domingo, 6 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 110, 111, 112 - Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 110, 111, 112
Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo I – Disposições Gerais
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 110. A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento. 1, 2

1.        A vontade e sua manifestação

Não é a vontade do agente que determina o conteúdo do negócio jurídico e sim a forma como essa vontade é externada socialmente. O ordinário é que a vontade real do sujeito coincida com a vontade que foi publicamente manifestada. Pode ocorrer, entretanto, um descompasso entre a vontade real e a vontade manifestada. Enfrentando essas situações de descompasso duas teorias extremas surgiram. A teoria subjetiva, que funda toda a essência do negócio jurídico na vontade real do sujeito, protegendo-a ante sua exteriorização errônea e a teoria objetiva, mais moderna, a qual reconhece como elemento essencial do negócio jurídico, e não a vontade íntima do sujeito, que não vindo a ser exteriorizada, não adquire relevância jurídica. Eduardo Ribeiro bem observou que o legislador do Código Civil buscou amenizar os extremos dessas duas teorias ora privilegiando a vontade real (CC, art 167), ora protegendo a vontade declarada (CC, art 154). Observa-se de todo modo, que prepondera no Código Civil a chamada teoria da confiança, segundo a qual deve-se preservar a confiança legitimamente criada no destinatário da declaração de vontade de que a vontade declarada corresponde à vontade real do agente. (1)

2.        Reserva mental

A reserva mental ocorre quando o agente voluntariamente declara sua vontade em descompasso com sua vontade real. É a divergência propositalmente causada entre o animus e a declaração. Em tal caso, como regra geral, prevalece o conteúdo da vontade que foi exteriorizada pelo agente. É ela que irá produzir efeitos jurídicos. A vontade real, que o agente voluntariamente guardou para si, será irrelevante para o direito. a situação será diferente, entretanto, se o destinatário dessa declaração tiver conhecimento de que ela não corresponde a real intenção de quem a declarou. Isso porque, neste caso, entende a doutrina que sequer há declaração de vontade, caracterizando verdadeira hipótese de inexistência de negócio jurídico. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 03.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Eduardo Ribeiro de Oliveira, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Comentário ao Código Civil: das pessoas, (art 79ª a 137), Vol. II, Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 229-230.

Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa. 1

1.        O silêncio como manifestação de vontade

Expressão máxima do princípio da liberdade das formas é que até mesmo o silêncio pode ser reconhecido como forma de exteriorização da vontade. Usualmente, entretanto, o silêncio corresponde à mais absoluta ausência de declaração de vontade. Em situações excepcionais, entretanto, se as circunstancias negociais assim permitirem, ou mediante previsão expressa da lei, o silêncio pode ser visto como uma forma de anuência e, portanto, de manifestação de vontade. É o que ocorre, por exemplo, com a assunção de dívida. Diz o parágrafo único do art 299 que: “qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa” (CC, art 299, parágrafo único). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 03.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. 1

1.        Interpretação da declaração de vontade

Diferentemente do que uma leitura apressada desse dispositivo poderia transmitir, ao dizer que “nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”, o legislador acabou mais uma vez prestigiando a vontade declarada em detrimento da vontade real do agente. O conteúdo do negócio jurídico é determinado pela declaração de vontade e pelas circunstâncias com que ela foi declarada, não pelo animus subjetivo e íntimo do agente que a declarou. Basta ver que o legislador expressamente conferiu importância interpretativa à intenção do agente que foi de algum modo consubstanciada na declaração de vontade. A vontade íntima do agente que de forma alguma chegou a ser exteriorizada, que não foi consubstanciada na declaração permanece irrelevante para o direito. O parâmetro interpretativo consagrado pelo artigo 112 é o de evitar-se o apego literal ao sentido da linguagem, insensível às circunstâncias que lhe dão significado. De maneira bastante didática, as regras de interpretação dos contratos foram sistematizadas pela doutrina em três diferentes planos, dos quais o intérprete pode valer-se (i) do sentido literal da linguagem (ponto de partida necessário, porém insuficiente); (ii) da contextualização verbal do contrato (interpretação de determinado comando em consonância com a inteireza da avença), e (iii) de sua contextualização situacional. (1) (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 03.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Francisco Paulo de Crescenzo Marino. Contratos coligados no direito brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2009, p. 146.

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