quinta-feira, 14 de maio de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 972, 973, 974 - continua Da Capacidade - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 972, 973, 974 - continua
Da Capacidade - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Do Direito de Empresa
Título I – Do Empresário (Art. 966 ao 980) Capítulo II - Da Capacidade
– vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

Art. 972. Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos.
Lecionando Barbosa Filho, a aptidão para o exercício da atividade empresarial, no que diz respeito ao empresário individual, decorre da conjugação sequencial de dois requisitos essenciais. Em um primeiro plano, festa necessário que a pessoa física seja plenamente capaz, i.é, tendo adquirido a capacidade de direito por meio do nascimento com vida, e não permaneça enquadrada, quanto à capacidade de gozo ou de fato, em quaisquer das hipóteses elencadas nos CC 3º e 4º deste Código, emitindo sua vontade sem obstáculos, de modo livre e consciente. Duas situações, aqui, chamam a atenção. O inciso V do CC 5º manteve a emancipação decorrente da manutenção de estabelecimento com economia própria, tal qual previsto no Código de 1916 (art. 9º, § 1º, V), com o fim de evitar possa o menor, maliciosamente, se beneficiar das regras de proteção próprias ao incapaz, mas o puro e simples exercício da atividade faz surgir apenas o “empresário de fato”, sendo imprescindível a formal emancipação para que o menor possa regularmente obter sua a prévia inscrição, tornando-se “empresário de direito”. Há, por outro lado, a possibilidade da perda da capacidade de gozo, em razão de circunstâncias supervenientes, o que, por certo, na prática, gera grandes embaraços, mas que, agora, foi objeto de tratamento legislativo específico, no CC 973. Num segundo plano, é necessário seja a pessoa desimpedida, i.é, não seja, em razão de sua condição profissional ou pessoa, proibida do exercício da atividade empresarial, tendo o Código Civil de 2002 deixado para o âmbito da legislação extravagante sua pormenorização. Entre os impedidos incluem-se os magistrados (art. 36 da Lei Complementar n. 35/79), os membros do Ministério Público (art. 44 da Lei n. 8.625/93), os servidores públicos civis e militares, os estrangeiros não residentes no Brasil (arts. 98 e 99 da Lei n. 6.815/80) e, até julgadas extintas suas obrigações ou quando condenados por crime falimentar, os falidos. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 986 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

De acordo com o histórico, o Código Comercial de 1850 condicionava o exercício da atividade empresarial às pessoas capazes, maiores de vinte um anos (art. 1º), tal como estabelecia o art. 9º do Código Civil de 1916. Com a redução da maioridade pelo Código Civil de 2002 para dezoito anos (CC 52), foi excluído, durante a tramitação do projeto, o parágrafo único constante da redação original desse dispositivo, que previa: “Somente se tiver dezoito anos, poderá o menor emancipado pelo casamento exercer atividade de empresário”, em razão de emenda da autoria do Senador Josaphat Marinho.

