Código
Civil Comentado – Art. 299
Da
Assunção de Dívida - VARGAS, Paulo S.
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Parte
Especial Livro I Do Direito Das Obrigações –
Título
II Da Transmissão das Obrigações
Capítulo
II Da Assunção de Dívida
Seção
III – Da Solidariedade Passiva (arts. 299 a 303)
Art. 299. É facultado a terceiro assumir a
obrigação do devedor, com o consentimento expresso do credor, ficando exonerado
o devedor primitivo, salvo se aquele, ao tempo da assunção, era insolvente e o
credor o ignorava.
Parágrafo
único. Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor
para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como
recusa.
No
lecionar de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 299, p.
264-266, Código Civil Comentado, “A assunção da dívida pode ser definida
como a transmissão singular da dívida de um devedor para terceiro, que passa a
ocupar seu lugar na relação obrigacional. O terceiro assume a dívida e se
compromete a saldá-la. Tal comportamento não implica que o crédito originário
esteja extinto e que tenha sido substituído por outro, mas sim que o mesmo
débito seja exigido de novo devedor que assumiu a responsabilidade por ele”.
Segundo
Mário Júlio de Almeida Costa, “a ideia subjacente é a da transferência da
dívida do antigo para o novo devedor, mantendo-se a relação obrigacional” (Direito
das Obrigações. Coimbra, Almedina, 2000, p. 759). Denomina-se interna a
assunção que se verifica por contrato celebrado entre o antigo e o novo
devedor, ratificado pelo credor; e externa aquela que resulta de contrato
estabelecido entre o novo devedor e o credor, com ou sem consentimento do
antigo devedor. No primeiro caso, não havendo ratificação do credor, não se
consolida a assunção de dívida. Assim sendo, até a ratificação, será permitido
aos devedores - antigo e novo - desfazerem o negócio.
Na
realidade, como adverte Renan Lotufo, a leitura do art. 299 do Código Civil,
ora em exame, assegura que enquanto não ocorrer o consentimento do credor não
haverá assunção da dívida, pois ele é elemento necessário para o nascimento da
transmissão. O credor depositou confiança no devedor, de modo que sua
manifestação de vontade é fundamental para que ele possa ser substituído por
outro (Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 166).
Outra
classificação possível para a assunção de dívida distingue aquela em que o
devedor se exonera da obrigação daquela em que ele se mantém solidariamente
obrigado perante o credor. A primeira é denominada assunção liberatória e a
segunda, cumulativa.
Na
lição de Renan Lotufo, a omissão do Código no tratamento da assunção cumulativa
“tem sua lógica”. Ensina que a assunção cumulativa não é hipótese de
transmissão da obrigação, mas mera “pluralidade subjetiva no polo passivo, de
obrigação previamente existente” (op. cit., p. 168).
Desse
modo, a transmissão da obrigação não se opera, havendo apenas a adesão de outro
devedor à mesma relação jurídica. Mário Júlio cie Almeida Costa também se
manifesta no sentido de que somente haverá verdadeira assunção de dívida no
caso da assunção liberatória (op. cit., p. 759). Assim, “enquanto não
manifestado o assentimento do credor, o devedor primitivo encontra-se vinculado
juridicamente a este, podendo dele ser exigido o pagamento do débito” (Maia,
Mairan. Comentários ao Código Civil brasileiro. Rio de Janeiro, Forense,
2003, p. 262).
São
requisitos da assunção de dívida o consentimento do credor e a existência e a
validade da obrigação transferida (Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições
de direito civil, atualizado por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de
Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 383).
Aparentemente,
Arnaldo Rizzardo não concorda com esta posição (Direito das obrigações.
Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 285). O consentimento do credor é sempre
necessário, porque ele conta com o patrimônio do devedor para garantir o seu
crédito. Desse modo, teria de suportar prejuízo se o devedor pudesse transferir
o débito para terceiro insolvente. A ausência do referido consentimento implica
a solidariedade do antigo devedor, que se mantém vinculado ao débito, como
resulta da leitura do artigo em exame. Desse modo, não havendo consentimento do
credor, a assunção é válida e eficaz, mas não se reconhece a exoneração do
antigo devedor (Costa, Mário Júlio de Almeida. Op. cit., p. 760).
O
referido consentimento pode se exteriorizar no momento da assunção ou
posteriormente. O parágrafo único do art. 299 do Código Civil de 2002, em
estudo, estabeleceu a possibilidade de o consentimento ser solicitado por
notificação, mas negou a possibilidade de ele ser tácito, afastando a presunção
a partir do silêncio do credor que não se manifesta no prazo que lhe for
solicitado para recusar seu consentimento expressamente.
