sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 636, 637, 638 - Continua - Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 636, 637, 638 - Continua
Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo IX – Do Depósito -
(art. 627 a 652) Seção I – Do Depósito voluntário –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 636. O depositário, que por força maior houver perdido a coisa depositada e recebido outra em seu lugar, é obrigado a entregar a segunda ao depositante, e ceder-lhe as ações que no caso tiver contra o terceiro responsável pela restituição da primeira.

Na escola de Nelson Rosenvald, o depositário não responderá pelos casos de força maior, quando o fato for devidamente comprovado (CC 642). Aqui, segue-se a regra geral do direito das obrigações pela qual o devedor se exonerará de tal responsabilidade, exceto quando expressamente tenha convencionado que assumiria os riscos de evento a ele inimputável (CC 393).

Força maior é o evento externo ao agente, de caráter inevitável. Não mais avulta a distinção com o fortuito, pois o parágrafo único do CC 393, assemelha-os em suas consequências, na diretriz da operabilidade. A título ilustrativo, haveria força maior na perda do objeto depositado em razão de uma catástrofe natural; de uma patologia incontrolável ou de uma guerra.

Ocorrendo perda da coisa em virtude do imponderável, caso tenha sido entregue outro objeto em reposição – quando for possível -, obviamente caberá ao depositário o dever de guarda e diligência ordinários com a obrigação de restituir ao tempo avençado.

Mas não é só. Segundo a parte final do dispositivo, confere-se ao depositante a posição de sub-rogado nos créditos obtidos pelo depositário em face de terceiros responsáveis pela restituição dos valores relacionados ao objeto originário, que se perdeu.

Portanto, traçando um paralelo com as hipóteses formuladas para a perda do objeto no usufruto (CC 1.407 a 1.409), temos que o depositante fará jus ao valor do seguro contratado pelo depositário, bem como à quantia consequente à desapropriação do bem depositado e à indenização paga pelo terceiro que culposamente destruiu o objeto. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 663 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Com o apoio de alguns nomes no Direito Civil, a doutrina de Ricardo Fiuza cita que apoiado na regra do CC 642, que isenta o depositário de responder pelos casos de força maior, o artigo sob exame prevê que, se “a coisa depositada se perdeu por fato inimputável ao depositário” (Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 16. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, 3 – Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, p. 296, este é obrigado a entregar a segunda ao depositante, “pois que não pode locupletar-se com a sua retenção indevida” (Caio Mário da Silva Pereira), Instituições de direito civil, 10. ed., Rio de Janeiro, forense, 1996, v. 3, p. 232). * Lembrar que a lei obriga depositário “entregar ao depositante aquilo que (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o fato de terceiro, inevitável e imprevisível que leva à perda da coisa é considerado fato de força maior. Pode ser furto, roubo, acidente. Em qualquer desses casos, pode o depositário receber outra coisa em caráter indenizatório, notadamente dinheiro, como ocorre se o evento estiver acobertado por contrato de seguro. Qualquer que seja o evento e a coisa dada em substituição à que havia sido depositada, faz jus o depositante a recebê-la. o recebimento da coisa dada em substituição não exonera nem o terceiro nem o depositário pelos prejuízos sofridos pelo depositante, para cuja apuração deve-se levar em conta o valor do bem que recebeu em substituição. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 29.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 637. O herdeiro do depositário, que de boa-fé vendeu a coisa depositada, é obrigado a assistir o depositante na reivindicação, e a restituir ao comprador o preço recebido.

Seguindo na pauta de Rosenvald, a morte acarreta a transmissão do patrimônio do de cujus (CC 1.784), provocando a assunção pelos herdeiros de todas as obrigações que não detenham caráter intuitu personae. Assim, por mais que o contrato de depósito possua origem personalíssima, a obrigação de restituir recai sobre os herdeiros do depositário. Raciocínio contrário esvaziaria o instituto, com total aniquilação do princípio da segurança jurídica e lesão à confiança e legítima expectativa do depositante, além de implicar apropriação indébita.

Todavia, muitas vezes o depósito poderá ser celebrado sem publicidade ou apenas verbalmente, não havendo possibilidade de o herdeiro saber que a coisa que lhe fora transmitida a título de sucessão era proveniente do referido contrato. Em tais casos, qualquer alienação que realize será pautada pela boa-fé – aqui em sua acepção subjetiva -, posto ser ela praticada na ignorância quanto à real titularidade da coisa negociada.

Como saída para o impasse criado entre a lesão ao patrimônio do depositante e a tutela da boa-fé do herdeiro alienante, o legislador propõe uma solução intermédia que não penalize excessivamente o alienante e possibilite ao depositante a recuperação da coisa.

Assim, o herdeiro do depositário deverá assistir o depositante no processo de reivindicação da coisa perante o terceiro. nessa modalidade de intervenção de terceiros (CPC 119), o assistente (herdeiro) terá interesse jurídico em que o assistido (depositante) vença a demanda, pois a relação jurídica da qual aquele é parte (compra e venda com o réu) será atingida pela sentença que vier a ser proferida entre o assistido e a parte contrária. O assistente produzirá provas e praticará atos processuais que sejam benéficos ao assistido.

Se a presumida boa-fé objetiva não for elidida pelo depositante, será o herdeiro apenas compelido a restituir ao adquirente o preço que este pagou pelo bem alheio, pois a coisa foi recuperada pelo real proprietário e o ordenamento não admite o enriquecimento injustificado. Apesar da omissão do Código Civil, provada a má-fé do herdeiro, ou seja, se sabia que a coisa era alheia e mesmo assim a negociou com terceiro, será responsabilizado eventualmente por perdas e danos, tanto pelo depositante como perante o adquirente, além de eventualmente sofrer as sanções do depositário infiel.

Tendo o herdeiro doado o bem ao terceiro, constatada a sua boa-fé, nada indenizará ao adquirente, lembrando-se de que não se pode reclamar a evicção nos contratos gratuitos (CC 447), pois o donatário não sofre prejuízo, mas apenas deixa de obter uma vantagem.

