Direito Civil Comentado - Art. 1.225, 1.226, 1.227
Dos Direitos Reais - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro III – Título II – Dos
Direitos Reais
(Art. 1.225 ao 1.227) Capítulo Único – Disposições Gerais
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DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS
DIREITOS HUMANOS
Artigos do 1º ao 30º, divididos de 10 em 10
distribuídos entre cada um dos três artigos que compõem os Direitos Reais.
Art. 1.225. São direitos reais: I - a propriedade; II - a superfície; III - as
servidões; IV - o usufruto; V - o uso; V I - a habitação; V II - o direito do
promitente comprador do imóvel; V III - o penhor; IX - a hipoteca; X - a
anticrese; X I - a concessão especial para fins de moradia; Inciso acrescentado
pela Lei n. 11.481, de 31.05.2007. X II - a concessão de direito real de uso.
Inciso acrescentado pela Lei n. 11.481, de 31.05.2007.
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS
DIREITOS HUMANOS
1º. Todos os seres humanos nascem livres e
iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir
em relação uns aos outros com espirito de fraternidade. (...)
Art. 2º. I – Todo ser humano tem capacidade
para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem
distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião (...)
Art. 3º. Todo ser humano tem direito à vida, à
liberdade e à segurança pessoal (...)
Art. 4º. Ninguém será mantido em escravidão ou
servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas
formas (...)
Art. 5º. Ninguém será submetido à tortura, nem
a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante (...)
Art. 6º. Todo ser humano tem o direito de ser,
em todos os lugares, reconhecido Como pessoa perante a lei. (...)
Art. 7º. Todos são iguais perante a lei e têm
direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a
igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e
contra qualquer incitamento a tal discriminação. (...)
Art. 8º. Todo ser humano tem direito a receber
dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os
direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.
(...)
Art. 9º. Ninguém será arbitrariamente preso,
detido ou exilado (...)
Art. 10º. Todo ser humano tem direito, em
plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal
independente e imparcial, para decidir seus direitos e deveres ou fundamentos
de qualquer acusação criminal contra ele (...)
Art. 1.225. São direitos reais: I - a propriedade; II - a superfície; III - as
servidões; IV - o usufruto; V - o uso; V I - a habitação; V II - o direito do
promitente comprador do imóvel; V III - o penhor; IX - a hipoteca; X - a
anticrese; X I - a concessão especial para fins de moradia; Inciso acrescentado
pela Lei n. 11.481, de 31.05.2007. X II - a concessão de direito real de uso.
Inciso acrescentado pela Lei n. 11.481, de 31.05.2007.
Sob o prisma de Francisco
Eduardo Loureiro, o CC 1.225,
seguindo a linha do que já dispunha o art. 674 do Código Civil de 1916,
consagra a positivação do princípio de que os direitos reais são numerus
clausus. Somente podem ser criados por lei, ao contrário dos direitos de
crédito, nos quais prevalece a autonomia privada em sua criação, constituindo numerus
apertus. O catálogo previsto no CC 1.225, porém, não é taxativo e não
esgota todos os possíveis direitos reais, já que há outros criados por leis
especiais diversas, como, por exemplo, a alienação fiduciária sobre bens
imóveis, regulada pela Lei n. 9.514/97, ou o compromisso de compra e venda de
imóveis loteados, disciplinado pela Lei n. 6.766/79. Note-se que não há por
parte do legislador necessidade da utilização de expressões sacramentais para a
designação dos direitos reais em leis especiais, bastando previsão legal e que
se deduza claramente do instituto sua natureza. Os incisos XI e XII foram
incluídos no Código Civil por força da recente Lei n. 11.481 de 2007. A
inclusão elimina a dúvida anteriormente existente na doutrina, sobre a natureza
jurídica dos institutos da concessão especial para fins de moradia e concessão
de direito real de uso, previstos, respectivamente, na Medida Provisória n.
2.220, de 2001, e art. 4º, inciso V, alínea g, do Estatuto da Cidade.
Não resta mais dúvida, diante da posição explícita da lei, que são direitos
reais sobre coisa alheia, de gozo e de fruição. Não havia necessidade, porém,
de alterar o Código Civil, pois novos direitos reais podem ser criados por leis
especiais. Ademais, por questão de método, os demais direitos reais referidos
neste artigo têm a tipicidade regulada no próprio Código Civil, o que não
ocorre com os ora acrescidos. A ausência de tipicidade no próprio Código Civil
dos dois novos direitos reais torna necessária breve analise sobre a sua
natureza e regras de regência em leis especiais. No que se refere à concessão
de direito especial para fins de moradia, a sua inclusão no inciso XI do CC.
1.225, em acréscimo ao direito de propriedade (inciso I), deixa claro que não
se trata de modalidade de usucapião sobre imóveis públicos de titularidade da
União, Estados e Municípios. Embora os requisitos sejam semelhantes aos do
usucapião especial urbano e usucapião coletivo, parece claro que o possuidor
não se torna proprietário do imóvel público ocupado, pois o direito real sobre
coisa alheia se extingue nos casos de se dar ao imóvel destinação diversa da
residencial, ou de se adquirir a propriedade ou concessão de uso de outro
imóvel urbano ou rural. Os requisitos para aquisição do direito real são
semelhantes aos da usucapião especial urbana individual e coletiva, tal como
previsto na MP n. 2.220/2001 e Lei n. 11.481/2007. Prevalece o entendimento de
que se trata de direito subjetivo dos possuidores que preencham os requisitos
legais, que, portanto, podem exigir compulsoriamente do Poder Público a outorga
do direito real e, no caso de recusa injustificada, a obtenção de sentença
judicial de natureza declaratória, que servirá de título hábil para ingresso no
registro imobiliário. Caso a posse tenha por objeto imóvel em área de risco à
saúde ou à vida dos ocupantes, o exercício do direito pode dar-se sobre imóvel
diverso. Embora não explicite a norma, parece razoável que em tal hipótese,
embora constitua direito subjetivo dos ocupantes, a nova gleba é de escolha do
Poder Público.
De
igual modo, pode também o Poder Público alterar o local ocupado por sua própria
iniciativa, deslocando o direito de moradia para área diversa, com o escopo de
evitar a ocupação em imóveis de uso comum do povo, destinado a projeto de
urbanização, defesa nacional, preservação ambiental, ou reservado à construção
de obras públicas. No que se refere à concessão de direito real de uso,
“consiste na transferência da faculdade de usar, do poder público, para o
particular ou outro ente estatal” (Luciano de Camargo Penteado, Direitos
reais, RT, 2008, p. 483). Não há aqui direito subjetivo do particular, pois
a iniciativa de concessão é do próprio poder público, por ato vinculado. Nos
termos do art. 18 da Lei n. 9.636/98, pode a União ceder gratuitamente ou
impondo determinadas condições ou encargos o uso de seus bens a Estados,
Distrito Federal, Municípios ou particulares, pessoas físicas ou jurídicas, em
se tratando de interesse público ou social ou de aproveitamento econômico de
interesse nacional. Distinguem-se a taxatividade e a tipicidade dos direitos reais.
A primeira trata do catálogo, do elenco dos direitos reais. A segunda define o
conteúdo de cada um dos tipos dos direitos reais, a descrição fundamental de
suas características ou elementos. São conceitos complementares, mas distintos
entre si. A doutrina tradicional afirma que os direitos reais são numerus
clausus e típicos. A doutrina contemporânea questiona o princípio da
tipicidade. Na lição de Gustavo Tepedino, se de um lado é certo que a criação
de novos direitos reais depende de lei, por outro lado também “certo é que no
âmbito do conteúdo de cada tipo real há um vasto território por onde atua a
autonomia privada e que carece de controle quanto aos limites (de ordem
pública) permitidos para esta atuação” (Multipropriedade imobiliária.
