Direito Civil
Comentado - Art. 947, 948, 949 - continua
Da Indenização - VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art.
233 ao 965) - Título IX – Da Responsabilidade Civil
(Art.
944 a 954) Capítulo II – Da Indenização
–
vargasdigitador.blogspot.com
Art. 947. Se o devedor não puder cumprir a prestação na
espécie ajustada, substituir-se-á pelo seu valor, em moeda corrente.
Segundo Cláudio Luiz Bueno De
Godoy, o dispositivo, como já o fazia o CC anterior, assenta o caráter
subsidiário, substitutivo e sub-rogatório que tem a indenização pecuniária. Ou
seja, sempre que, por qualquer motivo, não for possível a reparação do prejuízo
causado com a exata volta ao status quo
ante, a chamada reparação in natura
ou em espécie, terá cabimento a indenização pecuniária, com função assim
substitutiva. Ou, como hoje se sustenta, a resposta em pecúnia, e mediante o
agravamento de seu valor, pode ainda sê-lo à provocação do que Antônio
Junqueira de Azevedo denomina de dano social, ou seja, um dano que, a par do
reflexo individual, atinge também toda a sociedade, determina, no seu dizer, um
rebaixamento imediato do nível de vida da população, particularmente quando o
ofensor desatenda, de modo grave, uma obrigação de segurança ou ostente
comportamento exemplar negativo (“Por uma nova categoria da responsabilidade
civil: o dano social”. O Código Civil e
sua interdisciplinaridade, Coords. José Geraldo Brito Filomeno; Luiz
Guilherme da costa Wagner Júnior; Renato Afonso Gonçalves. Belo Horizonte, Del
Rey, 2004, p. 374-6).
É certo que a ideia fundamental
do sistema está, no campo da responsabilidade civil, na restauração do estado
de coisas afetado com o ilícito. Pense-se, por exemplo, nos danos ambientais,
como lembra Carlos Roberto Gonçalves (Comentários
ao Código Civil, coord. Antonio Junqueira de Azevedo. São Paulo, Saraiva,
2003, v. XXI, p. 527), ou mesmo nos danos paisagísticos ou ao patrimônio
histórico, em que se prevê, sendo possível, a restauração de quanto foi
degradado. Mesmo nos casos de danos individuais, procura-se a reparação em
espécie, como nas lesões pessoais ou estéticas. De toda sorte, sempre que for
impossível ou insuficiente à restauração do status quo ante a reparação em espécie, terá lugar a fixação da indenização
pecuniária, em moeda corrente, a de curso legal e forçado no país, malgrado a
ausência, no novo dispositivo, da ressalva final que continha seu artigo
correspondente, no CC/1916.
No tocante ao dano moral, e ainda se ressinta a respectiva
indenização de natureza e função reparatórias, servindo, antes, à compensação
da vítima e desestímulo ao ofensor (v. comentário ao CC 944), também se tem
defendido a necessidade de procurar, em resposta à sua ocorrência, ao agravo
perpetrado, fórmulas ou medidas não pecuniárias, como os exemplos, hauridos da
Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67), da publicação de sentença que a respeito da
ofensa se prolate ou mesmo o do direito de resposta. Pense-se, ainda, em
eventuais retratações públicas. Trata-se, segundo a arguta observação de
Anderson Shreiber (Novos paradigmas da
responsabilidade civil. São Paulo, Atlas, 2007, p. 187-90), de um lado, de
desestimular demandas animadas por simples cupidez, que o autor chama de
“demandas frívolas”, e, de outro, valorizar os interesses extrapatrimoniais,
evitando-se, nas suas palavras, a “mercantilização das relações existenciais”. (Cláudio
Luiz Bueno De Godoy, apud Código
Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002.
Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 954-955 -
Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 30/04/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
Na explanação de Ricardo Fiuza, em princípio a reparação deve ocorrer
in natura, com a reposição das coisas
ao estado anterior, de modo que, segundo o Código Civil atual e o anterior, a
indenização pecuniária é subsidiária.