Por fim, caso o bem alienado tenha se perdido ou inutilizado, sem culpa do terceiro adquirente, caberá ao herdeiro indenizar o depositante pelo seu valor. Evidentemente, conhecendo o adquirente a real situação do bem, também se responsabilizará pela indenização. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 664 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na Doutrina apresentada por Fiuza, sucedendo o falecimento do depositário, é transmitida aos seus herdeiros a obrigação de restituir a coisa depositada quando reclamada pelo depositante. Entretanto, se qualquer deles, estando de boa-fé, alienar a coisa a terceiro, será aquele obrigado a assistir o depositante na ação demandada contra o adquirente, além de restituir a este o preço por ela pago, ‘o que é evidente, pois não lhe pertencendo bem alisado, não há justificativa para conservar o preço” (Silvio Rodrigues, Direito civil, 27 .ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3. Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 263.

O dispositivo tem incidência sobre o herdeiro de boa-fé, que agiu sem qualquer intenção de prejudicar o depositante, porquanto unicamente a ele se refere. Logo, se o ato praticado estiver eivado de má-fé, além de assistir ao depositante na ação judicial restituir o preço acolhido, o herdeiro do depositário responderá pelas perdas e danos decorrentes da alienação por ele efetuada.’

Finalmente, “se a coisa depositada já não mais existe, por ter sido consumida de boa-fé pelo comprador, o herdeiro indenizará o depositante, o mesmo ocorrendo-se a tiver consumido em seu uso pessoal” (José Lopes de Oliveira, Contratos, 1. ed., Recife, Livrotécnica, 1978, p. 172). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 341 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo cuida da venda a non domino feita de boa-fé pelo herdeiro do depositário que, sem ter conhecimento de que o bem é objeto de contrato de depósito, julga que o mesmo é parte de sua herança e o aliena a terceiro o negócio é, a princípio, nulo. Deve-se observar, no entanto, o Caput do CC 1.268, que valida a tradição a adquirente de boa-fé que se segue à oferta pública de acordo coma teoria da aparência.

Assim, desde que a venda a non domino da coisa depositada não esteja acobertada pela teoria da aparência, deve o alienante de boa-fé assistir o depositante na reivindicação e restituir do comprador o preço que recebeu pela alienação. Por ter agido de boa-fé na alienação e sendo o erro escusável, não estará o herdeiro obrigado ao pagamento de outros prejuízos do depositante. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 29.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 638. Salvo os casos previstos nos arts. 633 e 634, não poderá o depositário furtar-se à restituição do depósito, alegando não pertencer a coisa ao depositante, ou opondo compensação, exceto se noutro depósito se fundar.

No diapasão de Nelson Rosenvald, quando cogitamos dos requisitos subjetivos para dar ou receber em depósito, devemos pensar na capacidade de fato ara a prática de negócios jurídicos, ou na superação da incapacidade, pelos institutos da representação e assistência. Todavia, não se exige do depositante a qualidade de proprietário da coisa dada em depósito, sendo suficiente que a sus posse seja legítima.

Portanto, um locatário, comodatário ou usufrutuário são pessoas legitimadas a realizar o contrato de depósito, quando necessitem que o bem recebido em razão de uma relação e direito obrigacional ou real seja custodiado por um depositário. Em tais situações, haverá uma ampliação no desdobramento da posse, na medida em que o depositário será o possuidor direito e o depositante e o proprietário serão possuidores indiretos.

Sendo assim não poderá o depositário negar a restituição a pretexto da eventual falta de titularidade sobre a coisa por parte do depositante. O dispositivo abre exceção para as hipóteses em que o depositário tenha conhecimento da pendencia de execução sobre a coisa ou for ela judicialmente embargada. Certamente, são situações em que não seria aconselhável a restituição, sob pena de ser responsabilizado pelo credor do depositante (CC 312).

Outrossim, não poderá o depositário elidir a obrigação de restituir sob o argumento da existência de um crédito que lhe é devido pelo depositante, insinuando o instituto da compensação. Ora, o CC 373, II, é explícito ao vedar a compensação quando um dos débitos seja proveniente de contrato de depósito. De fato, justifica-se a inadmissibilidade da compensação por ser fundamental que o depositário restitua a coisa, além do que inexiste aqui a fungibilidade das dívidas – não só fungíveis, individualmente, mas entre si -, requisito para qualquer compensação, a teor do CC 369. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 665 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na Doutrina de Ricardo Fiuza, uma vez reclamado o depósito, deverá o depositário restitui-lo ao depositante. As exceções a este comando encontram-se expressa e taxativamente previstas no CC 633, de modo que nenhum outro motivo permitirá ao depositário recusar-se a devolver o bem.

Desse modo, a lei proíbe ao depositário subtrair-se à restituição da coisa, pelas razões enunciadas: 1. Não pode isentar-se pela escusa de não pertencer o bem ao depositante “porque ele não tem poderes para defender direitos de terceiros” (Washington de Barros Monteiro. Curso de direito civil, 4. ed., São Paulo. Saraiva, 1965, v. 2 – Direito das obrigações, p. 235). Porém, se o depositário tiver motivos razoáveis para suspeitar de que a coisa depositada foi dolosamente obtida pelo depositante, pertencendo a outrem, não será obrigado a restituí-la, como observado pelo CC 633, infine. 2 (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 341 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo o mestre Marco Túlio de Carvalho Rocha, o depositante não precisa ser o proprietário da coisa, por esta razão, não pode o depositário recusar-se a devolver-lhe o bem somente por não ser ele o proprietário ou sob a alegação de compensação  por eventuais créditos que possuir junto ao depositante, exceto se os referidos créditos sejam relativos ao depósito, quando ele, depositário, passa a ter o direito de retenção (CC 644). O direito de retenção pode ser exercido por dívidas do mesmo depositante relativas a outro objeto. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 29.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 633, 634, 635 - Continua - Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 633, 634, 635 - Continua
- Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo IX – Do Depósito -
(art. 627 a 652) Seção I – Do Depósito voluntário –
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Art. 633. Ainda que o contrato fixe prazo à restituição, o depositário entregará o depósito logo que se lhe exija, salvo se tiver o direito de retenção a que se refere o art. 644, se o objeto for judicialmente embargado, se sobre ele prender execução, notificada ao depositário, ou se houver motivo razoável de suspeitar que a coisa foi dolosamente obtida.

