Código
Civil Comentado – Art. 292, 293, 294
Da Cessão
de Crédito - VARGAS, Paulo S.
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Parte
Especial Livro I Do Direito Das Obrigações –
Título
II Da Transmissão das Obrigações
Capítulo
I Da Cessão de Crédito
Seção
III – Da Solidariedade Passiva (arts. 286 a 298)
Art. 292. Fica desobrigado o devedor que, antes de
ter conhecimento da cessão, paga ao credor primitivo, ou que, no caso de mais
de uma cessão notificada, paga ao cessionário que lhe apresenta, com o título
de cessão, o da obrigação cedida; quando o crédito constar de escritura
pública, prevalecerá a prioridade da notificação.
No
lecionar de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 292, p.
253-254, Código Civil Comentado, “Caso o devedor efetue o pagamento ao
cedente, sem saber da cessão, o ato será válido, cabendo àquele que o recebeu
indevidamente restituí-lo ao cessionário - o que reforça a convicção de que o
negócio entre cedente e cessionário já era eficaz: tanto era que o recebimento
indevido haverá de ser repassado ao cessionário. Tal solução prestigia a boa-fé
do devedor.
Prevalece
na doutrina e na jurisprudência a ideia de que o conhecimento da cessão pelo
devedor só é relevante porque, até que isso se verifique, o pagamento que ele
efetuar ao cedente tem eficácia liberatória (ver comentário ao art. 290 do
Código Civil)”.
A
invalidade do pagamento efetuado ao cedente nesses casos depende de o
cessionário comprovar a ciência da cessão pelo devedor. Verifique-se que não se
exige concordância do devedor para a validade da cessão, mas mero conhecimento
dela. Entre nós, a notificação do devedor é condição de eficácia da cessão em
relação a ele, nos termos do disposto no art. 290 do Código Civil. Como se verá
no comentário ao art. 294, outra consequência da notificação é que, a partir
dela, novas exceções oponíveis pelo devedor ao cedente não poderão ser
ofertadas ao cessionário.
No
art. 290 do Código Civil, o legislador utilizou a expressão eficácia, em lugar
de validade, adotada no art. 1.069 do Código Civil de 1916. No mais, manteve a
mesma estrutura do dispositivo constante do Código revogado.
O
presente artigo desobriga o devedor em relação à obrigação cedida sempre que
pagar o credor primitivo antes de ter conhecimento da cessão, ou, ainda, quando
paga ao cessionário que apresenta, com o título da cessão, o da própria
obrigação cedida, nos casos em que mais de uma lhe é notificada. Acrescenta que
quando o título for escritura pública prevalecerá a prioridade da notificação.
O título do crédito deve ser o original, na medida em que o dispositivo pretende
atribuir à posse do documento a prioridade no direito ao seu recebimento, como
consagrado, aliás, no artigo antecedente. Desde logo, esse artigo merece o
registro de que não pode ser aplicado aos títulos de crédito, em relação aos
quais a obrigação de pagar resulta da condição de ser o recebedor o portador do
instrumento, tendo em vista a abstração, literalidade e autonomia de que é
dotado (Rosa Jr., Luiz Emygdio F. da. Títulos de crédito. Rio de
Janeiro, Renovar, 2000, p. 52, 56 e 62).
Nesses
casos, embora semelhantes as soluções, o fundamento jurídico é diverso, na
medida em que abstração e autonomia não são encontradas no título objeto de
cessão. Nos casos de cessão de crédito, enquanto não houver ciência do cedido,
ela não precisa ser respeitada pelo devedor. Essa razão justifica o sentido da
norma referida, pois o devedor pagará perante aquele, já que antes da
notificação não é obrigado a vincular-se ao terceiro, cessionário. O cedente
que recebe o valor antes da notificação deverá fazer a entrega do pagamento ao
cessionário, sob pena de enriquecimento sem causa, uma vez que já não é o
titular do crédito. Se várias cessões tiverem sido feitas será necessário
verificar a eficácia delas perante o devedor. Somente as que lhe forem
notificadas serão eficazes.
E,
segundo o art. 292 do Código Civil, dentre estes, terá preferência o que lhe
apresentar o título de cessão e o da obrigação cedida, com exceção dos casos em
que o crédito consta de escritura pública, quando prevalecerá a prioridade da
notificação. A regra de que ora se trata refere-se à tradição do título
representativo do crédito cedido, e não a um título de crédito.
Segundo
Renan Lotufo, o dispositivo trata de hipótese que contraria o princípio da
boa-fé. O comportamento do cedente é ilícito, o que justifica a existência de
uma regra que estabeleça a preferência de uma cessão sobre as outras {Código
Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 150). (Hamid Charaf
Bdine Jr, comentários ao CC art. 292, p. 253-254 Código Civil
Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord.
Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil
de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado
em 11/04/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Segundo
entendimento dos autores Sebastião de Assis
Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito
Civil, Seção 2.5 – Efeitos da cessão de crédito, os arts. 291 a 298 tratam de
diversos efeitos da cessão de crédito, a saber: a) pluralidade de cessões: Uma
vez cedido o crédito, a regra é a de que o primitivo credor já não tem mais
sobre ele nenhuma disponibilidade. Entretanto, ocorrendo várias cessões do
mesmo crédito prevalece a que se completar com a tradição do título do crédito
cedido. No item, este referente à desoneração do devedor, b) Pelo mesmo
princípio encartado no tópico anterior, fica desobrigado o devedor que, antes
de ter conhecimento da cessão, paga ao credor primitivo, ou que, no caso de
mais de uma cessão notificada, paga ao cessionário que lhe apresenta, com o
título de cessão, o da obrigação cedida; quando o crédito constar de escritura
pública, prevalecerá a prioridade da notificação. (Sebastião de Assis Neto,
Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil,
Volume Único. item 2.5. – Efeitos
da Cessão de Créditos p. 658, Comentários
ao CC. 292. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 11/04/2022, corrigido
e aplicadas as devidas atualizações VD).
Dessa
forma, esclarece a equipe de Guimarães e Mezzalira: Após a notificação da
cessão ou de qualquer forma de ciência da transferência do crédito pelo
devedor, se este ainda assim pagar ao credor primitivo paga mal e logo não se
desincumbe de sua obrigação perante o cessionário. No entanto, se o devedor
paga a dívida ao cedente, antes da ciência da transferência do crédito, ele
fica exonerado de sua obrigação, havendo mais de uma notificação de cessão, o
devedor exonera-se da obrigação, pagando ao cessionário que lhe apresentar
tanto os títulos da obrigação cedida quanto da cessão em si. No entanto, em se
tratando de obrigação que conste de registro público, deverá prevalecer a
prioridade da notificação.
“Ausência
de notificação. O autor não foi notificado da cessão de crédito. O débito é
inexigível porque a cessão é ineficaz perante o devedor que não foi notificado.
A ausência de tal formalidade torna o apontamento junto aos órgãos de proteção
ao crédito indevido e ilegal. Dano moral evidenciado” (TJSP, 18ª Câm. Dir.
Privado, Apel. n. 990.10.372628-6, Rel. Des. Carlos Alberto Lopes, j.
28.9.2010). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud
Direito.com, nos comentários ao CC 292, acessado em 11/04/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
293. Independentemente do conhecimento da cessão pelo
devedor, pode o cessionário exercer os atos conservatórios do direito cedido.
Na
observação de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 293, p.
255 Código Civil Comentado: “Admite-se que o cessionário do crédito
exerça atos de proteção de seu crédito, mesmo que da cessão o devedor não tenha
conhecimento. Esse dispositivo, além de reforçar a convicção de que o negócio
da cessão se aperfeiçoa com as manifestações de vontade dos credores cedente e
cessionário (pois apenas por esse motivo é possível reconhecer ao cessionário
legitimidade para os atos conservatórios), autoriza que ele tome as referidas
medidas antes da eficácia do negócio perante o devedor. É possível, pois, que o
cessionário ajuíze ação cautelar de arresto para conservar o patrimônio do
devedor que pretenda cair em situação de insolvência (art. 813 do CPC/1973). (Hamid
Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 293, p.
