segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 172, 173, 174 - Da Anulabilidade do Negócio Jurídico, VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 172, 173, 174 -
Da Anulabilidade do Negócio Jurídico,
VARGAS, Paulo S. R.
 
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo V –
Da Invalidade do Negócio Jurídico
 - vargasdigitador.blogspot.com

Art 172. O negócio anulável pode ser confirmado pelas partes, salvo direito de terceiro. 1, 2

Da anulabilidade

Quando a ofensa atinge o interesse particular de pessoas que o legislador pretendeu proteger, sem estar em jogo interesses sociais, faculta-se a estas, se o desejarem, promover a anulação do ato. Trata-se de negócio anulável, que será considerado válido se o interessado se conformar com os seus efeitos e não o atacar, nos prazos legais, ou o confirmar.

Anulabilidade visa, pois, à proteção do consentimento ou refere-se à incapacidade do agente. Segundo Francisco Amaral, sua razão de ser “está na proteção que o direito dispensa aos interesses particulares. Depende da manifestação judicial. Diversamente do negócio jurídico nulo, o anulável produz efeitos até ser anulado em ação, para a qual são legitimados os interessados no ato, i.é, as pessoas prejudicadas e em favor de quem o ato se deve tornar ineficaz. (Direito civil, cit., p. 519, apud, Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, 2010 – p. 475 - pdf – parte geral).

A anulabilidade, por não concernir a questão de interesse geral, de ordem pública, como a nulidade, é prescritível e admite confirmação, como forma de sanar o defeito que a macula. A confirmação não poderá, entretanto, ser efetivada se prejudicar terceiro (CC, art 172). Seria a hipótese, por exemplo, da venda de imóvel feita por relativamente incapaz, sem estar assistido, e que o vendeu também a terceiro, assim que completou a maioridade. Neste caso, não poderá confirmar a primeira alienação, para não prejudicar os direitos do segundo adquirente.

1.        Confirmação do negócio jurídico anulável

Uma vez que a anulabilidade volta-se à proteção única e exclusiva da pessoa prejudicada pelo defeito do negócio jurídico, cuja essencialidade tem por objeto um conteúdo disponível, nada obsta que essa pessoa possa renunciar ao seu direito de buscar a anulação do negócio jurídico, conferindo-lhe plena validade ao confirma-lo. Negar-lhe essa possibilidade afrontaria o próprio caráter individual e disponível da anulabilidade. Por meio da confirmação, não se forma um novo negócio jurídico, mas apenas aperfeiçoa-se um negócio defeituoso que já existia. Acertadamente a doutrina qualifica a confirmação do negócio jurídico como um negócio jurídico autônomo e unilateral. É negócio jurídico autônomo já que a pessoa emite uma declaração de vontade voltada a produção de um específico e determinado efeito jurídico (a confirmação do negócio jurídico preexistente). E é unilateral já que a produção desses efeitos independente de qualquer aquiescência da outra parte do negócio. Para a confirmação do negócio jurídico é necessário que a pessoa tenha validamente condições jurídicas de praticar o negócio de convalidação. Como é até mesmo intuitivo, não pode o relativamente incapaz convalidar o negócio jurídico anulável justamente em função dessa condição de relativamente incapaz. Tal convalidação apenas será válida se emitida após atingir a maioridade. Além disso, é necessário ainda que o negócio de confirmação tenha a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo (CC, art 173), admitindo-se, contudo, sua confirmação tácita caracterizada quando o negócio já tenha sido cumprido em parte pelo devedor, ciente do vício que o inquinava (CC, art 174).

2.        Efeitos da confirmação do negócio jurídico

Uma vez validamente confirmado o negócio jurídico anulável, extinguem-se todas as ações fundadas nessa causa de anulação (CC, art 175). O negócio jurídico torna-se perfeito como se o defeito jamais tivesse existido. A lei expressamente põe a salvo, contudo, eventuais direitos de terceiros que possam ser prejudicados por sua confirmação. Basta imaginar um imóvel alienado por um relativamente incapaz que, após atingir a maioridade o aliena novamente prometendo a esse terceiro que irá buscar anulação da primeira venda. Em tal caso, eventual confirmação da primeira venda não poderá prejudicar os direitos desse terceiro que adquiriu o imóvel. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 27.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art 173. O ato de confirmação deve conter a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo .1

Diferenças entre nulidade e anulabilidade

A primeira (a) é decretada no interesse privado da pessoa prejudicada. Nela não se vislumbra o interesse público, mas a mera conveniência das partes. A segunda é de ordem pública e decretada no interesse da própria coletividade. (b) A anulabilidade pode ser suprida pelo juiz, a requerimento das partes (CC, art 168), parágrafo único, a contrario sensu), ou sanada, expressa ou tacitamente, pela confirmação (art 172). Quando da anulabilidade do ato resultar da falta de autorização de terceiros, será validado se este a der posteriormente (art 176). A nulidade não pode ser sanada pela confirmação, nem suprida pelo juiz. O Código civil atual, para atender à melhor técnica, substituiu “ratificação” por “confirmação”.

A confirmação pode ser expressa ou tácita e retroage à data do ato. Expressa quando há uma de declaração de vontade que contenha a substância do negócio celebrado, sendo necessário que a vontade de mantê-lo seja explícita (art 173), devendo observar a mesma forma do ato praticado. Tácita quando a obrigação já foi cumprida em parte pelo devedor, ciente do vício que a inquinava (art 174), ou quando deixa consumar-se a decadência de seu direito. Expressa ou tácita, importa a extinção de todas as ações, ou exceções de que dispusesse o devedor contra o negócio anulável (art 175).

