DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 104, 105,
106
Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.
Livro
III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio
Jurídico – Capítulo I – Disposições Gerais
- vargasdigitador.blogspot.com
Art. 104. A
validade do negócio jurídico requer: 1, 2, 3, 4, 5
I – agente capaz;
II – objeto lícito,
possível, determinado ou determinável;
III – forma prescrita ou
não defesa em lei.
1.
Fatos jurídicos
São fatos jurídicos os acontecimentos naturais que tenham a aptidão de
criar, modificar ou extinguir direitos. Diversos outros fatos podem não ter
consequência alguma para o direito, razão pela qual não se amolgam à definição
de fatos jurídicos. Uma chuva que caia no meio do oceano, ou o vento que ocorra
em um campo, podem ser absolutamente irrelevantes para o direito. Em tais
casos, esses acontecimentos são considerados fatos juridicamente irrelevantes. Esses mesmos fatos, porém, podem
trazer consequências jurídicas, tornando-se juridicamente relevantes. Basta
imaginar se a chuva que cai no meio do oceano vem a afundar uma embarcação,
extinguindo o direito de propriedade que uma pessoa tinha sobre ela, fazendo
surgir o direito ao recebimento da respectiva indenização securitária,
resolvendo um contrato de transporte etc. Em tal caso, esse mesmo acontecimento
produz consequências jurídicas, tornando-se relevante para o direito.
2.
Atos jurídicos
São atos jurídicos os acontecimentos causados pela ação humana, com a
aptidão de criar, modificar ou extinguir direitos. Em síntese, pode-se apontar
que a distinção entre os fatos jurídicos e os atos jurídicos reside justamente no
concurso da vontade humana. Se determinado acontecimento juridicamente
relevante ocorre sem influência da vontade humana (chuva, por exemplo),
caracterizar-se-á um fato jurídico. Por outro lado, se
determinado acontecimento juridicamente relevante ocorre por força da vontade
humana (plantação em um campo, pintura de um quadro, construção de uma casa),
ter-se-á um ato jurídico. Os atos jurídicos comportam ainda classificação
quanto à sua licitude, podendo ser divididos em atos jurídicos lícitos e atos
jurídicos ilícitos.
3.
Negócios jurídicos
São negócios jurídicos os atos de vontade humanos dirigidos à realização
de determinado efeito ou consequência jurídica. Ao praticar um negócio
jurídico, o sujeito age com a finalidade de produzir efeitos em sua esfera de
direitos. Ao fazer uma oferta de compra de determinado imóvel, o sujeito tem em
vista justamente a celebração desse contrato de compra e venda. Neste caso,
portanto, o ato jurídico é praticado pelo sujeito visando à realização de um
efeito jurídico previamente imaginado e querido. Por força de tal definição,
pode-se observar que os negócios jurídicos são uma espécie de ato jurídico. Por
essa razão, a doutrina costuma classificar os atos jurídicos em atos jurídicos em sentido estrito e em negócios jurídicos. Enquanto que nos
negócios jurídicos o sujeito pratica o ato querendo a produção de determinados
efeitos jurídicos, os atos jurídicos em sentido estrito são praticados pelo
sujeito com indiferença quanto às suas consequências jurídicas. Diversas são as
classificações da doutrina acerca dos negócios jurídicos. Os negócios jurídicos
podem ser (a) unilaterais, bilaterais ou plurilaterais; (b) onerosos ou
gratuitos; (c) comutativos ou aleatórios; d) inter vivos ou causa mortis; (e)
solenes e não-solenes; (f) principais ou acessórios.
4.