Segundo a doutrina de Fiuza, como norma geral, qualquer pessoa maior de dezoito anos, brasileiro ou estrangeiro, pode ser empresário, na condição de titular de firma individual ou administrador de sociedade. Os maiores de dezesseis anos, legitimamente emancipados, também adquirem capacidade civil para o exercício de atividade empresarial. O CC/2002, ao contrário do Código Comercial de 1850 (art. 29, não relacionou as pessoas impedidas de serem empresários. São proibidos de exercer a atividade empresarial aqueles expressamente impedidos por força de lei especial, como os servidores públicos civis federais (Lie n. 8.112/90, art. 117, X), estaduais e municipais, os militares da ativa das forças Armadas e das Policias Militares (Decreto-Lei n. 1.029/69, art. 35), os magistrados (Lei Complementar n. 35/79, art. 36, leu), os membros do Ministério Público (Lei n. 8.625/93, art. 44, III), os corretores, leiloeiros e despachantes aduaneiros, assim como os empresários falidos enquanto não reabilitados (Decreto-Lei n. 7.661/46, arts. 138 e 195). Na condição de servidores públicos lato sensu, são também impedidos de exercer atividade empresarial o Presidente da República, Ministros de Estado, Governadores dos Estados, Prefeitos Municipais e ocupantes de cargos públicos comissionados em geral. Os membros do Poder Legislativo, como Senadores, Deputados Federais e Estaduais e Vereadores, não são proibidos de exercer atividade empresarial, salvo se a empresa “goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público ou nela exercer função remunerada” (CF, art. 54, fl, a). A legislação trabalhista (CLI, art. C), por seu turno, também restringe o exercício de atividade empresarial aos empregados que não sejam expressamente autorizados pelo empregador. Não pode também ser empresário a pessoa condenada a “pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato; contra a economia popular, contra o sistema-financeiro nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdurarem os efeitos da condenação” (Código Civil, art. 1.011, § 1º, Lei n. 6.404/76, art. 147, § 19. A norma do CC 972 veda o exercício de atividade empresarial, por meio de firma individual ou como administrador de sociedade, mas não impede, todavia, que qualquer das pessoas proibidas participe de sociedade empresária ou de sociedade simples na condição de sócio quotista ou acionista, desde que a ela não sejam atribuídos poderes de gestão. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 507, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Dissolvendo-se dúvidas com Elisete Almeida, existem dois tipos de capacidades: a capacidade de direito e a capacidade de gozo. Por exemplo: um nascituro pode ser sucessor (capacidade de direito), no entanto, esta capacidade está sujeita a uma condição: nascimento completo e com vida, porém, mesmo com o nascimento, ele não pode suceder, pois falta-lhe a capacidade de gozo.

Lendo-se os arts. 1º ao 5º CC, talvez torne mais fácil a compreensão quanto ao CC 972 em comento. No CC/2002 constata-se que a capacidade de gozo é inexistente para os menores até aos 16 anos de idade, sendo que qualquer ato praticado deve ser através de representação dos responsáveis e, se assim não for, o ato será nulo; depois tem-se os menores entre 16 anos e 18 anos, nestes casos a capacidade é relativa, os atos praticados devem ser assistidos pelos responsáveis, se assim não for o ato poderá ser anulado. Aos 18 anos atinge-se a plena capacidade civil. Tenha-se em atenção não ser direito de gozo e capacidade, mas, sim, capacidade de direito e capacidade de gozo. A capacidade de direito pode existir mesmo antes no nascimento da pessoa, a partir da concepção, já a capacidade de gozo, entre os 0 e os 16 anos não existe, entre os 16 anos e os 18 anos será relativa e aos 18 anos será completa (se não houver uma interdição). (Elisete Almeida, em resposta a pergunta no site jus.com.br, em 2.012, Acesso em 14/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).


Ricardo Negrão (2012, p. 73) detalha que a incapacidade cessa aos dezoito anos completos ou pela concessão dos pais, ou de um deles, na falta do outro, mediante instrumento público, independente de homologação judicial ou por sentença do juiz. Ainda terá que ser ouvido o tutor se o menor tiver dezesseis anos completos, pelo casamento, pelo exercício de emprego público efetivo, pela colação de grau em curso de ensino superior pelo estabelecimento Civil ou comercial ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria. (Cristian Rodrigues França, Silvana Faria Pereira, Adriele Luani Razini, Mariana Lunardelli, publicado em 05/2015, site jus.com.br. Acesso em 14/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 973. A pessoa legalmente impedida de exercer atividade própria de empresário, se a exercer, responderá pelas obrigações contraídas.