Pablo
Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho afirmam que já na vigência do Código
Civil de 1916 não seria possível admitir anuência tácita (Novo curso de
direito civil. São Paulo, Saraiva, 2002, v. II, p. 272). Renan Lotufo
enfrenta a questão e sustenta que o comportamento concludente - de que trata
Paulo da Motta Pinto (Declaração tácita e comportamento concludente no
negócio jurídico. Coimbra, Almedina, 1995) -, consistente, por exemplo, em
o credor receber pagamentos parciais de terceiro, representa aceitação
expressa, e não tácita, de modo que estaria incluída na disposição desse artigo
em exame (op. cit., p. 172).
Caio
Mário da Silva Pereira afirma que o recebimento parcial de pagamentos ou juros
caracterizará aceitação válida, ainda que a considere tácita, e não expressa -
divergindo, nesse aspecto, de Renan Lotufo (Instituições de direito civil,
20. ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense,
2003, v. II, p. 383). A inexistência ou invalidade da obrigação transferida
poderá ser alegada pelo assuntor ou pelo devedor primitivo, mas, se se tratar
de defeito sanável, a anuência de todos os envolvidos no negócio implicará
confirmação, afastando sua invalidade, de acordo com o disposto no art. 172 do
Código Civil (Pereira, Caio Mário da Silva. Op. cit., p. 383).
Também
se faz necessário o consentimento do novo devedor, que não pode ser obrigado a
assumir uma dívida contra a sua vontade. No entanto, o consentimento do devedor
primitivo é dispensável na denominada assunção de dívida externa, pois, como se
verificou acima, esta se estabelece a partir de negócio originariamente
celebrado entre o credor e o novo devedor, sem que se justifique a necessidade
de anuência do devedor, cuja situação não se alterará (caso as partes
convencionem que ele permanecerá vinculado ao débito) ou melhorará (se ele for
exonerado da obrigação).
No
caso em que o devedor primitivo for exonerado da obrigação, incidirão as regras
dos arts. 304 e seguintes deste Código, por aplicação analógica. O
consentimento expresso do credor é essencial, e ocorrerá a exoneração do
devedor primitivo sempre que o devedor substituto não for insolvente, ou,
sendo, o fato for do conhecimento do credor. Havendo consentimento expresso e
não sendo o assuntor insolvente, desaparece a responsabilidade patrimonial do
devedor primitivo.
Outro
requisito da assunção consiste em que ela seja fundada em contrato que exista e
que não seja inválido. Nos casos em que o novo devedor for insolvente, o
dispositivo em exame só admite a exoneração do antigo devedor se o credor tiver
conhecimento dessa circunstância. O dispositivo legal não se refere à má-fé,
mas apenas ao conhecimento. Dessa forma, para liberar o antigo devedor de sua
obrigação, é necessário que ele tenha ciência da insolvência do deve dor que
assume a obrigação - pode-se imaginar uma raríssima situação em que o primitivo
devedor seja insolvente e o credor aceite sua substituição por outro
insolvente, de cuja situação ele tem conhecimento, porque acredita na maior
capacidade de recuperação deste último. De modo geral, todas as dívidas podem
ser objeto de assunção, com exceção daquelas que, por seu conteúdo, devem ser
cumpridas pessoalmente pelo devedor, ou cuja transferência seja vetada pela lei
(Gomes, Luiz Roldão de Freitas. Da assunção e sua estrutura negociai.
Rio de Janeiro, Lumen Juris, 1998, p. 89).
A
assunção de dívida pode se dar pelos seguintes modos: a) expromissão:
mediante contrato celebrado entre o credor e o novo devedor. Pode ser
liberatória, quando o primitivo devedor não continua vinculado ao débito, e
cumulativa, nos casos em que o antigo devedor se torna solidariamente
responsável com o assuntor. Orlando Gomes pondera que, nessas hipóteses, haverá
repercussão em relação ao novo devedor: na cumulativa, ele terá direito
regressivo contra o devedor originário, em decorrência da solidariedade; na
liberatória, assegurasse-lhe o direito de “voltar-se contra o devedor
originário, invocando as regras do enriquecimento sem causa” (Obrigações.
Rio de Janeiro, Forense, 1986, p. 270).
