Direito Civil Comentado
- Art. 519, 520
- Da
Preempção ou Preferência –
VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(art. 481 a 853) Capítulo I – Da Compra e
Venda
Seção II
– Das Cláusulas Especiais à Compra e Venda –
Subseção
III – Da Preempção ou Preferência
- vargasdigitador.blogspot.com
Art.
519. Se
a coisa expropriada para fins de necessidade ou utilidade pública, ou por
interesse social, não tiver o destino para que se desapropriou, ou não for
utilizada em obras ou serviços públicos, caberá ao expropriado direito de
preferência, pelo preço atual da coisa.
Como ensina Nelson Rosenvald, aqui o Código Civil cuida do
interessantíssimo tema da retrocessão. Traduz-se no dever do poder público de
colocar à disposição do expropriado o imóvel que fora desapropriado, nos casos
em que não se lhe concedeu a finalidade visada pela necessidade ou utilidade
pública ou do interesse social.
Cuida-se de sanção dirigida à administração pública como
consequência da recusa em atender à especial vinculação do bem expropriado. O
bem será oferecido ao particular, a fim de que delibere acerca da recompra pelo
preço atual da coisa.
Contudo, o artigo em análise é claro ao afirmar que, mesmo não
tendo sido concedida a destinação originária, se ficar provada a sua utilização
em qualquer obra ou serviço público, restará inviabilizada a possibilidade de
retrocessão (v.g., substituir a construção da creche por um posto de
saúde), pois fica mantido o motivo superior que justificou o ato. Ou seja, a
retrocessão requer a tredestinção ilícita, i.é, o desvio de poder que conduz o
bem a uma finalidade contrária à do interesse público ou a sua transferência a
terceiro, denotando a desistência na desapropriação.
Ao contrário do disciplinado nos artigos anteriores, cuida-se de
hipótese de direito de preferência legal e não convencional. Ademais, não se
indeniza o prejuízo somente com perdas e danos (CC 518), mas com a própria
reaquisição da propriedade em razão do desinteresse superveniente do
expropriante.
Ninguém pode duvidar da manutenção da retrocessão no direito
vigente. Apesar de não ser inserida na Lei de Desapropriações (Decreto-lei n.
3.365/41), mantém-se no Código Civil, que é o local adequado para tratar de um
modelo do direito privado. Não se olvide de que a desapropriação é a máxima
restrição ao direito de propriedade, sento apenas justificada pela função
social que lhe é inerente (CF, 5º, XXII, XXIII e XXIV). Portanto, nada mais
natural que a possibilidade de retorno do bem imóvel ao proprietário quando é
frustrada a finalidade pública para a qual se pretendeu dirigir o bem.
A retrocessão é direito real
ou obrigacional? Pela própria estrutura da retrocessão, ela não se acomoda
perfeitamente nem a um nem a outro setor. Assume aspectos obrigacionais por se
situar no campo do direito de preferência, matéria alusiva aos contratos, relações
de cunho obrigacional. Todavia, não sendo concedida nenhuma finalidade pública
ao bem, o expropriado não receberá uma indenização – o que ocorreria em sede
obrigacional, mas poderá postular a ação de preferência (não a
reivindicatória), reavendo a coisa para si. Porém, isso não convola a
retrocessão em direito real, podendo-se admitir uma eficácia real do direito
obrigacional, pois a desapropriação geraria uma espécie de propriedade
resolúvel do poder público, condicionada à satisfação do interesse público. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 578/579 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/09/2019.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Como esclarece a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, ao lado
da preferência voluntária ou convencional (negocial), referida pelo art.. 513,
tem-se presente, no dispositivo, a preferência legal, em favor do
ex proprietário da coisa expropriada, também chamada retrocessão, obrigando o
Poder Público expropriante, em não a tendo destinado para a finalidade que
pronunciou a desapropriação, ou não a utilizando em obras e serviços públicos,
oferece-la ao seu anterior titular, recompondo o direito de propriedade
afetado. A retrocessão significa, como sustenta a doutrina, o direito que o
titular do bem expropriado tem de reincorpora-lo ao seu patrimônio, quando
desviado inteiramente o seu uso e destinação de interesse público ou social. A
sua aplicação deve-se, inclusive, à efetividade do princípio da moralidade que
deve reger a administração pública (CF, 37)
A jurisprudência tem ultimamente, no tema da infringência ao CC
1.150 de 1.916, definido que “resolve-se em perdas e danos o conflito surgido
com o desvio de finalidade do bem expropriado” (STJ, 4’ T., REsp 43.651-SP,
rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 5-6-2000). Também assentou o STJ: “A ação
de retrocessão é de natureza ‘real’, não se lhe aplicando a prescrição quinquenal
prevista no Decreto n. 20.190/32. A transferência do imóvel desapropriado a
terceiro (pessoa privada) constitui-se em desvio de finalidade pública,
justificando o direito a retrocessão a ser postulado pelo proprietário
expropriado” (REsp 62.506-PR, I’ I., Rel. Mm Demócrito Reinado, DJ de
19-6-1995). (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 277 apud Maria
Helena Diniz Código Civil Comentado já
impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Conforme ensina Marco Túlio de Carvalho Rocha, o artigo
519 cuida de matéria pertencente ao Direito Administrativo e que já não deveria
mais ser regulada pelo Código Civil: o direito de retrocessão que toca ao
desapropriado em caso de não-utilização do bem pelo expropriante
(tredestinção). Sobre a matéria, confira-se a Lei das Desapropriações. (Marco Túlio de
Carvalho Rocha
apud Direito.com acesso em 19.09.2019, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
Art.
520. O direito de preferência não se pode ceder nem passa aos
herdeiros.
Como mostra Nelson Rosenvald, aqui se vê que o direito de
preferência é intuitu personae e não se transmite aos herdeiros do
vendedor. Ademais, não pode ser objeto de cessão por negócio jurídico inter
vivos. A morte do vendedor é o termo da preempção, exceto se foi instituído
em favor de duas ou mais pessoas – como na venda de bem em condomínio -, quando
somente se extinguirá com a morte do último vendedor, adiante da
indivisibilidade da obrigação.
Vê-se que o mesmo fenômeno
não ocorre na retrovenda, pois o direito de retrato é cessível e transmissível
a herdeiros e legatários do vendedor, a teor do CC 507. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 579 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/09/2019.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Seguindo a orientação de Ricardo Fiuza, o direito de prelação é
direito personalíssimo, inábil de transmissibilidade, não podendo ser objeto de
cessão e tampouco os herdeiros do preemptor o sucedem no seu exercício. No seu
elevado magistério, Augusto Zenun sustenta, porém, o seguinte: “(...) no
tocante à herança, pode dar-se a sucessão quanto à preferência do vendedor, se
há cláusula expressa nesse sentido, podendo os herdeiros suceder na
preferência, diante da falta do vendedor”.
Melhor seria a solução dada pelo Código Civil Alemão (art. 514) ao
efetuar o preceito quando haja estipulação em contrário ou fixação de prazo
para o exercício do direito de prelação, o que importa em tratamento
equivalente à disciplina da retrovenda, onde o direito de retrato é cessível e
transmissível (art. 507), com prazo decadencial estabelecido. (Augusto Zenun, Da
compra e venda e da troca, Rio de Janeiro, Forense, 2001 (p. 79-80); João
Luiz Alves, Código Civil anotado (p. 778). (Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 277 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/09/2019,
corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Tem-se na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, que o direito de
preferência é personalíssimo: cabe apenas ao antigo proprietário que o
ressalvou quando da venda do bem que lhe pertencia. Não se transfere a
terceiros, nem por cessão, nem por herança. Falecido o titular do direito de
preferência, este estará extinto. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 19.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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