Direito Civil Comentado - Art. 627,
628, 629
- Do Depósito Voluntário
– VARGAS, Paulo S. R.
- vargasdigitador.blogspot.com
digitadorvargas@outlook.com
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
Capítulo
IX – Do Depósito – Seção I –
Do
depósito voluntário
(Art. 627 a 646)
Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto
móvel para guardar, até que o depositante o reclame.
Como diz o histórico: O presente dispositivo foi objeto de emenda, por parte da Câmara dos Deputados, no período inicial de tramitação do projeto para supressão do parágrafo único, que tinha a seguinte redação: “Parágrafo único. Este contrato é gratuito, mas as partes podem especificar que o depositário seja gratificado”. Trata-se de mera repetição do art. 1.265 do CC de 1916, com a supressão do parágrafo único.
Juntamente
com a doutrina, o relator, apoiado no Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao art. 627, p. 336
apud Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado, acrescenta os dados bibliográficos referentes à toda a seção I,
em comento:
O
depósito pode ser conceituado como o contrato pelo qual uma determinada pessoa,
denominada depositário, recebido uma outra, depositante, um certo objeto móvel
para guardar gratuita e temporariamente e, quando reclamado, restituí-lo ao
depositante, como deflui da lição de Ad Peneira de Queiroz (Direito civil; direito das obrigações,
Goiânia, Editora Jurídica IEPC, 1999, p. 160).
Convém
lembrar, ainda, a clássica definição: “É negócio feito no interesse do
depositante e, com efeito, surge no campo do direito como um favor prestado a
um amigo (un office d’ami), para
quem, com zelo, se guarda um objeto por ele entregue” (Silvio Rodrigues,
Direito civil; dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, 27. ed.
São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3, p. 256).
As
suas principais características estão presentes na reportada definição; assim,
o depósito é contrato unilateral, gratuito, real, intuitu personae, não solene
e temporário.
Fontes consultadas de toda a seção I: Silvio
Rodrigues, Direito civil; dos contratos e das declarações unilaterais da
vontade, 27. ed. São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3; Maria Helena Diniz, Curso de
direito civil brasileiro; teoria das obrigações contratuais e extracontratuais,
16. ed. São Paulo, Saraiva, 2001; Amoldo Wald, Curso de direito civil
brasileiro; obrigações e contratos, 14. ed. São Paulo, Revista dos Tribunais,
2000; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil, 10. ed., Rio
de Janeiro. Forense, 1996, v. 3; José Lopes de Oliveira, Contratos, Recife,
Livrotécnica, 1978; Ari Peneira de Queiroz, Direito civil; direito das
obrigações, Goiânia, Editora Jurídica IEPC, 1999. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – comentários ao art. 627, p. 336 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed.,
São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/09/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Conceituando e dando seu parecer técnico, o professor Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 627, p. 649-650 leciona: O depósito é o negócio jurídico bilateral pelo qual uma pessoa (depositante) entrega ã outra (depositário) coisa móvel infungível, a fim de que esta possa guardá-la e restituí-la quando solicitado. Destarte, temos uma obrigação de custódia da coisa, de natureza temporária.
O
dispositivo em exame retrata o contrato de depósito convencional, ou
voluntário. O verbo guardar é a marca dessa relação jurídica. O depositário
recebe o bem móvel para satisfazer o interesse precípuo do depositante, na
conservação da coisa até o momento da restituição. De modo diverso, nos
contratos de locação e comodato, a guarda apenas é pressuposto para que os seus
titulares possam usar e fruir o bem contratado, faculdades essas que são
vedadas ao depositário, exceto sob autorização do depositante, na forma do art.
640 do Código Civil.
Contudo,
apesar de certa variação doutrinária, consideramos o depositário como possuidor
direto do bem móvel - e não mero detentor -, na medida em que o desdobramento
da posse requer uma relação jurídica de direito real ou obrigacional, como no
depósito. O depositário não mantém a coisa consigo a título de permissão ou
detenção (art. 1.208 do CC), tampouco é subordinado do depositante (art. 1.198
do CC). O fato de não usar ou fruir a coisa, porém apenas conservá-la, não
afasta a prática de atos possessórios, pois, sendo o possuidor aquele que
exercita de fato algum dos poderes do proprietário (art. 1.196 do CC), a sua
condição de possuidor será captada pela possibilidade de manejar ações
possessórias na defesa da coisa em face de esbulhos, turbações ou ameaças.
