Direito Civil Comentado - Art.
746, 747, 748
DO TRANSPORTE DE COISAS - VARGAS, Paulo S. R.
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Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(Art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte
– Seção III
Do
Transporte de Coisas - (Art. 743 a 756)
Art.
746. Poderá
o transportador recusar a coisa cuja embalagem seja inadequada, bem como a que
possa pôr em risco a saúde das pessoas, ou danificar o veículo e outros bens.
Como
explica Claudio Luiz Bueno de Godoy, foi sempre previsão constante, nas leis
especiais editadas acerca do transporte de cargas (art. 49, Decreto n.
51.813/63; art. 37, Decreto n. 90.959/85; Decreto n. 1.832/96), a possibilidade
de o transportador recusar a mercadoria a ser transportada em virtude do seu mal
acondicionamento. Isso porque é obrigação do expedidor embalar adequadamente a
coisa que será deslocada, de acordo com sua natureza, de modo a evitar a
causação de danos a pessoas ou coisas. Pois o Código Civil de 2002 repete a
regra, mas acrescenta uma cláusula geral, a autorização pra a recusa sempre que
a coisa cujo transporte se pretende possa por em risco, de qualquer modo, a
saúde das pessoas ou a integridade do veículo transportador ou de quaisquer
outros bens. Porém, ao ser aceito o transporte, sem ressalva, responsabiliza-se
o transportador pelos danos que a carga possa sofrer, a par da responsabilidade
perante terceiros dos danos que ela possa provocar.
Bem
de ver que, nos casos de carga proibida – ou com regras específicas para
deslocamento, pela sua especial periculosidade – a recusa não é uma opção do
transportador, mas um dever seu, tanto quanto desacompanhada de seus
correspondentes documentos, como está no artigo seguinte. A exigência de
correto acondicionamento da coisa, que se impõe ao expedidor, bem assim a
prerrogativa de recusa, pelo transportador, se a embalagem for inadequada, na
verdade representam ainda a contrapartida da responsabilidade do condutor. Ou
seja, como é responsabilidade do transportador a preservação da higidez da coisa
transportada, então natural que se exija seja-lhe ela entregue adequadamente
embalada, conforme sua natureza e o meio de deslocamento que se fará.
A
não ser assim, e sobrevindo o dano à carga, resultante do mau acondicionamento
pelo expedidor, afasta-se a responsabilidade do transportador, inclusive como,
para o transporte rodoviário de cargas, se expressou no art. 12, II, da Lei n.
11.442/2007 ou, antes, para o transporte multimodal – regido por um único
contrato, mas executado mediante mais de uma modalidade de transporte – já se
havia levado ao texto do art. 16, II, da Lei n. 9.611/98. Isso, porém, vale a
ressalva, na relação interna entre os contratantes, eis que não se exime o
transportador da responsabilidade por danos havidos a terceiros, posto que
assegurado direito regressivo diante do expedidor (v. ainda, comentários ao CC
735).
