terça-feira, 6 de julho de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.792, 1.793, 1.794 Da Herança e de Sua Administração - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.792, 1.793, 1.794
Da Herança e de Sua Administração - VARGAS, Paulo S. R.
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Livro V – Do Direito das Sucessões - Título I – Da Sucessão em Geral
– Capítulo II – Da Herança e de Sua Administração - (Art. 1.791 a 1.797)

 

Art. 1.792. O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demostrando o valor dos bens herdados.

Este artigo corresponde ao art. 1.839 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.587 do Código Civil de 1916.

Agregando conhecimentos, o relator em sua doutrina, o direito romano, e em nosso direito pré-codificado, o herdeiro respondia ultra vires hereditatis (= além das forças da herança). Se o passivo hereditário superasse o ativo, o herdeiro estava obrigado a pagar, com seus próprios bens, as dívidas deixadas pelo falecido. A hereditas damnosa é a herança danosa, ou herança maldita, que podia levar o herdeiro à ruína econômica.

Para escapar dessa situação perigosa, o herdeiro aceitava a beneficio do inventário, o que acabou se tomando uma cláusula usual, e, com isso, ficava resguardado, pois os encargos da herança seriam pagos pelas próprias forças do acervo hereditário, O beneficium inventarii foi introduzido no direito romano pelo Imperador Justiniano.

O Código Civil de 1916 modificou a situação, definindo, no art. 1.587, que o herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança. Tornou-se ocioso e desnecessário o expediente de aceitar a beneficio do inventário, pois não se confundem o patrimônio do falecido e o patrimônio do herdeiro (bonorum separatio).

Em suma: é a herança que responde pelo pagamento das dívidas do falecido (art. 1.997). O herdeiro só responde intra vires hereditatis (= dentro das forças da herança). São separados os patrimônios do autor da herança e do herdeiro.

Mas o herdeiro deve provar que há excesso, ou seja , que os encargos equivalem às forças da herança, ou até as superam, é escusada essa prova se houver inventário, demonstrando o valor dos bens herdados, e, concomitantemente, o montante das dívidas. Mediante simples confrontação, chega-se ao resultado, sem necessidade de outra prova, que esta é a mais robusta e segura. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 923, CC 1.792, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 06/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Júlio Cesar Baillerini Silva, entende sob a perspectiva da relação de copropriedade tem-se que a admissão de tal fracionamento do dever de repassar os frutos do bem ao montemor quebranta a natureza jurídica da relação entre herdeiros, de ser um condomínio proindiviso, passando a ser prodiviso com uma condição resolutiva no intercurso (CC 121), donde a obtenção exclusiva dos frutos ficaria em prol do herdeiro beneficiário até que haja a sobrevinda da notificação extrajudicial que poria fim a exclusividade na fruição. 

A vontade do herdeiro superaria o espírito da lei quando optou pelo início da sucessão, ou seja, a morte do herdeiro e o fim da comunhão com a partilha dos bens (CC 2023).

Assim, os demais herdeiros que foram, pela lei, contemplados com o patrimônio do de cujus, desde a data de seu óbito, são obrigados a ver a cisão entre o momento do falecimento e o da notificação extrajudicial, com um herdeiro isoladamente aferindo os alugueis, para depois ocorrer a divisão dos quinhões.

A hipótese de tal ato, não deixa de gerar um certo enriquecimento sem causa, a uma porque não é obrigado a trazer tal bem a colação, pois não se trata de doação ou antecipação da legítima (CC 2002) e a duas por estar dispensado das penas da sonegação (CC 1992), pois os herdeiros conheciam a situação e de boa-fé (CC 113) permitiram a obtenção dos frutos na certeza da futura divisão, desde a data da morte (e isso não deixaria de romper com orientações já cristalizadas do Superior Tribunal de Justiça, como, verbi gratia, aquelas contidas nas súmulas nº 43 e 54, que, nitidamente, combatem orientações geradores de tal locupletamento ilícito).