Aliás,
o depósito voluntário é relação intuitu
personae, pois o dever de guarda é atribuído a alguém, em regra, em razão
de uma especial confiança quanto aos atos conservatórios da coisa. Portanto, o
possuidor direto poderá determinar que a guarda imediata fique a cargo de
detentores (v. g., funcionários), mas
não poderá transferir a posse a terceiros, exceto com a autorização do
depositante.
O
contrato de depósito convencional recai somente em bens móveis corpóreos e
infungíveis, que não podem ser substituídos por outros da mesma espécie,
qualidade e quantidade (art. 85 do CC). Tratando-se de coisas fungíveis,
estaremos diante do depósito irregular, que será disciplinado na forma do mútuo
(art. 645 do CC). Não se entende a razão pela qual o legislador vedou o
depósito de bens imóveis, até mesmo pela prática habitual do juiz de nomear
depositário para os bens de raiz que servem de objeto a qualquer execução (art.
845, § 1º, do CPC), a quem incumbirá a conservação de bens penhorados,
arrestados, sequestrados ou arrecadados.
O
depósito voluntário é contrato real, eis que só se aperfeiçoa com a entrega da
coisa. Cuida-se a tradição de pressuposto de existência, assim como o observado
para os contratos de comodato e mútuo. Como consequência, será contrato em
regra unilateral, já que a única obrigação será do depositário, qual seja
conservar e restituir. Acidentalmente, converter-se-á em contrato bilateral,
ocorrendo as hipóteses do art. 643 do Código Civil. Em princípio é contrato
gratuito, mas poderá resultar oneroso (art. 628) com a atribuição de
contraprestação ao depositante, como se percebe das necessidades do tráfego
jurídico (v. g., depósito de
pertences em casa noturna). (Nelson
Rosenvald, apud Código Civil
Comentado, comentários ao art. 627, p. 649-650, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual. - Barueri, SP: Manole,
2010. Acessado em 10/09/2022, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
Na
introdução ao Capítulo IX - Sebastião
de Assis Neto, et al, em Manual
de Direito Civil. Capítulo IX – Depósito
– item 1.Conceito e Natureza Jurídica, p.
1.171.
Comentários ao CC 627, deixa o seguinte parecer:
O depósito é contrato pelo qual o depositante
entrega ao depositário uma coisa móvel para guardá-la e restituí-la em
certo prazo. Veja-se, de pronto, que o conceito de depósito envolve a entrega
de coisa móvel para guarda e restituição.
Descabe falar, portanto, em depósito de coisa
imóvel. O entendimento pela caracterização do ônus de depositário decorrente da
penhora, arresto ou sequestro de coisa imóvel em juízo contraria a natureza
jurídica do contrato de depósito, que é destinado, por lei (CC 627), apenas
para móveis (Cf. Gomes, 1979, p. 413 e ss).
Embora a doutrina se refira a alguns países
que adotem a possibilidade de depósito de coisa imóvel (Gomes, idem), trata-se
de condição que refoge à natureza desse contrato, uma vez que o sentido de entrega,
guarda e restituição só se aplica aos imóveis por ficção jurídica.
Para o caso de constrição judicial sobre
coisa imóvel, a Lei 10.444/2002 havia modificado o art. 659 do CPC-1973 §
4º, passando a disciplinar-se no art. 844 do CPC-2015 (nota VD), que a
penhora de bens móveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, cabendo
ao exequente, sem prejuízo da imediata intimação do executado, providenciar,
para presunção absoluta de conhecimento por terceiros, o respectivo registro no
ofício imobiliário, mediante apresentação de certidão de inteiro teor do ato e
independentemente de mandado judicial.
O CPC-2015, em seu art. 838, também prevê a
realização de penhora a termo e dispõe de qual forma, no art. 844, que “Para presunção absoluta
de conhecimento por terceiros, cabe ao exequente providenciar a averbação do
arresto ou da penhora no registro competente, mediante apresentação de cópia do
auto ou do termo, independentemente de mandado judicial”.
Entretanto,
malgrado nosso entendimento, diz Sebastião de Assis Neto, et al, o
CPC-2015 se refere à possibilidade de depósito de coisa imóvel, ao
mencionar no art. 840, III, que: “– os imóveis rurais, os
direitos aquisitivos sobre imóveis rurais, as máquinas, os utensílios e os
instrumentos necessários ou úteis à atividade agrícola, mediante caução idônea,
em poder do executado”.
O
depósito, em regra, é contrato. Unilateral – porque pressupõe obrigações
somente para o depositário, já que a entrega da coisa pelo depositante não é
obrigação, mas pressuposto para a sua formação. Gratuito – pois não pressupõe,
em regra, retribuição pelo depositante e Real – porquanto não se forma solo consenso, dependendo para
aperfeiçoamento e criação de obrigações, da entrega da coisa pelo depositante.