Elementos de existência, requisitos de validade e fatores de eficácia do
negócio jurídico
Tradicionalmente, a doutrina civilista costuma analisar o negócio
jurídico em três diferentes planos: o plano da existência, o plano da validade
e o plano da eficácia. Para bem compreender o negócio jurídico, portanto, é
necessário analisar primeiramente se o negócio jurídico reúne todos os
elementos necessários à sua existência. Existindo, deve-se então perquirir se
todos esses elementos contêm os predicados necessários à sua validade. Por fim,
mesmo existindo e sendo válido, é necessário verificar a presença de eventuais
fatores de eficácia, cuja presença ou ausência eventualmente podem impedir o
negócio jurídico de produzir seus regulares efeitos. Tornou-se clássica a
categorização dos elementos do negócio jurídico de Antonio Junqueira de
Azevedo: “a) elementos gerais, isto é,
comuns a todos os negócios; b) elementos categoriais, i.é, próprios de cada
tipo de negócio; c) elementos particulares, i.é, aqueles que existem em um
negócio determinado, sem serem comuns a todos os negócios ou a certos tipos de
negócios”. (1) Por sua vez, os requisitos de validade são as
exigências que o legislador requer para que esses elementos sejam admitidos
pelo direito para a validade do negócio. Assim, por exemplo, o agente é um
elemento essencial do negócio jurídico. E sua ausência fatalmente levará à
inexistência do negócio jurídico. Por sua vez, exige o legislador que esse
agente seja capaz. Sem esse predicado exigido por lei para a validade do
negócio jurídico, ele e4xistirá, mas não será válido. Por fim, os fatores de
eficácia são todas as circunstâncias que podem influenciar a eficácia de um
negócio jurídico. Como regra geral, todo negócio jurídico existente e válido
produz efeitos. Contudo, pode ocorrer de existirem circunstâncias que impeçam
ou posterguem a eficácia dos negócios jurídicos, como é o caso da condição
suspensiva (CC, art 125).
5.
Os requisitos de validade do negócio jurídico: agente capaz, objeto lícito, possível,
determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei
Costuma-se apontar que os
elementos essenciais a todo e qualquer tipo de negócio jurídico são a forma, o
objeto, as circunstâncias negociais (assim entendida como as circunstâncias que
fazem com que uma manifestação de vontade seja socialmente vista como dirigida
à produção de efeitos jurídicos), o agente, o tempo e o lugar. No que se refere
ao tempo, ao lugar e às circunstâncias negociais do negócio jurídico, o
legislador não exigiu nenhum requisito de validade geral. Salvo para
disciplinar alguns negócios jurídicos específicos, os negócios podem ser
realizados em qualquer tempo e lugar e sob quaisquer circunstâncias, sem que
isso comprometa sua validade. Por outro lado, quanto aos demais elementos
essenciais do negócio jurídico, diz o art 104 do Código Civil que “a validade do negócio jurídico requer: I –
agente capaz; II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III –
forma prescrita ou não defesa em lei”. Sendo o negócio jurídico, antes de
tudo, um ato de vontade praticado pelo agente, exige o legislador que esse
agente tenha capacidade jurídica para expressar sua vontade. Para a validade do
negócio jurídico, portanto, é necessário que o agente seja capaz. Sendo
absolutamente incapaz, o negócio jurídico será nulo (CC, art 166, I). Sendo
apenas relativamente incapaz, o negócio jurídico será anulável (CC, 171, I),
Além disso, todo negócio jurídico tem necessariamente um objeto. Esse objeto,
por sua vez, será exatamente o que as partes almejam conseguir com a realização
do negócio jurídico. A doutrina costuma classificar o objeto do negócio
jurídico em objeto imediato 9ª ação humana) e objeto mediato (a coisa a que a
ação humana se refere). Assim, por exemplo, um contrato de compra e venda de um
imóvel. A prestação de dar será o objeto imediato do negócio e o imóvel seu
objeto imediato. Para que o negócio jurídico seja válido, é necessário que seu
objeto lícito, possível, determinado ou determinável. A licitude refere ao
objeto imediato. É a ação humana que pode ser lícita ou ilícita. Uma substância
entorpecente ou uma arma, por exemplo, não são ilícitas em si mesmo. É a ação
humana de vender substâncias entorpecentes ou armas à população é ilícita. Por
outro lado, a compra e venda de armas para equipar a polícia é plenamente
lícita. A possibilidade e a determinação do objeto, por sua vez, dizem respeito
à própria coisa. Sendo fisicamente impossível, por exemplo, atravessar o oceano
correndo, um negócio jurídico com esse objeto será nulo. A impossibilidade pode
ainda ser jurídica e não física, como é a disposição da herança de pessoa viva.
