quarta-feira, 10 de junho de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.028, 1.029, 1.030 Da Resolução da Sociedade Em relação a um sócio – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 1.028, 1.029, 1.030
 Da Resolução da Sociedade Em relação a um sócio
 VARGAS, Paulo S. R. Parte Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195)
Subtítulo II – Da Sociedade Personificada Capítulo I –
Da Sociedade Simples – (Art. 1.028 ao 1.032)
Seção VDa Resolução da Sociedade Em relação a um sócio
– vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á a sua quota, salvo:

I – se o contrato dispuser diferentemente;
II – se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade;
III – se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido.

Remanescendo ao Códigos de 1916, art. 1.399, IV e art. 355, item 4 – revogado – do Código Comercial, Marcelo Fortes Barbosa Filho aponta a morte de um dos sócios, já tida como inexorável dissolução de uma sociedade, considerada presente uma subordinação completa a agregação dos sócios à identidade e às qualidades individuais dos contratantes. Essa concepção rígida foi afastada, como demonstra o texto do presente artigo, mesmo no âmbito não empresarial das sociedades simples. Pretende-se, portanto, preservar a sociedade e, mais ainda, em benefício da coletividade, possibilitar a continuação da atividade empreendida e a correspondente geração de riquezas. Assim, morto o sócio, propõe-se, como regra geral, o empreendimento de uma resolução parcial do contrato celebrado, provocando, na forma do disposto no CC 1.031, a liquidação isolada e singular de sua quota social. Aos herdeiros é atribuído, mediante a redução do capital social, o valor correspondente à quota do de cujus, preservando o restante. Apesar de desfalcado seu acervo patrimonial, a sociedade sobrevive. Há, porém, três circunstâncias exceptivas, perante as quais outra solução será adotada. Num primeiro plano, caso os sócios entendam ser inviável a manutenção do ajuste, a dissolução da sociedade, e a extinção da pessoa jurídica serão irremediáveis, devendo ser sopesada, aqui, fundamentalmente, a importância da quota social ou, caso se trate de sócio de serviço, da atuação do falecido. Num segundo plano, podem já ter sido inseridas, no contrato social, com a finalidade de fornecer segurança quanto a futuros procedimentos, por meio de cláusula específica, regras concretas e incidentes, conforme a vontade coletiva consolidada, sempre diante da morte de um dos sócios, podendo-se imaginar, dentre as variações viáveis, a aquisição, por meio do pagamento de um valor fixo, da quota pelos demais sócios ou a amortização da quota, mediante a capitalização de reservas, pela pessoa jurídica. Num terceiro plano, os sócios remanescentes e os sucessores podem celebrar um acordo e viabilizar a admissão pura e simples de determinado sucessor ou de todos os herdeiros como sócios ou, ainda, de um terceiro, operando-se a substituição do falecido. Nos dois últimos casos, restará, enfim, mantida a integridade não somente da personalidade jurídica da sociedade, mas, também, do capital social. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1026 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/06/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Ante o histórico, referente ao artigo em comento, esta disposição foi modificada na tramitação do projeto no Congresso Nacional. O Código Civil de 1916, em seu art. 1.399, IV, previa que, no caso de morte de um dos sócios, a sociedade deveria ser dissolvida e consequentemente liquidada e extinta. Todavia, os artigos 1.402 e 1.403 admitiam a continuidade da sociedade se assim fosse deliberado entre os sócios remanescentes e os herdeiros do sócio falecido.

Conforme reage a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, a sociedade simples não se dissolve nem se extingue, automaticamente, no caso da ocorrência da morte de qualquer dos seus sócios. Na hipótese do falecimento de sócio, a regra geral é a liquidação de suas quotas no capital social, com o pagamento aos herdeiros, com redução do capital social, se for o caso, mas sem prejuízo da continuidade da sociedade. A liquidação das quotas implica o pagamento dos haveres e créditos do sócio falecido em favor de seus herdeiros, impossibilitando a participação destes, consequentemente, como membros da sociedade. Todavia, o contrato social pode estipular outro procedimento nesse caso, assim como os sócios remanescentes podem decidir pela dissolução da sociedade. A quota do sócio falecido também não será liquidada na hipótese de os herdeiros decidirem por sua substituição. Mas essa substituição somente ocorrerá mediante a aceitação dos demais sócios, tendo em vista o princípio da affectio societatis, como também em decorrência do disposto nos CC 997 e 999. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 537, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/06/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Thelma de Mesquita Garcia, em seu artigo a respeito da Sociedade e Família “Sucessão hereditária pode ameaçar continuidade de empresaA disciplina legal da sociedade empresária prevê, como regra geral (artigo 1028 do Código Civil), a liquidação das cotas do sócio que vier a falecer, admitindo as três exceções ali constantes, sempre vinculadas à vontade dos sócios.