São Paulo, Saraiva, 1993, p. 83). Essa interpretação elástica da tipicidade
permite dar maior alcance a cada um dos direitos reais, acomodando situações jurídicas
que necessitam ganhar realidade e colmatando as falhas e lacunas existentes em
cada uma das figuras. Tome-se como exemplo a possibilidade de enquadrar a
multipropriedade e o leasing imobiliário como modalidades do direito real de
propriedade. Ou a admissão do direito real de superfície por cisão, permitindo
ao proprietário alienar temporariamente construção já feita, em vez de
simplesmente conceder o direito de construir ao superficiário. Em termos
diversos, mantém-se íntegro o princípio positivado da taxatividade, mas se
admite certa elasticidade no princípio da tipicidade, para que cada um dos
direitos reais possa abrigar situações jurídicas que, embora não expressamente
previstas, sejam compatíveis com seus princípios e mecanismos. Verifica-se que
o CC 1.225 do Código Civil de 2002 eliminou dois direitos reais previstos no
art. 674 do Código Civil de 1916, quais sejam, a enfiteuse e as rendas
constituídas sobre imóveis. Isso quer dizer que tais direitos reais não mais
podem ser criados na vigência do Código atual, porque perderam a previsão
legal. Note-se que são direitos reais incidentes sobre imóveis, de modo que o
registro tem caráter constitutivo. Escrituras públicas que convencionaram as
aludidas relações jurídicas, antes do registro, geram simples direito de
crédito, que não mais podem se converter em direito real na vigência do atual
Código Civil de 2002. As enfiteuses e as rendas constituídas sobre imóveis
criadas no regime do velho Código Civil, porém, em atenção à garantia do ato
jurídico perfeito, continuam a produzir todos seus efeitos, até que sejam
extintas por uma das causas previstas na legislação revogada. São casos de
ultraatividade da lei revogada, que continua a projetar seus efeitos na
vigência da lei nova. A questão ganha especial relevância em relação ao direito
real de enfiteuse, em vista de sua natureza perpétua, o que cria a possibilidade
da figura persistir ainda por décadas, ou séculos, irradiando consequências
jurídicas no regime do atual Código Civil. O CC 2.038, atento a tal questão,
tratou de regular questões de direito intertemporal, proibindo a constituição
de subenfiteuses no regime do atual Código Civil.
Aproveitou
a oportunidade, ainda, para positivar entendimento pretoriano sobre a
enfiteuse, especialmente a impossibilidade de se cobrar o laudêmio sobre o
valor das construções ou plantações. A regra tem razão de ser. As acessões são
erigidas pelo enfiteuta, de modo que o cômputo de seu valor para cálculo do
laudêmio beneficia indevidamente o senhorio direto (proprietário), configurando
situação de enriquecimento sem causa. Ressalva, ainda, o § 2º do citado CC
2.038, que a enfiteuse dos terrenos de marinha e acrescidos regula-se por leis
especiais - Imóveis da União, Lei n. 9.636/98 e Terrenos de Marinha, Decreto-lei
n. 9.760/46 -, não alteradas pelo atual Código Civil. Constata-se que o CC
1.225, de outro lado, contempla dois direitos reais - superfície e promitente
comprador - não previstos no art. 674 do Código Civil de 1916. Na verdade, os
direitos reais de superfície e de promitente comprador já se encontravam
regulados por leis especiais e apenas receberam nova disciplina no Código
Civil. A propriedade fiduciária, agora regulada pelo Código Civil de 2002, não
se encontra mencionada no CC 1.225, por ter sido tratada como modalidade
especial do direito de propriedade, embora melhor se afeiçoe a direito real de
garantia.
Os
direitos reais classificam-se em direito real sobre coisa própria e direito
real sobre coisa alheia. O direito real sobre coisa própria é apenas a
propriedade. A entrega de parte das faculdades reais do proprietário a
terceiros gera os direitos reais sobre coisas alheias. Verifica-se, portanto,
que os direitos reais sobre coisas alheias são parcelas do direito real maior,
que é a propriedade. Os direitos reais sobre coisa alheia, por seu turno,
subdividem-se em direitos reais limitados de gozo ou fruição (superfície,
servidão, usufruto, uso e habitação); direito real de aquisição (direito de
promitente comprador); e direitos reais de garantia (hipoteca, anticrese,
penhor e propriedade fiduciária). A posse, tal como ocorria no Código de 1916,
não se encontra no rol dos direitos reais, o que reforça a tese de se tratar de
um instituto sui generi, uma situação de fato, similar ao comportamento
do proprietário, que gera uma série de efeitos que se situam entre os direitos
pessoais e os direitos reais.
(Francisco Eduardo Loureiro, apud Código
Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002.
Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.189-91.
Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 21/09/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
Em resumo
apresentado por Caroline
Christina Dias 4 anos atrás, o direito das coisas, também denominado direitos
reais, consiste em um conjunto de normas, predominantemente obrigatórias,
que tendem a regular o direito atribuído à pessoa sobre bens corpóreos, móveis
ou imóveis de conteúdo econômico. A eficácia do direito exercido é em face de
todos (erga omnes), assim, é um direito absoluto, e independe da
intermediação de outrem. Os direitos reais surgem por imposição legislativa. O
indivíduo pode recuperar a coisa quando esteja, ilegitimamente, em mãos
alheias. ‘numerus clausulus’ = o direito real é típico e taxativo, ou
seja, é aquele que se insere em um modelo definido pelo legislador (o
legislador cria direitos reais), ≠ ‘numerus apertus’, que são os
direitos obrigacionais, onde as partes, facultativamente, se valem de contratos
disciplinados na lei (contratos nominados) ou não (contratos inominados).
Classificação dos
direitos reais: a) ‘jus in re propria’ = direito sobre a coisa própria,
que se resume na propriedade; b) ‘jus in re aliena’ = direito real sobre
a coisa alheia. Bens incorpóreos, por exceção, podem estar sujeitos ao direito
real (ex: usufruto de títulos de crédito → O credor, titular de um crédito, faculta um
terceiro, usufrutuário do crédito, a perceber os frutos e a obrar as respectivas
dívidas). Contudo, essa situação aparta-se das prerrogativas próprias dos
direitos reais, pois estes pressupõem sempre a existência atual da coisa e
crédito (existência conceitual e não material). A maioria dos autores admite
poder ser objeto de direito real tanto coisas corpóreas como incorpóreas.
O direito real mais
completo é o direito de propriedade; todos os outros são decorrência dele. Os
direitos reais sobre coisa alheia importam numa restrição infligida ao
proprietário, quanto a uso e disposição de um bem que lhe pertence. → Ex: aquele que tiver
como segurança do pagamento de uma dívida o valor de um bem imóvel (hipoteca)
exercerá direito real sobre coisa alheia, de propriedade do devedor que tenha
oferecido a coisa em garantia. Por fim, há a preponderância do bem coletivo em
detrimento do individual (fenômeno moderno).
Diferença
entre o direito real e pessoal - Direito Pessoal - Os
sujeitos (passivo e ativo) são, em regra, definidos no momento em que se
constitui a obrigação (ex: comodato). Tem por objeto uma prestação, que pode
ser positiva (obrigações de dar ou fazer) ou negativa (obrigações de não
fazer). Há a necessidade da intermediação de um sujeito. As normas reguladoras
do direito obrigacional facultam às partem certa liberdade para regulamentar
seus interesses. Predominam normas dispositivas. Direitos obrigacionais não
admitem usucapião. Os direitos obrigacionais são transitórios ou temporários.
Nascem para serem extintos. O não exercício do direito obrigacional, em tempo oportuno,
provoca o seu perecimento.
Eficácia relativa - Direito Real - A identificação do
passivo só se dá no momento da violação do direito, oportunidade em que o
sujeito passivo indeterminado se torna determinável (há uma obrigação
passiva universal) - Tem por objeto um ou mais bens materiais determinados,
móveis ou imóveis. É exercido independentemente da colaboração de outra pessoa.
As normas são obrigatórias, ou seja, não admitem a interferência da vontade
individual. Predominam normas cogentes. Somente não admitem usucapião quando
sobre coisa alheia (ex: hipoteca), os demais podem ser usucapidos (pode ser
exercida a posse). Tem sua duração no tempo indefinida (salvo no caso de
propriedade resolúvel). A não utilização da propriedade, em regra, não implica
sua perda. Por isso, a ação reivindicatória é imprescritível. Eficácia contra
todos.