255 Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de
10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários
Autores: contém
o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole,
2010. Acessado
em 11/04/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Na
continuidade dos autores Sebastião de Assis
Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito
Civil, Seção 2.5 – Efeitos da cessão de crédito, item c) Exercício de atos
conservatórios, sendo o beneficiário da cessão o novo titular do crédito
nela exposto, independentemente do conhecimento da cessão pelo devedor, pode o
cessionário exercer os atos conservatórios do direito cedido. Tai atos
conservatórios importariam, por exemplo, no ajuizamento de ações ou
notificações que visem interromper o curso da prescrição iminente. (Sebastião
de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de
Direito Civil, Volume Único. item 2.5. – Efeitos da Cessão de Créditos p. 658, subitem b – Exercícios de atos
conservatórios. Comentários ao CC. 293.
Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 11/04/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Na
crítica da equipe de Guimarães e Mezzalira, a notificação da cessão é relevante
para fins da vinculação do devedor ao cessionário (CC, art. 292), mas não para
a eficácia do negócio para o cessionário. Assim, independentemente da
notificação, poderá o cessionário adotar todas as medidas necessárias à
conservação do seu direito, tal como, ilustrativamente, a propositura de
medidas tendentes à interrupção da prescrição. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e
Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 293,
acessado em 11/04/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
294. O devedor pode opor ao cessionário as exceções que
lhe competirem, bem como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da
cessão, tinha contra o cedente.
Na
visão de Bdine Jr., o momento da notificação do devedor cedido tem relevância
em razão do seguinte: a) até que ela ocorra, o devedor pode pagar seu débito ao
credor primitivo (art. 292, primeira parte, do CC); e b) a partir da
notificação, o devedor pode opor, tanto ao cedente quanto ao cessionário, as
exceções que lhe competirem e das quais dispunha até aquela oportunidade.
O
devedor não pode ter sua posição agravada em decorrência da cessão. Os defeitos
e vícios que comprometem o crédito não são sanados em virtude dela, mas a
modificação subjetiva que se opera na obrigação pode gerar situações que não
existiam até então (Lotufo, Renan. Código Civil comentado. São Paulo,
Saraiva, 2003, v. II, p. 153).
Se
houver exceção pessoal do devedor em relação ao cessionário, ela só poderá ser
afirmada após a notícia da cessão, já que até aquele momento seus efeitos não
se produziam em relação ao cedido. Renan Lotufo também observa que as exceções
pessoais do cedido em face do cedente devem ser arguidas tempestivamente, sob
pena de não mais poderem ser suscitadas perante o cessionário, que é pessoa
diversa (op. cit., p. 154).
No
mesmo sentido se manifestam Munir Karam (O novo Código Civil, estudos em
homenagem a Miguel Reale, coordenado por Domingos Franciulli Neto, Gilmar
Ferreira Mendes e Ives Gandra Da Silva Martins. São Paulo, LTr, 2003, p. 318) e
Caio Hilário da Silva Pereira (Instituições de direito civil, 20. ed.,
atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v.
II, p. 379).
Em
relação às exceções, o cedido poderá invocar pagamento, defeitos do negócio
jurídico, compensação, prescrição, incapacidade etc. No entanto, em se tratando
de exceções pessoais, se não alegá-las até a época da notificação, não poderá
apresentá-las mais tarde, pois seu silêncio equivale à anuência com os termos
do negócio e revela seu propósito de efetuar a quitação da obrigação
transferida.