Como aponta Nelson Rosenvald, mais uma vez o legislador afirma que nos contratos de depósito o prazo é assinalado em favor do credor, excetuando-se a regra geral do CC 133. Destarte, mesmo que o contrato possua termo, nada impedirá a pretensão antecipada à restituição da coisa ao depositante, pois nem sempre a exigibilidade do crédito coincide com o vencimento normal da obrigação.

Todavia, o dispositivo descreve quatro situações excepcionais – que na verdade se resumem a três -, em que justificadamente o depositário poderá manter a posse direta da coisa.

Primeiro, quando seja titular de direito de retenção da coisa em razão de dispêndio com valores líquidos de conservação do bem depositado ou prejuízos que dele advierem (CC 643 e 644).

Segundo, quando o bem depositado se tornar litigioso, em razão de constrição sobre ele efetuada. Nesse caso, o depositário que foi interpelado a respeito do fato ficará atento à lição do CC 312, evitando a restituição da coisa ao depositante, sob pena de se responsabilizar perante os credores de seu credor.

Terceiro, nos casos em que houver suspeitas da origem ilícita do bem depositado, caberá ao depositário comunicar à autoridade policial o fato, pois os seus deveres indisponíveis perante a sociedade se sobrepõem ao atendimento das obrigações contratuais perante o depositante.

De forma positiva, o legislador inovou ao alterar a redação da norma, adotando a expressão “dolosamente obtida”, em vez de “furtada, ou roubada”, pois é possível a prática de outras modalidades de ilícito a partir de uma conduta dolosa (v.g., estelionato, apropriação indébita). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 662 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 28/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Existe um histórico, antecedendo o comentário de Ricardo Fiuza, onde o presente dispositivo foi objeto de emenda, por parte da Câmara dos Deputados, no período inicial de tramitação do projeto, para aprimorar a linguagem e atender a doutrina. A emenda proposta teve em vista que a origem criminosa da coisa pode estar não só em furto, ou roubo, mas em qualquer outro fato criminoso, como a apropriação indébita e o estelionato. Daí a expressão “dolosamente obtida”, agora adotada. Trata-se, em resumo, de mera repetição do CC 1.268 de 1916, com essa melhoria.

Segundo a doutrina, em regra, ainda que celebrado por prazo determinado, o depositário deverá restituir o objeto depositado assim que reclamado pelo depositante, mesmo antes do vencimento do prazo estipulado. Isto pontue o depósito é realizado, como já referido, sempre em favor deste último, cabendo-lhe, pois, escolher o momento certo em que se extinguirá o aludido contrato.

Entretanto, a esta obrigação do depositário, admitem-se algumas exceções: primeiro, se o depositário tiver o direito de retenção a que se refere o CC 644, o qual será examinado oportunamente; segundo, se o objeto estiver judicialmente embargado, “assim entendida qualquer forma de apreensão judicial, como o arresto, sequestro ou a penhora” (Ad Peneira de Queiroz, Direito civil: direito das obrigações, Goiânia, Editora Jurídica IIEPC, 1999, p. 163); terceiro, se sobre o objeto depositado pender execução, “tendo o depositário sido notificado para não abrir mão do bem” (Arnoldo Wald, Curso de direito civil brasileiro: obrigações e contratos, 14.ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000, p. 449); quarto, se houver razoável e fundamentada suspeita de que o objeto foi obtido por meio criminoso pelo depositante; e quinto, se noutro depósito a coisa depositada se fundar (CC 638).

O CC/2002, além de alterar a redação do art. 1.268, acrescentou a esse dispositivo mais uma hipótese de exonerar-se o depositário em caso de sua recusa a restituir a coisa depositada. Tal hipótese consiste no fato de ele possuir o direito de retenção do bem até o pagamento dos encargos devidos pelo depositante. Embora não previsto no CC de 1916, art. 1.268, este já constituía um motivo de recusa à restituição, sendo que referido pelo art. 1.279 do mesmo diploma.

Agora, com a complementação do dispositivo em exame, note-se que tal enumeração pretendeu ser taxativa, de modo que, fora os casos aqui expressamente previstos, não pode o depositário recusar-se a devolver a coisa que lhe foi confiada. Essa é a premissa. Entretanto, há ainda a ressalva à restituição do depósito prevista no CC 638, quando noutro depósito se fundar. Para a melhor compreensão sistêmica, cremos conveniente a remissão a este último dispositivo, tal como feia em relação ao CC 644. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 339-340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Conforme esclarece Marco Túlio de Carvalho Rocha, o depósito pressupõe a confiança do depositante na devolução da coisa pelo depositário. Em regra, o depósito é realizado no interesse do depositante e, por essa razão, mesmo que o contrato seja por prazo determinado, pode o depositante reclamar a coisa depositada a qualquer tempo. Em tal caso, havendo interesse do depositário no depósito a prazo fixo, faz jus ao recebimento por todo prejuízo que sofrer em razão do contrato.

O depositário somente pode negar-se a devolver a coisa ao depositante se este não lhe pagar qualquer quantia que lhe deva (CC 644), se houver embargo judicial, inclusive execução notificada ao depositário, ou se houver fundada suspeita de que a coisa foi dolosamente obtida.

A não restituição da coisa pelo depositário sujeita-o ao pagamento de perdas e danos (CC 652). Embora a CF, 5º, LXVII a permita, a prisão do depositário infiel foi considerada revogado pelo STF, em razão da adesão do Brasil ao Pacto de San José da Costa Rica (RE 466343, HC 87585, julgados em 3.12.08) (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 28.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 634. No caso do artigo antecedente, última parte, o depositário, expondo o fundamento da suspeita, requererá que se recolha o objeto ao Depósito Público.

Nessa norma, como comenta o professor Nelson Rosenvald, o legislador complementa o exame do dispositivo pregresso. Assim, se o depositário suspeitar objetivamente da origem ilícita da coisa móvel depositada, não apenas se recusará a restituí-la ao depositante como também solicitará o recolhimento do objeto ao depósito público.

