Direito Civil Comentado - Art. 552,
553, 554
- Da Doação – VARGAS, Paulo S. R.
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Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(art. 481
a 853) Capítulo IV – Da Doação
Seção I –
Disposições Gerais
Art. 552. O doador não é obrigado a pagar
juros moratórios, nem é sujeito às consequências da evicção ou do vício
redibitório. Nas coações para casamento com certa e determinada pessoa, o
doador ficará sujeito à evicção, salvo convenção em contrário.
Ensina Nelson Rosenvald que a doação pura é um ato de
liberalidade, pelo qual o doador experimenta um empobrecimento justificado.
Cuida-se de contrato unilateral e gratuito, pois só o doador se obriga, sem que
receba uma contraprestação ou se evidencie qualquer sacrifício por parte do
donatário.
Pelas peculiaridades desse negócio jurídico, não é possível que se
lhe apliquem certas normas gerais da teoria contratual, como a incidência dos
juros moratórios, evicção e vícios redibitórios, sob pena de um agravamento
ainda maior de sua situação financeira.
A isenção de responsabilidade quanto aos juros moratórios impede
que o doador seja sancionado pelo fato de não entregar a coisa na data
ajustada, quando já está praticando uma liberalidade. Todavia, se o interpelado
for constituído em mora, responderá pelos juros de mora consequentes ao
processo a contar da data da citação (CC. 405), pois o benefício que concedeu
não lhe propicia o benefício da desídia.
Da mesma forma, a não ser que expressamente ressalve o contrário,
isenta-se de responsabilidade por vícios materiais e ocultos da coisa
existentes antes da tradição (CC 441) e pela perda da coisa pelo donatário em
virtude de uma decisão que conceda o direito sobre ela a um terceiro (CC 447).
Certamente, tais isenções de responsabilidade não incluem as
doações onerosas (com encargo), como se percebe ilustrativamente da leitura do
CC 441, parágrafo único. Ainda no que tange à evicção, há uma regra supletiva
no parágrafo único que permite a sua incidência nas doações para casamento com
certa e determinada pessoa. Aqui se faz referência à doação condicional do CC
546, na qual o legislador presume o dolo do cônjuge que oferece um bem ao
outro, considerando que a liberalidade se deu como uma forma de atrair o
interesse do outro nubente para o matrimonio.
O objetivo da norma em
comento é demonstrar que, se não há sinalagma, a diferença quanto à imputação
de deveres deve atender ao princípio da isonomia, dispondo que os desiguais
serão tratados desigualmente. Por essa razão, também se editou o CC 392,
enfatizando que, nos contratos benéficos, a parte a que não aproveite o
contrato só responderá por dolo. Portanto, se o doador sabia do vício material
ou jurídico do bem e ocultou o fato do donatário, será responsabilizado pela
quebra do princípio da boa-fé, pouco se cogitando de sua situação financeira e
muito se acautelando a confiança e legítima expectativa frustrada do donatário.
(Rosenvald Nelson, apud
Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de
10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. p.
602-603 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/10/2019. Revista e atualizada
nesta data por VD).
No entendimento de Ricardo Fiuza, a não-responsabilidade do doador
por juros moratórios e, ainda pelas consequências da evicção (CC 447 a 457) ou
dos vícios redibitórios (CC 441 a 446) da coisa doada é a regra geral. Isso
decorre de ser a doação um contrato não oneroso, ditado pela liberalidade
daquele que doa. A garantia da evicção é ressalvada, contudo, na doação feita
em contemplação de casamento futuro com certa e determinada pessoa (donatio
propter nuptias), de que trata o CC 546, instituída na dependência daquele
acontecimento (doação condicional), ficando, desse modo, sujeito o doador à
evicção, exceto por cláusula que o exclua. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 294 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em
07/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Como explica Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dever
de garantir o adquirente pela evicção ou por vícios redibitórios é próprio de
negócios bilaterais. Nos negócios unilaterais, como é o caso da doação, uma vez
que o credor somente tem benefícios com o ato, tal direito não existe.
Atente-se,
no entanto, para o fato de o Código Civil adotar a teoria das duas causas de Savigny
quanto às doações. Isso significa que no caso de doação remuneratória ou
gravada com encargo, o negócio somente é unilateral e gratuito na parte que
ultrapassa os serviços remunerados ou o encargo exigido, sendo, pois, no
tocante à parte equivalente a eles haver responsabilização por vícios
redibitórios e por evicção. Por opção legislativa, a lei admite ao donatário a
garantia pela evicção no caso de doação propter nuptias. (Marco Túlio de
Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 07.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 553. O donatário é obrigado a cumprir os
encargos da doação, caso forem a benefício do doador, de terceiro ou do
interesse geral.
Parágrafo único. Se desta última espécie for o encargo, o
Ministério Público poderá exigir sua execução, depois da morte do doador, se
este não tiver feito.
Na linha de raciocínio de Nelson Rosenvald, o encargo é elemento
acidental do negócio jurídico – assim como o termo e a condição – que poderão
ser inseridos em contratos gratuitos (v.g., comodato) ou negócios
unilaterais (v.g., testamento) pela autonomia privada das partes. Sua
oposição no contrato de doação produz uma restrição na eficácia da
liberalidade, pois implica a criação de uma obrigação de dar, fazer ou não
fazer para o donatário, convertendo o elemento acidental em essencial àquele
negócio jurídico. Não se trata, contudo, de uma contraprestação, pois
converteríamos a doação e compra e venda ou permuta, sacrificando a natureza
unilateral do contrato.
