CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 – COMENTADO – Art. 988
DA RECLAMAÇÃO - VARGAS,
Paulo S.R.
LIVRO III – Art. 988 a 993- TITULO I
– DA ORDEM DOS PROCESSO
E DOS PROCESSOS DE COMPETÊNCIA
ORDINÁRIA DOS TRIBUNAIS
– CAPÍTULO IX – DA RECLAMAÇÃO –
vargasdigitador.blogspot.com
988. caberá
reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:
I –
preservar a competência do tribunal;
II –
garantir a autoridade das decisões do tribunal;
II – garantir
a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo
Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
·
Redação
dada pela Lei 13.256 de 04.02.2016.
IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento
de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção
de competência;
·
Redação
dada pela Lei 13.256 de 04.02.2016.
§ 1º. A reclamação pode ser proposta perante qualquer tribunal,
e seu julgamento compete ao órgão jurisdicional cuja competência se busca
preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir.
§ 2º. A reclamação deverá ser instruída com prova documental e
dirigida ao presidente do tribunal.
§ 3º. Assim que recebia, a reclamação será autuada e distribuída
ao relator do processo principal, sempre que possível.
§ 4º. As hipóteses dos incisos III e IV compreendem a aplicação
indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos casos que a ela correspondam.
§ 5º. É inadmissível a reclamação:
I – proposta após garantir a observância de acórdão de recurso
extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em
julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não
esgotadas as instâncias ordinárias.
·
Redação
dada pela Lei 13.256 de 04.02.2016.
§ 6º. A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto
contra a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação.
·
Redação
dada pela Lei 13.256 de 04.02.2016.
1. NATUREZA JURÍDICA
Segundo ensina a doutrina
majoritária, a reclamação constitucional tem natureza jurisdicional, sendo
equivocado o entendimento de enxergá-la como mera atividade administrativa. A
confusão decorria de antiga associação da reclamação com a correição parcial, o
que a atual conjuntura constitucional fez desaparecer.
A natureza recursal deve ser
descartada, porque a reclamação constitucional não atende a elementos
essenciais dessa espécie de impugnação de ato judicial: a) não há qualquer
previsão em lei federal que a aponte como recurso, e, sem essa previsão legal
expressa, considerar a reclamação constitucional um recurso seria afrontar o
princípio da taxatividade; b) a reclamação constitucional está prevista nos
arts 102, I, l, e 105, I, f, ambos da CF, e nos arts 988 a 993,
deste CPC, como atividade de competência originária dos tribunais superiores, e
não como atividade recursal; c) o interesse recursal gerado pela sucumbência,
indispensável pelo menos para as partes recorrerem, não existe na reclamação
constitucional; d) a reclamação constitucional, ao menos em regra, não tem
prazo preclusivo para seu oferecimento, característica indispensável a qualquer
recurso; e) o objetivo da reclamação constitucional não é a reforma de decisão,
nem sua anulação, de forma que não se pretende nem a substituição de decisão
nem a prolação de outra em seu lugar, sendo perseguida pela parte,
simplesmente, a cassação da decisão ou a preservação da competência do
tribunal.
Também não é correto o
entendimento de que a reclamação constitucional seja um incidente processual.
Ainda que se admita certa divergência doutrinária a respeito do conceito de
incidente processual, parece ser pacífico o entendimento de que sua existência
depende de haver um processo em trâmite. A existência de processo em trâmite,
entretanto, não é exigência indispensável para a reclamação constitucional, que
pode ser apresentada diante de descumprimento da decisão de tribunal por
autoridade administrativa.
A divergência mais séria
encontra-se na discussão entre a natureza de ação e de exercício do direito de
petição, com importantes consequências práticas da adoção de um desses
entendimentos. Prefiro a corrente doutrinária que defende a natureza jurídica
de ação da reclamação constitucional (STJ, 1ª Seção, Rcl. 3.828/SC, rel. Min.
Eliana Calmon, j. 28/04/2010, DJe 07/05/2010), considerando-se presentes os
elementos fundamentais que compõem uma ação: petição inicial veiculando uma
pretensão, citação, contraditório, decisão de mérito coberta por coisa julgada
material, além de exigências formais que corroboram a conclusão, tais como a
exigência de pressupostos processuais positivos, a capacidade de ser parte, de
estar em juízo e postulatória, e negativos, a ausência de coisa julgada, de
perempção e de litispendência.
Ocorre, entretanto, que o
Supremo Tribunal Federal, em célebre julgamento no qual teve de enfrentar o
tema, chegou à conclusão de que a reclamação constitucional não seria uma ação,
mas o mero exercício do direito de petição, previsto no art 5º, XXXIV, a, da CF (STF: Tribunal Pleno, ADI
2.212/CE, rel. Min. Ellen Gracie, j. 02/10/2003, DJ 14/11/2003, p. 11). A
consequência mais interessante reconhecida por esse julgamento é a
possibilidade de as Constituições Estaduais preverem reclamação constitucional
de competência dos Tribunais de Justiça, enquanto a competência dos tribunais
regionais federais dependeria de previsão na Constituição Federal.
Essa consequência, entretanto,
passa a ser irrelevante diante do art 988, I e II, do CPC, que se limita a
indicar apenas o tribunal, não exigindo tribunais de superposição como ocorre
no texto constitucional, ao se referir ao cabimento da reclamação
constitucional para preservação da autoridade de suas decisões e evitar
usurpação de competência. Por outro lado, o art 988, § 1º, do CPC, prevê
expressamente que a reclamação pode ser proposta perante qualquer tribunal,
deixando claro que, independentemente de previsão constitucional (estadual ou
federal), o Tribunal de Justiça e o Tribunal Regional Federal também são
competentes para julgamento de reclamação constitucional quando sua competência
for usurpada ou para garantir a autoridade de suas decisões.
O posicionamento adotado pelo
Supremo Tribunal Federal, entretanto, se levado efetivamente a sério, poderá
desfigurar por completo o instituto da reclamação constitucional,
considerando-se as expressivas diferenças entre o exercício do direito de ação
e o de petição. Seriam dispensadas as formalidades do direito de ação, tais
como a necessidade de provocação de parte interessada por meio de petição
inicial, o pagamento de custas processuais, a capacidade postulatória, a coisa
julgada? O paradoxal é que a própria Corte Superior continua a exigir tais
requisitos, que, explicáveis à luz do exercício do direito de ação, perdem
qualquer justificativa diante do mero exercício do direito de petição. (Apud Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.619/1.620. Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed.
Juspodivm).
2. HIPÓTESES DE CABIMENTO
A Constituição Federal prevê
duas hipóteses de cabimento de reclamação constitucional: como forma de
preservação da competência dos tribunais superiores e de garantia da autoridade
de suas decisões. A Lei 11.417/2006, que disciplina a edição, a revisão e o
cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal,
prevê em seu art 7º, caput, uma
terceira hipótese de cabimento da reclamação constitucional: decisão judicial
ou ato administrativo que contrariar, negar vigência ou aplicar indevidamente
entendimento consagrado em súmula vinculante.
O CPC atual, além de repetir
essas três hipótese de cabimento (art 988, I, II e III), cria novas hipóteses
no inciso IV, ao prever o cabimento de reclamação constitucional para garantir
a observância de acórdão ou precedente proferido em julgamento de casos repetitivos
ou em incidente de assunção de competência. Também amplia o cabimento da
reclamação constitucional aos tribunais de segundo grau, porque o art 988, I e
II, do CPC se limita a indicar apenas tribunal, não exigindo tribunais de
superposição como ocorre no texto constitucional.
Deve-se notar que das hipóteses
de cabimento da reclamação constitucional sempre haverá ofensa a uma norma
legal, sendo possível se imaginar o cabimento de recurso contra tal violação. A
reclamação constitucional, entretanto, tem atrativos que os recursos não têm, e
por isso se torna um importante instrumento de impugnação. Independentemente da
competência para o julgamento da reclamação constitucional, um atrativo
indiscutível é a desnecessidade de decisão a ser impugnada, requisito
indispensável à interposição de recurso.
Na competência dos tribunais de
segundo grau, a reclamação constitucional pode ser utilizada com vantagem
quando a decisão a ser impugnada for interlocutória e não recorrível por agravo
de instrumento. Mas a grande vantagem da reclamação constitucional é a
desnecessidade de decisão a ser impugnada, requisito indispensável à
interposição de recurso.
Na competência dos tribunais de
segundo grau, a reclamação constitucional pode ser utilizada com vantagem
quando a decisão a ser impugnada for interlocutória e não recorrível por agravo
de instrumento. Mas a grande vantagem da reclamação constitucional é ocorrer a
chegada da matéria ao tribunal de superposição, exigindo-se das partes todo o
tortuoso caminho do esgotamento das vias ordinárias de impugnação, além da
existência de dificuldades procedimentais para fazer com que o mérito do
recurso extraordinário seja enfrentado. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.620/1.621. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
3. FORMA DE PRESERVAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO
TRIBUNAL
Nessa hipótese de cabimento, o
objetivo é evitar que órgãos jurisdicionais inferiores usurpem a competência
dos tribunais.
Com a mudança de competência
para o juiz de admissibilidade da apelação e dos recursos excepcionais, que à
luz do CPC serão feitos exclusivamente pelos tribunais competentes para o
julgamento do mérito recurso, nasce uma situação de potencial cabimento da
reclamação constitucional por usurpação de competência. Basta imaginar um juiz
de primeiro grau, diante de uma apelação manifestamente inadmissível, deixar de
recebe-la, impedindo sua remessa ao tribunal de segundo grau. Nesse caso, como
independentemente da natureza e/ou gravidade do vício formal, a competência
para analisar a admissibilidade da apelação é exclusiva do tribunal de segundo
grau, será indiscutível o cabimento da reclamação constitucional (Enunciado 208
do FPPC).
É interessante notar que a
reclamação constitucional nesse caso, nos termos do art 988, I do CPC, só se
presta a preservar a competência de tribunal, de forma que usurpada competência
do primeiro grau por tribunal não será cabível a reclamação constitucional.
Trata-se de cabimento comum em
processos penais em que, apesar da prerrogativa de foro da autoridade que
figura no processo como réu, a ação tramita em primeiro grau de competência
(STF, 1ª Turma, rel. 12.484/DF, rel. Min. Dias Toffoli, j. 29.04.2014, DJe
29.09.2014; STJ, Corte Especial, AgRg na Rcl 23.671/MT, rel. Min. Humberto
Martins, j. 06/05/2015, DJe 25/05/2015). Nesse tocante, é importante registrar
o entendimento consolidado pelos tribunais superiores de que não se aplica a
teoria das competências implícitas complementares na ação de improbidade
administrativa, sendo sempre no primeiro grau a competência para o julgamento
de tal espécie de ação coletiva (STF, Tribunal Pleno, Per 3.067 AgR/MG, rel.
