sexta-feira, 11 de outubro de 2019


Direito Civil Comentado - Art. 565, continua
- Da Locação de Coisas – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo V – Da Locação de Coisas
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 565. Na locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição.

Na ilustração de Nelson Rosenvald, no Direito Romano eram conhecidas três formas de locação: locatio conductio rei (locação de coisa); locatio conductio operarum (locação de trabalho humano); e locatio conductio operis (locação de obra).

Nesse sentido, o Código Civil de 1916, sob a rubrica “Da locação”, cuidava das três modalidades milenares de locação. Mas, com terminologia própria e adequada, o Código Civil de 2002 afasta as duas primeiras espécies de locação, convertendo-as aos contratos de prestação de serviço e empreitada.

Ademais, houve a unificação das locações civil e mercantil – esta anteriormente situada no Código Comercial de 1850 -, pois toda a matéria é agora versada no Capítulo V, do Título VI, do Livro “Do Direito das Obrigações”, relativo às várias espécies contratuais.

Significativa e a advertência do CC 2.036: “A locação de prédio urbano, que esteja sujeita à lei especial, por esta continua a ser regida”. Nesse ponto, há uma curiosidade. A norma geral remete à lei especial e esta, novamente, conduz ao Código Civil. Basta perceber que a locação de imóveis urbanos é tratada na Lei n. 8.245/91, sendo que logo em seu art. 1º, parágrafo único, adverte acerca das modalidades de locação que serão regidas pelo Código Civil e leis especiais (norma de reenvio).

Destarte, o Código Civil regula a locação de vagas autônomas de garagem; espaços destinados à publicidade; locação de apart-hotéis, hotéis-residência ou equiparados (além da aplicação de normas do CDC); e formas de locação que não tenham sido objeto de regulamentação por legislação própria.

Além de estabelecer normas genéricas para o tratamento de espaços legislativos olvidados por microssistemas – sobretudo quanto à locação de bens móveis em que não exista relação de consumo -, não se olvide de que subsidiariamente a lei civil também será aplicada àqueles casos de omissão na norma de regência específica.

Outrossim, excluem-se do Código Civil as locações de imóveis rurais (arrendamento rural, Lei n. 4.504/64 – Estatuto da Terra); locação de bens públicos (Decreto-lei n. 9.760/46); e o arrendamento mercantil (leasing), posto que é submetido à Lei n. 6.099/74 e resoluções do Banco Central.

Contudo, o Código Civil cuidou de delimitar o prazo prescricional trienal para o exercício da pretensão relativa ao pagamento de alugueis de prédios rústicos ou urbanos (CC 206, § 3º, I). Afastando-se da acepção ampla de locação tanto a prestação de serviço como a empreitada, restou conceituada no presente dispositivo a locação como o contrato pelo qual uma das partes, mediante contraprestação, concede à outra em caráter temporário o uso e gozo de coisa infungível.

Trata-se de contrato bilateral, gerando obrigações para ambas as partes (uso e gozo do bem em troca de retribuição pecuniária); oneroso, eis que os sacrifícios e vantagens são recíprocos; comutativo, sendo as prestações conhecidas e pré-estimadas pelas partes; e consensual, aperfeiçoando-se com o acordo de vontades, na medida em que a entrega da coisa não é pressuposto de existência, e sim fase de execução. Por fim, é contrato de duração, com execução sucessiva e renovada de prestações de dar quantia certa a cada período.

Como pressupostos de existência da locação temos: consenso dos sujeitos, coisa, temporariedade, remuneração, consensum, res, tempum pretium.

Os sujeitos do contrato são o locador (senhorio) e o locatário (inquilino). Em regra, o proprietário transmite a posse direta do bem ao locatário, reservando-se a posse indireta em razão da relação de direito obrigacional. Necessariamente não há coincidência entre a posição de locador e a de proprietário, pois mesmo um não proprietário poderá ceder o ouso e gozo da coisa em locação (sublocação) se não houver proibição contratual. Nesse caso, a posse será tripartida, cabendo a posse direta ao sublocatário e a posse indireta ao proprietário e àquele que cedeu a posse (v.g., usufrutuário que cede o exercício do usufruto a um terceiro – CC 1.393).

No condomínio, nenhum dos condôminos isoladamente poderá locar a coisa comum para terceiros sem o consenso dos outros (CC 1.314, parágrafo único). A restrição é coerente com a natureza do modelo jurídico: cada comproprietário detém uma fração ideal da coisa, que permite a sua disposição com exclusividade, mas a posse comum é de fruição de todos os condôminos, daí a necessidade do consentimento geral.

