quarta-feira, 5 de junho de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 381, 382, 383, 384 - Da Confusão – VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 381, 382, 383, 384
- Da Confusão – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
 (art. 304 a 388) Capítulo VIII – Da Confusão –
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Art. 381. Extingue-se a obrigação, desde que na mesma pessoa se confundam as qualidades de credor e devedor.

Confusão e a reunião na mesma pessoa das qualidades de credor e de devedor de uma mesma relação obrigacional. Opera-se ordinariamente pela sucessão por morte, a título universal ou singular, pela cessão de crédito e pela sub-rogação.

Seguindo orientação de Ricardo Fiuza, a confusão opera a extinção da dívida, agindo sobre o seu sujeito ativo e passivo e não sobre a obrigação, como se dá na compensação. Acarreta um impedimentum prestandi, i.é, a impossibilidade do exercício simultâneo d ação creditória e da prestação.

Havendo a confusão apenas na dívida acessória, não se extingue a principal, como no caso de o fiador herdar o direito creditório pelo qual se responsabiliza. Igualmente, se o fiador se tornar devedor da dívida afiançada, a fiança se extingue, mas subsiste a obrigação principal. Se a confusão se der na obrigação principal, extingue as acessórias: fiança, penhor etc.

Ressalva o mestre Alves Moreira que “a confusão não determina, pois, a extinção do crédito, sempre que a existência deste seja compatível com ela. É assim, que, ficando o devedor herdeiro do credor, o crédito do defunto deve ser computado para o efeito da quota disponível. Se, por exemplo, A, filho de B, deve a este R$ 1.000.000,00, e H, deixar legados, para se verificar se a importância destes excede a metade da herança de que B, podia dispor, deve considerar-se subsistente o crédito dele contra A” (Guilherme Alves Moreira. Instituições do direito civil português, 2.ed., Coimbra, Coimbra Ed., 1925, v. 2, p. 277).

O presente dispositivo não serviu de palco a nenhuma modificação, seja por parte do Senado Federal, seja por parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. Trata-se de mera repetição do art. 1.050 do Código Civil de 1916, sem qualquer alteração, nem mesmo de ordem redacional (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 208, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/06/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No diapasão de Guimarães e Mezzalina, qualquer obrigação pressupõe uma relação de sujeição ente um sujeito ativo e outro passivo, de forma que seu desaparecimento, seja por força das circunstâncias, seja pela comunhão de patrimônios, dá cabo à obrigação. Os casos mais comuns de confusão se dão nas hipóteses de sucessão causa mortis, quando o herdeiro passa a ser titular do crédito detido pelo falecido perante si, ou ainda de união patrimonial entre cônjuges que, antes do matrimônio, mantinham relação obrigacional entre si.

A confusão é forma de extinção da obrigacional, mas que não tem efeitos de pagamento, dado que o liame obrigacional ocorre sem a efetivação de uma prestação. São requisitos da confusão: (i) a unidade da relação obrigacional; (ii) reunião das qualidades de credor e devedor perante o mesmo indivíduo; e (iii) a ausência de separação de patrimônios.

Com a confusão, extinguem-se também as obrigações acessórias (acessorium sequitur principale). Assim, ilustrativamente, confundindo-se credor e devedor em indivíduo único, fica extinta a obrigação do fiador. O mesmo efeito, vale notar, não se dá se houver, por exemplo, a confusão entre fiador e credor, pela ausência do requisito da unidade da relação obrigacional. Nesse caso, há a extinção apenas da obrigação acessória (fiança) com a manutenção da obrigação principal, cujo credor passará a ser o antigo fiador.

Tornando-se interessado na herança o herdeiro que adquire os direitos dos demais, cabe-lhe o direito de pedir a adjudicação independentemente de pagamento do imposto inter vivos, embora credor do espólio, uma vez que extinta ficou a obrigação nos termos do art. 1.049 [CC 1916]” (RT 183/335).

“Se credor de indenização das benfeitorias realizadas no imóvel vem a adquiri-lo no curso do processo, aquelas passam ipso facto a lhe pertencer também, operando-se o instituto da confusão” (RT 660/165)  (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 04.06.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo no diapasão de Bdine Jr., quando A deve a B, mas, de algum modo, torna-se titular desse mesmo crédito, extingue-se a obrigação, pois não haverá possibilidade ou necessidade de adimplir a si mesmo. Tal hipóteses costuma ocorrer nos casos em que o devedor é o único sucessor do credor e sobrevém a morte deste último. Nesse caso, o crédito do credor será transmitido ao devedor, que, em consequência, será credor e devedor de si mesmo em relação à mesma obrigação, que será considerada extinta nos termos deste dispositivo. A confusão é meio legal de extinção da dívida, de maneira que será reconhecida mesmo que não haja intenção das partes ou manifestação de vontade nesse sentido (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 405 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 382. A confusão pode verificar-se a respeito de toda a dívida, ou só de parte dela.

Em explicação rápida, Bdine Jr. mostra que este artigo permite o reconhecimento da confusão como modo de extinguir a dívida, mesmo que ela não compreenda todo o débito, mas o alcance apenas em parte (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 407 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 05/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina Ricardo Fiuza apresenta que, sendo parcial a confusão, subsiste o restante da dívida. Os casos ais frequentes de confusão parcial, apontados por Tolentino Gonzaga, são os seguintes: o devedor que não é herdeiro único do de cujus: o terceiro que não é chamado sozinho à sucessão do credor e do devedor; o credor que não recebe a totalidade da dívida, por não ser único herdeiro do devedor, ou não lhe ter sido transferida integralmente a dívida (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 208, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 05/06/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em matéria de penhor e confusão parcial, Guimarães e Mezzalina, indicam revisão ao § 2º do CC 1.436. E para fins de extinção de demanda judicial, a confusão entre autor e réu deve ser da totalidade do direito subjudice, não bastando que seja apenas parcial (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 05.06.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 383. A confusão operada na pessoa do credor ou devedor solidário só extingue a obrigação até a concorrência da respectiva parte no credito, ou na dívida, subsistindo quanto ao mais a solidariedade.