No
entanto, a reparação indenizatória ou pecuniária é mais comum, em face das
dificuldades inerentes à reparação natural e, especialmente, ao
não-restabelecimento por esta da situação anterior, como por exemplo na
retratação em caso de ofensa à honra ou a direito moral do autor, a qual, via
de regra, não restaura o estado anterior, devendo ser fixada uma indenização
pecuniária. (Direito Civil -
doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 489, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 30/04/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Sob o prisma de Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, a regra do dispositivo segue o regramento geral
do Código de que a pecúnia se sub-roga no lugar da obrigação toda vez que não
houver a possibilidade de que aquela seja cumprida in natura. Não obstante, há que se ter em mente que a ideia central
do sistema funda-se, essencialmente, na restauração do status quo ante, especialmente quando se tratar de danos
ambientais, históricos, paisagísticos etc. Nessas ocasiões, também poderá haver
a complementação pecuniária quando a recuperação integral for impossível ou
insuficiente.
Godoy destaca que
“no tocante ao dano moral, e ainda se
ressinta a respectiva indenização de natureza e função reparatórias, servindo,
antes, à compensação da vítima e desestímulo ao ofensor (...), também se tem
defendido a necessidade de procurar, em resposta à sua ocorrência ao agravo
perpetrado, fórmulas ou medidas não pecuniárias, como os exemplos, hauridos da
Lei da Imprensa (Lei n. 5.250/67) – a despeito de que, recentemente, assentada
não recepcionada pela Suprema Corte (ADPF n. 130/DF, j. 30.4.2009) -, da
publicação de sentença que a respeito da ofensa se prolate ou mesmo o do
direito de resposta. Pense-se, ainda, em eventuais retratações públicas” (Godoy,
Cláudio Luiz Bueno de. Comentário ao
artigo 947 do Código Civil. In Peluso, Cesar (coord.). Código Civil Comentado, Barueri, Manole. 2015. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 30.04.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem
excluir outras reparações:
I – no pagamento
das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família;
II – na prestação
de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração
provável da vida da vítima.
No entender de Godoy, o artigo repete, quase que integralmente, o
dispositivo do art. 1.537 do CC/1916, que previa a indenização em caso de
homicídio com o pagamento das verbas nele elencadas. Bem de ver, porém, que já
sob a égide da anterior normatização vinha-se entendendo que a enumeração referida
não se continha em lindes exaustivos, por isso que não excluía a reparação de
outros danos que viessem a ser demonstrados, mesmo o moral. Pois nesse sentido,
por emenda senatorial, acrescentou-se, ao final da cabeça do artigo em comento,
a ressalva de que as verbas indenizatórias lá previstas não afastam outras
reparações, incluindo a moral.
No inciso I, estabelece-se a obrigação ressarcitória de despesas
experimentadas no tratamento da vítima, com seu funeral e luto da família. É
evidente que a recomposição se faz diante de quem tenha efetivado as mesmas
despesas. Mas alguma controvérsia sempre houve com a significação da expressão
luto da família, ora entendendo-se pertinente a despesa além daquelas do
funeral, como aquisição de jazigo ou construção de mausoléu, e aqui, conforme
acentua Carlos Roberto Gonçalves, desde que provado que a família tinha meios
para tanto, sob pena de indevido enriquecimento (Comentários ao Código Civil,
coord. Antonio Junqueira de Azevedo. São Paulo, Saraiva, 2003, v; XXI, p. 530),
ora considerando tratar-se de verdadeira indenização moral. A discussão hoje
perde relevo, uma por se ter garantido, já no CC 186, e de maneira genérica, de
resto na esteira do art. 5º, V, da CF/1988, a indenização moral, e outra
porque, pelo preceito, qualquer dano poderá ser reparado.