Veja-se, de outra parte, que o Código
Civil de 2002 não fez nenhuma ressalva, ao contrário do que se poderia
considerar inferido da redação do art. 50 do Decreto n. 51.813/63, por exemplo,
que pudesse induzir interpretação de que o transportador é obrigado a receber a
coisa se seu reclamo contra o mau acondicionamento não for acatado, apenas se
eximindo da respectiva responsabilidade. Antes de tudo, o regramento presente
procura evitar danos, que inclusive podem atingir terceiros, assim além da
questão da responsabilidade do transportador, apenas. Confira-se, a respeito, o
que se deduziu no comentário ao CC 739, acerca da questão da segurança como
justificativa da recusa do transportador à entabulação do ajuste. (Claudio Luiz
Bueno de Godoy, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 768-769 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 23/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Na
toada de Ricardo Fiuza, uma das obrigações do remetente é a de entregar a
mercadoria devida e convenientemente embalada, atendendo à natureza e
características da coisa que será transportada. Sendo inadequada a embalagem
verifica-se que ela pode pôr em risco a saúde das pessoas, ou danificar o
veículo e outros bens, o transportador pode recusar a coisa, negando-se a
efetuar o transporte. (Direito Civil -
doutrina, Ricardo Fiuza – p. 393 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed.,
São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Sob a luz de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a
rigor, o princípio da boa-fé objetiva permite a recusa de qualquer coisa cujo
transporte seja inadequado, não apenas em razão da embalagem. Assim, é lícito o
limite imposto por transportadores para a dimensão dos volumes transportados,
bem como a recusa de transporte de produtos químicos, de animais ou plantas que
sejam objeto de restrições administrativas. Somente não são admissíveis as
restrições arbitrárias, i. é, aquelas que não tenham justificativa num interesse
público importante. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 23.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
747. O
transportador deverá obrigatoriamente recusar a coisa cujo transporte ou
comercialização não sejam permitidos, ou que venha desacompanhada dos
documentos exigidos por lei ou regulamento.
Na
esteira de Claudio Luiz Bueno de Godoy, se no dispositivo anterior se autoriza
o transportador – portanto, sendo-lhe deferida uma prerrogativa – a recusar o
transporte de mercadorias que estejam mal acondicionadas ou que possam colocar
em risco a saúde alheia, o veículo pelo qual se efetua o deslocamento ou outras
mercadorias, no artigo presente se obriga o transportador a recusar o
transporte de cargas proibidas ou desacompanhadas da respectiva documentação.
E
também aqui, não se cuida de regra nova, eis que já antes constante de
legislação especial, por exemplo valendo a remissão ao que previa o art. 242 do
Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n. 7.565/86). Quando se determina a
recusa de transporte de mercadoria proibida, preserva-se mesmo a licitude do
objeto do contrato. Ou, caso se prefira, do objeto da prestação do
transportador.
Com
efeito, não se compadece o sistema com a possibilidade de que sejam
transportadas coisas cuja comercialização seja proibida, ou cuja posse por
vezes constitui mesmo crime, como no caso dos entorpecentes. Deve-se lembrar,
ainda, a ocasional existência de restrições legais ao transporte de coisas
perigosas, como combustível, por exemplo, que devem ensejar obrigatória recusa
do transportador a tanto não adequado.
Por fim, estabelece o preceito também a
obrigatória recusa quando a mercadoria não estiver acompanhada de sua
documentação, exigida por norma legal ou regulamentar, pense-se, por exemplo,
no transporte rodoviário de cargas desacompanhadas de sua nota fiscal. (Claudio
Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 769-770 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 23/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Na
doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, além dos casos previstos no artigo
antecedente, e com maior razão, o transportador terá de recusar, “deve
obrigatoriamente recusar”, a coisa cujo transporte ou comercialização não sejam
permitidos, ou que venha desacompanhada dos documentos exigidos por lei ou regulamento.
Não se trata de uma faculdade do transportador, mas de um dever legal. O objeto
transportado tem de ser lícito. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 394 apud Maria Helena Diniz Código
Civil Comentado já impresso pdf 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Segundo Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, é
comum a proibição de se transportar animais ou plantas para outros países,
tendo-se em vista a proteção sanitária e o combate à proliferação de doenças.
Razões de saúde ou de segurança podem determinar a proibição de transporte de
determinados bens. O contrato de transporte deve respeitar tais proibições, sob
pena de nulidade. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 23.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
748. Até
a entrega da coisa, pode o remetente desistir do transporte e pedi-la de volta,
ou ordenar seja entregue a outro destinatário, pagando, em ambos os casos, os
acréscimos de despesa decorrentes da contraordem, mais as perdas e danos que houver.
Na
toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, tal como se dá no transporte de pessoas,
a propósito remetendo-se aos comentários do CC 740, e lá fixando-se um limite
especial, não estipulado no presente dispositivo, ao menos por incidência do
Código Civil, para a respectiva cláusula penal compensatória, pode haver
desistência do contrato de transporte de coisas, manifestável até sua entrega
ao transportador.