Vê-se que o depositário deverá expor o fundamento da suspeita perante o magistrado, não só para demonstrar com certa segurança a veracidade de suas alegações como ainda para se exonerar de eventual responsabilidade criminal e cível por coautoria ou participação.

A nosso viso, a propositura de ação de consignação em pagamento (CC 335 e CPC 539), será a melhor forma de o devedor se desvincular de responsabilidade, tanto na hipótese em apreço como nas situações alinhavadas no artigo antecedente. Para tanto, basta conjugar os CC 633 e 634, com o CC 635, principalmente pela inclusão do termo “outrossim”. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 662 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 28/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como sugere a doutrina, apresentado por Ricardo Fiuza, no caso de o depositário possuir razoável e fundamentada suspeita de que o objeto depositado fora obtido dolosamente pelo depositante, a lei confere àquele o poder-dever de recusar-se a restituí-lo a este último e requer, após expor os fatos que fundamentem a sua desconfiança, seja providenciado o recolhimento do objeto ao Depósito Público.

É importante salientar que, “embora a lei não exija prova indubitável de que a coisa foi subtraída a seu dono, ela requer, pelo menos, que a suspeita seja razoável” (Silvio Rodrigues, Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 27.ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3, p. 264), buscando, assim, evitar a submissão do depositante a constrangimentos injustos e desnecessários. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 339-340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, se o depositário suspeitar que a coisa foi obtida pelo depositante por meios ilícitos, o depositário requererá seu depósito em estabelecimento público. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 28.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 635. Ao depositário será facultado, outrossim, requerer depósito judicial da coisa, quando, por motivo plausível, não a possa guardar, e o depositante não queira recebe-la.

Como esclarece o mestre Nelson Rosenvald, além das hipóteses do CC 633, será viável o exercício da ação de consignação em pagamento pelo depositário nos contratos sem prazo, quando houver justificativa razoável no sentido da impossibilidade de guarda a coisa em razão de evento superveniente à contratação. Outrossim, exige-se a prova da recusa do credor à devolução antecipada.

Seriam casos de onerosidade excessiva perante o depositário que acarretariam a resolução antecipada, porém justificada, da relação contratual, sem que se possam exigir perdas e danos do devedor. ilustrativamente, uma grave doença do depositário ou de familiar; a necessidade de uma viagem urgente; algum dano ao local em que se deu o depósito, impossibilitando a adequada conservação do bem móvel.

O artigo é necessário, pois a desconstituição da obrigação pelo devedor mediante consignação seria restrita às hipóteses do CC 335. Porém, nada menciona o referido dispositivo acerca da impossibilidade superveniente do devedor em realizar o pagamento.

Mesmo nos contratos de depósito com termo, nos quais o prazo é assinalado em favor do credor, e qualquer restituição antecipada implica inadimplemento absoluto, será possível ao depositário demonstrar a ocorrência do evento superveniente que justifique a resolução antecipada do contrato. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 663 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 28/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo na esteira do relator Ricardo Fiuza, em regra, deve o depositário devolver o objeto assim que reclamado, mesmo que o prazo fixado ainda não se tenha ultrapassado. Porém, a lei faculta ao depositário, desde que haja motivo plausível para não mais continuar com a guarda da coisa, devolvê-la ao depositante e, no caso de sua recusa em recebe-la, requerer seja providenciado o seu depósito judicial.

Anote-se, porém, indispensável a razoabilidade do motivo determinante que leve o depositário a pretender exonerar-se das responsabilidades pelo depósito antes admitido, “como, por exemplo, moléstia grave, viagem que ele tenha de empreender, serviço militar etc.” (Washington de Barros Monteiro. Curso de direito civil: direito das obrigações, 4.ed., São Paulo, Saraiva, 1965, v. 2, p. 236). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 340 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Leciona Marco Túlio de Carvalho Rocha, que se o depositante não requerer a coisa ao término do prazo ou, não havendo prazo, quando intimado pelo depositário, este poderá requerer o depósito judicial da mesma se não for do seu interesse mantê-la sob sua custódia. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 28.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 630, 631, 632 - Continua - Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 630, 631, 632 - Continua
- Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo IX – Do Depósito -
(art. 627 a 652) Seção I – Do Depósito voluntário –
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Art. 630. Se o depósito se entregou fechado, colado, selado ou lacrado, nesse mesmo estado se manterá.

Na lógica apontada por Nelson Rosenvald, se a obrigação principal do depositário se traduz na restituição da coisa em perfeito estado de conservação, preservando-se exatamente as condições que ela possuía ao tempo da tradição, é elementar que, quando da entrega de objeto fechado, colado, lacrado ou selado, retorne ele intacto ao poder do depositante.

Portanto, salvo autorização expressa do depositante, caberá ao depositário completo respeito ao dever de sigilo, responsabilizando-se civilmente pela inexecução do dever de abstenção pelo simples fato de abrir a caixa ou lacre em que estava depositado o objeto, independentemente de qualquer avaria ou dano que concretamente a coisa tenha sofrido.

O sigilo, ou segredo, situa-se em uma esfera menor que a da própria intimidade e compreende a prerrogativa de manter indevassadas as comunicações da pessoa. São diversos os aspectos da vida pessoa, familiar ou profissional da pessoa em que não se deseja intrusão por parte de terceiros (privacy ou right to be alone). Assim, o desrespeito ao direito fundamental à inviolabilidade da intimidade e da vida privada (CF, 5º, X), também direito da personalidade do depositante (CC 21), só será facultado caso o dano seja justificado pela tutela do próprio depositário ou da ordem pública (v.g., dúvida séria sobre a segurança ou salubridade do bem depositado). Enfim, cuida-se de hipóteses de ponderação de direitos fundamentais, resolvidos à luz do princípio da proporcionalidade. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 660 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como aponta Ricardo Fiuza em sua doutrina, das obrigações de guarda, conservação e posterior restituição da coisa depositada intacta resulta o comando do CC 630.