Min. Roberto Barroso, j. 19/11/2014, DJe 19/02/2015; STJ, Corte Especial, AgRg
na Pet 9.669/RJ, rel. Min. Og Fernandes, j. 17/09/2014; DJe 16/10/2014), não
sendo, portanto, cabível, nesse caso, reclamação constitucional aos tribunais
por alegada usurpação de competência. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.621/1.622. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
4. FORMA DE GARANTIR A AUTORIDADE DA DECISÃO
DE TRIBUNAL
Nota-se, na praxe forense, que
essa hipótese de cabimento da reclamação constitucional é a mais utilizada por
partes inconformadas com decisões que contrariam entendimento sumulado ou
dominante dos tribunais superiores, sempre com a alegação de que tais decisões
afrontariam a autoridade de precedentes de tais tribunais. Os tribunais
superiores, entretanto, são suficientemente claros na interpretação dos arts
102, I, l, e I, f, da CF, ao determinares que a afronta deva ocorrer
especificamente com relação a decisão determinada, sendo insuficiente para o
cabimento da reclamação constitucional o mero desrespeito à jurisprudência
consolidada (STF, Tribunal Pleno, Rcl 6.135 Agr/SP, Tribunal Pleno, rel. Min.
Joaquim Barbosa, j. 24.08/2008, DJe 20/02/1009.
Registre-se que esse
entendimento não se aplica às hipóteses previstas pelo art 988, IV, do CPC, que
se referem aos precedentes vinculantes e que serão tratadas no devido momento.
Essa regra, entretanto, tem ao
menos uma exceção criada pela jurisprudência. Segundo o art 105, III, caput, da CF, o cabimento de recurso
especial está condicionado ao fato de a decisão impugnada ser proferida pelos
Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais Estaduais, do Distrito Federal
e Territórios, sendo irrelevante a decisão de ter sido proferida em grau
recursal (última instância) ou em ação de competência originária do Tribunal
(única instância).
Essa exigência impede a
interposição de recurso especial contra as decisões proferidas em julgamento de
recurso inominado nos Juizados Especiais, regidos pela Lei 9.099/1995. O órgão
de revisão de sentença nos Juizados Especiais é o Colégio Recursal, composto
por juízes de primeiro grau de jurisdição, não tendo natureza de tribunal. A
mesma irrecorribilidade atinge a decisão dos embargos infringentes previstos no
art 34, caput, da LEF Lei
6.830/1980). Sendo tal recurso julgado pelo próprio juízo sentenciante, ainda
que seja a decisão de última instancia no processo, não poderá ser recorrida
por recurso especial, por ter sido proferida em primeiro grau de jurisdição.
Apesar de pacificado o
entendimento no sentido exposto, cumpre ressaltar o desconforto dos tribunais
superiores com a ausência de controle na aplicação da lei federal em sede de
Juizados Especiais Estaduais. Pela estrutura criada pela Lei 9.099/1995, ainda
que flagrantemente contrária ao entendimento consagrado pelo Superior Tribunal
de Justiça, a última palavra a respeito da lei federal é dada pelo Colégio
Recursal. O mesmo fenômeno não se verifica cm sede de Juizados Especiais
Federais, ao menos no tocante ao direito material federal, considerando-se a
existência da uniformização de jurisprudência prevista pelo art 14 da Lei
10.259/2001, que permite a chegada ao Superior Tribunal de Justiça de decisão
contrária a entendimento consolidado pelo tribunal superior a respeito da
aplicação e/ou interpretação de lei federal (ainda que limitada ao direito
material), o mesmo ocorrendo nos Juizados Especiais da Fazendo Pública
Municipal e Estadual em razão dos arts 18 e 19 da Lei 12.153/2009. Nesses, o
caminho procedimental é a uniformização de jurisprudência, sendo incabível a
reclamação constitucional para o Superior Tribunal de Justiça (Informativo
559/STJ, 1ª Seção, Rcl 22.033-SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em
8/4/2015, DJe 16/04/2015.
O plenário do Supremo Tribunal
Federal, demonstrando expressamente desconforto com tal situação, entendeu que,
enquanto não existir mecanismo processual mais apropriado a permitir a atuação
do Superior Tribunal de Justiça nas ações dos Juizados Especiais Estaduais,
deve-se admitir a reclamação constitucional (Informativo 557/STF: Plenário, RE
571.572 QO-ED/BA, rel. Min. Ellen Gracie, j. 26/08/2009, DJe 27.1.2009), em
posição que veio a ser incorporada pelo Superior Tribunal de Justiça
(Informativo 416/STJ: Corte Especial, Rel. 3.752-GO, rel. Min. Nancy Andrighi,
j. 18/11/2009, DJe 25.08.2010).
Salvo a exceção apontada em
sede de Juizados Especiais e as hipóteses descritas no art 988, IV, do CPC, é
possível concluir-se que a reclamação constitucional estará condicionada a uma
determinada decisão judicial de tribunal que gere efeitos para as partes, quer
porque participaram do processo na qual a decisão foi preferida (STF, Rcl.
3.084/SP, Tribunal Pleno, rel. Min. Ricardo Levandowski, j. j. 29/04/2009, DJe
01/07/2009, STJ, AgRg na Rcl. 2.942/SP, Primeira Seção, rel. Min. Castro Meira,
j. 22/10/2008, DJe 03/11/2008), quer porque a decisão tem efeitos erga omnes (STF, Rcl. 3.138/CE, Tribunal
Pleno, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 04/03/2009, DJe 23/10/2009). Essa
constatação permite a divisão das demandas nas quais os efeitos se operem inter partes e aqueles nas quais os
efeitos operem erga omnes, sendo possível
incluir, na primeira espécie, as ações individuais e na segunda, as ações
coletivas, inclusive o processo objetivo, considerado processo coletivo
especial, que tem tratamento específico no art 988, III, do CPC.