Já o inciso II consagra a hipótese típica de dano indireto, reflexo ou
por ricochete, vale dizer, uma repercussão do dano diretamente experimentado
por alguém na esfera de outrem, o lesado indireto ou reflexo. E isso quer sob o
ponto de vista material, quer sob o moral. Pelo primeiro, garante-se a
prestação de alimentos, pagos pelo responsável a quem a vítima direta os devia.
Há de tomar a expressão alimentos, porém, de forma meramente indicativa, eis
que todo e qualquer dano é indenizável. Da mesma forma, mas não sem discussão,
tem-se que não se devem considerar credores de alimentos, nos termos do
preceito, apenas aqueles sujeitos dos alimentos legais, decorrentes de
casamento, união estável e parentesco. Qualquer dependente econômico pode
postular, em tese, a reparação. Problema mais séria, a rigor, está nos casos em
que esse dependente já não recebesse auxílio do de cujus, na verdade
tendo sido privado de potencial ajuda de que viesse a necessitar. Caio Mário
lembra, a propósito, a tese da perda de uma chance por um possível socorro, ou
seja, a verificação sobre se, com a morte, alguém perdeu séria chance de ser
auxiliado, mesmo que ainda não o fosse no instante do óbito; admite, todavia,
que a questão toda se coloca em termos de verificação da certeza do dano (Responsabilidade
civil, 9ª ed. Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 43-4). Parece, aqui, que se
deve considerar titular de ação ressarcitória quem já fosse efetivamente
auxiliado pelo falecido, ou ao menos quem comprove disso já necessitar no
instante do óbito, mas então comprovados o dever e a possibilidade que tinha o de
cujus de auxiliar, o que se viu perdido com seu óbito.
Ainda acerca do dano material indenizável em caso de homicídio, importa
notar que, hoje, o novo CC expressa que ele é devido pelo tempo provável de
vida da vítima, que se vem admitindo ser ora de 65, ora de 70 anos. Se o
falecimento ocorreu quando já atingida essa idade, costuma-se presumir, então,
que por mais cinco anos pudesse viver a vítima, tempo do pagamento da
indenização sob a forma de prestação alimentar.
Em se cuidando de indenização paga aos filhos menores da vítima, tem-se
reputado que deva ela se estender, ainda que considerada a duração provável de
vida da vítima direta, até quando aqueles completem 25 anos, término comum da
idade universitária e idade em que presumidamente passariam a se sustentar,
ressalvando-se a cessação se antes casarem e o direito de acrescer aos demais
filhos, cessada a pensão de um ou alguns. Trata-se de orientação pretoriana
que, todavia, ao que se crê, não pode ser tomada de forma absoluta, sem
ressalva a casos nos quais, por algum motivo especial, ou alguma contingência
pessoal, demonstre o filho que necessitaria de auxílio e que o teria mesmo
depois dos 25 anos, posto em montante menor. Se o filho era maior e com a
ressalva acerca da prova da dependência, que acima se fez, para os lesados
indiretos em geral, limita-se em cinco anos, costumeiramente, o tempo do
pensionamento devido.
A pensão pode também ser devida ao cônjuge e companheiro, sempre à
consideração de que privados do socorro econômico do falecido, de novo
respeitado o tempo provável de vida da vítima e desde que os beneficiários não
contraiam novo casamento ou união estável.
Se o morto é menor e por isso sem atividade remunerada, mesmo assim a
Súmula n. 491 do STF reconheceu possível indenização material aos lesados
indiretos, tendo-se assentado o entendimento de que até quando aquele
completasse 25 anos e, a partir daí, reduzindo-se a pensão à metade, aqui por
se reputar que ainda continuaria a auxiliar os beneficiários, mas em montante
menor. Já quanto ao termo a quo de fixação da pensão, nessa mesma
hipótese, orientam-se uns pela fixação da data do evento, de resto na esteira
da Súmula n. 43 do STJ e ao pressuposto de que desde cedo o filho menor, no
mais das vezes, já representa força de trabalho para a família, outros se
orientando pela idade em que o menor poderia começar a trabalhar, portanto aos
14 anos.
