Direito Civil Comentado
- Art. 400, 401
- DA MORA
– VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título IV
– DO INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES
(art. 389 a 420) Capítulo II – DA MORA –
-
vargasdigitador.blogspot.com
Art. 400.
A
mora do credor subtrai o devedor isento de dolo à responsabilidade pela
conservação da coisa, obriga o credor a ressarcir as despesas empregadas em
conservá-la, e sujeita-o a recebe-la pela estimação mais favorável ao devedor,
se o seu valor oscilar entre o dia estabelecido para o pagamento e o da sua
efetivação.
Segundo
Bdine Jr., é preciso observar que, se a culpa é necessária para caracterizar a
mora do devedor, o mesmo não acontece em relação à do credor, como se verifica
da leitura deste artigo. Desse modo, se o devedor oferece a prestação no tempo
devido e o credor não a recebe, este estará em mora, independente de culpa.
Nessa hipótese, o devedor deixa de responder pelos riscos da coisa. Imagine-se
que alguém se compromete a entregar um veículo ao comprador na Praça José
Bonifácio, em Piracicaba. O Comprador atrasa-se para o encontro em razão de um
acidente de trânsito que o impede de chegar ao locar no horário que combinaram
os contratantes. No exemplo imaginado, se o carro fosse furtado em poder do
vendedor, o prejuízo seria suportado pelo comprador que se atrasou
involuntariamente.
A culpa do
credor é irrelevante para a caracterização de sua mora e o obriga a indenizar
os prejuízos do devedor relativos à conservação e a outros danos que suportar,
pois a menção às despesas de conservação não é taxativa, mas apenas
exemplificativa. Ademais, se o valor do bem oscilar entre o dia previsto para o
pagamento e o de sua efetivação, o credor pagará o preço mais favorável ao
devedor.
Ocorre mora
do credor quando ele não receber a prestação no tempo e do modo devidos. Para
que ela se verifique são necessários os requisitos seguintes: o vencimento da
obrigação, pois antes disse ela não é exigível e o devedor não pode liberar-se
de seu cumprimento; a oferta da prestação; a recusa injustificada do credor em
receber.
O devedor
isento de dolo deixa de ter responsabilidade pela conservação da coisa se
ocorrer mora do credor, como está consignado neste dispositivo. O dolo do
devedor estará caracterizado se ele abandonar o bem em face do atraso do
credor. A lei exige que o devedor tenha cuidados mínimos com o objeto da
prestação, conferindo-lhe direito de reembolso pelas despesas de conservação. A
oscilação de preço do produto ocorre, por exemplo, quando o comprador de certa
quantidade de gado atrasa-se para retirá-lo da fazenda do vendedor,
verificando-se o aumento do preço da arroba desde a data em que devia ter
apanhado os animais. Caso isso ocorra, o comprador pagará o preço do produto
vigente na data da retirada efetiva do gado.
O dolo
referido no artigo não corresponde à intenção de lesar, mas a ausência de
providências acautelatórias que evitem dano ao bem em seu poder. Segundo
Rizzato, não se compreendem nessas providências despesas vultosas, “como
pinturas de prédios, constante revisão de um equipamento, substituição de peças
e outras conservações que reclamam altos custos, insuportáveis pela sua
condição econômica” (RIZZARDO, Arnaldo. Direito das obrigações. Rio de Janeiro, Forense,
2004, p. 486).
Concluindo Bdine Jr., diz
que se a mora é simultânea, uma elimina a outra, ocorrendo compensação entre
elas. As duas partes devem ser consideradas como se não estivessem em mora e
nenhuma pode exigir perdas e danos da outra. Mas se as moras são sucessivas,
permanecem os efeitos anteriores de cada uma. Ambas as partes respondem por
perdas e danos do período em que estiveram em mora; o credor, pelos prejuízos
que se verificaram enquanto ele recusou o recebimento do pagamento, e o
devedor, pelos que se consumaram quando o primeiro concordou em receber e ele
não quis pagar (Hamid
Charaf Bdine Jr, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 438 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 25/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).