Além disso, o objeto deve ser determinado ou, ao menos determinável. Ou seja, é
necessário que seja precisamente identificado ou ao menos identificável
mediante a prévia estipulação de seu gênero e quantidade, por exemplo. A forma
do negócio jurídico é o meio pelo qual o agente manifesta sua vontade. Não
basta ao agente simplesmente querer a realização de determinado negócio
jurídico. Para que esse negócio exista, é necessário que o agente exteriorize
essa vontade a qual, manifestada em meio às circunstâncias negociais
específicas, será socialmente vista como dirigida à produção de determinados
efeitos. Como regra geral, vige no direito brasileiro o princípio da liberdade
das formas, a qual reputa válida todos os meios de exteriorização da vontade.
Em alguns casos, porém, a lei exige determinada forma específica para a
validade do ato. Em tais hipóteses, a inobservância dessa forma levará a
nulidade do negócio (CC, art 166, IV). (Direito
Civil Comentado apud Luís Paulo
Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 02.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).
(1)
Antônio Junqueira de
Azevedo, Negócio Jurídico, Existência, Validade
e Eficácia. São Paulo, Saraiva, 2002, p. 32.
Art. 105. A
incapacidade relativa de uma das partes não pode ser invocada pela outra em
benefício próprio, nem aproveita aos co-interessados capazes, salvo se, neste
caso, for indivisível o objeto do direito ou da obrigação comum. 1,
2
1.
Incapacidade relativa como exceção pessoal
Como precisamente qualificado por Maria Helena Diniz, a incapacidade
relativa é uma exceção pessoal. Ou seja, apenas pode ser alegada por quem a
aproveita. Nada mais natural, afinal de contas, sendo um instituto voltado à
proteção da pessoa natural que não tenha ainda o necessário discernimento para
a prática de determinados atos da vida civil, seria uma subversão à finalidade
desse instituto permitir que outras pessoas a invocassem em prejuízo do próprio
relativamente incapaz. Assim, por exemplo, não pode a pessoa que se obrigou a
determinada prestação em fazer de uma pessoa com dezessete anos invocar essa
sua condição para se livrar dessa respectiva prestação.
2.
Incapacidade relativa ante a indivisibilidade do objeto
A individualidade do objeto
invariavelmente impõe que se adote a mesma solução jurídica, ainda que
existentes diferentes interessados em seu objeto. Sendo esse o caso, os
co-interessados capazes poderão invocar a incapacidade relativa em favor do
incapaz e de si mesmos. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina.
Material coletado no site Direito.com
em 02.01.2019, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações (VD)).
Art. 106. A
impossibilidade inicial do objeto não invalida o negócio jurídico se for
relativa, ou se cessar antes de realizada a condição a que ele estiver
subordinado. 1, 2
1.
Impossibilidade relativa do objeto
Impossibilidade
relativa do objeto do negócio jurídico é aquela que não se mostra possível de
ser cumprida pela pessoa do devedor, mas que pode ser cumprida por outra
pessoa. É o que ocorre, por exemplo, com um contrato por meio da qual o dono de
um imóvel celebra um contrato com uma pessoa para futuramente reformá-lo,
enquanto essa pessoa está em processo de recuperação de uma moléstia que a
impede de trabalhar. Nesse exemplo, o contratado encontra-se impossibilitado de
cumprir o objeto do contrato. Contudo, outras pessoas podem fazê-lo, razão pela
qual o negócio é válido. Se a impossibilidade relativa do objeto do negócio
jurídico for posterior à sua celebração sem culpa das partes, o negócio se
resolve liberando as partes de suas obrigações. (Direito Civil Comentado apud
Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 02.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).
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