Na preleção de Barbosa Filho, mesmo ostentando capacidade civil plena, um indivíduo pode não apresentar a específica aptidão para o exercício da atividade empresarial, i.é, para ser empresário, em razão de sua condição profissional ou pessoal. nesse caso, é preciso levar em consideração a hipótese de uma pessoa impedida manter, concretamente, a produção ou a circulação de mercadorias ou serviços destinados ao mercado. Estará caracterizada, então, uma situação de ilicitude, mas, mesmo assim, os atos praticados deverão ser considerados válidos e plenamente eficazes, vinculando o patrimônio de seu autor, o impedido, de maneira a não poder ele colher, diante de terceiros, qualquer benefício do voluntário e malicioso descumprimento da proibição inserida nas normas legais. Não pode o impedido, para se desonerar, alegar o impedimento em seu favor, subsistindo toda responsabilidade peculiar e decorrente dos negócios jurídicos celebrados, de acordo com sua exata concepção. Ademais, consumado um ilícito, conforme a natureza do impedimento violado, subsistirão consequências de natureza penal ou administrativa, as quais deverão ser suportadas pessoalmente pelo impedido, que, indevidamente, assumiu a posição de empresário. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 987 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o histórico referente o artigo em comento, o dispositivo não foi objeto de qualquer alteração durante a tramitação do projeto do Código Civil no Congresso Nacional. O Código de 1916, ao tratar das sociedades civis, já atribuía responsabilidade pessoal ao sócio que viesse a contrair dívidas para a sociedade sem estar investido dos necessários poderes (art. 1.395). De modo mais direto e preciso, a vigente lei das sociedades por ações (Lei n. 6.404/76) também estabelece a responsabilidade pessoal do acionista administrador que praticar atos com violação da lei ou do estatuto (art. 158). O Decreto n. 3.708/19, no tocante às sociedades por quotas de responsabilidade limitada, estipulava que era cabível ação de perdas e danos, sem prejuízo da responsabilidade criminal, contra o sócio que usar indevidamente da firma social ou dela abusar (art. 11).

Quanto à doutrina lecionada por Fiuza, o exercício da atividade e dos poderes do empresário na administração da empresa somente é válido se a pessoa estiver investida dos devidos poderes, o que implica, necessariamente, seu desimpedimento, i.é, não ser a ela vedado o exercício de atividade empresarial, nos termos do CC 972 e das leis especiais. Se a pessoa estiver proibida de ser juridicamente qualificada como empresário, os atos por ela praticados que possam representar obrigações para a empresa serão por ela assumidos pessoalmente, ou seja, com o comprometimento direto e objetivo de seu patrimônio particular, devendo este responder pelas obrigações contraídas. A empresa, ou, quando for o caso, a sociedade, somente assume as dívidas e obrigações que foram contratadas por empresário ou sócio administrador investido dos necessários poderes, sem qualquer tipo de impedimento para a prática de atos de gestão empresarial. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 507-508, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em artigo de Cristian Rodrigues França, Silvana Faria Pereira, Adriele Luani Razini, Mariana Lunardelli, publicado em 05/2015, site jus.com.br, contém uma breve análise ao CC 973 em comento. O artigo aborda os legalmente impedidos de exercer a atividade empresarial e suas consequências quando da pratica desta atividade por estes, em especial com relação à terceiros.

O Código Civil não definiu expressamente o que é empresa. Para a doutrina, entretanto, empresa é a organização destinada às atividades de produção e circulação de mercadorias, bens e serviços, chefiadas ou dirigidas por uma pessoa física ou jurídica, denominada empresário. Neste sentido são as lições de Carvalho de Mendonça:

"Empresa é a organização técnico-econômica que se propõe a produzir mediante a combinação dos diversos elementos, natureza, trabalho e capital, bens ou serviços destinados à troca (venda), com esperança de realizar lucros, correndo os riscos por conta do empresário, isto é, daquele que reúne, coordena e dirige esses elementos sob sua responsabilidade."
Marcelo Tadeu Cometti (2009, p. 19 e 20) descreve empresa como um estabelecimento organizado, com bens corpóreos ou incorpóreos que oferece produtos e serviços para uma real necessidade à fim de obter lucro. A empresa é algo abstrato, ou seja, a empresa não é sujeito de direito.
Portanto, temos que a empresa somente terá "vida" por meio das atividades realizadas pela pessoa capaz civilmente de desenvolver atividade empresarial, ou seja, o empresário.
Lembrando que Ricardo Negrão (2012, p. 73) detalha que a incapacidade cessa aos dezoito anos completos ou pela concessão dos pais, ou de um deles, na falta do outro, mediante instrumento público, independente de homologação judicial ou por sentença do juiz. Ainda terá que ser ouvido o tutor se o menor tiver dezesseis anos completos, pelo casamento, pelo exercício de emprego público efetivo, pela colação de grau em curso de ensino superior pelo estabelecimento Civil ou comercial ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria.
O dispositivo 973 do CC, tema deste artigo, trata da pessoa legalmente impedida de exercer a atividade própria de empresário, i.é, há determinadas pessoas plenamente capazes a quem a lei veda a prática profissional da empresa em razões de ordem pública decorrentes das funções que exercem.
Henrique Chagas (2003) frisa que o impedimento deve ser interpretado restritivamente, pois a regra assegura a todos o direito ao livre exercício e qualquer atividade econômica, independentemente de autorização, salvo nos casos previstos em lei. Portanto, o impedimento decorre da lei, exatamente por tratar-se de uma restrição de direitos.
O Código Civil de 2002 não relacionou as pessoas legalmente impedidas, assim sendo, de acordo com a doutrina majoritária e diversos normativos, não poderão ser empresários, na condição de titular de firma individual ou administrador de sociedade, as seguintes pessoas:
 Funcionários Públicos; os falidos, enquanto não reabilitados; Militares que estejam na ativa; os membros auxiliares do comércio (corretores, leiloeiros, despachantes aduaneiros; tradutores juramentados); os magistrados e membros do Ministério Público; os cônsules, quando remunerados; os estrangeiros não residentes no Brasil; os Deputados e Senadores (estes, somente em empresas que gozem de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público – artigo 54, II, da CF/88). O elenco é somente exemplificativo. Observação importante é que estas pessoas são impedidas de serem empresárias, mas não de serem sócias de empresas.
O mérito do art. 973 diz respeito à responsabilidade do legalmente impedido de exercer empresa, pois, conforme esclarece Maria Helena Diniz (2012, p. 125):
“A pessoa que, estando legalmente impedida de exercer atividade própria de empresário, vier a praticar atos empresariais, por eles responderá, com seu patrimônio pessoal, arcando com as obrigações assumidas e também reparando os prejuízos causados; além disso, sujeitar-se-á às penalidades administrativas e criminais (Lei de Contravenções Penais, art. 47) relativas ao exercício ilegal da profissão e poderá, se insolvente, incidir em falência (Lei n° 11.101/2005 art. 178, c/c CC, art. 1.011,$ 1°), embora não tenha direito de requerer sua recuperação judicial (Lei n° 11.101/2005, art. 48) ou extrajudicial (Lei n° 11.101/2005, art. 161).”
A prática do comércio realizada por pessoa impedida é considerada válida em relação a terceiros de boa-fé, isto porque, ainda que exista impedimento legal, a pessoa que exerça profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços será considerada empresária e como tal passível de ver a sua falência decretada, tendo em vista a validade dos atos de empresa por ela praticados em face de terceiros de boa-fé, posto que, embora impedido de exercer a atividade empresarial, as pessoas não são consideradas incapazes e, por conseguinte, os seus atos são considerados válidos.
A proposta do legislador é proteger o terceiro de boa-fé que desconheça do impedimento legal, com isso o impedido deverá honrar as obrigações assumidas não podendo se prevalecer dos direitos inerentes ao empresário regular.
Exemplificando, toma-se por base a aplicação da Lei 11.101/2005 que trata dos institutos da recuperação judicial, extrajudicial e da falência da empresa aplicados exclusivamente à empresário ou sociedade empresária: os dois primeiros (recuperação judicial e extrajudicial) são procedimentos benéficos ao empresário, já que se trata da possibilidade do reerguimento da sua empresa que passa por crise econômico-financeira, já a falência é um processo agressivo de execução dos bens do empresário devedor que concentra todos os seus credores numa única ação, este último procedimento de benefício nada tem. Pois bem, aquele impedido legalmente de exercer a atividade empresarial, se assim o fizer, ficará submetido a uma possível ação de falência, se porventura não cumprir com as obrigações decorrentes da sua atividade, pois, deverá honrar com as obrigações contraídas; por outro lado nunca poderá se valer dos pedidos de recuperação judicial ou extrajudicial, destinados aos empresários que exercem regularmente a atividade empresarial.
Após o estudo realizado, verificou-se a percepção do legislador ao editar o artigo 973 do Código Civil, pois o dispositivo estudado impede algumas pessoas de serem empresárias, que, por causa da função que exercem, possuem acesso às informações privilegiadas.
Exemplificando: um Juiz de Direito está impedido de ser empresário, pois se o fosse, poderia um dia ocorrer à situação de ele, como empresário, ter uma lide processual contra sua empresa e ele, como juiz de direito, ser o juiz encarregado de decidir o caso.
Além de impedir tais pessoas de exercerem a atividade de empresário, o legislador deixou expresso que, se descumprida esta norma, o legalmente impedido arcará com as consequências e responsabilidades respondendo civil e criminalmente pelos atos praticados, podendo inclusive que as obrigações financeiras recaiam sobre seus bens particulares.
O artigo estudado é de suma relevância para a segurança jurídica no segmento empresarial, pois é capaz de prever, evitar e punir situações controversas. (Cristian Rodrigues França, Silvana Faria Pereira, Adriele Luani Razini, Mariana Lunardelli, publicado em 05/2015, site jus.com.br. Acesso em 14/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 974. Poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor de herança.