A confirmação não poderá, entretanto, ser efetivada se prejudicar terceiro (CC, art 172). Seria hipótese, por exemplo, da venda de imóvel feita por relativamente incapaz, sem estar assistido, e que o vendeu também a terceiro, assim que completou a maioridade. Neste caso, não poderá confirmar a primeira alienação, para não prejudicar os direitos do segundo adquirente. (c) a Anulabilidade não pode ser pronunciada de ofício. Depende de provocação dos interessados (CC, art 177) e não opera antes de julgada por sentença. O efeito de seu reconhecimento é, portanto, ex nunc. A nulidade, ao contrário, deve ser pronunciada de ofício pelo juiz (CC, art 168, parágrafo único) e seu efeito é ex tunc, pois retroage à data do negócio, para lhe negar efeitos. A manifestação judicial neste caso é, então, de natureza meramente declaratória.

Na anulabilidade, a sentença é de natureza desconstitutiva, pois o negócio anulável vai produzindo efeitos, até ser pronunciada a sua invalidade. A anulabilidade, assim deve ser pleiteada em ação judicial. A nulidade quase sempre opera de pleno direito e deve ser pronunciada de ofício pelo juiz, quando conhecer do negócio jurídico ou dos seus efeitos e a encontrar provada (art 168, parágrafo único). Somente se justifica a propositura de ação para esse fim quando houver controvérsia sobre os fatos constitutivos da nulidade (dúvida sobre a existência da própria nulidade). Se tal não ocorre, ou seja, se ela consta do instrumento, ou se há prova literal, o juiz a pronuncia de ofício. (d) A anulabilidade só pode ser alegada pelos interessados, isto é, pelos prejudicados (o relativamente incapaz e o que manifestou vontade viciada), sendo que os seus efeitos aproveitam apenas aos que a alegaram, salvo o caso de solidariedade, ou indivisibilidade (CC, art 177). A nulidade pode ser alegada por qualquer interessado, em nome próprio, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir, em nome da sociedade que representa (CC, art 168), caput).

O menor, entre 16 e 18 anos, não pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, espontaneamente declarou-se maior (CC, art 180), perdendo, por isso, a proteção da lei. (e) Ocorre a decadência da anulabilidade em prazos mais ou menos curtos. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois anos, a contar da data da conclusão do ato (CC, art 179). Negócio nulo não se valida com o decurso do tempo, nem é suscetível de confirmação (CC, art 169). Mas a alegação do direito pode esbarrar na usucapião consumada em favor do terceiro. (f) O negócio anulável produz efeitos até o momento em que é decretada a sua invalidade. O efeito dessa decretação é, pois, ex nunc (natureza desconstitutiva). O ato nulo não produz nenhum efeito (quod nullum est nullum producit effectum). O pronunciamento judicial de nulidade produz efeitos ex tunc, i.é, desde o momento da emissão da vontade (natureza declaratória).

Deve-se ponderar, porém, que a afirmação de que o ato nulo não produz nenhum efeito não tem um sentido absoluto e significa, na verdade, que é destituído dos efeitos que normalmente lhe pertencem. Isto porque, algumas vezes, determinadas consequências emanam do ato nulo, como ocorre no casamento putativo. Outras vezes, a venda nula não acarreta a transferência do domínio, mas vale como causa justificativa da posse de boa-fé. No direito processual, a citação nula por incompetência do juiz interrompe a prescrição e constitui o devedor em mora (CPC/1973, art 219, com correspondência no CPC/2015, art 240).

Durante a vigência do Código Civil de 1916 divergiam os doutrinadores no tocante à prescrição dos negócios nulos, em virtude da inexistência de regra expressa a respeito. Enquanto alguns defendiam a imprescritibilidade, outros entendiam que a prescrição se consuma no prazo máximo previsto no art 177 do aludido diploma, que era de vinte anos.

O Código Civil de 2002, todavia, declara expressamente a imprescritibilidade do negócio jurídico nulo no art 169, com o seguinte teor: “O negócio jurídico nulo não é  suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo”. Portanto, afastadas as dúvidas, não cabe mais nenhuma discussão a respeito desse assunto. Mas, como oportunamente ressalvado a alegação do direito pode esbarrar na usucapião consumada em favor do terceiro. (Direito Civil Comentado – A Parte Geral, Roberto Gonçalves, v. I, p. 476-478, 2010 Saraiva – São Paulo).

1.        Confirmação expressa do negócio jurídico anulável

Para que o negócio jurídico de confirmação seja válido e tenha aptidão de convalidar o negócio jurídico anulável, é necessário que contenha a substância do negócio celebrado e a vontade expressa de mantê-lo. Ou seja, é necessária a menção e individualizada de qual negócio jurídico que se pretende ratificar, não pairando dúvida alguma ao negócio jurídico que é objeto da confirmação. Note-se que não há nenhuma exigência de forma a ser observada para a confirmação do negócio jurídico. Assim, por exemplo, nada impede que a confirmação seja feita para ratificar um contrato por escrito. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 27.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art 174. É escusada a confirmação expressa, quando o negócio ojá foi cumprido em parte pelo devedor, ciente do vício que o inquinava. 1

1.        Confirmação tácita do negócio jurídico anulável

Não é só pela confirmação expressa que se pode ratificar um negócio jurídico anulável. Admite a lei que isso seja feito de forma tácita pelo devedor que teria interesse em pleitear a anulação do negócio jurídico. Para tanto, basta que o devedor, após inequivocamente estar ciente do vício que inquinava o negócio jurídico o tenha cumprido ainda que parcialmente. Todavia, mesmo a confirmação tácita apenas pode ser feita por aquele que tenha plena capacidade negocial para praticar o ato de confirmação. Assim, por exemplo, o relativamente incapaz que, ciente do vício cumprir parcialmente o negócio não o estará confirmando por inequívoca ausência de capacidade para tanto. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 27.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

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