Numa ação individual, cujas
decisões gerem efeitos somente para os sujeitos que participam do processo, é
possível que um juízo de grau inferior deixe de cumprir uma decisão proferida
pelo tribunal superior, típica hipótese de cabimento de reclamação
constitucional como forma de preservar a autoridade da decisão judicial, uma
vez sendo determinada, no caso concreto, por exemplo, a soltura de um réu
encarcerado em razão de indevida prisão civil, é natural que o juízo que
determinou a prisão deva executar a ordem contida na decisão do tribunal superior,
e, se isso não ocorrer, será cabível a reclamação constitucional.
O Superior Tribunal de Justiça
já teve oportunidade de julgar procedente reclamação constitucional em razão da
resistência de juízo de grau jurisdicional inferior cumprir decisão do tribunal
superior com a alegação de que a decisão ainda não era definitiva, em razão de
recurso pendente de julgamento. O tribunal entendeu que, não tendo o recurso
interposto contra sua decisão efeito suspensivo, não cabe ao juízo inferior se
negar a dar cumprimento imediato à decisão do tribunal, que, nessas
circunstancias, tem executividade imediata (STJ, 1ª Seção, Rcl 3.828/SC, rel.
Min. Eliana Calmon, j. 28-04-2010, DJe 07/05/2010). Também a decisão que volta
a declarar a incompetência do juízo, em afronta à decisão já proferida pelo
Superior Tribunal de Justiça em julgamento de conflito de competência, desafia
reclamação constitucional (STJ, 2ª Seção, Rcl. 1.859/MG, Rel. Min. Nancy
Andrighi, j. 22-06-2005, DJ 24/10/2005, p. 167).
Interessante questão levantada
pela doutrina diz respeito ao descumprimento por autoridade administrativa de
decisão de tribunal superior, proferida em ação individual. Seria cabível a
reclamação constitucional diante dessa situação? Concordo com a doutrina que
responde negativamente a esse questionamento, afirmando que descumprimento da
decisão por terceiro, sendo irrelevante se particular ou autoridade
administrativa, permite que a parte interessada na execução da decisão
peticione perante o juízo que deve executar a decisão para que as medidas
necessárias sejam adotadas e para que tal pronunciamento efetivamente gere seus
efeitos no plano prático. É, nesse sentido, o entendimento do Superior Tribunal
de Justiça (STJ, AgRg na Rcl. 2.918/MG, 1ª Seção, rel. Min. Denise Arruda, j.
08/10/2008, DJe 28/10/2008; STJ, REsp 863.055/GO, 1ª Seção rel. Min. Herman
Benjamin, j. 27/02/2008, DJe 18/09/2009), que deve ser prestigiado.
Na tutela coletiva, a eficácia
das decisões sempre atinge sujeitos que não participam do processo. No processo
coletivo comum, têm-se efeitos erga
omnes, na hipótese de direitos difusos, e ultra partes, na hipótese de direitos coletivos e individuais
homogêneos, a despeito da equivocada previsão contida no art 103 da Lei
8.078/1990 (CDC). Nesses casos, os indivíduos que tenham sido beneficiados pela
decisão proferida por tribunal superior poderão ingressar com reclamação
constitucional na hipótese de juízo hierarquicamente inferior desrespeita a
decisão. Naturalmente, também os autores da ação coletiva, bem como os
colegitimados, poderão ingressar com a reclamação constitucional, na hipótese
de a decisão desrespeitada ser proferida no próprio processo coletivo em
trâmite. (Apud
Daniel Amorim Assumpção Neves, p.
1.622/1.624. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
5. FORMA DE GARANTIR A
OBSERVÂNCIA DE DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM CONTROLE CONCENTRADO DE
CONSTITUCIONALIDADE
No tocante à eficácia erga omnes das decisões, têm posição de
destaque as ações de controle de constitucionalidade, espécies de processo
coletivo especial, tema versado expressamente pelo art 988, III, do CPC. Diante
de decisão proferida em ação direta de inconstitucionalidade, em ação
declaratória de inconstitucionalidade ou de arguição de descumprimento de
preceito fundamental, não podem os juízes, que enfrentarem a questão
constitucional de forma incidental, desconsiderar a decisão judicial do Supremo
Tribunal Federal, justamente porque o efeito erga omnes vincula a todos.
O mesmo se pode dizer da
autoridade administrativa, que também está adstrita à declaração concentrada de
constitucionalidade do Supremo Tribunal Federal, de forma que, praticado um ato
administrativo ou proferida uma decisão no âmbito de processo administrativo
que contrarie decisão preferida em ação de controle concentrado de
constitucionalidade, será cabível a reclamação constitucional.
Segundo reiteradas decisões do
Supremo Tribunal Federal, a vinculação entre o julgado-paradigma proferido na
ação de controle concentrado de constitucionalidade e aquele que impugna por
meio de reclamação constitucional deve ser perfeita (STF, Rcl. 6.735 AgR/SP,
Tribunal Pleno, rel. Min. Ellen Gracie, j. 18/08/2010, DJe 10/09/2010). Ainda
que não se discuta o acerto do entendimento, é recomendável afirmar que não é
somente a exata norma declarada (in)constitucional que pode ensejar reclamação
constitucional nos teros ora analisados, considerando a aplicação da tese da
transcendência dos motivos determinantes.