Assim, em razão da onerosidade acarretada à doação, deverá ela ser
objeto de aceitação expressa pelo donatário, não se admitindo a aceitação
presumida ou tácita (CC 539). Ao contrário do termo e da condição, em que se
suspende o exercício ou a própria aquisição do direito (CC 125 e 131), a
fixação de um encargo não suspende a aquisição do direito (CC 136), gerando
imediata eficácia da liberalidade e, via de consequência, da obrigação do
donatário de cumprir o encargo.
O caput do artigo enfatiza que o descumprimento do encargo
pode ser evitado mediante o ajuizamento da tutela específica, exigindo-se o
cumprimento do modo. Ora, se a aceitação gera a vinculação da doação ao
cometimento do encargo, tanto o doador como o terceiro que for beneficiado pelo
modo serão legitimados para o exercício da pretensão em juízo. Com relação ao
encargo de prestações de fazer, até mesmo a autoexecutoriedade será cabível em
hipóteses extremas, com posterior ingresso de demanda indenizatória perante o
donatário (CC 249, parágrafo único).
Tratando-se de cumprimento
de encargo de interesse geral, beneficiando a coletividade em caráter
indivisível, será o Ministério Público legitimado ao exercício da tutela
específica de execução do encargo, caso o doador não tenha agido em vida ou, se
iniciou a ação, não tenha sido a mesma concluída, caso em que o parquet
prosseguirá na ação. Tratando-se de ação condenatória, na falta de previsão
específica, aplica-se o prazo prescricional geral de dez anos para o exercício
da pretensão, a contar da data em que se aperfeiçoou a doação, se outro prazo
não foi assinalado. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual. p. 602-603 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/10/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
No diapasão de Ricardo Fiuza, a doação gravada com encargo ou
modal (CC 540), obriga ao donatário, podendo o doador revoga-la por inexecução
do encargo (CC 555, 2 ~parte), salvo quando o encargo beneficiar o próprio
donatário. Este fica sujeito ao adimplemento da obrigação, no prazo estipulado,
desde que incorrer em mora (CC 562). Quando a incumbência cometida pelo doador
for do interesse geral, e tendo aquele falecido, sem exigir a execução do encargo,
o Ministério Público tem legitimação superveniente, assegurada por lei (art.
5Q, última parte do CPC/1973 – correspondendo aos artigos 42 ao 53 do
CPC/2015), para exigir o cumprimento da obrigação do donatário. O MP não é
titular da relação jurídica de direito material ou dos interesses em conflito,
tendo atuação somente por morte do doador, aparelhando no próprio contrato a
pretensão da execução direta.
A constituição em mora do donatário se faz pelo vencimento do
prazo. Não o havendo, para o cumprimento, obriga-se o doador a notifica
judicialmente o donatário, assinalando-lhe, então, prazo razoável para que
cumpra a obrigação assumida (RI’, 204/252). (Direito
Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 294-295 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em
07/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
O encargo
pode ser instituído em benefício de qualquer pessoa, menos em benefício
exclusivo do donatário, pois não se admite que alguém se obrigue em relação a
si mesmo. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 07.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 554. A
doação a entidade futura caducará se, em dois anos, esta não estiver
constituída regularmente.
Na esteira de Nelson Rosenvald, assim como é possível efetuar
doação em prol de nascituro, sob a condição suspensiva de aquisição do
patrimônio com o nascimento com vida, em sede de inovação o legislador concebeu
a doação em prol de uma entidade futura, da existência incerta.
Cuida-se de doação sob condição suspensiva, sujeita a prazo
decadencial de dois anos para a sua constituição formal, sob pena de caducidade
da liberalidade, com a manutenção dos bens doados em poder do doador.
Dispensa-se a aceitação pelo
simples fato de o beneficiário não existir ao tempo da liberalidade, tampouco
um representante. Outrossim, ao incluir o termo “entidade”, o legislador não se
referiu apenas à pessoa jurídica, mas a qualquer ente personalizado ou não (v.g.,
condomínio), com finalidade lucrativa ou assistencial. Qualquer entidade será
sujeito de direitos, legitimada a agir em juízo na defesa de seus interesses. (ROSENVALD
Nelson, apud Código Civil Comentado:
Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar
Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 604 - Barueri, SP: Manole,
2010. Acesso 07/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).
Na trilha de Ricardo Fiuza, a eficácia da doação feita a entidade
finura (portanto inexistente) é submissa a uma condição suspensiva: a
constituição regular da entidade, no prazo assinado em lei. A doação, nessa
espécie, ficará sem validade, se a entidade não se constituir. A aceitação há
de ser presumida concomitante, portanto, com a existência da entidade
donatária. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p.
294-295 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em
07/10/2019, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Como afirma Marco Túlio de
Carvalho Rocha, é legal a doação sob condição suspensiva. A doação a pessoa
jurídica a ser criada é espécie de doação sob condição suspensiva, cuja
eficácia depende de ser criada a referida entidade. A lei estabelece prazo
máximo de 2 anos para a validade do negócio visando à segurança jurídica. (Marco Túlio de
Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 07.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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