§ 1º. Nos casos deste artigo, precederá autorização judicial, após exame das circunstâncias e dos riscos da empresa, bem como da conveniência em continuá-la, podendo a autorização ser revogada pelo juiz, ouvidos os pais, tutores ou representantes legais do menor ou do interdito, sem prejuízo dos direitos adquiridos por terceiros.

§ 2º. Não ficam sujeitos ao resultado da empresa os bens que o incapaz já possuía, ao tempo da sucessão ou da interdição, desde que estranhos ao acervo daquela, devendo tais fatos constar do alvará que conceder a autorização.

No escrutínio de Barbosa filho, as questões relativas à incapacidade superveniente do empresário individual, bem como de sua sucessão causa mortis em favor de incapaz, deixadas de lado na legislação pretérita, são, no atual Código, objeto de disciplina específica, cuja finalidade precípua é viabilizar a continuidade da empresa, desvinculando a manutenção e o desenvolvimento da atividade empresarial da situação pessoal de dado indivíduo, em benefício de todos que gravitam, com maior ou menor grau de dependência, em torno da complexa estrutura formada. Nas hipóteses propostas, de incapacidade superveniente ou sucessão causa mortis, o absolutamente incapaz (CC 3º), por meio de representante, e o relativamente incapaz (CC 4º), devidamente assistido, podem, portanto, prosseguir no exercício da atividade empresarial. Essa continuidade depende da obtenção de autorização judicial concreta. Trata-se de um requisito primordial, sendo imperiosa a conjugação com as normas protetivas ou restritivas próprias ao exercício da tutela ou da curatela e à administração de filhos menores (CC 1.689 a 1.693, CC 1.745 a 1.748 e CC 1.781). Feito requerimento pelo pai, tutor ou curador, mediante decisão fundamentada, o pedido de continuação será deferido ou não, devendo o juiz, então, efetuar uma análise de conveniência e oportunidade, sopesando os riscos do ramo empresarial exercido e os benefícios potenciais auferidos pelo incapaz e, também, por toda a coletividade de terceiros interessados. A autorização será sempre instrumentalizada por um alvará e pode ser condicionada à prestação de caução, ostentando caráter de precariedade, uma vez que, como esclarece o § 1º, revogável a qualquer tempo, por nova decisão judicial fundamentada, alterada a conjuntura que a houver motivado, ouvidos os pais, tutores ou representantes legais do menor ou do interdito. Em todo caso, a revogação não prejudicará jamais os direitos adquiridos por terceiros, imprescindível à liquidação dos negócios pendentes. Ademais, o legislador teve a preocupação de criar um patrimônio de afetação, circunscrevendo a responsabilidade patrimonial do incapaz a determinados bens, ou seja, àqueles vinculados ao próprio exercício da empresa, salvaguardados aqueles adquiridos antes da sucessão em favor do herdeiro incapaz ou antes da interdição do empresário individual e sem utilização empresarial. Tal fato deve, obrigatoriamente, constar do alvará expedido, recomendando-se seja feito um arrolamento de todos os bens excluídos da responsabilidade derivada do exercício da empresa. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 988 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 14/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o histórico, a redação desse dispositivo foi modificada durante a tramitação no projeto, quando foi suprimido o seu § 3º, que pede a ‘emancipação do menor comerciante quando este completasse dezoito anos’. Com a redução da capacidade de vinte e um para dezoito anos, tal regra ficou sem sentido. No Código Civil de 1916, havia a previsão de que, ocorrendo a incapacidade ou morte de um dos sócios na sociedade civil, tal fato seria causa de dissolução da sociedade (arts 1.402 e 1.403). O Código Comercial de 1850, de modo semelhante, previa a dissolução da sociedade na hipótese do falecimento de um dos sócios, salvo convenção em contrário estipulada no contrato social (art. 335, n. 4), hipótese em que a sociedade poderia continuar com os herdeiros do de cujus, desde que fossem maiores ou legitimamente emancipados; se os herdeiros fossem menores, nem com autorização judicial poderiam participar da sociedade (art. 308). Se o sócio falecido exercesse função de gerência ou administração na sociedade, os credores seriam também chamados para a nomeação do novo gerente (art. 309). O Código comercial de 1850, todavia, não continha qualquer previsão relativamente aos casos de interdição ou incapacidade superveniente de sócios, nas sociedades anônimas, a lei se refere, genericamente à hipótese de vacância do cargo de administrador, que poderá se dar por morte, interdição ou renúncia, sendo que, em qualquer hipótese, caberá ao Conselho de Administração designar o sucessor (Lei n. 64.047 & art. 150).

Segundo a doutrina de Ricardo Fiuza a norma do CC 974 contempla duas situações, a saber, os casos de falecimento e de interdição do empresário, que ocorre com sua incapacidade superveniente. Tanto em um caso como em outro, o Código Civil de 2002 permite a continuidade da empresa, sem necessidade da sua dissolução. No caso do interdito, será ele representado na empresa por meio de curador. Já na hipótese de falecimento do empresário, se o herdeiro for menor absolutamente incapaz, será ele representado por seus pais ou tutores, e, sendo relativamente incapaz, deverá ser assistido por seus pais em todos os atos que vier a praticar na condição de sócio. Em todos esses casos, a continuidade da empresa ou a viabilidade da sucessão na empresa dependerá, sempre, de autorização judicial. Não deverão integrar o capital da empresa os bens que o incapaz ou os herdeiros do falecido possuíam ao tempo da incapacidade ou da sucessão, quando esses bens integrarem o respectivo patrimônio pessoal não afeto à atividade empresarial. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 508-509, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 14/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No Lecionar de Osmar Brina Corrêa-Lima, o caput do art. 974 trata dos efeitos da incapacidade superveniente ao empresário individual. Intrigante a sua redação. Tente-se interpretá-lo conservando em mente três regras hermenêuticas: a) existe uma presunção juris tantum (relativa) de sabedoria do legislador; b) regra geral, inexistem palavras ociosas na lei; e c) “Deve-se evitar a interpretação que conduz ao absurdo” (Interpretatio illa summenda qua absurdum evitetur.).

É certo que a observância muito estrita dessas regras às vezes leva os doutrinadores a tentar explicar o inexplicável: a) regra geral, não existe regra sem exceção; b) todo ser humano é pessoa natural (A expressão "pessoa natural" contrapõe-se a “pessoa jurídica”); c) toda pessoa natural é sujeito de direitos e obrigações.