Entretanto, o depósito pode ser bilateral e oneroso, pois as partes podem estatuir que o
depositário seja remunerado pela guarda da coisa, havendo, nesse caso, criação
de obrigações recíprocas para ambas as partes (sinalagma) e a retribuição pelo depositante. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual
de Direito Civil, Volume Único. Capítulo
VII – Depósito – item 1.Conceito e Natureza Jurídica, p. 1.171. Comentários ao CC 627: Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 10/09/2022, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
Art. 628. O Contrato de depósito é gratuito, exceto se houver convenção em contrário, se resultante de atividade negocial ou se o depositário o praticar por profissão.
Parágrafo
Único. Se o depósito for oneroso e a retribuição do depositário
não constar de lei, nem resultar de ajuste, será determinada pelos usos do
lugar e, na falta destes, por arbitramento.
Como
já assinalado pelo instruisto Sebastião de Assis Neto, et al, o depósito, em regra, é contrato. Unilateral –
porque pressupõe obrigações somente para o depositário, já que a entrega da
coisa pelo depositante não é obrigação, mas pressuposto para a sua formação.
Gratuito – pois não pressupõe, em regra, retribuição pelo depositante e Real –
porquanto não se forma solo consenso,
dependendo para aperfeiçoamento e criação de obrigações, da entrega da coisa
pelo depositante.
Entretanto, o depósito pode ser bilateral e oneroso, pois as partes podem estatuir que o depositário seja remunerado pela guarda da coisa, havendo, nesse caso, criação de obrigações recíprocas para ambas as partes (sinalagma) e a retribuição pelo depositante. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Capítulo VII – Depósito – item 1.Conceito e Natureza Jurídica, p. 1.171. Comentários ao CC 628: Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 10/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No mesmo sentido, a doutrina de Ricardo Fiuza – comentários ao art. 628, p. 337 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: ‘Como sublinha o dispositivo em comento, o depósito voluntário é naturalmente gratuito, permitindo-se, porém, haja convenção no sentido de se estipular uma gratificação ao depositário, sem que tal ajuste deturpe a natureza do contrato’.
A
graciosidade é característica própria do contrato de depósito civil. O depósito
mercantil, por sua vez, possui natureza essencialmente remuneratória. É o que
exalta a doutrina: “No comércio, presume-se, pode o pagamento de comissão ao
depositário, ainda quando não estipulada” (Washington de Barros Monteiro, Curso de direito civil; direito das
obrigações, 4. ed. São Paulo, Saraiva, 1965. v. 2. p. 229-30). Assim, prevê
o NCC que o contrato de depósito é gratuito, exceto (...) se resultava de
atividade negocial — como a guarda de dinheiro em banco —ou se o depositário o
praticar por profissão — como a guarda de mercadorias em estabelecimentos
especializados, ou em caso de convenção expressa em contrário. São as exceções
previstas em lei à gratuidade, em regra, do contrato de depósito.
O parágrafo único estabelece, outrossim, que,
em caso de depósito onerosa, desde que a retribuição do depositário não conste
de lei nem de convenção ajustada entre as partes, essa retribuição será
determinada pelos usos do lugar, que se baseiam “na prática longamente
observada determinadas relações (...), a praxe aceita unanimemente” (José Answel,
Novo dicionário jurídico brasileiro. 1984, p. 390), e, em sua falta, por
arbitramento, que é a estimativa feita por pessoa escolhida pelas partes para
atribuir e fixar o valor pecuniário da retribuição cabível. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários
ao art. 628, p. 337 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/09/2022,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Conforme já observado e consente o professor Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 628, p. 650-651, em regra o contrato de depósito será marcado pela gratuidade. O contrato gratuito ou benéfico é aquele em que não há prestações recíprocas, já que a vantagem do depositante não implica correspondente sacrifício, nada devendo ao depositário. Normalmente, será aquele favor de um amigo a outro, que lhe impõe zelo e cuidado na conservação de um bem, sem que peça nada em retribuição.
Contudo,
em duas hipóteses o contrato será oneroso. Primeiro, quando houver cláusula
contratual fixando retribuição pecuniária para o depósito. Assim, haverá uma
imediata conexão entre prestação e contraprestação.
Outrossim,
a exigência de uma remuneração resulta da própria natureza do negócio jurídico.
Essa inovação do Código Civil nada mais é que um retrato da sociedade contemporânea,
na qual frequentemente o depósito aparece associado ao fornecimento de produtos
e serviços (v.g., estacionamento em
shopping, guarda de objetos em cofres de hotéis), sendo usual que dessas
atividades, normalmente desenvolvidas por empresários, possam os depositários
extrair vantagens econômicas.