Se a morte é de cônjuge ou companheiro que não trabalhava, passou-se a
entender que, longe de representar uma economia de gasto, como já se sustentou,
a ocorrência exigiria maior esforço econômico do sobrevivente para manter-se e
à família. A indenização material, sob a forma de pensão, calcula-se, no caso
de falecimento de cônjuge ou companheiro, à razão de dois terços dos
rendimentos da vítima, à consideração de que a terça parte restante seria gasta
consigo mesmo. Se não há renda, não há renda fixa ou conhecida, deve-se
utilizar o salário-mínimo como parâmetro para a determinação da pensão.
De maneira geral, o décimo terceiro integra a pensão indenizatória, mesmo
se o de cujus não possuía vínculo empregatício por ocasião do óbito, mas
devendo-se supor que viria a se empregar, só não sendo devida a verba se a
ocupação do falecido era de autônomo ou liberal. Não se olvide de que o art.
533 do CPC estabelece, agora não como regra, mas a possibilidade, ressalvada
sua desnecessidade no caso, e não só pelo fato da inclusão em folha de
pagamento, de constituição de capital para assegurar o pagamento da pensão.
Quanto ao pagamento da verba indenizatória de uma só vez, remete-se o leitor ao
comentário ao CC 950, lembrando-se, ainda, vir-se entendendo que a indenização
não se compensa com a previdenciária, mas, sim, com o seguro obrigatório.
Discutia-se se a pensão, havida alteração das circunstâncias que
lastrearam sua fixação, podia ser revista, mercê da incidência da cláusula rebus,
ou se isso afrontaria a coisa julgada, opinando pela solução permissiva, a que
já se acedia, por exemplo, Sérgio Cavalieri Filho (Programa de
responsabilidade civil, 5ª ed. São Paulo, Malheiros, 2003, p. 135-6),
inclusive com socorro à previsão do art. 505, I do CPC, agora fazendo remissão
ao texto do art. 533, § 3º, da mesma lei processual, com redação dada pela Lei
n. 11.232/2005.
Por fim, já no tocante ao dano moral devido, em caso de homicídio, às
vítimas indiretas, sobressalta, sempre, a discussão sobre a extensão dos
ofendidos que podem ser indenizados. Pela regra geral, de que está ausente a
limitação, qualquer um que demonstre haver sofrido agravo extrapatrimonial pode
postular indenização do lesante, e de forma autônoma. Cria-se, porém, situação
eventual de proliferação sucessiva de demandas, por prejudicados que o fazem
isoladamente, sem que haja um cobro ao ofensor, insciente de quanto e até
quando terá de indenizar. E, mais, afinal fixando-se uma indenização que,
arbitrada para o primeiro litigante vencedor, não esgotaria o dever
ressarcitório do lesante ou, se sim, em prejuízo dos ofendidos que posteriormente
o demandassem. Por isso tudo é que se vem sustentando que a postulação de
indenização moral a esse título esteja reservada aos parentes sucessíveis da
vítima direta, com precedência do cônjuge ou companheiro e filhos, mas de tal
arte que o recebimento por alguns que tenham já ajuizado a demanda exclua a
possibilidade de que os demais ajuízem, porquanto um só é o montante
indenizatório (v.g., Santos, Antônio Jeová. Dano moral indenizável, 3ª ed. São Paulo, Método, 2001, p. 505-7; Silva, Regina Beatriz Tavares da. Novo
Código Civil comentado, coord. Ricardo Fiuza. São Paulo, Saraiva, 2002, p.
847), e ainda que se reconheça a possibilidade de posterior ação entre os
beneficiários. Quando menos, admita-se ainda o ajuizamento isolado, deve-se
coibir o abuso, como no exemplo em que o cônjuge proponha ação indenizatória e
logo depois o faça, de novo, agora representando filho menor.
Quanto à possibilidade em
si de que menores impúberes, de tenra idade, possam pleitear indenização moral,
por alguns negada a pretexto de que eles nada compreendem e por isso não sofrem
nenhuma angústia ou dor, bem de ver, em primeiro lugar, que, segundo se vem
defendendo, haverá sempre uma privação do convívio com o parente falecido, de
regra os pais, o que significará um agravo em algum momento sentido. Mas, em
segundo, força convir que, hoje, o dano que por isso mesmo se prefere dizer
extrapatrimonial está in re ipsa, ou seja, na conduta em si de violação
de direitos da personalidade, diretamente fundados na dignidade humana e assim
objeto de uma tutela especial, independentemente de uma impossível prova ou
demonstração de que a vítima tenha efetivamente sofrido. A violação, repita-se,
induz o dano. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 955-958 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 30/04/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Como impõe a Doutrina de Ricardo Fiuza, de suma importância a
emenda senatorial, já que possibilita a reparação dos danos morais, cuja
indenizabilidade está consagrada na Constituição Federal (art. 52, V e X) e
neste Código, CC 186: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência
ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral comete ato ilícito”).
Na jurisprudência está reconhecida a indenizabilidade do dano
moral em caso de morte, por homicídio, de filhos, mesmo que de tenra idade (v. Súmula 491 do STF), do cônjuge e do
companheiro, independentemente da existência do direito dos pais e do consorte
à pensão alimentícia com relação ao falecido. Tal reconhecimento deu-se após
longa evolução jurisprudencial, como a seguir é anotado, em face do disposto no
art. 1.537 do Código Civil de 1916, que não fazia a ressalva que realiza o
dispositivo em análise quanto a outros danos.
No caso de morte de filho, dispensa-se a comprovação do dano
moral, uma vez que “a voz da natureza (terrível choque moral de uma mãe, diante
do cadáver de sua filha) determina a convicção induvidosa da existência do
sofrimento moral, dispensando-se a prova do sangramento interior da infeliz
genitora” (RT, 712/170). Em suma,
presume-se a lesão moral, nestes casos (JTARS,
82/137). A presunção é considerada por vezes absoluta (RT, 730/93) e em outros casos relativa JTJ, 181/59). Em nossa opinião essa presunção deve ser considerada
relativa e não absoluta, admitindo-se prova em contrário, ou seja, prova de que
não havia afeto entre o postulante e o parente falecido, o que se demonstra por
prolongado rompimento das relações entre eles.
A morte de um membro da família pode trazer dano moral a outro
membro dessa mesma família – dor sentimental pela morte de ente querido -, como
a cônjuge que sofre a perda de seu consorte, ou ao convivente cujo companheiro
é morto, ou ao pai ou mãe que sofre a perda do filho. Se a morte ocorre pela
prática de ato ilícito, cabe a aplicação dos princípios da responsabilidade
civil por dano moral, com o estabelecimento da devida indenização.
A reparação do dano moral pela morte de membro da família
fundamenta-se na “perda das afeições legítimas”, base da instituição da família
(cf. Roberto H Brebbia. El daño moral),
2ª ed., Rosado, Orbir, 1967, p. 281-7), mas pode fundar-se também na teoria do
dano reflexo ou dano em ricochete – par
ricochet – em que alguém sofre o reflexo do dano causado a outra pessoa. (v. Mário Moacyr Peno, Algumas obs. sobre
dano moral. Revista de Direito Civil,
37/13, e Yussef Said Cabal), Da’w
moral, 2ª ed. São Paulo. Revista dos Tribunais, 1999, p. 114).
Sabendo-se que no dano reflexo o elemento certeza apresenta-se
como norteador do direito à reparação (Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade civil, 9ª ed. Rio de
Janeiro, Forense, 1998, p. 44), examinemos que laços de família autorizam a
indenização desses danos morais. A princípio, laços conjugais, de união estável
e de ascendência e descendência. Porém, quando não existem cônjuge, ascendentes
ou descendentes, os irmãos que suplantaram aqueles em elos familiares podem
ocupar seus lugares para efeito de indenização (cf. Roberto H Brebbia. El daño moral, cit., p. 285). Cabe
observar que, embora a dor sofrida por outros parentes ou mesmo terceiros possa
ser mais intensa do que aquela dos membros da família antes referidos, por
razão de segurança nas relações jurídica não se pode aceitar que todos os que
se sintam afetados pela morte de outrem tenham direito a reparação; caso assim
não fosse, haveria uma carga indenizatória insuportável e injusta ao lesante.
E, se consideramos que o valor da indenização permaneceria inalterado,
independentemente do número de lesados, a indenização tornar-se-ia inócua pela
divisão de seu valor entre os vários sujeitos vitimados pelo ato ilícito.
Sob a égide do Código Civil anterior, a jurisprudência, em
corrente majoritária, embora se referisse ao dano moral, reconhecia a
indenizabilidade do prejuízo em termos materiais e futuros, tanto assim que
determinava o pensionamento da vítima, em forma de alimentos, com termo inicial
e final (STJ, 3’ T., Recurso Especial n. 1.13989/SP, rel. Min. Waldemar
Zveiter, j. 15.2.2001; STJ, 4’ T., Recurso Especial n. 93562/SP, rel. Min.
Aldir Passarinho Junior, j. 21.9.2000; STJ, 3’ T., REsp n. 208.151/MG, rel.
Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 11.2.1999; STJ, 3’ T., Recurso Especial n.
148706/SP, rei. Min. Waldemar Zveiter, j. 15-10-1998), e outra parte
considerava a plena indenizabilidade dos danos morais, sem qualquer ligação com
os danos materiais, presentes ou futuros, fixando uma quantia a ser paga de uma
única vez (STJ, 4’ T., Recurso Especial n. l 94468/PB, rel. Min. Ruy Rosado de
Aguiar, j. 6-5-1999; RT, 645/121). Com o CC/2002, deve prevalecer esta última
corrente jurisprudencial, já que o caput
deste artigo refere expressamente “outras reparações”, no caso de ordem moral,
e o inciso II estabelece a reparação dos danos materiais, em forma de
“prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta
a duração provável da vida da vítima”.
Quanto à
morte do cônjuge e do companheiro também houve longa resistência ao
reconhecimento do direito à indenização, que somente era aceita diante de danos
materiais pela morte do varão, em face da previsão expressa do art. 1.537 do
Código Civil; negava-se a indenização pela morte da esposa, sob o argumento de
que não haveria dependência econômica do marido em face da mulher, ainda mais
por caber ao varão a manutenção da família, na conformidade do art. 233, inciso
IV, do Código Civil de 1916. Com fundamento no art. 52, inciso X, da
Constituição da República, que consagrou a indenizabilidade dos danos morais, e
o advento da Súmula 37 do STJ, que acolheu a cumulação de danos morais e
materiais, a indenizabilidade dos danos acarretados pela morte do cônjuge
masculino ou feminino, bem como do genitor, seja pai ou mãe, passou a ser
admitida no plano moral e material, mesmo que cumulativamente (RSTI, 27/268 e 45/144; RT, 553/199; RJTJRS, 150/7 16; RT,
730/ 205; TJSP, 4’ Câmara de Direito
Privado, Apelação n. 00.123.4/0, rel. Des. Cunha Cintra, j. 28-3-1996). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p.
490-91, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 30/04/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na visão de Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, obviamente que os valores deverão ser pagos em
para aquele que houver, efetivamente, despendido os valores. De acordo com
Godoy, há quem defenda inclusive que os valores da indenização poderão abranger
jazido ou construção de mausoléu, quando se demonstrar que a família tinha
condição para adquirir ou efetuar tal empreitada. (Godoy, Cláudio Luiz Bueno
de. Comentário ao artigo 948 do Código
Civil. In Peluso, Cezar (coord.). Código Civil comentado, Barueri: Manole,
2015.).