Obrigação com eficácia real: na sua essência, é obrigação, mas seus efeitos adquirem contornos de direito real. Obrigação ‘propter rem’: tem-se de início uma relação de direito real e, em função dela, surge um vínculo obrigacional. É uma situação intermediária entre direito real e pessoal. Esta obrigação se transmite com a coisa, independentemente da vontade do adquirente. Ex: obrigações que decorrem do direito de vizinhança, como a necessidade de demarcar a propriedade de imóveis lindeiros. Ex 2: construção de muro pelos proprietários confinantes. Ambos têm obrigação de construí-lo, arcando com as respectivas despesas, por ser essa obra divisória uma típica prestação propter rem.
Aquisição dos direitos reais:
Art. 1226 CC – ‘Os direitos reais sobre coisas móveis,
quando constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a
tradição.’
Art. 1227 CC – ‘Os direitos reais sobre imóveis
constituídos, ou transmitidos por ato entre vivos, só se adquirem com o
registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos, salvo os
casos expressos neste código.’
Com relação aos imóveis cujo valor não ultrapasse a 30
vezes o maior salário-mínimo vigente do país, dispensa-se a escritura pública.
O contrato pode, assim, formalizar-se por instrumento público particular;
todavia, o registro desse instrumento é necessário para o surgimento do direito
real de propriedade. A ausência do registro não torna o ato nulo ou anulável,
apenas deixa as partes sem eficácia real perante terceiros. → Ex: uma hipoteca não registrada vigora entre as partes,
mas não gera efeito erga omnes; assim, quem adquirir o bem não o
adquira hipotecado. (Caroline Christina Dias publicado
em 2016 no site Jusbrasil.com, acessado em 21.09.2020
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Sob enfoque de Luís Paulo
Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, os direitos reais sobre coisas alheias,
acima enumerados – e, pois, d cunho taxativo (numerus clausus) – afetam
diretamente a propriedade de terceiros, a qual passa a ficar gravada ou
limitada em seu livre exercício ou fruição, tal como se dá no usufruto, onde o
exercício da posse direta passa das mãos do proprietário para o usufrutuário.
São considerados atributos inseparáveis dos direitos reais: a) direito
de preferencia ou exclusividade, eis que o exercício do direito do
titular afasta o dos demais, por ter prioridade; b) direito de sequela,
sendo o poder que o titular tem de seguir a coisa e reivindicá-la das mãos de
quem a possua injustamente; c) aderência, que é o vínculo estabelecido
pelo direito real em relação à coisa; d) efeitos erga omnes, traduzido
pela publicidade do direito real por meio do registro público, dirigido a todos
indistintamente, os quais não poderão alegar ignorância (CC 1.227).
A par da conhecida taxatividade
dos direitos reais, recentemente o STJ reconheceu que a multipropriedade
imobiliária (time-sharing) – descrita como um condomínio relacionado a
locais de lazer temporário, composto por casas, chalés ou apartamentos – se
enquadra entre os direitos reais descritos no CC 1.225 supra, pois o Código
civil de 2002 não criou obstáculos a tanto, não impondo, pois, qualquer
vedação. O multiproprietário ´´e titular da fração ideal do bem, o qual
está sujeito às regras dos demais direitos reais (REsp 1.546.165-SP, Min. Ricardo
Villas Boas, Rel. p/acórdão Min. João Otávio de Noronha; julgado de
26/04/2016). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e
Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.09.2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 1.226. Os direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos, ou
transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a tradição.
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS
DIREITOS HUMANOS
Artigos do 1º ao 30º, divididos de 10 em 10
distribuídos entre cada um dos três artigos que compõem os Direitos Reais.
Art. 11º. I –
Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido
inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em
julgamento público no qual lhe tenham (...)
Art. 12º.
Ninguém será sujeito a interferência na sua vida privada, na sua família, no
seu lar ou na sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo
ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou
ataque... (...)
Art. 13º. I –
Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das
fronteiras de cada Estado (...)
Art. 14º. I –
Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar
assino em outros países. (...)
Art. 15º. I – Todo
ser humano tem direito a uma nacionalidade. II ninguém será arbitrariamente
privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade. (...)
Art. 16º. I –
Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça,
nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimonio e fundar uma
família. (...)
Art. 17º. I –
Todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros. II –
Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade. (...)
Art. 18º. Todo
ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; esse
direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de
manifestar essa religião ou crença pelo ensino (...)
Art. 19º. Todo
ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão: esse direito inclui
a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e
transmitir (...)
Art. 20º. I –
Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacífica. II –
Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação (...)
Art. 1.226. Os direitos reais sobre coisas móveis, quando constituídos, ou
transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a tradição.
Conforme
as explicações de Francisco Eduardo Loureiro, os
direitos reais podem ser adquiridos a título originário ou derivado, inter
vivos ou causa mortis, singular ou universal. O artigo em exame trata da
aquisição da propriedade e de outros direitos reais sobre coisas móveis a título
derivado e inter vivos. A aquisição dos direitos reais, inclusive a
propriedade, pode dar-se de modo originário, ou seja, sem relação jurídica com
o proprietário anterior. A mera conduta do agente, ou a ocorrência de um fato
jurídico, sem relação de causa e efeito com o antigo proprietário, é que leva à
aquisição do direito real. Isolada é a posição de Caio Mário da Silva Pereira,
que dá interpretação restritiva à aquisição originária, limitando-a à coisa que
nunca foi, anteriormente, propriedade de outrem. A aquisição derivada, mais
comum, é aquela na qual há relação de transmissão do antigo ao atual
proprietário ou titular de direito real. Há uma relação jurídica causal ligando
o atual e o antigo proprietário. A aquisição derivada pode ainda dividir-se em
universal, quando uma gama de direitos e deveres relativos a um patrimônio é
transmitida, normalmente via causa mortis; ou singular, quando
determinados bens são transmitidos, normalmente por ato inter vivos.
Pode, porém, ocorrer aquisição universal por ato inter vivos, (por
exemplo, o casamento pelo regime da comunhão universal de bens), assim como a
aquisição singular por ato causa mortis (por exemplo, o legado). Diz o
artigo em exame que as aquisições a título derivado e inter vivos
somente transmitem-se com a tradição. A tradição, em tais casos, tem
caráter constitutivo do direito real. Antes da tradição, existe um simples
título, que confere apenas direito pessoal, ou de crédito, a seu titular. A
tradição, mediante entrega da coisa alienada ao adquirente, é que converte o
direito de crédito em direito real. Lembre-se de que nem toda entrega de coisa
móvel a outrem caracteriza tradição, como, por exemplo, ocorre no comodato, ou
na locação, em que há mera transmissão da posse direta. Exige-se para a tradição
um título que exteriorize negócio translativo da propriedade ou outros direitos
reais. A tradição é a entrega da coisa ao adquirente, em obediência à obrigação
assumida no título. Nosso sistema de aquisição da propriedade e de outros
direitos reais segue a tradição do Direito romano, exigindo título mais modo,
consistente em uma providência suplementar que, somada ao título, provoca a
aquisição do direito real. Ao contrário do sistema francês, a propriedade sobre
coisas móveis adquiridas a título derivado não se transmite somente com o
contrato (solo consensu), mas, seguindo o modelo romano, exige a entrega
da coisa alienada ao adquirente. Até a tradição, o adquirente é mero credor do
alienante. Extraem-se daí as duas marcas da tradição em nosso sistema jurídico:
é constitutiva da propriedade e de outros direitos reais sobre coisas móveis e
é causai, por se encontrar ligada ao título que lhe deu origem. Desfeito o
título, desfaz-se a tradição que dele proveio, salvo exceções previstas em lei,
em especial a da parte final do CC 1.268, adiante examinada. As aquisições de
coisas móveis a título originário por usucapião, achado de tesouro, ocupação,
especificação, adjunção, confusão e comistão decorrem de comportamento do
titular, a que a lei empresta efeito jurídico, independentemente de vínculo ou
relação com o ex-proprietário. Não se cogita, portanto, de entrega da coisa ao
adquirente, e nem os vícios que porventura atingiam a coisa se transmitem ao
novo proprietário. Ressalva, também, o artigo em exame, a contrario sensu, que
a aquisição de direitos reais a título causa mortis independe da
tradição, em razão do instituto da saisina previsto no CC 1.784, pelo
qual, aberta a sucessão, a herança transmite-se desde logo aos herdeiros
legítimos e testamentários, independentemente de ato de entrega dos bens aos
herdeiros. Embora não diga a lei, o casamento pelo regime da comunhão universal
de bens é ato inter vivos que transmite a propriedade de coisa móvel ao
cônjuge, independentemente da tradição, constituindo exceção à regra legal. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código
Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002.
Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.192-93.
Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 21/09/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
Em artigo publicado por Rogério Tadeu
Romano, na lição
de Arnoldo Medeiros da Fonseca (Caso fortuito e teoria da imprevisão, n.
69 e seguintes), às vezes, a imprevisibilidade determina a inevitabilidade, e,
então, compõe a etiologia desta. De toda sorte, trata-se de um conceito
meramente negativo, pois que como ele exprime apenas uma negação da culpa, se
afirma que o campo próprio do caso fortuito começa onde a culpa acaba. Mas
isso, como explicou Ruggiero, é também a única coisa possível e adequada, visto
que uma determinação positiva do caso supõe que o evento tenha caracteres
intrínsecos e objetivos, reconhecíveis e absolutos, quando um tal evento pode
considerar-se fortuito com respeito a uma dada relação jurídica e não fortuito
com relação a outra. Quando, na verdade, se recorre, para determinação positiva
do conceito, à ideia da imprevisibilidade e da inevitabilidade do evento, não
se enuncia uma qualidade intrínseca e objetiva do mesmo; a imprevisibilidade e
a inevitabilidade são em si essencialmente relativas e apenas se podem avaliar
quando se considerem em face de dada relação, do dever da previsão que nela
tinha o obrigado, da possibilidade que este tinha de evitar a eventualidade. Disse
ainda Ruggiero que há caso fortuito, quando, em dada relação concreta, cessa a
necessidade da previsão e a obrigação de um cuidado especial para o evitar,
donde resulta que a sua determinação apenas pode ser negativa.
E concluiu
Ruggiero (obra citada, pág. 161): “Ora, porque no caso fortuito (como na força
maior) não há imputabilidade, o devedor que não cumpre a obrigação por ter sido
causa de não cumprimento o caso fortuito, fica desde logo liberto. Dispõe,
finalmente, o art. 1.226 do Código Italiano de 1865: “O devedor não é obrigado
a qualquer indenização por danos, quando por virtude de uma força maior ou de
um caso fortuito foi impedido de dar ou de fazer aquilo a que se obrigou, ou
fez aquilo que lhe era proibido” (ver art. 1218 do Código Civil Italiano de
1942). A obrigação também se dissolve e o devedor se liberta todas as vezes que
uma causa estranha o impediu de prestar, ou porque a coisa devida se destruiu
ou deixou de ser comerciável, ou porque a pessoa do devedor não pode já
dispender a atividade necessária para produzir o resultado esperado, ou porque
já não está na sua mão aquela omissão que constituía o interesse do credor
etc., mas deve tratar-se de não cumprimento absoluto, que origine uma
impossibilidade objetiva de prestar; uma impossibilidade meramente relativa e
subjetiva, uma simples dificuldade, posto que grave, de prestar e que seja
particular do devedor, não poderia nem liberá-lo, nem exonera-lo da
responsabilidade pelos danos, em virtude do princípio fundamental, que exige
que a todo custo se cumpra a obrigação e se satisfaça o interesse do credor”.
A doutrina
alerta que cada hipótese deve ser ponderada segundo as circunstâncias que lhe
são peculiares, e em cada uma ter-se-á de examinar a ocorrência do obstáculo
necessário e inevitável à execução do devido. Disse Caio Mário da Silva
Pereira(obra citada, pág. 301) que “pode acontecer que o mesmo evento, que
facultou a um devedor o cumprimento, para outro já se erija com aquelas
características de impedir a prestação. Não vemos aí a instituição de um novo
requisito na etiologia da vis maior, senão a determinação de que os seus
elementos sejam apurados sem subordinação a um critério inflexível. Ao revés,
elástico deve ser. Se a inevitabilidade fosse absoluta, então o fortuito não
precisaria de apuração. Por ser relativa, e por admitir que o que um devedor
tem força para vencer outro não domina, é que o critério da apuração dos
requisitos obedece a um confronto com as circunstâncias especiais de cada
caso”.
Mas permite-se
que as partes possam ajustar que o devedor responda pelo cumprimento, ainda no
caso de força maior ou caso fortuito, que prevalecerá em face da declaração
expressa, já que não é de se presumir um agravamento da responsabilidade. Mas
estando o devedor em mora, cujo efeito é perpetuar a obrigação e sujeitar o
devedor às consequências do inadimplemento, ocorre a responsabilidade pelo
casus ou vis maior, salvo se demonstrar que não teve culpa no atraso ou que o
dano sobreviria, mesmo se a obrigação fosse oportunamente desempenhada.
Anote-se que,
no caso de ter o mandatário, contra a proibição formal do mandante,
substabelecido os poderes em um terceiro, responde pelo dano causado sob a
gerência deste, mesmo decorrente de fortuito, salvo provando que o dano teria
sobrevindo ainda que não tivesse realizado a substituição do representante,
como já registrava o artigo 1300 do Código Civil de 1916.
Observo,
outrossim, o mesmo entendimento, na gestão de negócios, quando o gestor fizer
operações arriscadas, ainda que o dono costumasse fazê-las, ou quando preterir
interesses deste por amor aos seus. Observe-se ainda, no caso da tradição de
coisas que se vendem, contando, marcando ou assinalando, quando já postas à
disposição do comprador. Mas se o acontecimento extraordinário não trouxer a
impossibilidade total da prestação, eximir-se-á o devedor da parte atingida ou
se forrará da mora, se apenas tiver como consequência o atraso na sua execução.
Mas não poderá invocar o prejuízo para exoneração absoluta, beneficiando-se
fora das marcas. (Rogério Tadeu Romano, em seu
artigo “Caso fortuito e força maior” publicado em setembro de 2019, site jus.com.br. Acesso em 21/09/2020, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Nos comentários de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, tradição
é a forma de transmissão da propriedade móvel, ou seja, é a entrega da coisa
móvel ao adquirente, com a firme intenção de lhe transferir o domínio. Assim,
não é suficiente a elaboração de simples contrato para a transferência do
direito real, pois este gera apenas um direito pessoa, sendo que o direito real
se consumará, tão somente, com a efetiva tradição do bem. Sendo assim, até o
momento da tradição (bens móveis) ou do registro imobiliário (imóveis),
é possível afirmar que o bem permanecerá na titularidade do vendedor. Só poderá
transferir a propriedade o tradens que for capaz e titular do domínio.
Caso seja feita por quem não seja o titular, a tradição não produzirá efeitos
jurídicos de transferência. Porém, se o adquirente estiver de boa-fé e o
alienante adquirir, posteriormente, a propriedade, a transferência será
convalidada desde o momento da tradição (CC 1.268, § 1º). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e
Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.09.2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos
entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis
dos referidos títulos (CC 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste
Código.
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS
DIREITOS HUMANOS
Artigos do 1º ao 30º, divididos de 10 em 10
distribuídos entre cada um dos três artigos que compõem os Direitos Reais.
Art. 21. I – Todo ser humano tem o
direito de tomar parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de
representantes livremente escolhidos. II – Todo ser humano tem igual direito de
acesso ao serviço público do seu país. (...)
Art. 22. Todo ser humano, como membro
da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço
nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e
recursos de cada Estado.. (...)
Art. 23. I – Todo ser humano tem
direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e
favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. II – todo ser humano,
sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho.
(...)
Art. 24. Todo ser humano tem direito a
repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a
férias remuneradas periódicas. (...)
Art. 25. I – Todo ser humano tem
direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde,
bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os
serviços sociais... (...)
Art. 26. I – Todo ser humano tem direito
à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e
fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução
técnico-profissional será acessível a todos... (...)
Art. 27. I – Todo ser humano tem o
direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as
artes e de participar do progresso científico e de seus benefícios. (...)
Art. 28. Todo ser humano tem direito a
uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos
na presente declaração possam ser plenamente realizados.
Art. 29. I – Todo ser humano tem
deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade
é possível. I – No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará
(...)
Art. 30. Nenhuma disposição da presente
Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo
ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar... (...)
Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos
entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis
dos referidos títulos (CC 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste
Código.
Debulhando o CC 1.227, que fecha o
Título I, dos Bens Reais, Francisco Eduardo Loureiro aplaude o preceito similar ao do artigo
anterior que reserva o legislador para disciplinar a aquisição e a transmissão
de direitos reais sobre bens imóveis a título derivado e inter vivos, que
somente se perfazem mediante o registro imobiliário. Segue nosso sistema
jurídico o modelo do Direito romano, que já exigia formalidade posterior ao
contrato para aquisição do domínio (traditio). O contrato é o título,
que somado ao modo (registro) provoca a transmissão e a aquisição de direitos
reais sobre bens imóveis.
Três
grandes sistemas de aquisição da propriedade imóvel vigoram nos ordenamentos
jurídicos do mundo ocidental. O primeiro é o sistema francês, pelo qual a
aquisição se dá pelo contrato (solo consensu), tendo o registro efeito
não constitutivo, mas meramente publicitário. O segundo é o sistema alemão
(art. 873 do BGB - Código Civil alemão), pelo qual a transmissão da propriedade
imobiliária se constitui por meio do registro do título em um cadastro de
imóveis. A particularidade do sistema alemão está no fato do registro
desvincular-se do título. Após o contrato, o título é depurado e, mediante
acordo formal de transmissão em processo sumário que corre perante juízes do registro imobiliário, o registro é feito
como negócio jurídico abstrato, com presunção absoluta de veracidade,
desligando-se do título que lhe deu origem. Admite-se a retificação e
cancelamento do registro somente em casos excepcionais. Os princípios são o da
exatidão do registro e o da proteção a quem nele confia. Tem como principal
mérito a segurança que desperta nos negócios imobiliários; e como principal
problema a questão dos vícios existentes no título não atingirem o registro, em
prejuízo do alienante inocente.
O
terceiro sistema, denominado misto ou eclético, foi o acolhido em nossos
Códigos de 1916 e atual. Para nós, o registro é constitutivo do direito real
sobre coisa imóvel. É ele que converte o título, gerador de simples direito de
crédito, em direito real, irradiando seus efeitos contra todos. Nesse ponto,
aproxima-se do sistema alemão. A diferença, porém, está no fato do registro em
nosso sistema ter a natureza de ato jurídico causal, pois permanece vinculado
ao título que lhe deu origem. Invalidado o título, invalida-se o registro. O
registro tem efeito constitutivo, mas não saneador do título causal. Disso
decorre que viciado o título, contaminado estará o registro, que será, então,
cancelado. Presume-se ser o imóvel daquele que tem o título registrado no
registro imobiliário, mas tal presunção é relativa no direito brasileiro (juris
tantum), segundo se extrai dos CC 1.245, § 2º, e 1.247 do Código Civil,
adiante examinados. Em vista do caráter constitutivo e causal do registro, a
Lei de Registros Públicos (Lei n. 6.015/73) cria minuciosos mecanismos de
segurança de acesso dos títulos (arts. 167 a 288), consolidados em diversos
princípios, mais bem examinados nos comentários aos CC 1.245 a 1.247 do Código
Civil. Note-se a ressalva do próprio CC 1.227 em que o registro é constitutivo
somente em relação às transmissões por atos inter vivos e a título negocial
derivado. Os modos originários de aquisição da propriedade imobiliária - usucapião
e acessão - independem do registro, que tem efeito meramente publicitário e
regularizador, visando a permitir que ulteriores alienações a título derivado
tenham acesso ao registro, preservando a continuidade. De igual modo, também as
transmissões da propriedade imobiliária causa mortis independem do
registro, porque ocorrem no exato momento da morte, por força do instituto da saisitie,
consagrado no CC 1.784. O inventário, a partilha e o registro do respectivo
formal têm o propósito de atribuir quinhões certos aos herdeiros, extinguindo
ou modificando o condomínio criado pela morte do autor da herança, bem como o
de permitir a disponibilidade dos imóveis herdados, em atenção ao princípio da
continuidade do registro imobiliário. A parte final do CC 1.227 ressalva “casos
expressos neste Código”, em que, por exceção e mediante expressa previsão do
legislador, deixa o registro de ter caráter constitutivo do direito real. Caso
exemplar é o do casamento pelo regime da comunhão universal de bens, no qual a
transmissão de imóveis ocorre independentemente do registro. Lembre-se de que a
certidão de casamento é somente averbada no registro imobiliário, com a
finalidade de preservar a continuidade, no momento da transmissão do imóvel do
casal a terceiro. Outros casos, embora de natureza duvidosa, podem ser citados.
Discute-se a natureza jurídica do usufruto legal e do direito de habitação do
viúvo. Ainda para aqueles que os consideram direitos reais, ou assemelhados,
dispensa-se o registro. Os efeitos em relação a terceiros decorrem da própria
situação jurídica dos titulares (pais em relação aos bens dos filhos menores
sujeitos ao poder familiar, viúvo em relação ao imóvel residencial do casal, se
for o único daquela natureza a inventariar), independentemente do registro. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código
Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002.
Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.194-95.
Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 21/09/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
Comentário
de Valestan Milhomem da Costa “Não há dúvida que o legislador se distraiu da essência do artigo 108
do Código Civil quando flexibilizou a indispensabilidade da escritura pública
para negócios jurídicos levando em conta o valor do imóvel”.
O artigo
108 do Código Civil encerra a regra geral da forma instrumentária essencial à
validade dos negócios imobiliários, ao dizer: "Não dispondo a lei em
contrário, a escritura
pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição,
transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a
trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País".
Dita norma
tem grande relevância no campo dos negócios jurídicos imobiliários, exigindo
indivisa atenção dos profissionais do direito, sobretudo daqueles que mourejam
nas atividades notariais e registrais, pois baliza forma indispensável à
produção dos efeitos pretendidos sempre que o negócio se referir a direitos
reais sobre imóveis, onde a regra é a escritura pública, excetuando-se os casos
previstos em lei especial - sendo especial, não é aplicável a hipóteses não
contempladas - e os casos em que o valor do imóvel não ultrapassar a 30 vezes o
maior salário mínimo vigente no País.
Fora isso,
nenhum negócio envolvendo direitos reais sobre imóveis pode ser realizado sem
escritura pública, sob pena de ser tido como não realizado, por inobservância da forma
prescrita em lei, essencial à validade do negócio, não podendo, inclusive, e a
toda evidência, ser registrado no Cartório do Registro de Imóveis, por
submissão ao princípio da legalidade.
Casos
Especiais De Exceções À Escritura Pública - As hipóteses em que é possível prescindir da
escritura pública para a validade do negócio jurídico são: o compromisso de compra e venda de
imóveis loteados (Lei nº 6.766/79, art. 26 (urbano); e art. 7º, Dec. Lei
2.375/87 (rural)), a venda e
compra de
imóvel de qualquer valor com financiamento mediante a contratação da alienação
fiduciária em garantia, o mútuo com alienação fiduciária
em garantia imobiliária, nos termos do SFI (Lei nº 9.514/97, arts. 38 e Parágrafo
único do art. 22, com redação dada pela Lei nº 11.076/2004), a compra e venda de imóvel de qualquer
valor com financiamento do SFH (art. 1º da Lei nº 5.049/66, que alterou o art.
61 da Lei nº 4.380/64), e, naturalmente, qualquer negócio jurídico envolvendo
imóvel de valor
igual ou inferior a
trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País, por força da exceção
trazida no CC 108 do Código Civil.