Cuidando-se de contrato consensual, é suficiente o acordo de vontades no tradicional esquema proposta/aceitação, sendo a tradição da coisa uma obrigação de coisa certa que recai sobre a pessoa do locador. Já no comodato, mútuo e depósito, a entrega da coisa é elemento de formação do negócio jurídico, tratando-se de contratos reais.

O objeto do contrato de locação será um bem móvel ou imóvel, consistente em coisa infungível e inconsumível, tendo em vista a necessidade de sua restituição ao locador, ao término do contato, com a manutenção de sua substância, preservando-se a essência. Ora, sendo os bens fungíveis e consumíveis passiveis de exaurimento, a sua cessão descaracterizaria a locação, conforme a acepção a eles conferida pelos CC 85 e 86.

A locação será contratada por prazo ou sem prazo. Em qualquer dos casos, a temporiedade é fundamental, pois a perpetuidade conduziria a uma espécie de enfiteuse, que não pode mais ser constituída a partir de 11 de janeiro de 2003 (CC 2.038)

O preço é um dos elementos essenciais da locação. Ao contrário da compra e venda, a vontade das partes quanto ao preço não importa em transmissão da propriedade, mas em cessão de posse. O aluguel é a contraprestação fundamental do locatário, a mais importante de suas obrigações. Se não houvesse a onerosidade, instalar-se-ia o comodato. A retribuição é explicada como compensação pecuniária ao proprietário que é privado da posse imediata da coisa e da percepção de seus frutos naturais e industriais. Daí servirem os pagamentos em dinheiro ou bem de outra espécie – como frutos civis, pouco importando se o locatário utiliza a coisa efetivamente ou não. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 612/613 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Sob magistério de Ricardo Fiuza, tem-se o contrato de locação no CC/2002, em suas modalidades básicas, ser agora tratado, na espécie, em capítulos próprios. Versa o presente sobre o da locação de coisas – locatio rerum – CC 565 a 578. No tocante ao de serviços – locotio operarwn – (CC de 1.916, arts. 1.216 a 1.235), passou este constituir novo contrato nominado, o de prestação de serviços (CC 593 a 609), e o de execução de trabalho determinado, locação de obra ou empreitada, tem sua disciplina nos CC 610 a 626.

A locação predial urbana é regida pela Lei n. 8.245/91 (Lei do Inquilinato). A de prédios rústicos é regulada pelo Estatuto da Terra (Lei n. 4.504/64, arts. 92 e ss.). O Decreto-lei n. 9.760/46 disciplina a locação dos próprios nacionais.

Pelo contrato de locação de coisas, uma parte transfere a posse do bem à outra, por prazo certo ou indeterminado, mediante retribuição ajustada. Trata-se de contrato oneroso, de relação continuativa, não exigindo forma solene.

Coisa não fungível ou infungível é aquela que não pode ser substituída por outra, ainda que da mesma espécie, qualidade e quantidade, a exemplo de uma obra artística. A retribuição ou remuneração, certa e determinada, pelo uso e gozo da coisa cedida é chamada de aluguel ou aluguer. As partes que integram o contrato são denominadas locador ou locutor (o que cede a coisa) e locatário ou conductor (o que usa e usufrui). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 301 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Pegando carona com Marco Túlio de Carvalho Rocha, segundo Orlando Gomes “Locação é o contrato pelo qual uma das partes se obriga, mediante contraprestação em dinheiro, a conceder à outa, temporariamente, o uso e gozo de coisa não fungível” (Contratos, n. 210, p. 305).

A locação do direito romano deu origem aos seguintes contratos típicos, além da locação de coisas: a) prestação de serviços (CC 593 a 609); b) empreitada (CC 610 a 626); c) contrato de trabalho (Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT); d) transporte (CC 730 a 756).

Atualmente, o termo é utilizado para designar, exclusivamente, a locação de coisas: a) moveis (CC 565 a 578); b) imóveis urbanos (Lei n. 8.245/91); c) imóveis rústicos ou rurais (Lei n. 4.504/64 – Estatuto da Terra, art. 95).

Locação é contrato bilateral, oneroso, consensual, impessoal, de duração. As regras sobre o contrato de locação, estabelecidas no Código Civil, valem, na íntegra, para a locação de bens móveis. Com relação a bens imóveis, as referidas regras valem em caráter supletivo, i.é, vigoram na ausência de disciplina diversa na legislação especial.

Partes na locação são o locador e locatário (nas locações de imóveis urbanos empregam-se, igualmente, senhorio e inquilino). O locador não precisa ser proprietário da coisa, basta que seja possuidor, com direitos de uso e gozo.

O adquirente da coisa, por ato inter vivos só é obrigado a respeita a locação se houver previsão contratual e se o contrato tiver sido levado a registro (CC 576, § 1º). A locação por prazo determinado transmite-se aos herdeiros das partes (CC 577) (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 11.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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