Não considero a previsão do
inciso III do art 988 do CPC propriamente uma novidade, porque essa hipótese
apenas específica, para o processo objetivo, aquela prevista no inciso II do
mesmo dispositivo legal e já existente no sistema processual. Tanto é assim que
o Supremo Tribunal Federal tem posicionamento pacificado a respeito do
cabimento da reclamação constitucional nesse caso, antes de previsão expressa
específica como agora consagrada no art 988, III, do CPC (STF, Tribunal Pleno,
RE 730.462/SP, rel. Min. Teori Zavascki, j. 28/05/2015, DJe 09/09/2015).
Interessante debate trava-se,
atualmente, quando ao cabimento de reclamação constitucional à luz da teoria
dos efeitos transcendentes dos motivos determinantes.
Durante certo período de tempo,
o Supremo Tribunal Federal entendeu que, havendo a declaração concentrada de
inconstitucionalidade, os motivos determinantes da decisão geravam efeitos
vinculantes erga omnes, o que
significa que outras normas, que não tinham sido objeto de apreciação no
processo objetivo, desde que tivessem o mesmo conteúdo daquela analisada,
sofreriam os efeitos do controle concentrado. Uma vez declarada
inconstitucional, uma norma municipal que determina a criação de um tributo, em
todos os processos em que se discutia incidentalmente a constitucionalidade de
uma norma de outro Município, que cria por lei municipal o mesmo tributo,
haveria vinculação dos juízes à decisão do Supremo Tribunal Federal. Não sendo
respeitada a decisão, caberia a reclamação constitucional (STF, Rcl. 2.986
MC/SE, decisão monocrática, Min. Celso de Mello, j. 11.03.2005, DJ 18.03.2005,
p. 87; Rcl 2.363/PA, Tribunal Pleno, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 23.10.2003,
DJe 01.04.2005).
Mais recentemente, entretanto,
o Supremo Tribunal Federal tornou-se refratário à adoção da teoria (STF,
Tribunal Pleno, Rcl 3.294 AgR/RN, rel. Min. Dias Toffoli, j. 03.11.2011, DJe
29.11.2011; STF, Tribunal Pleno, Rcl 9.778 AgR/RJ, rel. Min. Ricardo
Levandowski, j. 26.10.2011, DJe 11.11.2011; STF, Tribunal Pleno, Rcl 3.014/SP,
rel. in. Ayres Britto, j. 10-3-2010, DJe 21-5-2010), inclusive rejeitando
reclamações constitucionais que têm como objeto, lei municipal ainda não
declarada inconstitucional pelo tribunal em controle concentrado (STF, 1ª
Turma, Rcl 11.478 AgR/CE, rel. Min. Marco Aurélio, j. 05.06.2012, DJe 21.06.2012).
Aparentemente visando a
legislar sobre a polêmica, o art 988 do CPC, em seu § 4º prevê que as hipóteses
dos incisos III e IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua
não aplicação aos casos que a ela correspondam. Entendo que o atual CPC adotou
a teoria dos efeitos transcendentes dos motivos determinantes ao se referir à
“tese jurídica”, e não a norma jurídica decidida concretamente pelo Supremo
Tribunal Federal. (Apud
Daniel Amorim Assumpção Neves, p.
1.624/1.625. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
6. FORMA DE GARANTIR A OBSERVÂNCIA DE SÚMULA
VINCULANTE
A Lei 11.417/2006 disciplina a
edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo
Supremo Tribunal Federal, tratando em seu bojo de hipótese específica de
cabimento de reclamação constitucional. Nos termos do art 7º, caput, na hipótese de decisão judicial
ou ato administrativo contrariar, negar vigência ou aplicar indevidamente
entendimento consagrado em súmula vinculante, será cabível a reclamação
constitucional. Tal hipótese de cabimento é repetido pelo art 988, IV, do CPC.
O dispositivo legal prevê ainda
que o cabimento da reclamação constitucional não impede a utilização de outros
meios de impugnação contra a decisão, inclusive a via recursal, em regra
aplicável somente às decisões judiciais ou proferidas em processo
administrativo. Apesar da correção da regra legal, a suposta multiplicidade de
formas de impugnação da decisão deve ser interpretada à luz do enunciado da
Súmula 734/STF, que não admite o ingresso de reclamação constitucional depois
do trânsito em julgado da decisão que alegadamente desrespeita o pronunciamento
do Supremo Tribunal Federal. Significa que, ao menos em algumas hipóteses, não
será facultativa a escolha do recurso ou da reclamação, mas imperativo que a
parte ingresse com o primeiro para evitar o trânsito em julgado e permitir a
apresentação do segundo meio impugnativo.
A regra mais polêmica a
respeito do tema ora enfrentado encontra-se no art 7º, § 1º, da Lei 11.417/2006
e prevê que, sendo objeto da reclamação constitucional, a omissão ou ato da
administração pública, exige-se o esgotamento das vias administrativas para o
ingresso em juízo.
Há entendimento de que a norma,
ainda que pragmaticamente justificável diante do receio de aumento
significativo de reclamações constitucionais perante o Supremo Tribunal
Federal, é manifestamente inconstitucional, em afronta clara e indiscutível ao
princípio da inafastabilidade da jurisdição, consagrado no art 5, XXXV, da CF,
considerando-se que a única hipótese em que se admite a exigência do
esgotamento das vias administrativas para só então se permitir o exercício
jurisdicional é prevista pelo art 217, § 1º, da CF.
Por outro lado, há corrente
doutrinária que não enxerga qualquer inconstitucionalidade da norma, afirmando
ser abusiva a utilização da reclamação constitucional sem que as esferas
administrativas tenham sido esgotadas. O principal fundamento desse
entendimento é o de que não se pode substituir a crise numérica dos recursos
extraordinários por uma nova crise das reclamações constitucionais. Mais uma
vez, o receio de uma explosão no número de reclamações constitucionais leva
parcela da doutrina a aceitar obstáculo criado por norma infraconstitucional ao
acesso ao Poder Judiciário.