Com
a unificação das obrigações civis e empresariais no Código Civil de 2002, o
legislador traz para o direito civil a natureza essencialmente remuneratória do
depósito mercantil, sendo certo que no comércio qualquer atividade se torne
objeto de remuneração, já que as trocas econômicas são a essência das relações
contratuais.
O
parágrafo único do art. 628 adere à diretriz da operabilidade, que permite que
nos negócios jurídicos em que não se tenha determinado a remuneração (v.g., contrato verbal) possa o
magistrado buscar os usos do local em que se contratou para definir o
pagamento. Assim, no depósito de animais para rodeios no município de Barretos
(SP), não será tarefa árdua ao magistrado a investigação dos padrões negociais
para os aludidos contratos. Caso os usos do lugar não sejam identificados, ou
mesmo não existam, o magistrado poderá arbitrar com base na sua percepção equitativa
a respeito do que mais se aproximaria de um “preço justo” para aquela situação.
(Nelson Rosenvald,
apud Código Civil Comentado, comentários ao art. 628, p. 650-651, apud Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual. - Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado em 10/09/2022,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Como
referencia Marco Túlio de Carvalho Rocha et al, apud
Direito.com, nos comentários ao CC 628: O dispositivo estabelece duas
presunções relativas a respeito do contrato de depósito. A primeira, genérica,
no sentido de presumi-lo gratuito; a segunda, que estabelece exceção à
primeira, de que o contrato é oneroso se o depositário realizá-lo como parte de
suas profissionais ou se relacionado a atividade negocial.
Uma vez que tais
presunções são relativas, se o contrato for expresso quanto ao caráter gratuito
ou oneroso do depósito vale o que estiver estipulado.
A presunção
relativa por desempenho de atividade em caráter profissional e razoavelmente
clara: se alguém deixa seu veículo em um estacionamento, deve pagar o
respectivo preço, ainda que, ao deixar o veículo, não tenha procurado se
inteirar do preço cobrado. A presunção de onerosidade quando se tratar de
atividade negocial é menos clara. Ocorre, por exemplo, se um fornecedor de
bebidas entrega um freezer a um revendedor. A presunção é de onerosidade; a
gratuidade deve estar expressa no contrato.
Nos casos em que a onerosidade é presumida, cabe arbitramento
judicial do preço, na falta de estipulação expressa. (Marco Túlio de Carvalho
Rocha et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC
628, acessado em 10/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Art. 629. O depositário é
obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e
diligência que costuma com o que lhe pertence, bem como a restituí-la, com
todos os frutos e acrescidos, quando o exija o depositante.
Aplicado o Direito Civil de acordo com a doutrina de Ricardo
Fiuza – comentários ao art. 629, p. 337 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: Do dispositivo em comento extraem-se as três obrigações
fundamentais do depositário: a)
guardar a coisa, o que é inerente e essência do contrato de depósito; b) conservá-la da mesma forma com que
atua na preservação das suas coisas próprias; c) restituí-la assim que reclamada pelo depositante.
A
lei, tutelando a pessoa do depositante contra eventual depositário infiel,
impõe o presente preceito, através do qual sujeita o depositário a proceder na
conformidade das expectativas daquele, expressando, afinal, a obrigatoriedade
da restituição da coisa depositada e na forma em que se encontrava quando da
celebração do contrato ou do seu equivalente. Assim, “se a coisa depositada
perece ou se deteriora por dolo ou culpa do depositário, a este cabe a
responsabilidade. Na hipótese, entretanto, de a perda ou deterioração advir de
força maior ou caso fortuito, não mais lhe cabe o dever de reparar, pois aqui
aplica-se a regra res perit domino,
já conhecida, e o depositante é o dono da coisa” (Silvio Rodrigues, Direito civil; dos contratos e das
declarações unilaterais da vontade, 22. ed. São Paulo, Saraiva, 1994, v. 3,
p. 264).
Jurisprudência: 1. “É vedada a prisão civil do
devedor fiduciante em ação de busca e apreensão contra si proposta, porquanto
não equiparável a depositário infiel. Precedentes (STJ, 3’T., AGREsp
330.207-PR, rei. Mm. Fátima Nancy Andrighi, DJ de 5-11-2001); 2. (...). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários
ao art. 629, p. 337 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/09/2022,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na direção seguida por Nelson Rosenvald, apud Código Civil Comentado, comentários ao
art. 629, p. 651-652: Cuidando-se o depósito de um contrato de
duração, no qual a execução jamais será concomitante à contratação, todo o
empenho do depositário será dirigido à guarda responsável da coisa. Atuará ele
como bonus pater famíliae, vale dizer
como o protótipo de diligência exigido do cidadão médio, atento e dotado de
ordinária inteligência, a fim de restituir a coisa infungível ao depositante.