No entendimento de Bdine Jr., credores ou devedores solidários fazem jus ao crédito ou são responsáveis pelo débito em sua integralidade. Dessa forma, perante aquele com que estabelecem a relação jurídica podem agir individualmente como se cada um deles fosse o único credor ou devedor. a confusão, porém, não poderá, segundo o dispositivo em exame, acarretar a extinção da totalidade da dívida, pois somente parte dela diz respeito a cada credor ou devedor solitário.

Admitindo-se, pois, que a confusão com um só dos devedores solidários ou credores solidários extinguisse a dívida, os demais credores se veriam compelidos a cobrar o cocredor, que obteve satisfação de seu débito sem vantagem para eles, o mesmo se verificando em relação ao devedor, o que é vedado no presente dispositivo.

Tal procedimento não corresponde ao disposto nos CC 267 e 269, que, no primeiro, ao definir solidariedade ativa, permite que qualquer credor exija a dívida na integralidade, e, no segundo, só autoriza extinção da dívida em valor superior à parte do credor, até o montante do que foi pago, se efetivamente ocorreu pagamento, i.é, se houver adimplemento daquilo efetivamente devido. Na confusão, como se verifica do exame do presente dispositivo, a solução é diversa (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 407 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 05/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na esteira de Guimarães e Mezzalina, tais efeitos decorrem, com naturalidade, das regras atinentes à solidariedade (CC, 264 a 285) (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 05.06.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

A doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, aponta a mesma regra do Código Civil português (art. 869~), ou seja, pela confusão não se extingue o crédito ou a dívida solidários, mas apenas e proporcionalmente a parte que cabia ao devedor solidário.

Registra, mais uma vez com perfeição, Alves Moreira que “operada a confusão, esta não produz efeitos senão nessa parte, donde resulta que, posta essa parte de lado, a obrigação subsiste a mesma, ficando o credor solidário, que sucede ao devedor, obrigado a pagar a qualquer dos outros credores, integralmente, o montante do crédito que a esses credores pertence, e não apenas a quota parte desse credor, e ficando o devedor solidário que sucede ao credor com o direito de exigir dos outros devedores a importância total da dívida, deduzida apenas a quota parte que pertencia ao devedor em quem se operou a confusão. A confusão só pode ser alegada, pois, como exceção pelos codevedores em relação à quota parte que não dívida cabia ao devedor que sucedeu ao credor. Só nessa parte é que, pela impossibilidade do exercício da ação creditória a confusão produziu os seus efeitos” (Guilherme Alves Moreira, Instituições do direito civil português, cit., p. 280) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 208, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 05/06/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 384. Cessando a confusão, para logo se restabelece, com todos os seus acessórios, a obrigação anterior.

Trilhando a esteira do mestre Bdine Jr., se a confusão cessar – porque, exemplificativamente, o ascendente credor, diversamente do que se imaginava, está vivo, de modo que o débito do descendente para com ele não se consolidou nas mãos deste -, o débito se restabelecerá com todos os seus acessórios.

No entanto, garantias e direitos reais de terceiros constituídos no momento em que se operou a confusão devem ser respeitados (PEREIRA, Caio Mário da Silva Instituições de direito civil, 20.ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 274). Em consequência da cessação da confusão, o crédito volta a existir com todos os acessórios que a ele se vinculavam. Segundo Sílvio Rodrigues, a confusão cessa porque é fundada em causa transitória ou ineficaz (Direito civil. São Paulo, Saraiva, 2002, v. II, p. 224).

Segundo a doutrina de Ricardo Fiuza, cessada a confusão, como no caso de anular o testamento e o devedor deixar de ser herdeiro do credor, restabelece-se a obrigação, com todos os seus acessórios. Nesses casos, diz-se que a confusão apenas paralisou o exercício do direito pela impossibilidade de o credor exercê-lo contra si mesmo, não se havendo operado a extinção da dívida. Daí por que, cessado o impedimento, ressurge o direito com as garantias acessórias.

Ressalta Beviláqua que “se, porém, se trata de uma dívida garantida por hipoteca ou penhor, e aquela foi cancelada, ou este remido, é claro que se não restauram as garantias reais com o restabelecimento da dívida. O mesmo deve dizer-se da fiança” (Clóvis Beviláqua, Código Civil comentado, cit., p. 213) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 209, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 05/06/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na linha de Guimarães e Mezzalina, o dispositivo em questão trata das hipóteses em que o fato gerador da confusão não se convalide ou não seja de caráter definitivo, levando, portanto, à cessação da confusão. O exemplo clássico da doutrina é o caso de anulação de testamento que teria gerado a confusão entre credor (falecido) e o devedor (herdeiro). Nessa hipótese, com a anulação do ato, a obrigação revigora-se retroativamente, inclusive com todas as garantias, como se a confusão nunca houvesse ocorrido.

A despeito de a obrigação se restaurada por inteira na hipótese prevista no artigo, Pereira destaca as garantias reais e o direito de terceiros devem ser respeitados, quando foram constituídos ou adquiridos na pendência da confusão. Assim, exemplifica que eventual inscrição que tenha sido feita em matrícula do imóvel anteriormente hipotecado, na pendência da confusão que veio a cessar, deverá ter preferência sob a garantia que se revigora (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., pp. 273-274) - conforme ensinado, no site direito.com, acessado em 05.06.2019 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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