Nesses exatos termos alhures pode-se, aliás, extrair referido conteúdo ao se analisar o voto do Ministro Ari Pargendler ao decidir, no sentido de que:


Aberta a sucessão, domínio e posse transmitem-se aos herdeiros (CC 1.572). A herança é recebida em estado de comunhão proindiviso, o qual pode, ou não, terminar com a partilha: a) deixa de existir se o patrimônio puder ser dividido entre os herdeiros, cada qual passando a ser proprietário de um ou mais bens; b) subsiste, seja porque não houve a divisão do patrimônio, seja porque este é indivisível – mas muda de natureza, porque passa a ser um estado de comunhão intervivos, não mais um estado de comunhão hereditária. “O fim da partilha” – ensina Pontes de Miranda – “é tirar todo caráter hereditário da comunhão. A lei tem essa comunhão como transitória, e breve; por isso mesmo, impôs prazos para a abertura e para o encerramento do inventário” (Tratado de Direito Privado, Editor Borsoi, Rio de Janeiro, 1971, 3ª edição, Tomo LX, p. 223). Quid, se a partilha tarda, estando um dos herdeiros na posse e gozo de imóvel sob comunhão hereditária? Salvo melhor juízo, a resposta depende de saber, primeiro, se o imóvel cabe, ou não, no quinhão do possuidor e, segundo, se ele tem preferência na respectiva partilha. Na espécie, o quinhão hereditário cabe no quantum que deve ser partilhado ao possuidor, e ele tem preferência na adjudicação, tal qual deflui, a contrario sensu, do CC 1.777 e da elaboração doutrinária, in verbis: “A comodidade dos herdeiros há de ser atendida. Os exemplos mais frequentes são os de vizinhança de prédios herdados e prédios já de propriedade do herdeiro, os de situação do edifício ou apartamento em lugar em que reside ou tem negócios o herdeiro...“ (Pontes de Miranda, op. cit. p. 249). Se o imóvel cabe no quinhão hereditário e o possuidor tem preferência na partilha, não está obrigado a transferir para o espólio os frutos atuais ou potenciais do bem, nem pode lançar os respectivos encargos à conta da herança (v.g., despesas condominiais, taxas e impostos); se prevalecesse a solução adotada nas instâncias ordinárias, ter-se-ia o resultado insólito de o proprietário pagar aluguel. O desate da lide, evidentemente, seria outro se o quinhão hereditário fosse menor do que o bem ocupado pelo herdeiro, porque este teria então de carrear ao espólio os respectivos frutos, sob pena de enriquecimento sem causa. (Júlio César Baillerini Silva, em artigo publicado no site jus.com.br, de fevereiro de 2012, CC 1.792 intitulado “O enriquecimento ilícito e o princípio da saisine na utilização exclusiva de imóvel da herança por herdeiro”, acessado em 06/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Agregando conhecimentos, Guimarães e Mezzalira, desde o direito romano, os herdeiros recebiam a herança, que se comunicava com o patrimônio individual de cada um deles, muitas vezes, isso representava pesado ônus para o herdeiro. Com a evolução do Direito, por volta do século V dC, introduziu-se o chamado benefício de inventário. O herdeiro entrava no inventário e dizia se permanecia ou não como tal. A lei brasileira consagrou esse instituto e estabeleceu que os herdeiros são responsáveis pelas dívidas do falecido até o montante que tenham recebido.

Chama-se força da herança o resultado da equação crédito menos débito. Se há resultado positivo existe herança, que será entregue aos herdeiros. Mas os credores do falecido podem acionar o herdeiro até o montante positivo, resultado da equação. Ninguém responde por dívidas do falecido, superiores à força da herança, àquilo que tiver sido transmitido para os herdeiros no formal de partilha.

Só os credores do falecido poderão habilitar sua penhora no rosto dos autos do inventário. Em havendo  mais dívidas que o patrimônio, não haverá preferência para o primeiro, mas será instaurado o processo de insolvência do falecido, com a venda de todos os bens e pagamento dos credores. Mesmo nessa hipótese, não se pode esquecer que o primeiro a recolher será o ITCD – Tributo do Estado Membro, consoante localização dos bens arrecadados.

Jurisprudência: Emenda: Civil. Ação de cobrança. Consumo irregular de energia. Processo administrativo. Falecimento do titular da unidade consumidora. Legitimidade do espólio para figurar no polo passivo da lide. – As dívidas contraídas pelo de cujus serão suportadas pelos bens por ele deixados e obrigam os herdeiros até o limite da herança, a teor do disposto no CC 1.792. – É possível o ajuizamento de ação de cobrança em desfavor do espólio do titular da unidade consumidora com o objetivo de reconhecimento de débitos de consumo irregular de energia, sendo certo que, posteriormente, em eventual cumprimento de sentença, é que se deverá discutir a existência ou não de bens suficientes para satisfação da dívida. (TJMG – Apelação Cível 1.0184.09.021359-8/001, relator: des. Alberto vilas boas, 1ª Câmara Cível, julgamento em 09/09/2014, publicação da súmula em 17/09/2014). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.792, acessado em 06/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem cano o quinhão de que disponha o coerdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.

§ 1º Os direitos, conferidos ao herdeiro em consequência de substituição ou de direito de acrescer, presumem-se não abrangido .

§ 2º É ineficaz a cessão, pelo coerdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente.

§ 3º Ineficaz é a disposição, sem prévia autorização do juiz da sucessão, por qualquer herdeiro, de bem componente do acena hereditário, pendente a indivisibilidade.

Este artigo corresponde ao art. 1.840 do Projeto de Lei n. 634/75. Não tem paralelo no Código Civil de 1916.

Na doutrina que o relator expõe, cessão de herança não pode ser feita antes da abertura da sucessão. Como não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva (CC 426). Cessão de direitos sobre herança futura é pacto sucessório, negócio jurídico nulo de pleno direito (CC 166, n. II e VII).

Sendo a herança deferida como um todo unitário, enquanto não ocorrer a partilha, persistindo a indivisão, cada herdeiro tem direito a uma quota parte ideal nos bens deixados pelo de cujus.

Pela cessão, o coerdeiro transfere, no todo ou em parte, a outro herdeiro ou a estranho, o seu quinhão hereditário. A cessão pode ser gratuita ou onerosa, correspondendo à doação, no primeiro caso, e a compra e venda, no segundo.

Repetindo o que consta no art. 44, III, do Código Civil de 1916, o Código Civil de 2002, art. 80, II, considera imóvel, para os efeitos legais o direito à sucessão aberta. Ainda que determinada herança só contenha bens móveis, ou apenas direitos pessoais, é considerada imóvel para os efeitos legais.

Permite o CC 1.793 que o coerdeiro transmita o seu direito à sucessão, bem como o quinhão de que disponha, exigindo, para tanto, forma especial e solene: a escritura pública (cf. BGB, art. 2.033, Art. 2). Cessão de direitos hereditários que não for feita por escritura pública é nula de pleno direito (art. 166, IV). E, se o herdeiro é casado, é necessária, para a cessão, a autorização do cônjuge, exceto no regime da separação absoluta (CC 1.647, caput e inciso I). A falta de autorização, quando necessária, tornará anulável o ato praticado (CC 1.649).

O cessionário toma o lugar, assume a posição jurídica do cedente na sucessão do de cujus, participando do inventário com todos os direitos e deveres do transmitente, e, na proporção do quinhão hereditário, responde pelos encargos da herança (cf. BGB, art. 2.382; Código Civil português, art. 2.128). Quando a cessão é feita a estranho, o adquirente, sem ser herdeiro, entra na comunhão hereditária.