O dispositivo trata do
dano em ricochete, em que deverão ser indenizados aqueles que eram,
economicamente, dependentes do falecido. Tal hipótese pode abranger danos tanto
de natureza material quanto moral.
Tem-se entendido como
estimativa de vida ora 65 anos, ora 70 anos. Se a vítima já havia atingido tais
idades, tem-se como razoável admitir-se que ela viveria por mais 5 anos. No
caso de filhos do falecido, entende-se que eles seriam dependentes até os 25
anos (idade de término da instrução universitária), admitindo-se prova em
contrário. Já, no tocante ao termo a quo,
compreende-se que a pensão deve ser fixada desde a data do evento danoso e que
o filho menor representaria força de trabalho para a família desde a partir dos
14 anos.
No que se refere a danos
morais, tem-se compreendido que a indenização deverá ser paga apenas aos
herdeiros sucessíveis, com preferencia ao cônjuge ou companheiro e aos filhos,
para evitar possível abuso de direito ou excesso de pagamento parte do
agressor.
Súmula STF 491. “É indenizável o acidente que cause a morte
de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado.”
Súmula STJ 43. “Incide correção monetária sobre dívida por
ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo”.
Súmula STJ 246. “O valor do seguro obrigatório deve ser
deduzido da indenização judicialmente fixada”.
Súmula STJ 313. “Em ação de indenização, procedente o pedido,
é necessária a constituição de capital ou caução fidejussória para a garantia
de pagamento da pensão, independentemente da situação financeira do demandado”.
(Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 30.04.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor
indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao
fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver
sofrido.
Na visão de Godoy, se o preceito do artigo anterior se dedica à fixação
de indenização em caso de homicídio, trata o presente de igual verba, mas que seja
devida em razão de lesão ou qualquer ofensa à saúde da vítima. E o faz, se
comparado ao CC/1916 e ao quanto previsto em seu art. 1.538, de maneira mais
simplificada. Pela anterior normatização, indenizavam-se, em primeiro lugar, as
despesas de tratamento e os lucros cessantes até o final da convalescença, ou
seja, quanto a vítima, nesse tempo demonstrasse ter deixado de auferir em razão
da lesão sofrida, por exemplo verbas atinentes ao desempenho de trabalho ou
atividade inviabilizados durante a recuperação. Isso não mudou no atual Código.
Porém, seguia o antigo art. 1.538 determinando que fosse também paga à
vítima a importância da multa, no grau médio da pena criminal correspondente,
duplicando-se a soma indenizatória, se do ferimento causado adviesse aleijão ou
deformidade. Pior, previa-se ainda que, se a pessoa aleijada ou deformada fosse
mulher capaz de casar, a ela se pagasse um dote. E aí os problemas, dado que
não havia, como não há, pena de multa originariamente estabelecida para o crime
de lesão corporal, e depois pela discussão sobre se a verba teria natureza de
reparação moral, sobretudo em virtude da determinação de duplicação para as
hipóteses de aleijão ou deformidade, em razão do que se sustentava que, a
rigor, o caso seria de dano estético, autônomo em relação ao dano moral. Sem
contar o dote que, em verdade, a pretexto de favorecer a mulher, e tão somente
ela, a considerava alguém cujo destino forçoso era o casamento, em óbvia
afronta não só à igualdade para com o homem, o que se poderia corrigir
garantindo-se a este idêntica verba ressarcitória, mas mesmo à dignidade da
mulher.
Pois o CC/2002, como se disse, simplificou a questão ao estabelecer que
fará jus o prejudicado à indenização de qualquer outro prejuízo, além das
despesas de tratamento e dos lucros cessantes, que demonstre haver sofrido.