Essa abordagem genérica da lei não afasta o risco de decisões judiciais equivocadas, que ameaçam a continuidade da empresa, pois acabam impondo aos sócios remanescentes a admissão de herdeiro, e ainda lhe atribuem cargo de administrador, o que afronta o regime jurídico societário e inviabiliza a gestão da empresa. Esse grave equívoco decorre da interpretação errônea da sucessão hereditária no âmbito do Direito Societário.

Da perspectiva da lei civil, a sucessão hereditária transmite aos herdeiros a posse e o domínio dos bens do falecido. Porém, do prisma do Direito Empresarial, a morte do sócio não implica o ingresso do herdeiro na sociedade de pessoas, não lhe atribuindo automaticamente o direito de ser sócio, mas apenas o eventual crédito correspondente às cotas herdadas, porque o que se transmite por herança é a propriedade destas.

O princípio da affectio societatis, que norteia a constituição da sociedade de pessoas, exige o consentimento dos sócios para qualquer alteração no quadro societário, pois, em razão do caráter pessoal da sociedade, a confiança recíproca é pressuposto de sua constituição e do cumprimento do seu objeto social. Em suma, à luz do regime jurídico societário, herdeiro não é sócio, seja sucessor do minoritário ou do majoritário.

Ao reconhecer-se ao herdeiro o direito ao crédito correspondente às cotas, cumpre-se a lei civil, sem desafiar a sistemática do Direito Societário, perante o qual a vontade dos sócios de sociedade de pessoas deve ser respeitada, sob pena de quebra da affectio societatis e violação do princípio constitucional da liberdade de associação e de contratação.

Se a doutrina não admite a transmissão hereditária do status de sócio em sociedade de pessoas, muito menos, do cargo de administrador, não se podendo compelir os sócios remanescentes a aceitarem o herdeiro na gerência da empresa. O critério de escolha do administrador se baseia nas suas características pessoais, pois o cargo exige credibilidade e aptidão para gerir os negócios da empresa, atributos que não se transferem por herança.

Ainda que o contrato social nada disponha a respeito, a omissão não deve ser interpretada como anuência tácita dos sócios remanescentes ao ingresso dos herdeiros na sociedade. Mas as lacunas do contrato têm gerado controvérsias de sérias consequências.

Daí a importância de definir no contrato social todas as coordenadas que disciplinarão a sucessão hereditária, de modo a tornar inequívoca a vontade dos sócios, para garantir o ingresso de herdeiros ou para vetá-los.

Não basta, porém, estabelecer condições genéricas para a sucessão. A permissão pura e simples de substituição do sócio falecido por seus herdeiros e sucessores pode representar um título em branco assinado antecipadamente pelos sócios em favor de herdeiros e sucessores eventualmente desconhecidos. Proibições mal definidas também podem dar ensejo a leituras equivocadas.

Portanto, o único meio seguro de evitar a aplicação errada da lei sucessória ao caso concreto, é especificar, com precisão técnica, no contrato social, todas as disposições de vontade dos sócios em relação à sucessão hereditária na empresa. (Sociedade e famíliaSucessão hereditária pode ameaçar continuidade de empresa” - Thelma de Mesquita Garcia e Souza, advogada especialista em Direito Empresarial, autora do livro Governança Corporativa e o Conflito de Interesses nas S.A., postado em 15 de dezembro de 2005, Revista Consultor Jurídico, acessado em site da conjur.com.br. Acesso 10/06/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.029. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa.

Parágrafo único. Nos trinta dias subsequente à notificação, podem os demais sócios optar pela dissolução da sociedade.