Em regra, a cessão é negócio jurídico translativo aleatório, pois corre o cessionário o risco de o quinhão que adquiriu ser preenchido por coisas em quantidade inferior à esperada. O que o cedente transfere é a sua quota parte na herança; o que ele garante é a sua qualidade de herdeiro, e, salvo cláusula expressa em contrário, não se responsabiliza pelo volume ou extensão do direito hereditário transmitido. E ineficaz a cessão de direito hereditário sobre bem determinado, sobre qualquer bem da herança considerado singularmente, como a cessão de direitos, por exemplo, que faz um dos herdeiros, tendo por objeto imóvel identificado, que integra o espólio (cf. BGB, art. 2.033, 2).

Além da cessão de herança, pode ser feita a disposição de bem componente do acervo hereditário, pendente a indivisibilidade. As duas figuras são inconfundíveis. Mas a alienação de bem determinado, que compõe o acervo hereditário, só pode ser feita com prévia autorização do juiz da sucessão (CPC/1973, art. 992, 1, correspondendo ao art. 619 no CPC/2015). Sem essa providência, a disposição é ineficaz. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 924, CC 1.793, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 06/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Ricardo Guimarães Kollet, em artigo “A cessão de direitos hereditários no Novo Código Civil, publicou em novembro de 2003, no site Jus.com.br, ao falar da cessão de direitos hereditários, dá uma panorâmica, quando mostra que um contrato do qual opera-se a transmissão de direitos provenientes de sucessão, enquanto não dados a partilha que declarará a partição e deferimento dos bens da herança entre os herdeiros (legítimos ou testamentários) e aos cessionários, não encontrava dispositivo específico que a contemplasse diretamente no Código Civil de 1916. A referência à cessão encontrava guarida no artigo no artigo 1.078, do CC/1916, segundo o qual aplicam-se as disposições deste título (cessão de crédito) as disposições sobre a cessão de outros direitos para os quais não haja modo especial de transferência.

Outra menção ao instituto, existente no diploma privado anterior, podia ser verificada no artigo 1.582 que preceituava a não presunção de aceitação da herança se procedida a cessão gratuita aos demais herdeiros. A cessão de direitos hereditários foi instrumento largamente utilizado no direito brasileiro o que motivou o legislador de 2002 em contemplá-la nos dispositivos criados.

O Código Civil atual prevê, em seu artigo 1.793, que "o direito a sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o coerdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública". O novo preceito, que passa a integrar o ordenamento civil pátrio, nos informa dois requisitos básicos para a cessão, a saber: a) somente após a abertura da sucessão, ou seja, após a morte do autor da herança, poderemos falar em cessão dos respectivos direitos posto que, mesmo no ordenamento antigo (art. 1.089), quanto no atual (CC 426) a herança de pessoa viva não podia e continua não podendo ser objeto de contrato. Com a abertura da sucessão a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários, permanecendo, até o partilhamento final, o estado de indivisão, ou seja, a) na expressão do Código civil, "como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros" (CC 1.791); b) a cessão deverá revestir-se de forma pública, ou seja, deverá ser feitas em notas do Tabelião (por escritura pública).

Duas formas de cessão de direitos hereditários devem ser anotadas para poder-se pontuar as questões sobre os efeitos que devam produzir: uma a título universal, quando um ou mais de um dos coerdeiros cede ou cedem, no todo ou em parte, seu quinhão hereditário, devendo a cessão incidir sobre a totalidade da herança; outra a título singular, ou seja, sobre bem certo e determinado da herança, quando a sub-rogação do cessionário relaciona-se tão somente ao particularmente negociado.

A questão da possibilidade de cessão, por parte de coerdeiro, de seu quinhão hereditário, a título universal, seja no todo ou em parte, parece repousar em águas mansas. Somente deve-se atentar para o direito de preferência dos outros coerdeiros insculpido no CC 1.795 do Código. Conforme as palavras de Silvio Rodrigues "O condômino pode alienar a terceiro sua parte indivisa, ou seja, a fração ideal de que é titular; pode mesmo alienar uma parte alíquota de seu quinhão..." (1). Segundo César Fiuza "cessão de herança é a alienação gratuita ou onerosa da herança a terceiro, estranho ou não ao inventário". Segundo o mesmo autor "A cessão pode ser total ou parcial quando envolver todo o quinhão do cedente ou parte dele" (2). Neste caso, o cessionário receberá a herança assim como se encontra, ou seja, em estado de indivisibilidade.