Assim, salvo autorização expressa do depositante, se o depósito se entregou fechado, colado, selado ou lacrado, deve o depositário “respeitar o segredo da coisa sob sua guarda” (Maria Helena Diniz, curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, 16. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, v. 3, p. 296) e “ter não só a delicadeza moral, como a obrigação jurídica, de conservá-lo nesse estado” (Washington de Barros Monteiro. Curso de direito civil: direito das obrigações, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 1965, v. 2., p. 234), sob pena de presunção de culpa do depositário e consequente responsabilidade deste por eventuais perdas e danos.

Cabe lembrar, ademais, que devidamente autorizado pelo depositante, poderá o depositário abrir o depósito que lhe foi entregue fechado. Entretanto, ainda assim, estará ele obrigado a guardar segredo da coisa, exceto em caso de ato ilícito. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 338 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 27/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Concluindo com Marco Túlio de Carvalho Rocha, o depositário obriga-se a devolver ao depositante a coisa no estado em que a recebeu. Se a coisa estiver lacrada, deve devolvê-la lacrada, salvo a ocorrência de caso fortuito ou força maior, como a determinação do Poder Público para que a embalagem seja aberta. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 27.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 631. Salvo disposição em contrário, a restituição da coisa deve dar-se no lugar em que tiver de ser guardada. As despesas de restituição correm por conta do depositante.

Segundo leciona Nelson Rosenvald, a norma trata de dois temas ligados à restituição do bem: o local da devolução e a titularidade das despesas decorrentes da entrega da coisa. A matéria não era versada no CC de 1916, daí a oportunidade de o legislador se manifestar.

Em regra, o local do pagamento será o domicílio do devedor, ou seja, as obrigações são quesíveis (CC 327). Excepciona-se a regra geral quando as partes convencionarem diversamente, ajustando obrigações portáveis, ou quando a própria lei ou as circunstâncias firmarem a necessidade do pagamento em local diverso ao domicílio do devedor.

Em razão da própria natureza da obrigação do depositário de guardar a coisa com toda a diligência e cuidado – e, de modo geral, graciosamente -, seria exagerado também impor a ele a obrigação de transportar o bem a qualquer outro local, até mesmo a seu próprio domicílio, pois não é necessário que o local do depósito coincida com o local em que o depositário estabeleça a sua vida ou os seus negócios.

Portanto, mesmo tratando-se da restituição e bens móveis, o legislador cuidou de disciplinar a matéria de forma semelhante ao que é preconizado para as obrigações de pagamento envolvendo bens imóveis (CC 328), prevalecendo o local em que a coisa está situada.

No que tange às despesas provenientes da restituição da coisa, serão elas debitadas ao depositante. Aqui também se preserva o princípio do equilíbrio ou justiça contratual, haja vista que o negócio jurídico foi realizado objetivando precipuamente a satisfação do credor, não sendo razoável ampliar os sacrifícios do depositário a ponto de ele ter de responder pelo transporte e perfeito acondicionamento da coisa móvel.

Caso o credor se recuse a receber a coisa no lugar em que está depositada, ou então se negue a pagar os custos de restituição, a fim de se exonerar de eventual responsabilidade pela mora, incumbirá ao depositário a promoção da consignação em pagamento, nas formas dos incisos I e II do CC 335. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 660-661 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Uma das obrigações do depositário, conforme aponta Fiuza, é a de restituir a coisa depositada assim que reclamada pelo depositante. O codificador de 1916 silenciou quanto ao local onde a coisa deveria ser restituída. A doutrina, entretanto, já consagrou que a coisa deverá ser devolvida no local combinado ou, na falta de estipulação, entretanto, já consagrou que a coisa deverá ser devolvida no local combinado ou, na falta de estipulação, no lugar do depósito. O CC/2002 corrige a omissão com o presente artigo, pelo qual se determina que a restituição da coisa, salvo disposição em contrário, deverá se dar no local em que tiver de ser guardada.

Por fim, acrescenta o novel dispositivo que as despesas provenientes da restituição da coisa deverão correr por conta do depositante. Isto porque o contrato de depósito é negócio feito no interesse exclusivo do depositante, sendo, portanto, inadmissível exigir-se que o depositário arque com as despesas provenientes da restituição do objeto. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 338 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 27/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em regra, conclui Marco Túlio de Carvalho Rocha, o depósito é feito e devolvido no mesmo lugar. Se houver determinação para que seja a coisa transportada a outro lugar para a entrega, as despesas de transporte correm por conta do depositante, salvo estipulação em sentido contrário. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 27.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 632. Se a coisa houver sido depositada no interesse de terceiro, e o depositário tiver sido cientificado deste fato pelo depositante, não poderá ele exonerar-se restituindo a coisa a este, sem consentimento daquele.

Na cartilha de Nelson Rosenvald, a exemplo do que ocorre com a estipulação em favor de terceiros (CC 436 e 438), é facultado ao depositante efetuar a entrega da coisa ao depositário no interesse de terceiros e não em proveito próprio. Temos aqui uma espécie de derrogação do princípio da relatividade contratual, pois o depositário assumirá obrigações perante uma pessoa que não integrou a relação negocial. A hipótese será vista com nitidez nos casos em que o depositante se apresenta como um administrador de bens alheios, cientificando o depositário da sua condição.