A doutrina
apresentada por Ricardo Fiuza, a ponta que o art. 400 estabelece os efeitos da mora
accipiendi, a saber: a) o devedor, desde que não tenha agido com dolo para
provocar a mora, não responderá pelos riscos com a conservação da coisa; b) as
despesas que o devedor tiver com a conservação serão ressarcidas pelo credor;
c) se o valor da prestação oscilar entre o dia estabelecido para o pagamento e
o dia do efetivo recebimento, o credor estará obrigado a receber pelo valor
mais favorável ao devedor; d) o devedor pode desobrigar-se, consignando o
pagamento.
E questiona: No caso do mútuo
feneratício, a mora do credor faz cessar afluência dos juros? Entende-se
que sim. A posição, entretanto, não é unânime. Beviláqua registra as
divergências: “O Código Civil brasileiro refere-se á atenuação da
responsabilidade do devedor, declarando que ele, somente responde por seu dolo,
após a mora do credor; mas não fala da cessação dos juros, como faz o alemão,
art. 301. Se a dívida é produtiva de juros, cessam estes, desde a mora do
credor. Todavia é tão racional esta isenção de juros durante a mora do credor
que podemos considera-la incorporada ao nosso direito, independentemente de
disposição expressa. É certo que, em relação ao ponto, a opinião dos doutos é
divergente. Assim é que Windscheid (Pand, II, § 346, nota ‘7) acha que
eles são devidos, como frutos da coisa, porque o devedor goza do capital.
Momento, porém frisa, a diferença entre os frutos propriamente ditos e os juros
do capital, e faz sentir que não se devem cobrar juros de uma quantia, que o
devedor devia conservar à disposição do credor, para entregar a qualquer
momento. Aliás, havendo consignação, cessam os juros (art. 796)” (Clóvis
Beviláqua, Código Civil comentado, cit., p. 118-9) (Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 216, apud Maria Helena
Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/06/2019, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
Seguindo a
esteira de Guimarães e Mezzalina, tais efeitos são decorrência direta da recusa
injustificada do credor em receber a coisa, no termo aprazado. Nessa hipótese,
diversamente do que se dá na mora do devedor, não há a necessidade de que haja
culpa do credor. Basta apenas e tão somente que este retarde o recebimento da
prestação ou não a receba da forma devida, bem como que o devedor não tenha
agido com dolo.
Exemplificativamente,
pode-se mencionar a hipótese de credor que deixou de comparecer no locar e hora
combinado com o devedor, em razão de acidente de trânsito, e a coisa objeto da
prestação foi furtada por terceiro. nesse caso, o credor seria o responsável
pelos prejuízos sofridos pelo devedor (Direito
Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em
25.06.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 401. Purga-se a mora:
I – por parte do devedor,
oferecendo este a prestação mais a importância dos prejuízos decorrentes do dia
da oferta;
II – por parte do credor,
oferecendo-se este a receber o pagamento e sujeitando-se aos efeitos da mora
até a mesma data.
Surfando com Bdine Jr.,
purgar ou emendar a mora é o modo pelo qual se procede à sua cessação. Aquele
que está em mora pode purga-la, cumprindo a obrigação descumprida e indenizando
a outra parte. A purgação só pode ser feita se ainda trouxer resultado útil ao
credor. Do contrário, haverá inadimplemento absoluto.
Este artigo aponta as
hipóteses em que a purgação da mora poderá ser feita pelo credor ou pelo
devedor. a purgação da mora pelo devedor realiza-se mediante oferta da
prestação atrasada mais o valor dos prejuízos dela resultantes. Os prejuízos a
serem ressarcidos são os conhecidos, pois os ainda não conhecidos podem ser
cobrados em ação autônoma, mas não impedem a emendar da mora. Em relação ao
credor, a purgação verifica-se quando ele aceita receber o pagamento e sujeita-se
aos efeitos da mora.
A purgação pode ocorrer a
qualquer momento, desde que ainda seja útil ao credor. Desse modo, é possível
concluir que a consignação é ação destinada a prevenir e a emendar a mora. A
purgação da mora não se confunde com a sua cessação. Esta última não depende de
um comportamento do moroso, pois resulta da própria extinção da obrigação em
decorrência de outro fato que não seja imputável a ele. É o que ocorre quando
as dívidas fiscais do devedor são anistiadas. Nesse caso, cessa a mora,
produzindo efeitos pretéritos, pois os efeitos já produzidos serão afastados.