Seguindo o entendimento de Marcelo Fortes Barbosa Filho, foi prevista, aqui, a retirada voluntária do sócio, decorrente de seu dissenso unilateral. Há, nessa hipótese, a denúncia do contrato por parte do descontente, desfazendo apenas um dos vínculos jurídicos derivados do contrato plurilateral, possibilitadas a manutenção de todos os demais e a preservação da pessoa jurídica. Uma dupla disciplina foi construída, diferenciando-se os requisitos da retirada voluntária de acordo com a duração prevista para a execução do ajuste de vontades. Se a sociedade foi contratada por prazo indeterminado, as exigências para o rompimento de uma relação individual, de um só sócio, são menos importantes, podendo ser satisfeitas pelo próprio interessado, sem a necessidade de intervenção de qualquer outra pessoa ou de demonstração de relevância da causa do dissenso. A vontade de extinguir o liame societário é, então, soberana, pois ninguém pode ser constrangido a permanecer, indefinidamente, associado. Basta seja providenciada a notificação dos demais sócios, estabelecida uma antecedência mínima de sessenta dias, visando à necessária reorganização do quadro social. Tal notificação pode ser judicial (CPC 301 e 726), ou extrajudicial (art. 160 da Lei n. 6.015/73), só produzindo efeitos, evidentemente, após sua entrega efetiva. Dita notificação, no entanto, firmou-se como requisito formal da denúncia do contrato de sociedade, pois, no curso do prazo de sessenta dias, os sócios deverão decidir sobre a sorte da pessoa jurídica como um todo, em particular sobre a eventualidade de uma dissolução total da sociedade. Se a sociedade, no entanto, for contratada por prazo determinado, persistirá uma fundada expectativa dos demais sócios quanto à continuidade da execução do contrato de sociedade, motivo pelo qual, em atenção ao princípio da boa-fé objetiva, exige-se esteja o dissenso unilateral fundado numa justa causa, a ser reconhecida, obrigatoriamente, em juízo. O conceito de justa causa é aberto e indeterminado, ficando a cargo do juiz, em cada caso concreto, determinar se os fatos alegados e comprovados ostentam a relevância proposta e sustentam a pretensão de retirada unilateral. Pelo parágrafo único, confere-se, também, aos demais sócios, considerada a denúncia do contrato de sociedade com prazo indeterminado, a faculdade de optarem, levando em conta sua conveniência e as peculiaridades de seu empreendimento, num prazo de trinta dias, contado da efetiva notificação, pela dissolução completa, com o que será, naturalmente, iniciado um procedimento de liquidação e, ao final, extinta a pessoa jurídica, aguardando aquele que manifestou seu desejo de se retirar até o término da total apuração de haveres e adimplemento dos débitos para auferir os valores correspondentes a sua quota. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1028 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/06/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente, a redação da norma é a mesma constante do projeto original. Os arts. 1.404 a 1.406 do Código de 1916, estabeleciam as regras para a retirada voluntária do sócio da sociedade, sob a forma de renúncia, que poderia ser de boa-fé ou de má-fé. O CC/2002 não contempla essa distinção. O artigo 1.408 do antigo Código também previa a necessidade de justa causa para a retirada do sócio na sociedade constituída por prazo determinado.

No entanto, a doutrina de Fiuza, afirma ninguém ser obrigado a associar-se ou a manter-se associado (CF, art. 52, XX). Assim, todo sócio tem o direito de se retirar da sociedade se for de seu interesse pessoal. Quando a sociedade for constituída por prazo indeterminado, o sócio pode retirar-se a qualquer tempo, bastando notificar os demais sócios, por escrito, com antecedência de sessenta dias. Se a sociedade for por prazo determinado, o sócio que pretender retirar-se tem de provar, por meio de ação judicial de dissolução de sociedade, a existência de justa causa motivadora para sua saída. Neste caso, o juiz apreciará as razões em que se funda a decisão de retirada antes do tempo previsto para a dissolução da sociedade. O parágrafo único deste dispositivo diz respeito, apenas, à hipótese de retirada do sócio nas sociedades por prazo indeterminado, quando os demais sócios poderão deliberar pela dissolução total da sociedade, e não apenas por sua dissolução parcial. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 537, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/06/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em seu artigo “Direito de recesso do sócio de sociedade limitada firmada por prazo indeterminado, Ricardo Victor Gazzi Salum, considera ter o Código Civil de 2002 trazido para seu bojo a disciplina das sociedades, anteriormente encontrada no Código Comercial - cuja primeira parte foi expressamente revogada - consoante se infere do artigo 2045 do diploma civil vigente.