A norma é clara ao impor ao depositário a obrigação de obter o consentimento do terceiro, mesmo quando pretenda restituir o bem ao depositante. A falta de autorização impõe a obrigação do depositário de indenizar o terceiro. a não ser que o depositante se reserve o direito potestativo de substituí-lo, independentemente de sua anuência ou do depositário (CC 438). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 661 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Atenção à observação aplicada na doutrina de Ricardo Fiuza ‘na obrigatoriedade de o depositário restituir a coisa depositada sofre as restrições elencadas pelo CC 633, (sombreado pelo art. 1.216 do CC de 1916), quando excetuam-se o embargo judicial do bem, a constrição judicial sobre a coisa e a suspeita motivada de o bem depositado ter sido obtido por meio criminoso, e, ainda a do CC 644 (motivado no art. 1.279 do CC de 1916), correspondente ao direito de retenção do depósito’. Ressalvadas essas hipóteses para a recusa do depositário em restituir a coisa sob depósito, e assente a obrigação de restituir como regra, caso haja, porém, da restituição condicionada. Tal ocorre quando o depósito é feito no interesse de terceiro. tenha-se o exemplo clássico de o depositante ser procurador ou administrador dos bens e interesse de terceiros, procedendo, nessa qualidade, o depósito do bem. E certo, ademais, que assumindo o depositário as obrigações concernentes à natureza do contrato, e baste ciente do interesse de terceiro (podendo ser este proprietário ou não do bem), não poderá exonerar-se da obrigação de restituir sem que, previamente, aquele a cujo favor operou-se o depósito preste a sua devida e necessária anuência.

A única hipótese de exonerar-se o depositário da obrigação sem o consentimento do terceiro interessado encontra-se prevista no CC 635, fazendo-se mister, porém, haja “boa razão para romper o contrato, tal como a ocorrência de fato que obrigue o depositário a viajar ou que, de qualquer maneira, torne impossível ou penosa a guarda da coisa” (Silvio rodrigues, Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3, p. 261) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 339 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 27/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Ratificando com Marco Túlio de Carvalho Rocha, há situações em que o principal interessado no depósito da coisa é terceiro e não o próprio depositante. Isto ocorre, por exemplo, quando o depósito da coisa é exigido por terceiro como garantia de uma obrigação. A coisa depositada é, por exemplo, caucionada se o depositário tiver conhecimento de que o depósito é feito no interesse de terceiro, não pode devolver a coisa ao próprio depositante sem a autorização do terceiro interessado, sob pena de responder por eventual prejuízo que este vier a sofrer em razão do ato. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 27.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 26 de novembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 627, 628, 629 - Continua - Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 627, 628, 629 - Continua
- Do Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo IX – Do Depósito -
(art. 627 a 652) Seção I – Do Depósito voluntário –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto móvel para guardar, até que o depositante o reclame.

Como esclarece Nelson Rosenvald, o depósito é o negócio jurídico bilateral pelo qual uma pessoa (depositante) entrega à outra (depositário) coisa móvel infungível, a fim de que esta possa guarda-la e restituí-la quando solicitado. Destarte, temos uma obrigação de custódia da coisa, de natureza temporária.

O dispositivo em exame retrata o contrato de depósito convencional, ou voluntário. O verbo guardar é a marca dessa relação jurídica. O depositário recebe o bem móvel para satisfazer o interesse precípuo do depositante, na conservação da coisa até o momento da restituição. De modo diverso, nos contratos de locação e comodato, a guarda apenas é pressuposto para que os seus titulares possam usar e fruir o bem contratado, faculdades essas que são vedadas ao depositário, exceto sob autorização do depositante, na forma do CC 640.

Contudo, apesar de certa variação doutrinária, consideramos o depositário como possuidor direto do bem móvel – e não mero detentor -, na medida em que o desdobramento da posse requer uma relação jurídica de direito real ou obrigacional, como no depósito. O depositário não mantém a coisa consigo a título de permissão ou detenção (CC 1.208), tampouco é subordinado do depositante (CC 1.198). O fato de não usar ou fruir a coisa, porém apenas conservá-la, não afasta a prática de atos possessórios, pois, sendo o possuidor aquele que exercita de fato algum dos poderes do proprietário (CC 1.196), a sua condição de possuidor será captada pela possibilidade de manejar ações possessórias na defesa da coisa em face de esbulhos, turbações ou ameaças.

Aliás, o depósito voluntário é relação intuitu personae, pois o dever de guarda é atribuído a alguém, em regra, em razão de uma especial confiança quanto aos atos conservatórios da coisa. Portanto, o possuidor direto poderá determinar que a guarda imediata fique a cargo de detentores (v.g., funcionários), mas não poderá transferir a posse a terceiros, exceto com a autorização do depositante.

O contrato de depósito convencional recai somente em bens móveis corpóreos e infungíveis, que não podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade (CC 85). Tratando-se de coisas fungíveis, estaremos diante do depósito irregular, que será disciplinado na forma do mútuo (CC 645). Não se entende a razão pela qual o legislador vedou o depósito de bens imóveis, até mesmo pela prática habitual do juiz de nomear depositário para os bens de raiz que servem de objeto a qualquer execução (CPC/1973, art. 659, § 5º, correspondendo no CPC/2015, ao art. 845), a quem incumbirá a conservação de bens penhorados, arrestados, sequestrados ou arrecadados.

O depósito voluntário é contrato real, eis que só se aperfeiçoa com a entrega da coisa. Cuida-se a tradição de pressuposto de existência, assim como o observado para os contratos de comodato e mútuo. Como consequência, será contrato em regra unilateral, já que a única obrigação será do depositário, qual seja, conservar e restituir. Acidentalmente, converter-se-á em contrato bilateral, ocorrendo as hipóteses do CC 643. Em princípio é contrato gratuito, mas poderá resultar oneroso (CC 628) com a atribuição de contraprestação ao depositante, como se percebe das necessidades do tráfego jurídico (v.g., depósito de pertences em casa noturna). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 657-658 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como explica Ricardo Fiuza em sua doutrina, o depósito pode ser conceituado como o contrato pelo qual uma determinada pessoa, denominada depositário, recebido de uma outra, depositante, um certo objeto móvel para guardar gratuita e temporariamente e, quando reclamado, restituí-lo ao depositante, como deflui da lição de Ad Peneira de Queiroz (Direito civil: direito das obrigações, Goiânia, Editora Jurídica IEPC, 1999, p. 160).

Convém lembrar, ainda, a clássica definição: “É negócio feito no interesse do depositante e, com efeito, surge no campo do direito como um favor prestado a um amigo (um office d’ami), para quem, com zelo, se guarda um objeto por ele entregue” (Silvio Rodrigues, Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3, p. 256).