Contudo,
nem sempre se tem observado a indispensabilidade da Escritura Pública para a
formalização dos negócios envolvendo direitos reais sobre imóveis, cuja consequência
inarredável é a invalidade desses negócios, ainda que sejam registrados no
competente Registro de Imóveis, posto que o registro não tem o condão de
validar negócios nulos, nos quais se enquadram os formalizados sem revestirem a
"forma prescrita em lei" (CC 166, IV, NCC; art. 82 e 130, CC 1916).
Vejamos alguns exemplos.
Compra E Venda
Com o FGTS Sem Parcela de Financiamento - A compra e venda de imóvel com utilização de
recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, sem financiamento de parcela do preço por
instituição integrante do SFH deve ser formalizada por escritura pública, nos
termos do artigo 108 do Código Civil. Ocorre que muitos desses negócios são
formalizados mediante
instrumento particular,
invocando-se para tanto o disposto no art. 1º da Lei nº 5.049/66, pelo fato da
CEF comparecer nesses contratos.
O art. 1º
da Lei 5.049/66, que incluiu o § 5º ao art. 66 da Lei nº 4.380/64, diz:
"Os contratos de que forem
parte o
Banco Nacional de Habitação ou entidades
que integrem o Sistema Financeiro da Habitação, bem como as operações
efetuadas por determinação da presente Lei, poderão ser celebrados por
instrumento particular, os quais poderão ser impressos, não se aplicando aos mesmos
as disposições do art. 134, II, do Código Civil (1916), atribuindo-se o caráter
de escritura pública, para todos os fins de direito, aos contratos particulares
firmados pelas entidades acima citados até a data da publicação desta
Lei." (Grifamos)
Para
compreendermos o alcance da norma acima, e não incorrermos num desvio de
finalidade da lei, deve-se destacar que a Lei nº 4.380/64 teve por finalidade
instituir "a correção monetária nos contratos imobiliários de interesse
social, o sistema financeiro para aquisição da casa própria", criar
"o Banco Nacional da Habitação (BNH), e Sociedades de Crédito Imobiliário,
as Letras Imobiliárias, o Serviço Federal de Habitação e Urbanismo" e dar
"outras providências". Ou seja: em nenhum tópico da lei ela tem por finalidade
regular negócios com utilização dos recursos do FGTS do próprio trabalhador,
para cujo desiderato é despiciendo ser o agente operador integrante do SFH.
Essa base é essencial para compreensão da extensão da norma autorizadora da
realização dos negócios imobiliários mediante instrumento particular.
Aliás, o
tópico destinado ao "Elemento Teleológico", na Hermenêutica e Aplicação do
Direito, Carlos
Maximiliano (Forense, 2001) diz: "Considera-se o Direito como uma ciência
primariamente normativa ou finalística; por isso mesmo a sua
interpretação há de ser, na essência, teleológica. O
hermeneuta sempre terá em vista o fim da lei, o resultado que a mesma precisa
atingir em sua atuação prática. A norma enfeixa um conjunto de providências,
protetoras, julgadas necessárias para satisfazer a certas exigências econômicas
e sociais; será interpretada de modo que melhor corresponda àquela finalidade e
assegure plenamente a tutela de interesse para a qual foi redigida". (Grifos
originais)
Destarte,
para se aferir se há regularidade na formalização dos negócios de compra e
venda de imóvel com utilização do FGTS, sem financiamento, através de contratos
particulares, é necessário saber se esses negócios atendem à finalidade da lei
que autoriza essa forma instrumentária, preenchendo os requisitos necessários,
sem o que não encontram guarida para sua validade. Nas partes sublinhadas do
art. 1º da Lei nº 5.049/66, que é o que aqui interessa, e tendo em mira as
regras de hermenêutica citadas, podem-se identificar dois elementos
concorrentes para autorizar a formalização do negócio imobiliário por
instrumento particular: 1) ser a entidade integrante do SFH parte no contrato,
e 2) ser parte no contrato como integrante do SFH,
ou seja: ser parte em razão de financiamento concedido para
fins habitacionais, na forma e para os fins estabelecidos na Lei nº 4.380/64,
pois não havendo financiamento razão não há para exigir-se a qualidade de
"integrante do Sistema Financeiro da Habitação".
Contudo,
nos negócios de compra e venda de imóvel com liberação dos recursos do FGTS sem
financiamento, não há nenhuma necessidade de qualquer das partes ter a
qualidade de "integrante do Sistema Financeiro da Habitação", e, se
qualquer dos comparecentes tem essa qualidade, isso não tem o condão de ampliar
o alcance do art. 1º da Lei nº 5.049/66 para hipóteses distintas do objetivo da
Lei nº 4.380/64, de forma a alterar a essência do artigo 108 do Código Civil,
dispensando-se a Escritura Pública. Ou seja: no contrato o que
importa não é a qualidade de quem comparece, mas a qualidade com que
comparece.
Na
liberação de recursos do FGTS para aquisição da casa própria a Caixa Econômica
Federal (CEF) atua na qualidade de agente operadora do FGTS (art. 4º, Lei nº 8.036/90) - cujo
gestor é o Ministério da Ação Social (art. 6º, Lei nº 8.036/90) - e
não como integrante do SFH, que é o fundamento legal para a CEF
firmar negócios imobiliários mediante instrumento particular. A qualidade da
CEF de integrante do SFH nada tem a ver com a sua qualidade de agente operadora
do FGTS. São atribuições distintas e autônomas. Ser a CEF integrante do SFH
somente é relevante para a hipótese de aplicação dos recursos do FGTS em
operações de financiamento, onde, evidentemente, os recursos utilizados não são
os do próprio financiado, mas os da massa de trabalhadores, segundo critérios
estabelecidos pelo Conselho Curador do FGTS, na forma fixada no art. 9º da Lei
nº 8.036/90, o que é completamente distinto dos objetivos da Lei nº 4.380/64,
aditada pelo art. 1º da Lei nº 5.049/66. De forma que, invocar-se aquele
dispositivo legal para firmar contratos particulares quando não há
financiamento revela-se desvio de finalidade que não pode anular a essência do
artigo 108 do Código Civil.
Aliás, a
Corregedoria da Justiça do Estado do Rio de Janeiro, através do MM. Juiz de
Direito Auxiliar, Dr. Luiz de Mello Serra, em publicação do DOERJ de
14/12/2005, pág. 52, acolheu parecer do DEIAC, no sentido de que
"nas hipóteses do pagamento total pela conta do FGTS, ou originando-se o
seu complemento de quaisquer outras fontes que não as entidades
supramencionadas" (leia-se: "BNH ou entidades integrantes do
SFH"), "entendemos que não cabe ao dispositivo acima acolher o
contrato em tela" (leia-se: "parágrafo 5º do artigo 61 da Lei 4380 de
21/8/1964, acrescentado pela Lei 5049 de 29/06/1966"), "devendo-se
sim, proceder pela forma prescrita no artigo 108 do Código Civil
Brasileiro", e determinou que devem "as serventias
de Registro Imobiliário cumprirem as leis vigentes mencionadas".
Ademais,
tendo-se em mira o conceito de que parte é "cada uma das pessoas que
firmam entre si um contrato" (Michaelis), ou, ainda: "No sentido
técnico-jurídico, seja na linguagem forense ou na terminologia usada em
referência aos contratos, parte é toda pessoa que intervém ou
participa de um ato jurídico ou processual, como interessado nele" (De Plácido e
Silva) (grifamos), é questionável dizer que a CEF seja parte nos negócios onde
comparece tão-somente para liberar os recursos do FGTS, assim como é
questionável dizer que o Banco sacado é parte num negócio firmado entre o
emitente de um cheque e o favorecido simplesmente pelo fato do pagamento do
negócio ser realizado através do Banco sacado, ainda na hipótese de cheque
administrativo, salvo no tocante à responsabilidade pela provisão do fundo
(AgRg no Ag 32.939/RJ, Rel. Min. Antônio Torreão Braz, Quarta Turma, julgado em
26.10.1993, DJ 22.11.1993 p. 24960).
Por
último, neste tópico, para o caso de se imaginar que a utilização do FGTS se
enquadra nos objetivos da Lei nº 4.380/64 em razão do seu objetivo social de
viabilizar a casa própria, não se pode olvidar que a casa própria focada pela
mencionada lei é a da população de baixa renda, o que
afasta de plano a maioria dos negócios realizados com recursos do FGTS sem
financiamento, pois a conta do FGTS de pessoas de baixa renda quase sempre é insuficiente para
adquirir imóvel sem financiamento. A regra, portanto, é a escritura pública.
Promessa De Compra E Venda - Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza, em "A
Promessa de Compra e Venda no NCC", artigo publicado no Boletim
Eletrônico do Colégio Notarial – Seção Federal (www.notariado.org.br), diz que "na vigência do Código Civil de
1.916 prevaleceu o entendimento de que a promessa de compra e venda de bem
imóvel poderia ser celebrada, em qualquer hipótese, por instrumento particular.
Não incluído no rol dos direitos reais na legislação então vigente o direito do
promitente comprador, acabou por predominar a corrente que defendia não ser o instrumento
público da substância do ato".
O ilustre
articulista aponta o cerne da admissibilidade da promessa de compra e venda por
documento particular na égide do Código revogado: o direito do compromissário
não tinha natureza real. Assim, bastava o compromisso de compra e venda ser
firmado em caráter irrevogável para viabilizar a ação de adjudicação do direito
contratado com vistas à obtenção da carta de adjudicação e o consequente
registro no ofício imobiliário.
Porém, o
novo Código Civil elevou à categoria dos direitos reais o direito do promitente
comprador do imóvel, nos termos do CC 1.225, VII, e estabeleceu, no CC 1.417,
que esse direito real à aquisição do imóvel é adquirido quando a promessa, em
que não se pactuou arrependimento, é registrada no Cartório de Registro de
Imóveis. A relevância do CC 1.417 é acentuada no CC 1.418, que condiciona o
direito de exigir a outorga da escritura definitiva, ou, em havendo recusa na
outorga, o direito a requerer a adjudicação judicial do imóvel, ao promitente
comprador titular de direito real;
ou seja: àquele que registrou a promessa de compra e venda no Registro de
Imóveis, tanto por exigência especial do CC 1.417 como pela regra geral do CC
1.227 do Código Civil.
Com isso,
temos que essa nova orientação do Código Civil torna sem efeito a Súmula 239 do
STJ, que reconhece o direito à adjudicação compulsória independente do registro
do compromisso de compra e venda, pois não é aceitável que entendimento jurisprudencial
prevaleça contra norma legal, sobretudo quando é clara, específica e atual. Aliás,
o Dr. Eduardo Pacheco, no artigo citado, diz: "Assim, é requisito
indispensável para a adjudicação compulsória, dentre outros [...] o registro do
instrumento de promessa. A Súmula 239 do STJ perdeu, portanto, eficácia para os
negócios celebrados na vigência do novo Código". E acrescenta: "Joel
Dias Figueira Jr., em Novo Código Civil Comentado, coordenação de Ricardo
Fiúza, Saraiva, ressalta a perda de eficácia da súmula em mira, assinalando que
o registro "se trata de condição necessária definida no próprio CC 1.417,
ou seja, requisito que se opera ex lege para a configuração do
próprio direito real, não podendo ser rechaçado por orientação pretoriana,
ainda que sumulada, nada obstante perfeitamente adequada, antes do advento no
novo CC".
Ademais, o
CC 1.417, por via de consequência, torna inafastável a observância do CC 108
quanto à forma de instrumentar os negócios de promessa de compra e venda, cuja
forma irrecusável em todos os casos é a escritura pública, mas que se torna
obrigatória para os casos em que a lei não prevê o escrito particular, como é o
caso dos contratos de promessa de compra e venda de unidades integrantes de
incorporação imobiliária, nos termos da Lei nº 4.591/64, diga-se: o grande
universo das promessas de compra e venda; pois sem escritura pública não será
possível viabilizar o registro do contrato no Registro de Imóveis, e sem
registro do contrato o promitente comprador não será detentor dos direitos
reais de aquisição do imóvel, mas mero detentor de um crédito, correspondente
ao valor desembolsado para aquisição do imóvel. Como consequência, caso o
promitente vendedor desista do negócio, por alguma razão que lhe seja
conveniente, o promitente comprador terá apenas direito às Perdas E Danos
resultantes da resilição do contrato, mas não poderá exigir a outorga da
escritura definitiva, por lhe faltar o requisito básico à pretensão: o direito
real à aquisição do imóvel, na forma do CC 1.418 do Código Civil.
Assim,
quanto ao CC 1.417, duas conclusões são patentes: 1) o registro da promessa no
Cartório de Registro de Imóveis para fins de constituição do direito real à
aquisição é exigível em todos os casos de promessa de compra e venda de imóvel,
visto que o artigo faz referência à "promessa de compra e venda, [...]
celebrada por instrumento público ou particular", ou seja: em qualquer
hipótese, observando, naturalmente, a forma instrumental do negócio
estabelecida na lei (escritura pública ou escrito particular); 2) o CC 1.417
não possui conteúdo de forma dos negócios de promessa de compra e venda,
sobretudo envolvendo direitos reais sobre imóveis, cuja matéria é regulada no CC108,
posto que o conteúdo do CC 1.417 é a natureza dos
direitos do promitente comprador, conforme destacado no Título IX – Do Direito
Do Promitente Comprador.
Eduardo
Pacheco, ainda, expressa opinião similar ao dizer: "O direito do promitente
comprador é direito real (CC 1.225, VII), que se adquire com o registro (CC
1.227). À evidência, a promessa de compra e venda visa a constituição de
direito real sobre imóvel, e portanto é da substância do ato a escritura
pública. A promessa só terá eficácia, que é a aptidão para produzir efeitos (e
dentre eles o de constituir direito real pelo registro), se for lavrada por
instrumento público, ressalvadas as exceções".
De forma
que, salvo as exceções legais, o compromisso de compra e venda de imóvel nunca deve ser firmado por
documento particular, mas sempre por
escritura pública.
O Papel Do Registro De Imóveis - A Lei nº 6.015/73, em seu artigo 1º diz que "os serviços concernentes aos Registros Públicos [...] para autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei", esclarecendo, ainda, a Lei nº 8.935/94, artigo 1º, que os "Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos".
Assim, sem que façamos digressões sobre inúmeros conceitos doutrinários e jurisprudenciais acerca do papel do Registro de Imóveis, mas sem nos distanciar desses conceitos, não há dúvida que o Registro de Imóveis exerce um papel fundamental na segurança e eficácia dos negócios jurídicos. Esse papel é desempenhado, sobretudo, através da qualificação dos títulos que lhe são apresentados, mediante a observância de vários princípios (há quem enumere 21 deles - ERPEN, Décio Antonio e Lamana Paiva, João Pedro. Princípios do Registro Imobiliário Formal. Introdução do Direito Notarial e Registral, saFE, Porto Alegre, RS, 2004), sobretudo do princípio da legalidade, que se impõe logo no primeiro artigo da lei especial, ao dizer que "os serviços concernentes aos Registros Públicos [...] ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei". Ou seja: a observância dos limites legais é essencial para que o Registro de Imóveis cumpra seu papel, que é o de guardião da segurança e eficácia dos negócios jurídicos de que é repositório, sob pena de não realizar essa sua função.
Dentre o regime estabelecido na Lei º 6.015/73 está o disciplinado no artigo 221, incisos I a IV, que lista os títulos passíveis de ingresso no fólio registral imobiliário. No inciso II lemos que somente podem ser registrados "escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes e testemunhas, com as firmas reconhecidas [...]" (grifamos).
A lei que
autoriza o negócio através de "escrito particular" é a que cria e/ou
rege o negócio jurídico de forma especial, ou o Código Civil, de modo geral.
Não havendo autorização em nenhum desses repositórios legais, o negócio não
poderá ser firmado por instrumento particular com vista a obter o registro do
título no Registro de Imóveis.
Contudo,
diante do artigo 108 do Código Civil, esse mister se torna mais espinhoso para
o registrador de imóveis, pois há minúcias que podem conduzir a interpretações
e a procedimentos equivocados, tornando temerário o ato praticado. O ponto
escorregadio diz respeito à admissibilidade do instrumento particular para
negociar direitos reais sobre imóveis com fundamento na parte final do CC 108,
cujo requisito é o valor do
imóvel transacionado,
o que não pode ser confundido com o preço do negócio. A toda evidência, valor do imóvel e preço do
negócio são coisas distintas. Todo imóvel tem um valor, mas nem todo negócio
tem um preço, como ocorre com a doação pura (sem ônus ou encargo). A questão é,
“quando o registrador pode considerar preenchido o requisito do art. 108 do
Código Civil, referente ao valor do imóvel, para autorizar a instrumentação o
negócio por documento particular”.
Nos
negócios de doação, venda, permuta e dação em pagamento, pode-se considerar
como valor do
imóvel a
avaliação da coletoria estadual (doação) ou municipal (venda, permuta, dação em
pagamento) para fins de cobrança do imposto devido, e não, necessariamente, o
valor atribuído ao imóvel nos contratos gratuitos ou o valor da transação
(preço) declarado nos contratos onerosos, por razões óbvias: nem sempre o valor
declarado é real.
Assim, num
escrito particular em que a compra e venda é realizada por valor inferior a
trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País e a guia do imposto de
transmissão apresenta avaliação do imóvel com valor superior, está patente que
o escrito particular não atende o disposto no CC 108, devendo ser exigida a
escritura pública.
Nos
negócios de constituição de garantia real, porém, não é possível utilizar o
paradigma acima, em razão desses negócios não estarem sujeitos ao imposto de
transmissão (art. 156, II, CR/88). Como o requisito do CC 108 não é o valor do
negócio (preço), que no caso seria o valor do empréstimo, quase sempre inferior
ao valor do imóvel, a aferição do requisito autorizador do escrito particular
deverá ser o valor atribuído ao imóvel para fins de execução da dívida, ainda
que em geral essa avaliação não corresponda ao valor efetivo do imóvel. O
ideal, nesse caso, seria que se apresentasse junto com o título particular uma
avaliação de um profissional habilitado. Porém, essa providência, além de
onerosa, prescinde de fundamento legal.
Diante do
exposto, destaca-se o papel do Registro de Imóveis em garantir a segurança e a
eficácia dos negócios jurídicos que lhe são submetidos à qualificação para fins
de constituição de direitos reais sobre imóveis, obstando, sem receio, o
registro de documentos que não atendem o requisito de forma prescrita em lei,
como é o caso dos escritos particulares de compra e venda de imóvel pagos,
total ou parcialmente, com recursos do FGTS, mas sem o concomitante
financiamento do SFH, haja visto a falta de autorização legal nesse sentido, como
também de qualquer escrito particular de compromisso de compra e venda que não
esteja precisamente amparado na lei, sejam os relativos às incorporações imobiliárias sejam os
relativos ao valor do imóvel. A acolhida desses títulos sem a necessária
autorização legal constitui violação que compromete a segurança e a eficácia
dos negócios jurídicos imobiliários, nos termos da Lei dos Registros Públicos e
do CC 108.
O Valor Da Permissão Do Documento Particular Em Razão Do Valor Do Imóvel - A ressalva na parte final do CC108 vem de certa forma perpetuar o disposto no art. 134, II, do Código Civil de 1916, de utilidade questionável. Perdeu o legislador uma boa oportunidade para ajustar aquela previsão legal a uma realidade prática que melhor atenda aos interesses sociais, regra de valor predominante em todo direito moderno, sem descuidar da segurança jurídica correspondente. Basta fazermos um levantamento em todos os registros imobiliários do país para nos darmos conta do insignificante número de casos em que alguém se utilizou apropriadamente daquela previsão legal para instrumentar um negócio jurídico por documento particular. E as razões são óbvias. Primeiro: quem negocia imóvel de tão baixo valor, em regra não tem a menor ideia que existe essa previsão legal. Segundo: quem sabe dessa previsão, raramente, mas muito raramente, conhece o Direito o suficiente para elaborar um documento particular de forma que possa ter ingresso no Registro de Imóveis, levando-se em consideração que esses contratos devem ser elaborados em sintonia com as disposições dos artigos 222 e 225 da Lei nº 6.015/73; com as normas concernentes à capacidade e representação das partes, nos termos do Código Civil, e demais legislação (lei, em sentido material e formal, provimentos, instruções normativas, etc.) no que diz respeito aos documentos (pessoais e do imóvel) e aos tributos indispensáveis à prática do ato. Ou seja: um universo infinitamente reduzido de pessoas faz uso dessa previsão legal.
Assim, o melhor é sempre se valer da escritura pública para viabilizar a regularização do imóvel, valendo-se do indiscutível conhecimento do tabelião acerca da matéria, evitando-se aborrecimentos e desgastes por ocasião do registro do título no Registro de Imóveis. Contudo, a permissão do instrumento particular para negócios relativos a direitos reais sobre imóveis na hipótese do CC 108 releva descompasso com a realidade social quanto à melhor forma de se promover a regularização desses negócios. O mais lamentável é que isso ocorre exatamente quando há uma enorme consciência jurídica da importância da regularização fundiária como fator, sobretudo, e antes de tudo, de inclusão social, pois essa permissão desprestigia a regularização da forma mais simples e segura: a escritura pública.
Não há dúvida que o legislador se distraiu da essência do CC 108 do Código Civil quando flexibilizou a indispensabilidade da escritura pública para negócios jurídicos levando em conta o valor do imóvel. Em vez disso, teria feito melhor se tivesse mantido o foco num valor de maior expressão que o valor do imóvel: a segurança jurídica dos negócios realizados através da escritura pública. É viabilizando a escritura pública para todos os negócios jurídicos, com emolumentos condizentes com cada negócio, que se cumpre a essência do CC 108, e não dispensando a escritura pública exatamente para aqueles que mais necessitam dela: os menos favorecidos e ou leigos. (Valestan Milhomem da Costa, A indispensabilidade da escritura pública na essência do art. 108 do Código Civil publicado em setembro/2006, site jus.com.br. Acesso em 21/09/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Sob o
prisma de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo estabeleceu
como um das maneiras de se adquirir a propriedade imóvel o respectivo registro
imobiliário do ato translativo ou do título de transferência, remetendo-se
ao CC 1.245, o qual prevê expressamente que a propriedade transfere-se, entre
vivos, com o registro competente do título (Diniz, 2007, p. 130). É a forma derivada
de aquisição.
De fato, os negócios jurídicos (contratos) firmados entre as partes não
são suficientes para a transferência da propriedade imóvel – como compra e
venda, doação ou dação em pagamento – sendo indispensável, assim, o cumprimento
da formalidade registral ora estabelecida na Lei 6.015/73 (LRP), seguindo a
orientação do direito germânico. Mesmo uma carta de arrematação não
transfere por si a propriedade, necessitando seu pronto registro imobiliário
para tais efeitos.
O registro público de uma sentença de usucapião tem efeito apenas
declaratório, e não constitutivo – como na maioria dos casos de transferência
derivada de cadeias dominiais – eis que tal registro apenas reconhece um direito
preexistente, que se consumou com a anterior posse jurídica caracterizada pelo animus
domini.
Prenotação é a anotação prévia e provisória da entrega no
protocolo, feita por oficial de registro público em relação a um determinado
título apresentado para registro. O registro terá como data o dia em que se
apresente o título ao oficial do registro, e este o prenotar no protocolo. Matrícula
é o ato de cadastramento de um determinado imóvel, de acordo com suas
especificações e confrontações, estabelecendo um sistema cadastral. Registro
é o ato posterior à matrícula o qual, mediante apresentação do título
constitutivo competente, a propriedade imóvel é registrada. Averbação é
uma anotação feita na matrícula a pedido do interessado referente ao imóvel,
para externar fatos ou atos determinados sobre a situação do bem (LRP, art. 227
e ss.). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e
Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.09.2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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