Na purgação da mora, os efeitos produzidos não são pretéritos, porque estes
últimos se conservam (Hamid
Charaf Bdine Jr, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 439 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 26/06/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).
Segundo a Doutrina, purgação
ou emenda da mora é a extinção dos efeitos futuros do estado moroso, em
decorrência da oferta da prestação, pelo devedor, acrescida de todas as perdas
e danos até o dia da oferta, ou ainda em face da prontificação do credor em
receber a coisa, pagando todos os encargos advindos com advindos com a sua
demora em receber.
Na concepção de Ricardo
Fiuza, a purgação pode ser admitida a qualquer tempo, mesmo depois de iniciada
a ação executiva contra o devedor ou a consignatória contra o credor. Nesses
casos, as perdas e danos incluirão também os honorários advocatícios e as
custas judiciais.
Pode a convenção das
partes impedir a mora? Sobre o assunto, decidiu a Câmara dos Deputados no
período inicial de tramitação do projeto. Na ocasião, registrou o Deputado
Eniani Satyro, em seu relatório geral: “Na realidade, muito embora o Código
vigente permita que as partes livremente convencionem a proibição da purgação
da mora, esta deve ser sempre admitida, como preceito de ordem pública. Nos
dias atuais, como restrição de ordem social à autonomia da vontade, deve
prevalecer o princípio que assegura sempre direito à purgação da mora, nos
casos previstos na lei. É sobretudo nos negócios estipulados entre pessoas de
nível cultural e econômico diverso, ou nos contratos de adesão, que consta a
exclusão da purgação da mora em virtude de convenção das partes, com graves
prejuízos ao contraente mais fraco. Muito embora possa haver hipóteses em que a
conclusão do negócio só convenha quando previsto o adimplemento em data certa,
a concessão do direito de purgar a mora resulta de relevantes razoes de
natureza social que cabe ao legislador preservar” (Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 217, apud Maria Helena
Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/06/2019, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
No diapasão de Guimarães e
Mezzalina, a purgação da mora, tanto do credor quanto do devedor, dá-se com a
assunção pelo inadimplente das respectivas consequências que houver gerado à
contraparte na relação obrigacional. Tal emenda somente poderá ser efetuada nos
casos em que, a despeito do cumprimento não se dar no termo aprazado, a
prestação ainda é útil e aproveitável (termo não essência – vide comentários ao
artigo 333). A purgação da mora também não poderá ocorrer nos casos em que,
pela lei ou pela convenção, a consequência da mora for a resilição do contrato.
A purgação da mora poderá
ocorrer ainda quando o afetado por ela renunciar aos direitos que possam lhe
advir da situação. Essa renúncia poderá ser expressa ou tácita. Nessa segunda
hipótese, a renúncia deverá ser verificada de acordo com as circunstâncias do
caso, especialmente quando o comportamento daquele a quem a mora aproveitar
tiver comportamento incompatível com os direitos detidos em face da parte
inadimplente.
“A parte embargante,
entendendo serem excessivos os cálculos apresentados pelo exequente, deveria
ter realizado o pagamento dos valores que acreditava serem devidos – parte
incontroversa -, desvencilhando-se, de tal modo, da incidência de correção
monetária e de juros de mora sobre referido montante. Inteligência dos arts.
394 e 395 do CC/2002” (STJ, 5ª T. REsp n. 767498 – RJ, Rel. Des. Arnaldo
Esteves Lima, j. 9.3.2006).
Nesse caso,
o devedor deverá oferecer a prestação acrescida dos juros moratórios e
eventuais danos emergente e lucros cessantes que houver causado ao credor. Em
se tratando de termo não essencial e não havendo lide pendente, a purgação da
mora será admitida sem a necessidade de anuência do credor. Já tendo o credor
ajuizado demanda em face do devedor, a emendatio morae sem anuência do
sujeito ativo da relação obrigacional somente será admitida, nos casos em que
houver expressa disposição legal (ex.? na hipóteses de ação de despejo por
falta de pagamento prevista na lei do inquilinato – lei n. 8.245 de 18.10.1981)
(Pereira,
Caio Mário da Silva. Teoria Geral das
Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., p. 316).
No caso de purgação da mora
do credor, além de arcar com eventuais prejuízos acarretados ao devedor, ele
ficará ainda sujeito a receber a coisa no estado em que se encontrar (Direito
Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 26.06.2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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