As suas principais características estão presentes na reportada definição; assim, o depósito é contrato unilateral, gratuito, real, intuitu personae, não solene e temporário. Silvio Rodrigues, Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3; Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, 16.e d., São Paulo, Saraiva, 2001; Arnoldo Wald, Curso de direito civil brasileiro; obrigações e contratos, 14. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2000; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil, 10. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1996, v. 3; José Lopes de Oliveira, Contratos, Recife, Livrotécnica, 1978; Ari Peneira de Queiroz, Direito civil; direito das obrigações, Goiânia, Editora Jurídica IEPC, 1999. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 336 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como especifica Marco Túlio de Carvalho Rocha, o depósito é o contrato mediante o qual uma pessoa (depositário) recebe de outra (depositante) um objeto móvel, e compromete-se a guarda-lo até que esta o reclame.

É contrato real, de duração e intuitu personae. É unilateral quando gratuito e bilateral se oneroso (a gratuidade é presumida: CC 628).

O depositante não precisa ser proprietário da coisa, basta que detenha a posse. O depositário tem que ser capaz. Se se tornar incapaz no curso do contrato, seu representante diligenciará para devolver a coisa (CC 641). (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 26.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 628. O contrato de depósito é gratuito, exceto se houver convenção em contrário, se resultante de atividade negocial ou se o depositário o praticar por profissão.

Parágrafo único. Se o depósito for oneroso e a retribuição do depositário não constar de lei, nem resultar de ajuste, será determinada pelos usos do lugar, e, na falta destes, por arbitramento.

Conforme já observado pelo mestre Nelson Rosenvald, em regra o contrato de depósito será marcado pela gratuidade. O contrato gratuito ou benéfico é aquele em que não há prestações recíprocas, pois, a vantagem do depositante não implica correspondente sacrifício, nada devendo ao depositário. Normalmente, será aquele favor de um amigo a outro, que lhe impõe zelo e cuidado na conservação de um bem, sem que peça nada em retribuição.

Contudo, em duas hipóteses o contato será oneroso. Primeiro, quando houver cláusula contratual fixando retribuição pecuniária para o depósito. Assim, haverá uma imediata conexão entre prestação e contraprestação.

Outrossim, a exigência de uma remuneração resulta da própria natureza do negócio jurídico. Essa inovação do Código Civil nada mais é que um retrato da sociedade contemporânea, na qual frequentemente o depósito aparece associado ao fornecimento de produtos e serviços (v.g., estacionamento em shopping, guarda de objetos em cofres de hotéis), sendo usual que dessas atividades, normalmente desenvolvidas por empresários, possam os depositários extrair vantagens econômicas.

Com a unificação das obrigações civis e empresariais no Código Civil de 2002, o legislador traz para o direito civil a natureza essencialmente remuneratória do depósito mercantil, sendo certo que no comércio qualquer atividade se torne objeto de remuneração, já que as trocas econômicas são a essência das relações contratuais.

O parágrafo único do CC 628 adere à diretriz da operabilidade, que permite que nos negócios jurídicos em que não se tenha determinado a remuneração (v.g., contrato verbal) possa o magistrado buscar os usos do local em que se contratou para definir o pagamento. Assim, no depósito de animais para rodeios no município de Barretos (SP), não será tarefa árdua ao magistrado a investigação dos padrões negociais para os aludidos contratos. Caso os usos do lugar não sejam identificados, ou mesmo não existam, o magistrado poderá arbitrar com base na sua percepção equitativa a respeito do que mais se aproximaria de um “preço justo” para aquela situação. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 658-659 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo a doutrina de Ricardo Fiuza, como sublinha o dispositivo em comento, o depósito voluntário é naturalmente gratuito, permitindo-se, porém, haja convenção no sentido de se estipular uma gratificação ao depositário, sem que tal ajuste deturpe a natureza do contrato.

A graciosidade é característica própria do contrato de depósito civil. O depósito mercantil, por sua vez, possui natureza essencialmente remuneratória. É o que exalta a doutrina: “No comércio, presume-se, pode o pagamento de comissão ao depositário, ainda quando não estipulada” (Washington de Barros Monteiro, Curso de direito civil; direito das obrigações, 4.ed., São Paulo, Saraiva, 1965, v. 2, p. 229-30). Assim, prevê o CC/2002 que o contrato de depósito é gratuito, exceto (...) se resultava de atividade negocial – como a guarda de dinheiro em banco – ou se o depositário o praticar por profissão – como a guarda de mercadorias em estabelecimentos especializados, ou em caso de convenção expressa em contrário. São as exceções previstas em lei à gratuidade, em regra, do contrato de depósito.

O parágrafo único estabelece, outrossim, que, em caso de depósito onerosa, desde que a retribuição do depositário não conste de lei nem de convenção ajustada entre as partes, essa retribuição será determinada n pelos usos do lugar, que se baseiam “na prática longamente observada determinadas relações (...) a praxe aceita unanimemente” (José ÁWSWéI, Novo dicionário jurídico brasileiro) 1984, p. 390, e, em sua falta, por arbitramento, que é estimativa feita por pessoa escolhida pelas partes para atribuir e fixar o valor pecuniário da retribuição cabível. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 337 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como mostra os ensinamentos de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo estabelece duas presunções relativas a respeito do contrato de depósito. A primeira, genérica, no sentido de presumi-lo gratuito; a segunda, que estabelece exceção à primeira, de que o contrato é oneroso se o depositário realizá-lo como parte de suas profissionais ou se relacionado a atividade negocial.

Uma vez que tais presunções são relativas, se o contrato for expresso quanto ao caráter gratuito ou oneroso do depósito vale o que estiver estipulado. A presunção relativa por desempenho de atividade em caráter profissional é razoavelmente clara: se alguém deixa seu veículo num estacionamento, deve pagar o respectivo preço, ainda que, ao deixar o veículo, não tenha procurado se inteirar do preço cobrado. A presunção de onerosidade quando se tratar de atividade negocial é menos clara. Ocorre, por exemplo, se um fornecedor de bebidas entrega um freezer a um revendedor. A presunção é de onerosidade; a gratuidade deve estar expressa no contrato. Já nos casos em que a onerosidade é presumida, cabe arbitramento judicial do preço, na falta de estipulação expressa. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 26.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 629. O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe pertence, bem como a restituí-la, com todos os frutos e acrescidos, quando o exija o depositante.