Regra geral, toda pessoa, natural ou jurídica, é capaz de exercer direitos e tem deveres na ordem civil (Segundo o art. 1º do Código Civil, "Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil". Sugere-se aqui a seguinte leitura: “Art. 12 - Toda pessoa (natural ou jurídica) é capaz (de exercer) direitos e (tem) deveres na ordem civil".).

Regra geral, toda pessoa natural somente adquire a plena capacidade para exercer pessoalmente os atos da vida civil ao completar dezoito anos. (CC 5º).

Excepcionalmente, a pessoa natural adquire a plena capacidade para exercer pessoalmente os atos da vida civil antes de completar dezoito anos: “I – pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos; II – pelo casamento; III – pelo exercício de emprego público efetivo; IV – pela colação de grau em curso de ensino superior; V – pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria (CC 5º - parágrafo único).

Excepcionalmente, a pessoa natural maior de dezoito anos, embora sujeito de direitos e obrigações, não possui a plena capacidade para exercer pessoalmente os atos da vida civil. Será considerada incapaz. A incapacidade para o exercício pessoal dos atos da vida civil pode ser absoluta ou relativa.

São absolutamente incapazes para o exercício pessoal dos atos da vida civil: “I - os menores de dezesseis anos; II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade” (CC 3º). Os absolutamente incapazes devem ser representados. É nulo o negócio jurídico quando celebrado por pessoa absolutamente incapaz. Código Civil, art. 166, I).

São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: “I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; IV - os pródigos” (CC 4. 0 parágrafo único do art. 4º dispõe que “A capacidade dos índios será regulada por legislação especial”.). Os relativamente incapazes devem ser assistidos. “É anulável o negócio jurídico por incapacidade relativa do agente. (CC 171, I).

Regra geral, toda pessoa natural plenamente capaz pode ser empresária individual (Código Civil: “Art. 972 - Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil...”).

Relembrando: Eis o texto completo do art. 972: “Art. 972 - Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos”. Contudo, o art. 973 dispõe o seguinte: “Art. 973 - A pessoa legalmente impedida de exercer atividade própria de empresário, se a exercer, responderá pelas obrigações contraídas”. Desse artigo se extrai a seguinte conclusão: a pessoa legalmente impedida (ex.: o funcionário público, o juiz, etc.) pode se tomar empresária; contudo, se o fizer, poderá sofrer sanções de ordem administrativa (ex.: até mesmo perder o seu emprego público).

Regra geral, somente a pessoa natural plenamente capaz pode ser empresária individual. (CC 972). Somente a pessoa natural plenamente capaz pode tornar-se empresária.

Excepcionalmente, a pessoa natural incapaz poderá ser empresária. Essa afirmativa apoia-se, precisamente, no art. 974 do Código Civil, transcrito no início deste trabalho.

A incapacidade da pessoa natural pode decorrer: (a) da menoridade; ou (b) da existência de problemas ligados, direta ou indiretamente, à sanidade mental. (Arts. 3º e 4º do Código Civil).

A colocação dos ébrios, dos viciados em tóxicos, e dos pródigos como pessoas com problemas ligados à sanidade mental, certamente, poderá gerar controvérsia ou discordância; contudo, fica mantida aqui por mera conveniência didática.

Os incapazes em decorrência da menoridade devem ser representados ou assistidos pelos seus pais ou pelo seu tutor. O menor absolutamente incapaz deve ser representado pelos seus pais ou pelo seu tutor. O menor relativamente incapaz deve ser assistido pelos seus pais ou pelo seu tutor.

Os absolutamente incapazes e os relativamente incapazes em decorrência da existência de problemas ligados, direta ou indiretamente, à sanidade mental devem ser, respectivamente, representados ou assistidos pelo seu curador. (Osmar Brina Corrêa-Lima (Professor Titular de Direito Comercial da Faculdade de Direito da UFMG e da Faculdade de Direito Milton Campos - Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, p. 222-224 - Acesso em 14/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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