A grande questão que se arvora diz respeito à cessão, por coerdeiro, de bem da herança, considerado singularmente, ou seja, sobre um bem certo e determinado da herança. O Código sanciona com a ineficácia da mesma em dois casos: quando feita por coerdeiro sobre bem da herança considerado singularmente (parágrafo segundo) e sem prévia autorização do juiz da sucessão, pendente a indivisibilidade (parágrafo segundo).

Quanto a resolução da primeira questão nos parece ser no sentido de que a cessão de direitos, a título singular, sobre imóvel certo e determinado, antes de ajuizada a ação de inventário ou arrolamento, não poderá ser feita pelo coerdeiro isoladamente. Entretanto, se feita pelo conjunto de todos os herdeiros com direito àquela herança parece que não será afetada pela ineficácia pois esta terá de ser alegada pela parte prejudicada. Tendo todos os herdeiros participado do ato de cessão, não haveria interessado legítimo para insurgir-se contra o ato. Poderiam, ainda, os demais coerdeiros, participarem do ato para expressar sua concordância, mesmo que não transfiram seus quinhões. Nesse caso a parte cedida, matematicamente, será abatida da quota do herdeiro cedente, quando da partilha respectiva.

Nesse sentido, continua a lição de Silvio Rodrigues, acima citada, a partir da interrupção: "...mas não pode, jamais, alienar um bem que componha o acervo patrimonial ou hereditário, pois este bem é insuscetível de ser alienado por um dos condôminos sem o assentimento dos demais. Na hipótese de todos os coproprietários desejarem fazer a venda de um bem, é a comunidade que procede à alienação, e o preço recebido, até ser dividido entre os interessados, se sub-roga no lugar da coisa vendida, pelo princípio de sub-rogação real" (3). Eduardo de Oliveira Leite, em seus comentários ao Novo Código Civil, ao pontuar a questão diz que o coerdeiro fica impedido de "dispor do bem sem o assentimento dos demais".

Entretanto, cabe ao intérprete perquirir: como o Tabelião vai verificar se todos os herdeiros estão presentes? A resposta parece bastante singela na perspectiva notarial visto que os atos que aportam ao serviço de notas são basicamente declarações de vontade. Sendo assim, a declaração dos cedentes no sentido de que compõem todo o polo ativo da relação sucessória, com a concordância do cessionário, que assumirá os riscos por eventual ineficácia do ato, apresenta-se como satisfatória. Deverão declarar também na escritura que não foi ajuizada a respectiva ação de inventário ou arrolamento, quando será necessária a autorização judicial conforme declinar-se-á em momento oportuno.

Corroborando os argumentos até aqui delineados, sobre a possibilidade da cessão de direitos hereditários anteriormente à propositura da ação de inventário ou arrolamento, pode ser destacada a possibilidade do cessionário, subsidiariamente, proceder a abertura da mesma, conforme a dicção do inciso V, do artigo 988 do CPC/1973 (legitimidade concorrente), correspondendo no CPC/2015 ao art. 616. O cessionário somente poderá iniciar a ação portando o respectivo instrumento de cessão, habilitando-se na forma processual cabível.

No que diz respeito à cessão, a título singular, por qualquer herdeiro, pendente a indivisibilidade, quando já existe ação judicial, parece deva ser aplicado o parágrafo segundo do CC 1.793, devendo haver prévia autorização do juiz da sucessão. Se admitir-se que a cessão poderá ser feita mesmo anteriormente à propositura da ação, a autorização judicial a que se refere o dispositivo em tela somente terá cabimento quando já estiver tramitando o feito.

Entretanto, embora as interpretações acima, ter-se que noticiar uma decisão inédita e isolada num processo de arrolamento onde foi habilitado cessionário de direito sobre imóvel certo e determinado, havido conforme escritura pública de cessão de direitos hereditários, sobre parte da herança, a saber, um imóvel (certo e determinado), a qual foi outorgada pelas únicas partes integrantes do polo ativo da relação jurídica (viúva meeira e herdeira-filha). Abstraindo-nos aqui de comentar a impropriedade da cessão dos direitos de meação (posto que não foi elemento norteador da decisão), relata-se tão somente o pronunciamento do judiciário, através de despacho, nos seguintes termos: "a partilha contraria as disposições do CC 1793 (a cessão de direitos foi formalizada antes da partilha) (o grifo é nosso). Oportuno, pois, o prazo de 10 dias para adequação da mesma, a fim de viabilizar a homologação nos devidos termos". A manifestação parece infundada posto que, após a partilha, o ato a ser feito somente poderá ser de doação ou compra e venda, nunca de cessão. Por outro lado nem o artigo 1793 nem seus parágrafos referem-se ao momento em que deve ser feita a cessão. A doutrina de Venosa é adequada quando sublinha: "Só existe cessão antes da partilha. Após, a alienação é de bens do herdeiro. O cessionário participa do processo de inventário, pois se sub-roga na posição do cedente" (5). A decisão deverá ser reformada.

A questão não reside, portanto, na feitura da cessão em momento anterior ou posterior a partilha, mas sim se antes ou depois de ajuizada a ação de inventário ou arrolamento. Se posterior, demanda a autorização do juiz da sucessão; se anterior, deverá ser feita por todos os coerdeiros, ou por parte deles com a anuência dos demais, adotando-se as cautelas já mencionadas.

A sanção cometida ao negócio jurídico que afrontar a determinação legal (feita por coerdeiro ou sem a autorização judicial) é de ineficácia. No ordenamento civil anterior (Código de 1916) entendia-se, pela fala do artigo 145, que seria nulo o ato jurídico "quando a lei lhe negar efeito" (inciso V). Entretanto, o artigo 166 do Código Civil de 2002 não reproduz esta regra. A regra posta diz que é nulo o ato jurídico quando "a lei proibir-lhe a prática, sem cominar sanção" (inciso VII). No caso em tela a lei ao proibir a prática da cessão por coerdeiro de bem considerado singularmente ou sem prévia autorização judicial, sanciona o descumprimento com a ineficácia. A ineficácia dos negócios jurídicos resulta de sua nulidade ou de sua anulabilidade. A questão é saber se o ato praticado em desacordo com o preceito é nulo ou anulável. (Destaca-se)

Se para o ato jurídico ser nulo é necessário que não haja outra cominação e tendo a lei sancionado o descumprimento com a ineficácia, tem-se que, por exclusão, o caso ser de anulabilidade. Por outro lado, se atentado para a lição de Venosa que leciona repousar "a nulidade sempre em causas de ordem pública, enquanto a anulabilidade tem em vista mais acentuadamente o interesse privado" (6) pode-se colocar a questão da ineficácia da cessão, nos casos mencionados nos parágrafos segundo e terceiro, do artigo 1793, do Código Civil de 2002, como sendo de anulabilidade visto que os interesses postos em questão são de natureza privada podendo, a qualquer tempo, os demais coerdeiros ou mesmo o juiz da sucessão convalidar o ato feito em desacordo com a lei, adjudicando o bem considerado singularmente ao cessionário.

 

Mesmo que se pudesse colocar os atos referidos no plano da nulidade esta seria relativa, a qual, na lição de Clóvis Beviláqua, "refere-se a negócios que se acham inquinados de vício capaz de lhes determinar a ineficácia, mas que poderá ser eliminado, restabelecendo-se a sua normalidade". A cessão feita em desacordo com a lei pode, efetivamente, dentro do processo de inventário, ser contemplada pelos demais herdeiros quando da partilha, adjudicando-se, como já foi dito, o bem, em favor do cessionário, com a homologação judicial, restando ratificada e produzindo os efeitos queridos pelos agentes.