Conforme comentário de Nelson Rosenvald, cuidando-se o depósito de um contrato de duração, no qual a execução jamais será concomitante à contratação, todo o empenho do depositário será dirigido à guarda responsável da coisa. Atuará ele como bônus pater famílias, vale dizer como o protótipo de diligência exigido do cidadão médio, atento e dotado de ordinária inteligência, a fim de restituir a coisa infungível ao depositante.

Apesar de o Código se referir ao cuidado e diligência “que costuma com o que lhe pertence”, devemos perceber que, na hipótese de o depositário ser uma pessoa negligente e desidiosa, não poderá se servir de tais defeitos como padrão de conduta habitual para justificar a deterioração ou perda da coisa. Temos aqui parâmetros objetivos de comportamento leal e correto na custódia e conservação da coisa, conforme induz o princípio da boa-fé objetiva.

A redação do artigo afasta a incidência da regra geral do CC 392. Se em princípio aquele que não é favorecido pelo contrato gratuito só responderá por dolo, o mesmo não ocorre no contrato de depósito. Em outras palavras, mesmo que A faça um favor a B em guardar os seus objetos temporariamente, assumirá total responsabilidade pela sua destruição, mesmo diante de culpa levíssima, sendo a exclusão do dever de indenizar apenas factível em casos de força maior devidamente provados (CC 642).

A segunda parte da norma se refere à obrigação de restituir a coisa móvel quando o exija o depositante. Conforme a lição da Toeira Geral do Direito das Obrigações, “se a obrigação for de restituir coisa certa, e essa, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá [...]” (CC 238).

Aliás, não sendo o contrato fixado com termo, aplica-se o princípio da satisfação imediata (CC 331), sendo lícito ao credor exigir imediatamente a coisa, sendo possível a constituição do devedor em mora caso se recuse a restituir o bem após o transcurso de prazo razoável assinalado em interpelação (CC 397, parágrafo único). Não poderá o devedor (depositário) unilateralmente deliberar pela restituição da coisa antes do término do prazo contratual. Aqui se aplica a parte final do CC 133, pela qual o prazo não se presumirá em proveito do devedor, quando as circunstâncias do contrato apontem no sentido de ter ele sido estabelecido em benefício do credor, como é o caso do depósito.

A recusa injustificada à obrigação de restituir enseja ao depositante o ajuizamento de ação de reintegração de posse em razão do esbulho decorrente da conversão da posse justa em precária (CC 1.200). Sendo o contrato escrito e com prova literal, será lícito o manejo da ação de depósito, como forma de o depositante exigir a restituição da coisa, satisfazendo a sua pretensão resultante da violação do direito subjetivo (CPC/1973, art. 901, sem correspondente no CPC/2015). Infere-se do exposto que não é da essência do contrato de depósito que assuma a forma escrita, sendo suficiente a tradição do bem. Porém, a ausência do instrumento subtrai ao credor a via do procedimento especial do depósito (CPC/1973, art. 902, com correspondência no CPC/2015, art. 311 e parágrafo único). Ou seja, o contrato escrito é solenidade ad probationem e não ad substantiam.

Por fim, a norma requer que a restituição da coisa se faça acompanhada de seus frutos e acrescidos. Vale dizer, em sentido amplo: os frutos naturais, industriais e civis, além dos produtos obtidos no período de depósito, serão restituídos ao depositante. Isso decorre da ordem natural de tal negócio jurídico. Se o depositário apenas guarda a coisa, sendo-lhe vedada a sua exploração econômica, todos os acréscimos econômicos que dela resultarem serão devolvidos conjuntamente ao bem principal. Exemplificando: no depósito de uma vaca campeã, já prenhe ao tempo da tradição, serão restituídos os bezerros. Idêntico dispositivo se aplica nos contratos de penhor, nos quais o credor pignoratício apenas detém a custódia da coisa, como depositário (CC 1.435, I e IV). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 659-660 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua justificativa, Ricardo Fiuza diz do dispositivo em comento extraírem-se as três obrigações fundamentais do depositário: a) guardar a coisa, o que é inerente e essência do contrato de depósito; b) conservá-la da mesma forma com que atua na preservação das suas coisas próprias; c) restituí-la assim que reclamada pelo depositante.

A lei, tutelando a pessoa do depositante contra eventual depositário infiel, impõe o presente preceito, através do qual sujeita o depositário a proceder na conformidade das expectativas daquele, expressando, afinal, a obrigatoriedade da restituição da coisa depositada e na forma em que se encontrava quando da celebração do contrato ou do seu equivalente. Assim, “se a coisa depositada perece ou se deteriora por dolo ou culpa do depositário, a este cabe a responsabilidade. Na hipótese, entretanto, de a perda ou deterioração advir de força maior ou caso fortuito, não mais lhe cabe o dever de reparar, pois aqui aplica-se a regra res perit domino, já conhecida, e o depositante é o dono da coisa” (Silvio Rodrigues, Direito civil: dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 22. ed., São Paulo, Saraiva, 1994, v. 3, p. 264).

Jurisprudência: 1. “É vedada a prisão civil do devedor fiduciante em ação de busca e apreensão contra si proposta, porquanto não equiparável a depositário infiel. Precedentes (STJ, 3’ 1., AGREsp 330.207-PR, rel. Mm. Fátima Nancy Andrighi. DJ de 5-11-2001); 2. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 337 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/11/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em sua exposição, afirma Marco Túlio de Carvalho Rocha ser ao depositário, imposta diligência ordinária na guarda da coisa depositada. Não é obrigado a realizar diligências especiais. Se o depósito se faz a céu aberto, disto tendo ciência o depositante, não lhe é exigível a guarda da coisa em recinto fechado.

A restituição da coisa deve ser feita tão logo a exija o depositante, mesmo que o contrato tenha sido firmado por prazo determinado, exceto se o depositário tiver o direito de retenção a que se refere o CC 644. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 26.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).