Direito Civil Comentado - Art.
833, 834, 835, 836
- DOS
EFEITOS DA FIANÇA - VARGAS, Paulo S. R.
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Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(art. 481
a 853) Capítulo XVIII – Da Fiança
– Seção
II – Dos Efeitos da Fiança (art. 827 a 836) –
Art.
833. O fiador tem direito aos juros do desembolso pela
taxa estipulada na obrigação principal, e, não havendo taxa convencionada, aos
juros legais da mora.
No lecionar de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo em tela, tal
como seu correspondente no CC/1916, cuida do que se convencionou chamar de
juros do desembolso. Ou seja, o fiador, desde o instante em que paga a
obrigação afiançada, vê vencer, em seu favor, juros pelo quanto a esse
propósito tenha despedindo. Bem se vê, portanto, que tais juros não se
confundem com os juros que incidem sobre o débito principal, aquele afiançado.
A regra, a rigor, dessume-se do mesmo princípio insculpido no dispositivo do
artigo precedente. Mesmo prestada de forma benéfica, a fiança difere da doação
porque, a priori, não tenciona o
fiador, com ela, transferir de seu patrimônio bens ou valores ao afiançado. Por
isso que, honrando a fiança, deve ser ressarcido de tudo que a esse título haja
pago.
Tem o devedor afiançado, portanto, uma obrigação de reembolsar o
fiador quando este tenha pago seu débito ao credor, destarte desde aí vencendo
juros sobre essa quantia a ser reembolsada. A taxa desses juros do desembolso
será idêntica à taxa de juros ocasionalmente estabelecida na obrigação
principal. Se lá não estiver convencionada, a taxa dos juros do desembolso será
a legal, fixada na forma do CC 406, a cujo comentário se remete o leitor. (Claudio Luiz
Bueno de Godoy, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 856 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 05/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Caminhando com Ricardo Fiuza, ainda sobre os trilhos das relações
entre fiador e afiançado, sabe-se que o primeiro, sub-rogando-se nos direitos
do credor (CC 831), pode exigir do segundo o montante integral que pagou,
acrescido dos juros do desembolso pela taxa estipulada na obrigação principal,
e, à falta dessa taxa convencionada, pela taxa legal, que corresponde aos juros
moratórios de 6% ao ano.
Sobre o assunto, insta rememorar lição do ilustre Prof. Silvio
Rodrigues, quando nos ensina que, “sob esse aspecto, a fiança, embora constitua
um contrato benéfico, apresenta nítida diferença da doação, porque, enquanto
nesta quem faz a liberalidade deseja sofrer uma diminuição patrimonial em favor
do beneficiário, na fiança o fiador conta em não sofrer qualquer diminuição
patrimonial, tanto que, se, por acaso e contra a sua vontade, tiver o fiador de
fazer qualquer pagamento, encontra na lei um remédio para se reembolsar” (Direito civil: dos contratos e das
declarações unilaterais da vontade, 15 ed., São Paulo, Saraiva, 1986, v. 3, p.
399-400). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 438 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 05/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães
e Samuel Mezzalira, os juros podem ser legais ou convencionais. O Decreto n.
22.626;1934 estabelece que os juros convencionais não podem ultrapassar o dobro
da taxa dos juros legais. Os juros legais, conforme o CC 406, correspondem aos
juros incidentes sobre os tributos devidos à Fazenda Nacional. Conforme
comentários ao CC 406, há divergências quanto à aplicação da taxa Selic ou aos
juros previstos no Código Tributário Nacional.
Mesmo que o contrato
não preveja a incidência de juros, tem o fiador o direito de aplicar os juros
legais sobre os valores efetivamente desembolsados para pagamento da dívida. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 05.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
834. Quando o credor, sem justa causa, demorar a execução
iniciada contra o devedor, poderá o fiador promover-lhe o andamento.
Relembrando o Código Civil de 1916, Claudio Luiz Bueno de Godoy
aponta que a mesma providência que continha o art. 1498 anterior, se repete no
presente. Autoriza-se, com efeito, que o fiador possa dar andamento à demanda
injustificadamente paralisada que tenha sido movida pelo credor contra o
devedor afiançado. O pressuposto é e sempre foi o de que, afinal, o fiador tem
todo interesse em que se consume, de maneira proveitosa, a cobrança que o
credor promove contra o afiançado, de sorte, assim, a se forrar aos efeitos do
inadimplemento diante do qual foi estabelecida a garantia.
Pense-se na execução que, retardada, pode já encontrar um
patrimônio por isso insuficiente do devedor. Interessa ao fiador que isso não
aconteça, já que assim seria liberado de seu vínculo de garantia, razão pela
qual se lhe defere o que se tem entendido ser uma verdadeira legitimação
anômala ou extraordinária para prosseguir na execução, algo, segundo Washington
de Barros Monteiro, muito próximo da execução inversa que o devedor podia
encetar, na forma do art. 526 do CPC/2015, antigo 570 do CPC/1973, em sua redação
originária (Curso de direito civil – direito
das obrigações, 2ª parte, 34 ed. São Paulo, Saraiva, 2003, v. V, p. 385-6). A
ideia é de que se trata de medida de consumação, por outrem, do direito do
credor, inerte em fazê-lo.
É bem verdade, porém, que na execução inversa cogita-se do dever
que tem o credor de receber, ao passo que, um pouco diferente, aqui, no artigo
em comento, alvitra-se dever a rigor de boa-fé objetiva, ou seja, o de não
incidir no abusivo protraimento do exercício de direito, a dano de terceiro, no
caso o fiador. Daí que, para que o fiador assuma o andamento da execução, no
interesse direito do credor, portanto não desligado da relação creditícia, como
se daria na hipótese do art. 778, § 1º, IV do CPC, antigo art. 567, III, do
CPC/1973, porque não havido pagamento pelo garante,
com sub-rogação legal, mas, mesmo assim, em última análise também no seu
próprio proveito, porquanto cumprido caminho de desoneração da fiança prestada,
o retardo no andamento deve ser ao credor atribuível e sem causa razoável que o
justifique.
Dispõe a lei que a providência versada somente se possibilita
quando o credor demorar, sem justo motivo, o andamento da execução. Nada mais
senão o conceito de abuso, genericamente previsto no CC 187, a que se remete o
leitor, o que caberá ao juiz aferir, no caso concreto, independentemente de
prazo que, afinal, o legislador não estabeleceu a priori, malgrado serviente, todavia só como um critério, os
trinta dias previstos no art. 485, III do CPC, antigo art. 267, III, do CPC/1973.
Para Lauro Laertes de Oliveira, deve-se admitir não só o prosseguimento como o
próprio ajuizamento da ação de execução, pelo fiador, no interesse do credor,
contra o devedor afiançado (Da fiança.
São Paulo, Saraiva, 1986, p. 67).
Na mesma esteira, forte na lição de Alessandro Segalla e de Biasi
Ruggiero, o Ministro José Augusto Delgado cogita mesmo de o fiador poder
ajuizar inclusive ação de despejo por falta de pagamento contra o devedor
afiançado, de novo no interesse imediato do credor, mas em última análise no
seu próprio, dado que, assim, limita a extensão da garantia prestada, que se
pode alongar por inércia do locador que abusivamente protrai o exercício de seu
direito (Comentários ao novo Código
Civil, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro, Forense, 2004,
v. XI, t. II, p. 257-65). Seria também um caso de legitimação extraordinária,
ou de substituição processual, para os autores citados, mas sempre à
consideração de que das pessoas se espera – e mesmo impõe a própria Constituição
Federal, no art. 3º, I – comportamento leal, pautado pelo solidarismo, que
destarte reclama relação de colaboração, de tal modo que a demora no exercício
do direito, pelo credor, mesmo que sem esse deliberado proposito, eis que aqui
se cogita da boa-fé objetiva (v.g.,
CC 113, 187 e 422), pode bem prejudicar o fiador, por isso que então ficando a
ele facultadas as medidas aqui cogitadas e, particularmente, aquela disposta no
artigo em comento.
Por fim, diga-se que o dispositivo presente, confrontado com seu
correspondente, no CC/1916, não mais refere a figura do abonador, prevista no
art. 1.482 do Código Bevilaqua, na verdade um garantidor da fiança. Era mesmo
uma fiança da fiança, ou uma sub fiança, de pouco uso, coo observa Gildo dos
Santos (“A fiança”. In: O novo Código
Civil, coord. Domingos Franciulli Netto, Gilmar Ferreira Mendes e Ives
Gandra da Silva Martins Filho, São Paulo, LTr, 2003, p. 747-79), pelo que não
reproduzida no Código Civil de 2002, malgrado também por ele não vedada. (Claudio Luiz
Bueno de Godoy, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 856-57 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 05/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Rápido comentário de Ricardo Fiuza, na sistemática anterior,
prevista no CC de 1916, tanto o fiador quanto o abonador (fiador do fiador)
podiam, na incúria injustificada do credor, impulsionar a execução já iniciada
contra o devedor principal, a subfiança é a fiança a fiador (fiança da fiança):
afiança-se a dívida que o fiador, com sua promessa, assumiu. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 438 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 05/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Como apontam Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel
Mezzalira, o fiador tem interesse em que o credor receba do devedor a dívida.
Que o devedor cumpra a obrigação espontaneamente ou, se não o fizer, que o
credor faça uso da execução forçada. A demora do credor em cobrar o que lhe é
devido pode permitir que o afiançado venha a se tornar insolvente, agravando a
responsabilidade do fiador.
Em razão disso, se o credor não cobrar do devedor o que
lhe é devido após o vencimento da obrigação, fica caracterizada a moratória e
essa acarreta a exoneração do fiador nos termos do CC 838, I.
O fiador, embora
tenha interesse, não possui legitimidade para iniciar a cobrança do devedor em
benefício do credor. Uma vez iniciada a cobrança por este, no entanto, fica o
fiador autorizado a promover-lhe o andamento, caso o credor não o faça, em
razão do interesse que tem no pagamento da dívida pelo devedor afiançado. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 05.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
835. O fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver
assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por
todos os efeitos da fiança, durante sessenta dias após a notificação do credor.
Como entende Claudio Luiz Bueno de Godoy, prestada com termo final
previamente estabelecido, a fiança se extingue com o implemento desse tempo. Da
mesma forma, posto que firmada sem prazo, porquanto representativa de negócio
jurídico acessório, a fiança igualmente se extinguirá se extinta a obrigação
garantida. Todavia, pode a fiança ser prestada sem limitação de tempo, quando
então, mesmo que ainda vigente o negócio garantido, e desde que também ele não
contenha termo final estabelecido a
priori, que se impõe afinal a quem é garantidor acessório, a qualquer
instante poderá o fiador se exonerar.
A ideia evidente é que o fiador não pode permanecer
indefinidamente vinculado à garantia prestada, sem saber até quando persistirá
essa sua obrigação. Por isso mesmo, defere-lhe a lei a possibilidade de, a seu
talante, no exercício de prerrogativa que é mesmo potestativa, exonerar-se da
fiança, sempre e quando lhe convier. Mas, diferentemente do Código anterior,
que previa igual possibilidade, todavia, na falta de acordo, sujeitando o
fiador ao ajuizamento de ação exoneratória para somente a partir do respectivo
julgamento se livrar da obrigação da garantia, estatui o Código civil de 2002
uma automática exoneração desde o sexagésimo dia depois que o credor for
notificado da intenção do fiador de se exonerar. Ou seja, basta, hoje, ao
fiador notificar o credor para que, depois de sessenta dias dessa
cientificação, se libere do vínculo fidejussório.
É certo que, nos sessenta dias subsequentes à notificação,
persiste, ainda, sua obrigação de garantia. Porém, ultrapassado esse
interregno, sobrevém-lhe automática exoneração, repita-se, diversamente do que
previa o art. 1.500 do revogado Código Civil, que impunha a exoneração apenas
depois de acordo ou sentença exoneratória.
Muito polêmica, todavia, sempre causou a exoneração de fiador que,
em contrato de locação, tivesse prestado a fiança até a entrega das chaves.
Tanto mais porque, com a edição da Lei n. 8.245/91 (art. 39), determinou-se
que, nos ajustes locativos prediais urbanos e na falta de disposição contratual
em contrário, qualquer das garantias da locação se estenderia até a devolução
do imóvel. E, agora, com a edição da Lei n. 12.112/2009, que modificou
dispositivos da Lei Locatícia, foi acrescentado ao mesmo preceito a ressalva da
responsabilidade ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado.
Em se tratando, pois, de fiança prestada sem limitação de tempo,
em contratos de locação prorrogados por prazo indeterminado, de há muito se
discute se caberia ao fiador se exonerar, a despeito do contido no art. 39 da
lei locatícia. Os argumentos de costume versados, basicamente, dizem respeito à
prevalência ou não do dispositivo especial diante da dicção geral do antigo
art. 1.500, atual CC 835, do Código Civil, bem assim à existência ou não de um
prazo afinal certo quando se estatui que a fiança prevalecerá até a entrega das
chaves do imóvel locado. Pois, a propósito, hoje prevalece, no âmbito dos
julgados do Superior Tribunal de Justiça, conforme está no item da
jurisprudência, a tese de que a responsabilidade do fiador até a entrega das
chaves não o impede, depois de prorrogado o contrato de locação por prazo
indeterminado, de postular, livremente, a sua exoneração, todavia que não se
dá, tão somente, de modo automático, pela expiração do ajuste. E de pronto
porque, apesar do que foi previsto pela lei especial, a matéria relativa à
fiança, uma das garantias locatícias, tem seu unificado regramento no Código
Civil. Apenas a ela faz alusão a Lei n. 8.245/91 como uma das espécies de
garantias possíveis na locação. Não se estabeleceu, porém, espécie nova ou
própria de fiança. Tanto assim que tudo quanto diga respeito à natureza,
sub-rogação e efeitos da fiança locatícia se regula pelo disposto no Código
Civil. Nesse sentido é a observação de Gildo dos Santos (“A fiança”. In: O novo Código Civil, coord. Domingos
Franciulli Netto, Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins Filho.
São Paulo, LTr, 2003, p. 747-79). Se é assim, o mesmo se deve dar com relação à
exoneração, aplicando-se, então, a regra do artigo em comento. E veja-se que a
ele é subjacente a preocupação com uma fiança não sem termo, propriamente, que,
de fato, pode ser incerto, mas sim com a incerteza desse tempo, ainda que seja
certa a ocorrência a que é atinente.
Em outras palavras, a questão não se coloca, como querem muitos,
na distinção entre termo e condição, de modo a argumentar que a extensão da
fiança até a entrega das chaves represente uma limitação, porquanto certo o
evento que determina sua extinção. O problema está na insciência do fiador
sobre até que data se estenderá sua responsabilidade, ainda que se saiba, de
antemão, que ela um dia cessará, porquanto certo o evento da entrega das
chaves. A indefinição sobre o instante da ocorrência, todavia, é o móvel da
previsão de que possa ele se exonerar.
Por fim, também acesa a divergência sobre se é possível ao fiador
renunciar ao direito de pedir a exoneração, quando a lei autorize, parece,
porém, que admitir tal prerrogativa significa abrir caminho a uma indefinida
vinculação do fiador, o que não se compadece com o sistema do direito
obrigacional, que tende sempre a disponibilizar meio de o obrigado se
desvincular. Seria como permitir que o contratante renunciasse ao direito de
denunciar um contrato entabulado por prazo indeterminado. Certo que a fiança é
ajuste acessório e, por isso, de toda sorte um dia se extingue, quando cessa o
contrato principal. Mas não se pode olvidar, tal como dito ao início, de que,
se o contrato principal tem prazo pré-definido, a fiança, mesmo sem prazo,
necessariamente se estende até o termo da obrigação afiançada. A questão,
destarte, somente se coloca quando também a obrigação principal não tenha prazo
definido, aí então não se concebendo que o fiador possa, de antemão, dispor da
potestativa prerrogativa de se liberar do vínculo fidejussório. (Claudio Luiz
Bueno de Godoy, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 858-59 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 05/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Sob o prisma de Ricardo Fiuza, a fiança por prazo determinado
extingue-se com o advento do termo. Quando, todavia, foi prestada prazo
indeterminado, mas garantindo negócio com prazo determinado, ela cessa com a
extinção do negócio subjacente, pois o acessório, como sabemos, segue o
princípio. Entretanto, se a fiança não for prestada por prazo certo, garantindo
negócio também indeterminado a todo tempo exigir ao fiador a sua exoneração,
que pode efetivar-se por mera manifestação volitiva ou por sentença judicial,
simplesmente porque a garantia não é concedida em caráter perpétuo.
Nesse ponto, o CC/2002 trouxe mudanças significativas, que merecem
ser ressaltadas: a um, porque admite a exoneração por simples comunicação (notificação)
ao credor, independentemente de anuência deste ou do devedor principal, ou
mesmo de sentença judicial; a dois, porquanto, pelo prazo de sessenta dias,
contados da notificação ao credor, o fiador continuará vinculado por todas as
obrigações assumidas pelo devedor, produzindo, daí, efeitos ex nunc, voltado apenas para o futuro.
Caio Mário da Silva Pereira, parecendo já antever dita alteração,
anotava ser “injusta a letra da Lei que libera o fiador apenas a partir da
prolação da sentença exoneratória, alvitrando, como mais justa, a liberação do
fiador a partir da citação do credor, retrotraindo os efeitos da sentença a
partir da data daquela” (Instituições de
direito civil, Rio de Janeiro. Forense, 10 ed. 1996, p. 360).
Jurisprudência: “A jurisprudência
assentada nesta Corte construiu o pensamento de que é válida a renúncia
expressa ao direito de exoneração da fiança, mesmo que o contrato de locação
tenha sido prorrogado por tempo indefinido, vez que a faculdade prevista no
Art. 1.500 do Código Civil trata de direito puramente privado” (STJ, 6M 1, REsp
318.345-PR, rel. Mm Vicente Leal, DJ
de 10-9-2001). (Direito Civil -
doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 438 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em
05/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Creem Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira ser a
fiança contrato de duração. Pode ser estipulada por prazo determinado ou
indeterminado. Se por prazo determinado, vige até o termo final se outra causa
de exoneração do fiador não sobrevier antes dele. Tal como na generalidade dos
contratos por prazo indeterminado, a fiança pode ser rescindida mediante
resilição unilateral de qualquer das partes a qualquer tempo. A denúncia do
contrato se faz mediante notificação do fiador ao credor. Uma vez feita a
notificação, o fiador permanece ligado ao contrato por sessenta dias.
A resilição da fiança exonera do fiador das obrigações que
venham a ser constituídas após o prazo de sessenta dias mencionado no
dispositivo. A responsabilidade do fiador pelas obrigações anteriores ao
vencimento desse prazo permanece.
Na locação de
imóvel, o fiador pode denunciar o contrato quando este é prorrogado automaticamente,
passando a vigorar por prazo indeterminado. Feita a denúncia, o fiador continua
a responder pelas obrigações pelo prazo de 120 dias (art. 40, inciso X, Lei n.
8.245/90). O locador pode notificar o locatário para que apresente fiador no
prazo de 30 dias sob pena de rescisão da locação. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 05.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
836. A obrigação do fiador passa aos herdeiros; mas a responsabilidade
da fiança se limita ao tempo decorrido até a morte do fiador, e não pode
ultrapassar as forças da herança.
Na visão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a fiança é garantia
pessoal que, destarte, mesmo quando prestada por prazo certo, se extingue com a
morte do fiador. Mas, até então, persiste a responsabilidade do fiador que,
assim, se se traduz numa obrigação já devida ao tempo de sua morte, é
transmitida aos herdeiros.
Em diversos termos, dívidas surgidas até o momento da morte, em
virtude da fiança prestada, passam aos herdeiros, como de resto é a regra geral
da sucessão causa mortis. