sentença nos mesmos
autos da execução satisfeita pelo fiador, nos termos do art 794, § 2º, do CPC. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.260. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
3. DISPONIBILIDADE DO DIREITO AO BENEFÍCIO DE ORDEM
O benefício
de ordem é um direito disponível do fiador, não havendo qualquer impedimento
legal para que o fiador renuncie expressa ou tacitamente a seu direito. É comum
em contratos de locação a renúncia expressa ao benefício de ordem pelo fiador,
em típica hipótese de renúncia expressa; a renúncia tácita ocorre sempre que o
fiador deixa de indicar os bens do devedor no caso concreto, ainda que tal
indicação fosse possível. O Superior Tribunal de Justiça entende que é válida
cláusula contratual em que o fiador renuncia ao benefício de ordem (STJ, 4ª
Turma, AgRg no AgRg no AREsp 174.654/RS, rel. Min. Raul Araújo, j. 03.06.2014,
DJe 20/06/2014).
Para que o
fiador possa exercer seu direito ao benefício de ordem é imprescindível que
exista título executivo contra o devedor, única forma de se legitimar a invasão
patrimonial em seu patrimônio. Na hipótese de processo de conhecimento movido
somente contra o fiador, o futuro e eventual direito ao benefício de ordem só
será mantido se o réu chamar ao processo o devedor principal, porque se a
condenação for exclusiva contra o fiador, prevê o § 3º do art 794 do CPC a
inaplicabilidade do caput do mesmo dispositivo legal. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.260. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
LIVRO II – DO
PROCESSO DE EXECUÇÃO
TÍTULO I – DA EXECUÇÃO EM GERAL – CAPÍTULO
V – DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL - vargasdigitador.blogspot.com
Art 795. Os
bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, senão
nos casos previstos em lei.
§ 1º. O sócio réu, quando responsável
pelo pagamento da dívida da sociedade, tem o direito de exigir que primeiro
sejam excutidos os bens da sociedade.
§ 2º. Incumbe ao sócio que alegar o
benefício do § 1º nomear quantos bens da sociedade situados na mesma comarca,
livres e desembargados, bastem para pagar o débito.
§ 3º. O sócio que pagar a dívida
poderá executar a sociedade nos autos do mesmo processo.
§ 4º. Para a desconsideração da
personalidade jurídica é obrigatória a observância do incidente previsto neste
Código.
Correspondência no CPC/1973, art 596,
caput e §§ 1º e 2º, na seguinte ordem e redação:
Art 596, caput. (Este referente ao
caput e § 1º do art 795, do CPC/2015, ora analisado). Os bens particulares dos
sócios não respondem pelas dívidas da sociedade senão nos casos previstos em
lei; o sócio, demandado pelo pagamento da dívida, tem direito a exigir que
sejam primeiro excutidos os bens da sociedade.
§ 1º. (Este
referente ao § 2º do art 795, do CPC/2015, ora analisado). Cumpre ao sócio, que
alegar o benefício deste artigo, nomear bens da sociedade, sitos na mesma
comarca, livres e desembargados, quantos bastem para pagar o débito.
§ 2º. (Este referente ao § 3º do art
795, do CPC/2015, ora analisado). Aplica-se aos casos deste artigo o disposto
no parágrafo único do artigo anterior.
§ 4º sem correspondente no CPC/1973.
1. DIREITO DO SÓCIO AO BENEFÍCIO DE ORDEM
O direito
ao benefício de ordem não é exclusivo do fiador, também existindo para o sócio
quando demandado pela dívida da sociedade. O sócio pode exercer esse direito
quando for coobrigado, quando terá responsabilidade primária subsidiária, como
ocorre em algumas espécies de sociedade (p. ex. sociedade em nome coletivo [art
1.039 do CC] e do sócio comanditado na sociedade em comandita simples [art
1.045, caput, do CC]), sociedade irregular e de sociedade de fato, nas
quais a responsabilidade do sócio é solidária e ilimitada (art 990 do CC), como
também na hipótese de desconsideração da personalidade jurídica (art 50 do CC),
quando terá responsabilidade patrimonial secundária.
Os §§ 1º a
3º do art 795 do CPC replicam ao sócio as regras previstas nos §§ 1º a 3º do
art 794 do mesmo diploma legal, ao regulamentar o direito do fiador ao
benefício de ordem. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.261. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
2. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
Reconhecendo
que uma das formas de o sócio responder com seu patrimônio por dívida da
sociedade, e assim poder se valer do direito ao benefício de ordem, é por meio
da desconsideração da personalidade jurídica, o art 795, § 4º, do CPC prevê a
obrigatoriedade da observância do incidente previsto nos arts 133 a 137 do CPC
para a desconsideração da personalidade jurídica.
Na
realidade o art 134, § 2º, do CPC, dispensa a instauração do incidente se a
desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese
em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica, o que obviamente deve ser
considerado na interpretação do art 795, § 4º, do CPC.
Apesar
da obrigatoriedade prevista de forma clara e indiscutível no dispositivo ora
comentado, já há criação de exceções à instauração do incidente de
desconsideração da personalidade jurídica, como se pode notar do Enunciado 53
da ENFAM: “o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente prescinde
do incidente de desconsideração da personalidade jurídica previsto no art 133
do CPC/2015”. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.261/1.262. Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed.
Juspodivm).
LIVRO II – DO
PROCESSO DE EXECUÇÃO
TÍTULO I – DA EXECUÇÃO EM GERAL – CAPÍTULO
V – DA RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL - vargasdigitador.blogspot.com
Art 796. O espólio
responde pelas dívidas do falecido, mas, feita a partilha, cada herdeiro
responde por elas dentro das forças, da herança e na proporção da parte que lhe
coube.
Correspondência no CPC/1973, art 597
com a seguinte redação:
Art 597. O espólio responde pelas
dívidas do falecido; mas, feita a partilha, cada herdeiro responde por elas na
proporção da parte que na herança lhe coube.
1. RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL PELAS DÍVIDAS DO
FALECIDO
O art 796
do CPC, que reproduz o teor do art 1.997 do CC, trata da responsabilidade
patrimonial pelas dívidas do falecido, estabelecendo que até a partilha o
responsável patrimonial é o espólio, mas após esse momento procedimental, até
mesmo porque a partir daí não existirá mais espólio, a responsabilidade passa a
ser do herdeiro dentro das forças da herança e na proporção da parte que lhe
coube, o que será aferido pelo quinhão recebido (STJ, 6ª Turma, REsp
1.1290.042/SP, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 01.12.2011, DJe
29/02/2012). (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 1.262. Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
Nenhum comentário:
Postar um comentário