Além
disso, veja-se que, no transporte de pessoas, esse exercício não se condiciona,
propriamente, ao início do percurso, eis que mesmo durante o trajeto poderá
haver desistência. A previsão de desistência para o transporte de mercadorias
até sua entrega reforça antigo entendimento que via nesta espécie um contrato
real, somente aperfeiçoado com a tradição da coisa a ser transportada. Mas,
como se viu nos comentários ao CC 730, o contrato de transporte, mesmo de
cargas, é consensual, sendo que a entrega já constitui ato de execução.
De
mais a mais, nada impedia que a lei estabelecesse, mesmo assim, a possibilidade
de arrependimento. Porém, ao fazê-lo, exatamente porque o contrato já estaria
então aperfeiçoado, não eximiu o desistente de compor as perdas e danos
provocadas pelo seu arrependimento. É possível a fixação prévia desse valor,
por acordo das partes, mediante o estabelecimento de cláusula penal, malgrado
sem limite que se determinou para o transporte de pessoas, mas atendendo-se ao
princípio de equilíbrio das relações contratuais que permeia o ordenamento como
um todo (CF 3º, I), não só o CDC 53. A propósito, remete-se aos comentários do
CC 732.
Bem
de ver que, no Decreto n. 19.473/30, particularmente em seu art. 7º,
facultava-se ao remetente, todavia então obrigado a pagar o frete por inteiro,
exigir o desembarque imediato da mercadoria, mesmo já em trânsito, portanto
ainda depois de sua entrega (right of stopage in transitu). Nem se
considera que essa possibilidade esteja excluída pelo atual Código Civil,
apenas se ressalvando a verificação de eventual prejuízo maior, inclusive,
quanto aos lucros cessantes, que se componha pelo pagamento integral do frete,
sempre observada eventual abusividade, conforme o dano real comprovado no caso
concreto.
Mas, além da desistência, o preceito em
questão permite que o expedidor altere o destino da carga, tal qual já se
continha no art. 113 do Código Comercial. Ao que se entende, tal alteração
poderá ser feita mesmo quando a mercadoria já estiver em trânsito, sempre
mediante o ressarcimento do acréscimo de despesas que a contraordem pode
induzir, inclusive reajuste do frete, se for o caso. A ressalva, porém, que se
há de fazer quanto a qualquer alteração que se faça com relação ao destino de
mercadoria cujo deslocamento já se iniciou é a eventual onerosidade excessiva
que a variação pode ensejar e que persista mesmo diante da revisão do frete.
Essa situação autoriza a recusa da alteração pelo transportador, tal qual o
caso em que não se acorda o reajuste do frete devido pelo acréscimo de esforço
para o serviço alterado, quando então o transportador permanece com a obrigação
de entrega no local do destino original. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 770-771 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso
23/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Na toada de Ricardo
Fiuza, como no transporte de pessoas, em que o passageiro tem direito a
rescindir o contrato antes de iniciada a viagem (CC 740), no transporte de
mercadoria, até a entrega da coisa, pode o remetente desistir do transporte e
pedi-la de volta, ou ordenar que seja entregue a outro destinatário. Em ambos
os casos, terá de pagar os acréscimos de despesa decorrentes da contraordem,
mais as perdas e danos que houver. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 394 apud Maria Helena Diniz Código
Civil Comentado já impresso pdf 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 23/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Sob a luz de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o
contrato de transporte de coisa é realizado entre o expedidor e o
transportador. O destinatário não é parte, a menos que ele mesmo seja o
expedidor. O dispositivo confirma o poder de disposição que tem o expedidor
sobre a coisa. É ele quem determina a quem a mercadoria deverá ser entregue e
tem assegurado o direito de alterar a destinação do bem, ficando obrigado ao
pagamento dos acréscimos provenientes da alteração de desígnios. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em
23.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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