Entretanto, se considerado que inexiste defeito na manifestação de vontade, o ato não será nulo nem anulável, posto que somente no plano da eficácia será atacado. Tem-se, então, um ato jurídico existente e válido, mas ineficaz. Nesse passo, mesmo sendo lavrado o ato contrariamente ao preceito legal, se os demais herdeiros quando da partilha houverem por bem contemplar o cessionário com o imóvel havido particularmente, a cessão produzirá plenamente seus efeitos.  (Ricardo Guimarães Kollet, em artigo “A cessão de direitos hereditários no Novo Código Civil” referencia o art. 1.793, publicado em novembro de 2003, no site Jus.com.br. Acessado em 06/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob a contemplação de Guimarães e Mezzalira, a cessação do direito pode ser alienado pelo herdeiro a outrem, obedecidas as regras para tal. Em primeiro lugar, somente pode ser feita por escritura pública, dando-se preferencia aos demais coerdeiros. Se houve abertura de inventário, necessária, também, a prévia autorização do juiz do feito.

 A cessação é genérica, não podendo o cessionário determinar o bem alienado, porque todos são titulares da universalidade, até que á partilha seja ultimada e homologada por sentença.

Ocorre a cessão, amiúde, quando o interessado quer “dinheiro” e o processo demora mais que o devido. Deve, então, oferecer aos outros, diretamente ou por intermédio de petição no curso do processo. Se o juiz deferir o requerimento, estará habilitado o herdeiro ceder parte ou a totalidade do seu direito. O estranho deve ser evitado, porque dificultará concluir o processo, desejoso de receber um certo bem.

Deixando de requerer a prévia autorização do juiz, ineficaz será a cessão, pois todos os bens estão arrolados no inventário. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.793, acessado em 06/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.794. O coerdeiro não poderá ceder a sua quota hereditária a pessoa estranha à sucessão, se outro coerdeiro a quiser, tanto por tanto.

 Este artigo corresponde ao art. 1.841 do Projeto de Lei O: 634/15k Não tem correspondente no Código Civil de 1916.

Consta nas memórias do relator Ricardo Fiuza, “O Código Civil inova ao prever normas especiais para a transferência de direitos hereditários”.

 Até a partilha, o direito dos coerdeiros é indivisível, regulando-se pelas normas relativas ao condomínio. O coerdeiro não pode ceder a sua quota hereditária a pessoa estranha à sucessão, se outro coerdeiro a quiser, tanto por tanto (cf. art. 504, caput, primeira parte).

Pelo mesmo preço, outro coerdeiro tem preferência na aquisição da quota hereditária. Mas não há falar em direito de preferência se o coerdeiro cede a sua quota hereditária a outro coerdeiro. 

Mencionando o CC 1.794 que a preferência do coerdeiro na cessão da quota hereditária a pessoa estranha à sucessão ocorrerá se ele a quiser, “tanto por tanto”, pressupõe a onerosidade da cessão. Estão excluídas desse dispositivo e da preferência que ele estatui as cessões gratuitas do quinhão hereditário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 924, CC 1.794, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 06/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Jeocaz de Jesus Silva, em artigo publicado mencionando o artigo em comento, intitulado Cessão de Herança, no site juridicocerto.com, em 11/03/2019, aponta que na cessão da herança o herdeiro não pode ceder o que está previsto para ser sua como herança ou sua quota parte hereditária para um estranho/terceiro à sucessão, caso outro coerdeiro queira a quota parte hereditária tanto por tanto. Se nenhum dos coerdeiros não tem interesse na cota parte, o outro poderá dispor para qualquer interessado. Caso um dos coerdeiros vende sua cota parte para um estranho e o outro coerdeiro toma conhecimento dessa venda, poderá requerer a cota parte depositado o preço que o estranho pagou, se o requerer no prazo de até 180 dias após a transmissão (arts. 1.794 e 1.795, CC/2002). Em seus Comentários ao Novo Código Civil, Eduardo de Oliveira Leite diz que o coerdeiro fica impedido de “dispor do bem sem o assentimento dos demais”.