Há
então repercussão em relação ao devedor originário, b) delegação:
mediante contrato celebrado entre o devedor e o terceiro. Também poderá ter
efeito liberatório ou cumulativo, sempre dependendo da existência do
consentimento do credor. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art.
299, p. 264-266, Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência,
Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil
Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada
e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 16/04/2022,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Na
conceituação no item 3. Assunção de Dívida, os autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria
Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, lecionam
ser a assunção de dívida instituto jurídico já existente antes do advento do
Código civil de 2002, entretanto, não era expressamente prevista na codificação
de 1916.
Afirmam discordância com a expressão cessão de débito,
pois a palavra cessão transmite ideia de transferência de um benefício,
donde ressai que, gramaticalmente, não se pode, em tese, falar na cessão de uma
posição desfavorável. Essa a razão da melhor denominação do instituto como assunção
de dívida, pois a assunção, sim, é palavra que define melhor a
situação, em que não se fala de um devedor “cedendo” a sua dívida, mas
sim de um terceiro assumindo a responsabilidade pelo cumprimento da
prestação.
Para entende-la, e traçar suas principais diferenças
com a novação subjetiva passiva (CC, art. 360, II), é necessário que se observe
a localização da assunção de dívida prevista no Título II do Livro I
(Direito das Obrigações), denominado de transmissão das obrigações, ao lado da
cessão de crédito. Já a novação se encontra no Título III do mesmo Livro,
denominado de adimplemento ou extinção das obrigações.
Logo, vê-se, enquanto a assunção tem a finalidade
de transmitir a titularidade passiva de uma obrigação, a novação
visa constituir nova obrigação, com extinção da primeira.
Na definição de Antunes Varela, portanto, assunção de
dívida “é a operação pela qual um terceiro (assuntor) se obriga perante o
credor a efetuar a prestação devida por outrem” (apud Farias e Rosenvald,
2007, p. 237). (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo,
em Manual de Direito Civil, Volume Único, item 3) Assunção de Dívida, p. 661. Comentários
ao CC. 299. Ed. JuspodiVm, 6ª
ed., consultado em 16/04/2022, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Na visão da Equipe de Guimarães e Mezzalira, é possível a
alteração do sujeito passivo da relação obrigacional, desde que haja a
concordância do credor. Referida concordância pode ser expressa ou tácita. Essa
segunda modalidade se dá nos casos em caso, ilustrativamente, o credor
permanece silente após ser intimado pelo devedor a se manifestar sobre a cessão
do débito (parágrafo único), ou quando o credor recebe pagamento parcial ou de
juros do cessionário, ou ainda quando praticar qualquer ato que demonstre estar
de acordo com a transferência da dívida. À semelhança da cessão de crédito (CC,
arts. 286 a 298), a assunção de débito também é negócio jurídico convencional e
abstrato.
Com a assunção, o cedente fica exonerado da solução e da
responsabilidade patrimonial pelo débito, assumindo o assuntor, inteiramente,
sua posição na relação obrigacional. Entretanto, na hipótese de insolvência do
assuntor do tempo da cessão, o negócio é ineficaz entre as partes e o credor
primitivo continua responsável pelo débito.
A transferência de dívida pode se dar tanto por contrato
celebrado entre o assuntor e o credor primitivo, com a anuência do credor
(forma delegatória) quanto por acordo direito entre o credor e o assuntor
(forma expromissória).
É possível ainda, que haja a assunção cumulativa da
dívida, quando um terceiro o assumir, em conjunto ao devedor primitivo, a
responsabilidade pelo cumprimento da obrigação. Ainda para esses casos, faz-se
necessária a anuência do credor, para que a cessão se convalide. Inexistindo
referida anuência, não há a cumulação de dívidas, mas há a promessa de
liberação, em que o terceiro assume a obrigação perante o devedor de liberá-lo
da obrigação em face do credor.
Há assunção de dívida nos casos de aquisição de
estabelecimento ou de fundo de comércio. Nessa modalidade, para a proteção do
direito dos credores, subsiste a responsabilidade solidária do devedor
primitivo até um ano a contar da publicação do negócio. Há, assim, espécie de
transferência da dívida que se efetiva sem a anuência dos credores.
“O art. 299 do Código civil não exclui a possibilidade
da assunção cumulativa da dívida quando dois ou mais devedores se tornam
responsáveis pelo débito com a concordância do credor” (Enunciado 16 do
CEJ). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et
al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 299, acessado em 16/04/2022,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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