Mais, o Projeto de Lei n. 276/2007 de reforma do CC/2002, atento ao fato de que
o dano moral não se prova, está in re ipsa, como se disse em comentário
ao artigo precedente, a que ora se remete o leitor, pretende alterar a parte
final do dispositivo presente para, no lugar da remissão a “outro prejuízo que
o ofendido prove haver sofrido”, prever-se a indenização dos danos emergentes e
lucros cessantes – sem excluir outras reparações” (veja-se, ainda, no
comentário ao artigo seguinte, a proposta de acréscimo de parágrafos àquele
dispositivo, tratando, igualmente, do dano moral devido em caso de ofensa
física).
Tem-se, enfim, a previsão da reparação de quaisquer espécies de danos
resultantes da lesão corporal, leve ou grave, ou seja, com ou sem deformidade
ou aleijão. Não mais se referiram verbas específicas, de toda sorte tendendo a
persistir a divergência sobre a natureza do dano estético, se representativo de
uma categoria autônoma ou de potencial foco de um dano material, como a modelo
que tem sua carreira prejudicada por uma cicatriz deformante, e/ou moral,
consistente na especial afetação da autoestima que uma deformidade ou aleijão
podem provocar. Muito embora se entenda que, a rigor, a deformidade ou aleijão
podem agravar a indenização moral, sem prejuízo, sempre, de sua eventual
repercussão patrimonial, a tendência da jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça é permitir a cumulação do dano moral e do dano estético, ao argumento
de que a pertinência deste último está na lesão morfológica, causa de repulsa
por terceiros, portanto diversamente da afetação subjetiva e íntima da
autoestima da vítima.
Quanto a despesas com
tratamento que se protrai no tempo, mas por período a priori
indeterminado, da mesma forma que a eventual e futura necessidade de aparelhos
ou próteses, tem-se admitido o pagamento à medida de sua comprovação,
identicamente aos casos de agravamento dos efeitos da lesão, dela diretamente
decorrentes, quando se permite nova liquidação. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 958-959 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 30/04/2020.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Sob a luz de Fiuza, o dispositivo tem em vista a reparação dos danos
materiais (despesas de tratamento e lucros cessantes) e dos danos morais
resultantes de ofensa à integridade física, que é direito da personalidade,
pelo qual se tutela a incolumidade do corpo e da mente.
Segue a corrente de pensamento mais atualizada, expressa em leis
recentes (Lei de Direitos Autorais – Lei n. 9.610/98 – e Código do Consumidor –
Lei n. 8.078/90), que recomenda a fixação de critérios genéricos e não
taxativos na reparação do dano moral. O Código Civil de 1916, em seu art.
1.538, taxava o valor da indenização por dano moral, em caso de violação à
integridade física, em importância correspondente à multa no grau médio da
respectiva pena criminal.
Mas este dispositivo
contém equívoco ao mencionar a prova desses outros danos, que têm natureza
moral. O dano moral dispensa a prova do prejuízo em concreto, sua existência é
presumida, por verificar-se na “realidade fática” e emergir da própria ofensa, já
que exsurge da violação a um direito da personalidade e diz respeito à
“essencialidade humana” (cf. Carlos Alberto Biliar, Reparação civil por
danos morais, cit., p. 208-18). Essa presunção é adequada à natureza do
direito lesado, no caso a integridade física, que compõe a personalidade
humana, de modo a surgir ipso facto a necessidade de reparação, sem que
haja necessidade de adentrar o psiquismo humano. Lembre-se, neste passo, que a
grande dificuldade na reparação do dano moral sempre foi essa prova, a rigor
impossível porque não há como penetrar na subjetividade do lesado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p.
491-92, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 30/04/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Resumida e timidamente Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, falam da
medida ressarcitória que se protrai no tempo até que haja a efetiva recuperação
da vítima, podendo haver seu agravamento ou atenuação, conforme o estado da
lesão acarretada, deixando por conta da “Súmula STJ 387. É lícita a cumulação
de dano estético e dano moral.”, a conclusão. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 30.04.2020, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
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