O
Código de 2002 não repetiu a parte final do art. 1.072 do Código Civil de 1916,
que vedava ao cedido opor ao cessionário de boa-fé a simulação do cedente. E
assim o fez, porque a simulação deixou de ser causa de invalidação por
anulação, para caracterizar nulidade (art. 167 do CC), de modo que não será
possível manter a validade do negócio, como ocorria na vigência do diploma
legal revogado. Contudo, terceiros de boa-fé terão seus direitos ressalvados em
face dos contraentes do negócio jurídico simulado (art. 167, § 2º, do CC).
Destarte,
se o cessionário estiver de boa-fé, poderá, eventualmente, postular seu crédito
em relação ao devedor. O devedor que não apresentar ao cessionário essas
exceções ficará impedido de fazê-lo mais tarde, salvo se demonstrar motivo
justificado para tê-lo deixado de fazer. Seu silêncio implica prestigiar a
presunção do cessionário de que nenhum obstáculo enfrentaria além dos que
naturalmente resultam do título. Essa limitação temporal ajusta-se ao princípio
da boa-fé objetiva: é dever do cedido informar ao cessionário todas as defesas
de que pretenderá fazer uso oportunamente, para não surpreende-lo mais tarde. (Hamid
Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 294, p.
256 Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de
10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários
Autores: contém
o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole,
2010. Acessado
em 11/04/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Segundo
entendimento dos autores Sebastião de Assis
Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito
Civil, Seção 2.5 – Efeitos da cessão de crédito, item d) Oponibilidade de
exceções: na cessão de crédito, o devedor pode opor ao cessionário as
exceções que lhe competirem, bem como as que, no momento em que veio a ter
conhecimento da cessão, tinha contra o cedente (art. 294). Assim, o devedor
pode opor ao cessionário exceções que tinha conta o cedente no momento que teve
conhecimento da cessão, como, por exemplo, seu direito à escolha na obrigação
alternativa, existência de condições suspensivas etc.
Esse princípio, no entanto, não se aplica aos títulos de
crédito, pois, por natureza, têm eles os atributos da autonomia, literalidade e
cambiaridade, pelos quais a lei optou por permitir que o devedor emita título
de sua vontade pelo qual confere ao credor a prerrogativa de fazê-lo circular,
independentemente até de sua notificação. É o que resulta dos arts. 955 e 956
deste Códex. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo,
em Manual de Direito Civil, Volume Único. item 2.5. – Efeitos da Cessão de Créditos p. 658, subitem d – Oponibilidade de
exceções. Comentários ao CC. 294. Ed.
JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 11/04/2022, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
Na
apreciação da Equipe de Guimarães e Mezzalira, o cessionário assume posição
idêntica do cedente na relação com o devedor (mutação subjetiva), ficando
investido, assim, de todos os seus direitos e garantias. Em contrapartida, o
devedor fica desobrigado perante o cedente e, caso este efetue a cobrança da
dívida, terá o devedor a exceção peremptória da ilegitimidade de agir. O
crédito cedido, a seu turno, não sofre qualquer alteração com a transferência,
passando-se ao cessionário com todas as suas vantagens ou vícios. Com a cessão
do crédito, o devedor poderá opor ao cessionário, além, obviamente, das
exceções relativas à validade e eficácia da obrigação e das exceções
processuais, todas as demais exceções pessoais (compensação, novação, transação
e confusão) que tenha contra o novo credor.
Em
relação ao credor primitivo, o devedor não poderá mais, após a notificação de
cessão, opor qualquer exceção pessoa que tenha contra o cedente. Qualquer
exceção que o devedor detenha em face do credor deverá ser aposta, quando o
devedor receber a notificação da cessão. Caso o devedor não seja notificado da
cessão, poderá este opor ao cessionário eventual compensação de crédito que
detinha em face do cedente (CC, art. 377).
O
devedor pode ainda apor, contra o cessionário, o direito de resolução do
negócio em razão de inadimplemento ocorrido antes da cessão. Pode, assim,
exercer os direitos de denunciar o negócio, desde que, ao tempo da cessão, já
estivesse vivenciando a situação de inadimplemento contratual. (Luiz Paulo
Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos
comentários ao CC 294, acessado em 11/04/2022, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
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