O tratamento da antiga Sociedade por Quotas de Responsabilidade Limitada (atualmente Sociedade Limitada), prevista no Decreto nº. 3.708/19, foi tacitamente revogado pelo Código Civil de 2002, tendo em vista que referida sociedade possui, agora, regras específicas tratadas nos CC 1.052 a 1.086.

A leitura dos dispositivos relacionados à disciplina das sociedades, no Código Civil de 2002, atesta que não houve expressa menção acerca do direito de recesso do sócio da Sociedade Limitada.

A doutrina, no entanto, vem buscando sanar esta omissão do diploma civil no seu artigo 1029, que regula o direito de retirada do sócio na Sociedade Simples.
Ampara essa tese a previsão expressa contida no CC 1053 do Código Civil de 2002, o qual prevê que, nos casos de omissão, as regras das Sociedades Simples serão aplicáveis às Sociedades Limitadas.

Com efeito, desde a promulgação do Código Civil de 2002, os especialistas vêm entendendo que as regras das sociedades simples constituem regras gerais de direito societário.

O Código Civil de 2002, brasileiro, tal qual o italiano, não se preocupou em conceituar a sociedade simples. Mas se pode inferir, da estrutura codificada, que as disposições das sociedades simples são regras gerais em matéria de direito societário. (Campinho, 2003, P. 85).

Tal interpretação, aliás, decorre da própria dicção do já mencionado artigo 1053 do Código Civil de 2002, segundo o qual "a sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples".

Seguindo essa orientação, e desde que o contrato social não preveja expressamente a regência supletiva da Sociedade Limitada pelas normas da Sociedade Anônima, como admite o parágrafo único do mencionado dispositivo, pode-se afirmar que, nas omissões do Código Civil de 2002, em relação à disciplina das demais sociedades, poder-se-ão aplicar as regras das Sociedades Simples, abrangidas pelos artigos 997 a 1051.

Nesse sentido, diante da ausência de regra expressa descrevendo o direito de retirada do sócio das Sociedades Limitadas, deve-se invocar a regra preconizada pelo artigo 1029 do Código Civil, o qual regula a matéria para as Sociedades Simples.
Comentando as hipóteses de retirada de sócio das Sociedades Limitadas, Sérgio Campinho assevera:

É assegurado ao sócio pelo art. 1.029 do Código Civil de 2002 – de aplicação compulsória à sociedade limitada, visto sua implicação na resolução, ainda que parcial, do contrato da sociedade em relação ao sócio dissidente –, o direito de, além dos casos previstos na lei ou no contrato, poder retirar-se da sociedade, sempre que lhe aprouver (sociedade com prazo indeterminado) ou quando for verificada justa causa (sociedade com prazo determinado).

Firmando-se a sociedade por prazo indeterminado de vigência, o recesso poderá ser viabilizado mediante singela notificação aos demais sócios, por via judicial ou extrajudicial, por meio da qual o dissidente emita claramente sua vontade de desfazer-se do vínculo, com antecedência mínima de sessenta dias, não sendo necessário, porque a lei não exige, declarar justa causa para o ato. Na verdade, não se lhe impõe que justifique ou decline a causa de sua iniciativa, em atenção ao princípio de que ninguém é obrigado a manter-se contratado, por prazo indeterminado. Por simples manifestação unilateral de sua vontade, o sócio libera-se do vínculo contratual. (Campinho, 2003, P. 209/210).

Fábio Ulhoa Coelho leciona que: "As condições para o exercício do direito de retirada variam, segundo a limitada tenha sido contratada por prazo indeterminado ou determinado. A natureza contratual da limitada orienta a compreensão da matéria. Se a sociedade é contratada por prazo indeterminado, o sócio pode retirar-se a qualquer momento (CC/2002, art. 1.029; c/c, art. 335, nº. 5), já que, em decorrência do princípio da autonomia da vontade, que informa o direito contratual, ninguém pode ser obrigado a manter-se vinculado contra a sua vontade, por tempo indefinido.