Por fim, há ainda uma terceira
corrente doutrinária, que entende cabível a exigência legal a depender do caso
concreto. Segundo esse entendimento somente quando se mostrar razoável o
esgotamento das vias administrativas de solução de conflito não se admitirá a
reclamação constitucional. Aparentemente, há uma indevida confusão entre
inafastabilidade da jurisdição e interesse de agir, defendendo essa corrente
doutrinária que, sendo provado, no caso concreto, o efetivo interesse de agir,
poderia o tribunal incidentalmente declarar a inconstitucionalidade do art 7º,
§ 1º, da Lei 11.417/2006 e julgar a reclamação constitucional.
Acredito haver uma indevida
confusão no debate sobre o tema. O dispositivo legal não impede o acesso da
parte à jurisdição, mas somente impede que tal acesso ocorra pelo meio
específico da reclamação constitucional. Não consigo compreender por qual
motivo a previsão pode ser ofensivo ao princípio da inafastabilidade da tutela
jurisdicional, afinal, se a limitação a certa forma procedimental de provocar a
jurisdição for inconstitucional, será complicado, por exemplo, explicar porque
não se admite produção de prova oral em sede de mandado de segurança, ou porque
a ação coletiva não se presta, ao menos em regra, para a defesa de interesses
individuais.
Entendo, portanto, que o acesso
à jurisdição está garantido, não pelo caminho mais fácil da reclamação
constitucional, mas por meio de qualquer ação impugnativa da decisão ou ato
administrativo, seguindo-se as regras processuais de competência para fixar o
órgão competente para o julgamento de tal ação. Caso a parte pretenda se valer
do caminho mais fácil e rápido, que é a reclamação constitucional, terá de
esperar o esgotamento das vias administrativas, conforme prevê o artigo ora
comentado, não sendo possível se apontar qualquer inconstitucionalidade em tal
regra legal.
Nessa hipótese de reclamação
constitucional, nos termos do art 7º, § 2º, da Lei 11.417/2006, as
consequências do acolhimento do pedido diferem, a depender da espécie de ato
impugnado. Sendo a decisão que afronta a súmula vinculante de natureza
judicial, o Supremo Tribunal Federal a cassará e determinará que outra seja
proferida em seu lugar, com ou sem a aplicação da súmula. Nesse caso, é questionável
a previsão legal a mencionar a cassação da decisão, considerando sua própria
previsão de que outra decisão venha a ser proferida no lugar daquela impugnada,
o que permite a conclusão de tal decisão ter sido anulada, e não simplesmente
cassada.
Já na reclamação constitucional
contra ato administrativo, o tribunal se limitará à anulação do ato,
considerando-se que a prática de novo ato no lugar daquele anulado cabe à
administração pública, não sendo possível ao Poder Judiciário exigir sua
prática. Parece que, nessa hipótese de procedência, o legislador considerou a
discricionariedade do administrador público a respeito da postura que adotará
após a anulação do ato. (Apud
Daniel Amorim Assumpção Neves, p.
1.625/1.627. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
7. FORMA DE GARANTIR A OBSERVÂNCIA DE PRECEDENTE PROFERIDO EM
INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) E INCIDENTE DE ASSUNÇÃO
DE COMPETÊNCIA.
Reforçando a tese de que os criados
em julgamento repetitivo – recurso extraordinário/especial repetitivos e IRDR =
e em julgamento de incidente de assunção de competência têm eficácia
vinculante, o art 988, IV do CPC prevê o cabimento de reclamação constitucional
para garantir a observância de tais precedentes.
Segundo o § 4º do art 988 do
CPC, a observância dos precedentes vinculantes previstos no inciso IV do mesmo
dispositivo legal compreende a aplicação indevida da tese jurídica e sua não
aplicação aos casos que a ela correspondam. Como o art 489, § 1º, V, do CPC
exige na fundamentação da decisão que o órgão julgador identifique os
fundamentos determinantes do precedente vinculante, justamente para demostrar
seu cabimento ou não ao caso concreto, será dessa fundamentação que a parte
terá condição de analisar o cabimento da reclamação constitucional contra a
decisão.
Questão interessante surge na
hipótese de o órgão julgador deixar de aplicar o precedente vinculante com
fundamento na distinção ou superação. Nesse caso, será cabível a reclamação
constitucional? Não há dúvida de que a distinção ou superação da tese fixada no
precedente vinculante, desde que fundamentada nos termos do art 489, § 1º, VI,
do CPC, são razões legais para o órgão julgador deixar de aplicar ao caso
concreto tal precedente, mas o art 988, IV, do CPC, não faz qualquer menção a
tais circunstâncias.
Uma primeira forma de responder
à pergunta é interpretar o art 988, IV, do CPC no sentido de que, havendo a
distinção ou superação, a parte não teria direito a garantir a observância do precedente,
não sendo, dessa forma, cabível a reclamação constitucional a adequação da
distinção ou superação aplicada no caso concreto para o órgão deixar de aplicar
o precedente com eficácia vinculante.
Significa dizer que o tribunal
terá que confirmar o acerto da distinção ou superação aplicada no caso
concreto, e o eventual equívoco em tal aplicação não deve levar à inadmissão da
reclamação constitucional, mas sim a julgamento de improcedência. Trata-se,
entretanto, de questão com pouca consequência prática, porque se o tribunal
entender, nesse caso, pela inadmissão da reclamação constitucional,
extingui-la-á sem resolução do mérito. De uma forma ou outra, o autor da
reclamação constitucional terá rejeitada sua pretensão. (Apud Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.627/1.628. Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed.