Apesar de o Código se referir ao cuidado e
diligência “que costuma com o que lhe pertence”, devemos perceber que, na
hipótese de o depositário ser uma pessoa negligente e desidiosa, não poderá se
servir de tais defeitos como padrão de conduta habitual para justificar a
deterioração ou perda da coisa. Temos aqui parâmetros objetivos de
comportamento leal e correto na custódia e conservação da coisa, conforme induz
o princípio da boa-fé objetiva.
A redação do artigo afasta a incidência da
regra geral do art. 392 do Código Civil. Se em princípio aquele que não é
favorecido pelo contrato gratuito só responderá por dolo, o mesmo não ocorre no
contrato de depósito. Em outras palavras, mesmo que A faça um favor a B em
guardar os seus objetos temporariamente, assumirá total responsabilidade pela
sua destruição, mesmo diante de culpa levíssima, sendo a exclusão do dever de indenizar
apenas factível em casos de força maior devidamente provados (art. 642 do CC).
A segunda parte da norma se refere à obrigação
de restituir a coisa móvel quando o exija o depositante. Conforme a lição da
Teoria Geral do Direito das Obrigações, “se a obrigação for de restituir coisa
certa, e essa, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o
credor a perda, e a obrigação se resolverá [...]” (art. 238 do CC).
Aliás, não sendo o contrato fixado com termo,
aplica-se o princípio da satisfação imediata (art. 331 do CC), sendo lícito ao
credor exigir imediatamente a coisa, sendo possível a constituição do devedor
em mora caso se recuse a restituir o bem após o transcurso de prazo razoável
assinalado em interpelação (art. 397, parágrafo único, do CC). Não poderá o
devedor (depositário) unilateralmente deliberar pela restituição da coisa antes
do término do prazo contratual. Aqui se aplica a parte final do art. 133 do
Código Civil, pela qual o prazo não se presumirá em proveito do devedor, quando
as circunstâncias do contrato apontem no sentido de ter ele sido estabelecido
cm benefício do credor, como é o caso do depósito.
A recusa injustificada à obrigação de restituir
enseja ao depositante o ajuizamento de ação de reintegração de posse em razão
do esbulho decorrente da conversão da posse justa em precária (art. 1.200 do
CC). Sendo o contrato escrito e com prova literal, será lícito o manejo da ação
de depósito, como forma de o depositante exigir a restituição da coisa, satisfazendo
a sua pretensão resultante da violação do direito subjetivo (art. 901 do
CPC-1973, sem alteração no CPC-2015, nota
VD). Infere-se do exposto que não é da essência do contrato de depósito que
assuma a forma escrita, sendo suficiente a tradição do bem. Porém, a ausência
do instrumento subtrai ao credor a via do procedimento especial do depósito
(art. 902 do CPC-1973, sem alteração no CPC-2015, nota VD). Ou seja, o contrato escrito é solenidade ad probationem e não ad substantiam.
Por fim, a norma requer que a restituição da
coisa se faça acompanhada de seus frutos e acrescidos. Vale dizer, em sentido
amplo: os frutos naturais, industriais e civis, além dos produtos obtidos no
período de depósito, serão restituídos ao depositante. Isso decorre da ordem
natural de tal negócio jurídico. Se o depositário apenas guarda a coisa,
sendo-lhe vedada a sua exploração econômica, todos os acréscimos econômicos que
dela resultarem serão devolvidos conjuntamente ao bem principal.
Exemplificando: no depósito de uma vaca campeã, já prenhe ao tempo da tradição,
serão restituídos os bezerros. Idêntico dispositivo se aplica nos contratos de
penhor, nos quais o credor pignoratício apenas detém a custódia da coisa, como
depositário (art. 1.435,1 e IV, do CC).
Na crítica de Marco Túlio de Carvalho
Rocha et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC
629: Ao depositário é imposta diligência ordinária na guarda da coisa
depositada. Não é obrigado a realizar diligências especiais. Se o depósito se
faz a céu aberto, disto tendo ciência o depositante, não lhe é exigível a
guarda da coisa em recinto fechado.
A restituição da coisa deve ser feita tão logo a exija o depositante, mesmo que o contrato tenha sido firmado por prazo determinado, exceto se o depositário tiver o direito de retenção a que se refere o art. 644 do Código Civil. (Marco Túlio de Carvalho Rocha et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 629, acessado em 10/09/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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