Das sociedades por prazo indeterminado, o sócio pode retirar-se a qualquer tempo, independentemente de motivação". (Coelho, 2002, P. 434).

Como se denota, ambos os juristas citados entendem que, nas Sociedades Limitadas firmadas por prazo indeterminado, o sócio poderia exercer seu direito de recesso por simples manifestação unilateral de vontade, o que independeria, inclusive, da anuência dos demais sócios.

Com efeito, tal dispositivo consagra o princípio da autonomia da vontade, pois não se pode admitir que o sócio seja obrigado a se manter contratado, por prazo indeterminado, contra sua própria vontade.

Nos termos do artigo 1029 do Código Civil, o sócio que pretender se retirar da Sociedade Limitada firmada por prazo indeterminado deverá manifestar sua intenção, aos demais sócios, mediante singela notificação a estes, com antecedência mínima de 60 dias.

A notificação poderá ser realizada por qualquer forma que exprima a efetiva intenção de retirada do sócio, seja judicial ou extrajudicialmente, mormente porque a lei não exige formalidades específicas para o exercício desse direito.

No entanto, inclusive para a contagem do prazo de 60 dias, é prudente que a notificação seja formalizada de tal forma que permita ao sócio fixar com exatidão a data final para o exercício do direito de recesso, evitando-se eventuais controvérsias.

Essa notificação que não precisa explicitar os motivos da retirada, mas tão só o desejo do sócio de não mais se manter associado, como a lei não impõe forma especial, poderá ser realizada judicial ou extrajudicialmente. O importante é que seja veiculada por um dos meios de comunicação de vontade existentes, capaz de fazer prova segura de que chegaram, a comunicação e seu conteúdo, incólumes ao seu destinatário. (Campinho, p. 118/119).

Faz-se mister ressalvar, outrossim, a previsão trazida pelo parágrafo único do aludido artigo 1029, que resguarda a possibilidade dos demais sócios, nos 30 dias subsequentes ao recebimento da notificação, o direito de optar pela dissolução da sociedade.

Tal se justifica porque há casos nos quais o recesso de um dos sócios pode tornar inclusive desinteressante a continuidade da própria sociedade. Nessas hipóteses, portanto, não será realizada a dissolução parcial, mas sim a dissolução total da sociedade.

Após decorridos os 60 dias da notificação, e não manifestando os demais sócios a intenção de realizar a dissolução total da sociedade ou mesmo dado início ao processo de liquidação das quotas do sócio retirante, este poderá promover a dissolução parcial judicialmente. (Ricardo Victor Gazzi Salum, “Direito de recesso do sócio de sociedade limitada firmada por prazo indeterminado”, postado em 18 de junho de 2008 no site migalhas.com, acessado em 10/06/2020, Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente.

Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.

Como esclarece Barbosa filho, na sociedade simples, a exclusão de sócio, desconsiderada a hipótese de inadimplemento da integralização das quotas do capital social, que merece tratamento específico e peculiar (CC 1.004), observa uma série de restrições, como fim de que não seja caracterizada uma expulsão, a quebra injustificada e repentina do liame contratual concretizado. O sócio minoritário pode ser excluído em duas circunstâncias diversas. Há, conforme o parágrafo único do presente artigo, a possibilidade de eclodirem problemas de incompatibilidade decorrentes da situação patrimonial individual de determinado sócio, o que implica, assim, a exclusão de pleno direito, a qual independe de qualquer deliberação dos demais sócios. Essa exclusão automática ocorre em razão da decretação da falência, dada a perda de disponibilidade patrimonial e a arrecadação de todos os bens, com exceção apenas dos impenhoráveis, para a satisfação dos credores mantidos em concurso, ou motivada por execução singular, observados, com todo rigor, os requisitos previstos no parágrafo único do CC 1.026. Liquida-se, então, a participação societária e o produto obtido será destinado aos credores do sócio excluído. É possível, porém, que a exclusão decorra da deliberação dos sócios, a ser aprovada, nesse caso, pelos votos da maioria do capital social, exigindo-se fundamentação específica, consistente no grave descumprimento de obrigações contratuais ou na incapacidade superveniente do excluído, bem como posterior confirmação judicial do alegado, movida ação de rito ordinário, em que, estabelecido contraditório, será concedida a oportunidade de ampla defesa. Ressalte-se que o conceito de falta grave é aberto, merecendo ser feito, caso a casa, um juízo de valor concreto, medindo-se a incompatibilidade da conduta noticiada e comprovada com a condição de sócio. Alguns exemplos merecem realce. Um sócio de serviço pratica uma falta grave quando simplesmente deixa de prestar a contribuição ajustada, quando divulga informações confidenciais ou quanto pratica atos de gestão ilícitos ou com violação do próprio contrato social. Nessas duas circunstâncias, a exclusão preserva a sociedade simples e viabiliza o prosseguimento do empreendimento. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1028 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/06/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Lendo o histórico, nenhuma alteração ou emenda foi apresentada a este dispositivo durante a tramitação do projeto no Congresso Nacional. O art. 1.406 do Código Civil de 1916 não continha regra específica para a exclusão do sócio que tivesse praticado falta grave, mas, apenas, a possibilidade de exclusão antecipada do sócio renunciante de má-fé.

Acompanhando a doutrina de Ricardo Fiuza, qualquer sócio pode ser excluído, por iniciativa da maioria dos sócios, se vier a cometer falta grave, atentando contra a sociedade e contra as disposições do contrato social. A ressalva feita ao CC 1.004 e seu parágrafo único refere-se ao processo de exclusão diferenciado aplicável ao sócio remisso, que deixa de integralizar o capital subscrito. Esse processo de exclusão deve ser feito por via judicial, através de ação própria, em que deverá ser justificada e provada a ocorrência de falta grafe. Independe de decisão judicial a exclusão do sócio que vier a falir, como empresário individual, ou cuja quota tenha sido objeto de liquidação para pagamento de dívidas pessoais, tal como previsto no parágrafo único do CC 1.026. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 538, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/06/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Creditando ao autor Luiz Cláudio Barreto Silva em seu artigo “Sociedade comercial: É cabível a exclusão judicial do sócio majoritário pelos minoritários por falta grave”, é possível a exclusão dos sócios majoritários pelos minoritários pela via judicial. Essa é a interpretação de substancial vertente doutrinária ao artigo do Código Civil em vigor, que disciplina a resolução da sociedade com relação ao sócio. Nessa espécie de expulsão dos sócios não se leva em conta a maioria do capital social. É que o Código Civil brasileiro usa a expressão "mediante iniciativa dos demais sócios". Por isso, cometida falta grave (Art. 1001 a 1009 do Código Civil Brasileiro o rol para a doutrina especializada não é taxativo, é meramente enunciativo), não se pode negar aos demais sócios, ainda que minoritários, o direito de buscar na via judicial a expulsão do sócio faltoso da sociedade.

Não se desconhece que o Código Civil Brasileiro disciplina em outro artigo (CC 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa. (Destacou-se), espécie de exclusão por meio da qual se exige a "maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social". Contudo, essa exigência restringe-se à expulsão extrajudicial do sócio por justa causa.

No entanto, em se tratando de expulsão judicial por falta grave, a expulsão dos sócios majoritários pelos minoritários é plenamente admissível, o que se constata do posicionamento de Arruda Alvim e Thereza Alvim: "Outra modificação importante diz respeito à possibilidade, pelo novo sistema, de exclusão dos sócios majoritários pelos minoritários. Na vigência do Decreto nº 3.708, a melhor doutrina já admitia a exclusão judicial dos sócios majoritários pelos minoritários, lastreada na lição clássica de Fábio Konder Comparato, conforme frisado por José Waldecy Lucena.

Agora, como o art. 1.030 prevê que o sócio pode ser excluído judicialmente, mediante 'iniciativa dos demais sócios', parece claro que essa exclusão pode ser feita judicialmente". (Newton De Luccaet al; Alvim e Thereza Alvim (Coord.). Comentários ao Código civil brasileiro: do direito de empresa. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 464. 