Juspodivm).
8.
FORMA DE GARANTIR A OBSERVÂNCIA DE PRECEDENTE PROFERIDO EM
REPERCUSSÃO GERAL E RECURSO EXCEPCIONAL REPETITIVO
Constava da redação originária
do art 988, IV, do CPC, o cabimento de reclamação constitucional para garantir
a observância de precedente proferido em julgamento de recursos repetitivos,
mas esse cabimento foi suprimido do dispositivo legal pela Lei 13.256, de
04.02.2016, que alterou o Código de Processo Civil durante seu período de
vacância.
Numa primeira leitura dos
incisos do art 988 do CPC, portanto, não consta mais o cabimento de reclamação
constitucional na hipótese ora analisada. Demonstrando uma técnica legislativa
no mínimo duvidosa, entretanto, o § 5º, II, do art 988 do CPC garante o
cabimento de reclamação constitucional nesse caso, ainda que sob a condição de
serem esgotadas as instâncias ordinárias. Se o objetivo do legislador era criar
uma condição de admissibilidade da reclamação constitucional nesse caso,
deveria ter mantido a hipótese no inciso IV do art 988 e previsto tal condição
no § 5º do mesmo dispositivo. Estranhamente, entretanto, retirou a hipótese do
inciso IV, mas a ressuscitou no § 5º do art 988 deste CPC.
Por “esgotamento das instâncias
ordinárias”, o legislador aparentemente pretendeu afastar o cabimento de
reclamação constitucional contra sentença que desrespeita precedente fixado em
julgamento de recurso especial e extraordinário repetitivo.
Um dado curioso, que demonstra
que as revisões finais de textos legais após sua aprovação não se limitam a
aprimorá-los em termos redacionais, chegando à inconstitucional alteração de
seu conteúdo: no texto aprovado pelo Senado Federal do Projeto de Lei 168/2015,
não havia no dispositivo legal previsão expressa a respeito do recurso
extraordinário repetitivo no art 988, § 5º, II, do CPC, que s limitava a prever
a repercussão geral e o recurso especial repetitivo. É lamentável que o
legislador confunda repercussão geral com recurso extraordinário repetitivo,
desconsiderando a óbvia possibilidade de um recurso extraordinário não ser
repetitivo, mas ter repercussão geral. Certamente pensando na bobagem aprovada
na Câmara e no Senado, na revisão “redacional” final do texto foi incluído o
recurso extraordinário repetitivo.
Dessa forma, se um acórdão
desrespeitar o precedente criado em julgamento de recurso especial e
extraordinário repetitivo, e em julgamento de recurso extraordinário com
repercussão geral, ainda que não repetitivo, caberá reclamação constitucional
para o tribunal de superposição. Mas no caso de sentença proferida em tais
moldes, caberá a apelação. O mesmo se diga no caso de decisão monocrática
proferida em segundo grau, que sendo recorrível por agravo interno (art 1.021, caput, deste CPC), não poderá ser objeto
de reclamação constitucional. (Apud
Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.628.
Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
9. LEGITIMIDADE ATIVA
Conforme já afirmado
anteriormente, ainda que o Supremo Tribunal Federal entenda que a reclamação
constitucional tem natureza de direito de petição, parece ser indiscutível a
necessidade de provocação por meio da parte interessada ou pelo Ministério
Público, nos termos do caput do art
988, deste CPC.
Na realidade, as próprias
hipóteses de cabimento são suficientes para demonstrar a incongruência prática
de o juízo que conduz o processo instaurar de ofício a reclamação
constitucional. Ocorre, entretanto, que a eventual iniciativa de ofício no
tocante à reclamação constitucional não precisa ficar limitada ao juízo da
causa, podendo-se imaginar que o próprio tribunal, diante de hipótese de
cabimento da reclamação constitucional, poderia determinar a avocação dos autos
ou medidas para fazer valer sua decisão, por meio de propositura de ofício de
uma reclamação constitucional. A previsão contida no art 988, caput, do CPC afasta expressamente essa
possibilidade.
É preciso cuidado ao conceituar
o interesse necessário à parte na legitimidade ativa da reclamação
constitucional. Não é possível limitar a legitimidade às partes do processo
originário, até porque é cabível a reclamação constitucional independentemente
da existência de processo. Ademais, mesmo quando existe um processo em trâmite,
não se pode descartar a priori a
existência de terceiros juridicamente interessados, que também terão
legitimidade para a propositura da reclamação constitucional, o que fica claro
no processo coletivo (comum e especial).
Entendo que o interesse deve
ser demonstrado, no caso concreto, pelo autor da reclamação constitucional, por
meio da comprovação de possível repercussão do processo em trâmite ou do ato
administrativo praticado em sua esfera jurídica. Ainda que não precise
demonstrar qualquer sucumbência no caso concreto (como ocorre na hipótese de
usurpação de competência), sendo incorreto associar o interesse da parte a uma
eventual melhora em sua situação prática, deve demonstrar que a ilegalidade
cometida pode juridicamente atingi-lo.
O Ministério Público não deve
se omitir diante de verificação de cabimento da reclamação constitucional. Sua legitimidade,
portanto, decorre de sua função institucional de fiscal da ordem jurídica, de
forma que não há necessidade de que participe do processo em que a ilegalidade
é cometida para oferecer a reclamação constitucional. Há um interesse público
no respeito à competência, à autoridade das decisões e de precedentes
vinculantes dos tribunais e, sendo a reclamação constitucional uma das formas
de se garantir esse respeito, é natural a legitimidade do Ministério Público à
luz do art 178, I, deste CPC. (Apud
Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.629.
Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
10. INSTRUÇÃO DA PETIÇÃO INICIAL
Toda prova a ser produzida pelo
autor já deve ser apresentada com a própria petição inicial, nos termos do art
988, § 2º, do CPC. Ainda que o procedimento seja sumário e documental, não
parece haver uma preclusão à produção de prova documental pelo autor com a
apresentação da petição inicial, desde que demonstre motivadamente, as razões
da juntada extemporânea.
O Superior Tribunal de Justiça,
entretanto, entende que a ausência de documentos indispensáveis à propositura
da reclamação constitucional é causa de indeferimento liminar (STJ, 1ª Seção,
EDcl na Rcl 9.537/RS, rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 23.10.2013, DJe
29/10/2013), não se admitindo a juntada da documentação em sede de agravo
interno proposto contra a decisão monocrática do relator de indeferimento da
petição inicial (STJ, 3ª Seção, AgRg na Rcl 18.385/SP, rel. Min. Regina Helena
Costa, j. 27/08/2014, DJe 04/09/2014). (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.629/1.630. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
11. DISTRIBUIÇÃO
Nos termos do art 988, § 3º, do
CPC, o relator será, sempre que possível, o juiz da causa principal, ou seja, o
relator do recurso ou ação originária da qual resultou a decisão que restou
descumprida por órgão hierarquicamente inferior. Trata-se, segundo parcela da
doutrina, de espécie de prevenção temática, que naturalmente não existirá na
hipótese de usurpação de competência, quando a distribuição deve ser livro. (Apud Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.630. Novo Código de
Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
12. DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO
Tratando-se de ação judicial,
não há prazo processual para o ingresso da reclamação constitucional. Ocorre,
entretanto, que o Supremo Tribunal Federal pacificou entendimento, inclusive em
súmula, de que não cabe reclamação constitucional contra decisão transitada em
julgado, não se admitindo que a reclamação assuma natureza rescisória (Súmula
734/STF: “Não cabe reclamação constitucional quando já houver transitado em
julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo
Tribunal Federal). Nesse sentido, é a previsão expressa do art 988, § 5º, I, do
CPC. Compreende-se o entendimento em respeito à coisa julgada material, porque,
caso se admitisse o cabimento da reclamação constitucional nessas
circunstâncias, abrir-se-ia perigoso instrumento de relativização da coisa
julgada. (Apud
Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 1.630.
Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo –
2016. Ed. Juspodivm).
13. AUTONOMIA
ENTRE DIREITO RECURSAL E DIREITO À RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL
Questão interessante diz
respeito à reclamação constitucional apresentada contra decisão judicial que
não seja atacada por recurso, ou porque não existe recurso cabível ou porque a
parte que poderia se valer do caminho recursal não o fez. Pergunta-se, nesse
caso, haveria trânsito em julgado em razão da não interposição do recurso? O
eventual trânsito em julgado prejudica a reclamação constitucional pendente de
julgamento?
Apesar de existir doutrina que
defende a existência de trânsito em julgado nesse caso, ainda que não sendo
prejudicada a reclamação constitucional, inclusive em opinião referendada em
decisão do Supremo Tribunal Federal, prefiro acreditar que a pendencia da
reclamação constitucional impede o trânsito em julgado, razão pela qual a não
interposição de recurso contra a decisão não gera a consequência natural de
tornar a decisão imutável e indiscutível e, por isso, não prejudica o andamento
da reclamação constitucional.
Já tive a oportunidade de
demonstrar que nem sempre a ausência de recurso gera o trânsito em julgada da
decisão, ainda que se reconheça que o efeito principal de qualquer recurso seja
justamente o obstativo. Como ocorre no reexame necessário, é possível a
existência de uma condição impeditiva do trânsito em julgado, que somente se
verificará após a realização de determinado ato processual. Entendo que a
pendência da reclamação constitucional seja justamente uma condição impeditiva
do trânsito em julgado, de forma que a ausência de interposição de recurso
contra decisão não torna prejudicada a reclamação, como também a manutenção ou
cassação da decisão não impugnada depende do teor do julgamento de tal
reclamação.
De qualquer forma,
entendendo-se que houve ou não o trânsito em julgado da decisão após o ingresso
da reclamação constitucional, o importante é que todos concordam que a
reclamação não restará prejudicada, sendo julgada normalmente. Significa dizer
que basta à parte interessada ou ao Ministério Público ingressar com a
reclamação constitucional, antes do trânsito em julgado da decisão, sendo
irrelevantes os atos processuais praticados posteriormente no processo. É nesse
sentido do § 6º do art 988 do CPC ao prever que a inadmissibilidade ou o
julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão
reclamado não prejudica a reclamação.
A objeção consagrada à
utilização da reclamação constitucional como meio rescisório traz interessante
consequência no tocante ao prazo para seu ajuizamento. Ainda que não seja
correto falar-se em prazo para o ajuizamento da reclamação constitucional, a
depender do caso concreto, criar-se-á um prazo, justamente para que a ação seja
apresentada em juízo antes do trânsito em julgado da decisão. Enquanto existir
recurso pendente de julgamento contra a decisão impugnada em sede de reclamação
constitucional no prazo recursal, sob pena de perder o direito à reclamação,
nos termos do art 988, § 5º, I, deste CPC. (Apud Daniel
Amorim Assumpção Neves, p. 1.630/1.631. Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).
Este CAPÍTULO IX "DA RECLAMAÇÃO" continua
nos artigos 989 a 993, que vêm a seguir.
Nenhum comentário:
Postar um comentário