A preferência, todavia, só pode ser exercida nas cessões onerosas, como se depreende da expressão “tanto por tanto” (CC 1.794). Não há, por conseguinte, direito do coerdeiro se a transferência da quota hereditária é feita gratuitamente. Como não existe preferência se o coerdeiro cede o seu quinhão a outro coerdeiro, que, logicamente, não é pessoa estranha à sucessão.(Enneccerus, Kipp e Wolff, Tratado de derecho civil, v. II, § 107).

O cedente deve ser capaz de alienar, não bastando a capacidade genérica. O cessionário recebe a herança no estado em que se encontra, correndo, portanto, os riscos de ser mais ou menos absorvida pelas dívidas. Aquele garante a existência do direito cedido, não a sua extensão ou quantidade dos bens, a não ser que haja ressalva expressa. Dado o caráter aleatório da cessão, não responde o cedente pela evicção. (Direito Civil, cit., v 7, p. 127).

Assinala, a propósito, ARNALDO RIZZARDO, que na cessão transparece, em especial, “o caráter aleatório, não muito comum em outros contratos, pois nem sempre, quando consumada a cessão, há o conhecimento da quantidade e da extensão do patrimônio e dos encargos. Isto principalmente se o contrato envolve a quota do herdeiro, integrado por bens e dívidas. Possível, pois, que uma aparente vantagem, evidenciada por razoável patrimônio, venha a desaparecer frente às obrigações que posteriormente surgem”.(Maria Helena Diniz, Comentários ao Código Civil, v. 22, p. 493-494).

Preceitua, efetivamente, o art. 1.794 do Código Civil: “O coerdeiro não poderá ceder a sua quota hereditária a pessoa estranha à sucessão, se outro coerdeiro a quiser, tanto por tanto”. Equivale a dizer que, para efeitos do direito de preferência, os coerdeiros são equiparados aos coproprietários, em caso de alienação de quinhão hereditário a estranhos. Complementa o CC1.795 do mesmo Código: “O coerdeiro, a quem não se der conhecimento da cessão, poderá, depositado o preço, haver para si a quota cedida a estranho, se o requerer até cento e oitenta dias após a transmissão. Parágrafo único. Sendo vários os coerdeiro a exercer a preferência, entre eles se distribuirá o quinhão cedido, na proporção das respectivas quotas hereditárias”.

Repete o legislador o que já havia determinado no art. 504, caput, ao disciplinar a venda de coisa indivisível em condomínio. O coerdeiro preterido pode exercer o seu direito de preferência ou prelação pela ação de preempção, ajuizando-a no prazo decadencial de cento e oitenta dias, contados da data em que teve ciência da alienação[18], e na qual efetuará o depósito do preço pago, havendo para si a parte vendida ao terceiro (Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, v. 7: direito das sucessões, 11. ed. – São Paulo; saraiva, 2017). Jeocaz de Jesus Silva, em artigo publicado mencionando o artigo em comento, CC 1.794, intitulado Cessão de Herança, no site juridicocerto.com, em 11/03/2019. Acessado em 06/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para Guimarães e Mezzalira, todos os coerdeiros têm preferencia para efetivar a cessão, não podendo o cessionário “vender” seu direito sem o exercício dos outros. O prazo, em regra, é de trinta dias, devendo a proposta de cessão ser pormenorizada, informando quanto por cento está à venda, forma de pagamento. Se mais de um herdeiro o quiser, estabelecer-se-á concorrência ou licitação entre os interessados. O estranho, repita-se, deve ser evitado a todo custo. É preciso que os herdeiros se conscientizem que litigar em processo de inventário causa prejuízos a todos, buscando entendimentos. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.794, acessado em 06/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).


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