Em igual sentido, a lição de Fernando Brandariz: "A interpretação do artigo 1030 do Código Civil pode levar o interprete a ter a conclusão de que o sócio majoritário nunca poderá ser excluído, porque estabelece que a iniciativa de exclusão deve partir da maioria, mas não é isso que ocorre. O sócio majoritário como qualquer outro pode ser excluído quando der causa a ela, se isso não fosse possível, os sócios minoritários ficariam presos à sociedade e sendo responsabilizados pelos atos realizados pelo sócio majoritário. A exclusão do sócio majoritário mesmo que exista cláusula permissiva de exclusão, somente será realizada por meio de processo judicial. Isso ocorre porque a Junta Comercial não arquiva alteração de contrato social com assinaturas apenas da minoria do capital social". (BRANDARIZ, Fernando. A expulsão do sócio por falta grave. Disponível em: gapconsultoria.com.br /assessoria. Acesso em: 11 mar. 2009. 

É também o entendimento de Marcus Vinicius Caminha: "Na nossa opinião, a melhor exegese que se pode fazer do art. 1030, do Código Civil em vigor é a sistemática, através do seu cotejo com o art. 1.085, a partir da qual passa-se a perceber que, hoje, está legalmente autorizada a exclusão de sócio que detenha a maioria do capital social. Com efeito, enquanto o art. 1085, ao tratar da exclusão, fala que esta pode ser implementada pela maioria do capital social, o art. 1030 diz que a iniciativa desta poderá ser apenas "da maioria dos demais sócios", maioria, essa, que, no nosso entendimento, deve ser calculada não em função do capital social, e sim em razão do número de sócios.

É possível a exclusão de sócio que detenha a maioria do capital social, desde que esta exclusão se faça pela via judicial, sendo necessário que seja requerida pela maioria dos sócios, considerados singularmente enquanto pessoas, e não em função do capital social que detêm". (CAMINHA, Marcus Vinícius. Exclusão de sócio de sociedade por quotas no novo Código Civil: devido processo legal e controle jurisdicional do ato de exclusão; apuração de haveres. Disponível em: ambito.juridico.com.br. Acesso em: 11 mar. 2009. 

Na mesma linha de entendimento, as considerações de Carlos Celso Orcesi da Costa: "É que, não obstante uma primeira impressão de que se cuide de exclusão apenas pela maioria, bem analisado, o texto permite inclusive a exclusão pela minoria, quando exclui o sócio em xeque da deliberação de ingressar ou não com a lide". Se um sócio tiver 60% do capital e outros quatros sócios tiverem 10% cada um, a maioria no caso se estabelecerá com 30%, isto é, a decisão de três dos quatro sócios remanescentes". (COSTA, Carlos Celso Orcesida. Código Civil da Visão do Advogado. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 4, p. 169.

No mesmo sentido, a lição de Arnoldo Wald: "O artigo 1.030 traz inovação no que diz respeito ao poder da minoria. Isto porque, de acordo com a redação do artigo, 'pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios'. Ou seja, a maioria será computada excluindo-se do cálculo o sócio que se pretende jubilar. Se o sócio a ser excluído detém a maioria do capital social da sociedade, a sua exclusão poderá, em tese, se dar por decisão dos sócios restantes, ou seja, por decisão dos sócios minoritários". (TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Comentários ao novo Código Civil, v. XIV, livro II, do direito de empresa. (Coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 237. 

Por conseguinte, e sem desmerecer os entendimentos em sentido diverso, é cabível a expulsão do sócio majoritário pelos minoritários, desde que a postulação seja feita pela via judicial e se comprove a prática, por parte do referido sócio, de falta grave, seja daquela contida nos artigos 1001 a 1009, do Código Civil Brasileiro, ou de outra espécie com igual conformação, uma vez que as situações elencadas pelo legislador como configuradoras de falta grave não são exaustivas, mas meramente enunciativas. (TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Comentários ao novo Código Civil, v. XIV, livro II, do direito de empresa. (Coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 237. (Destacou-se). (SILVA, Luiz Cláudio Barreto, no site lex.com.br, Produtos online, acessado em 10/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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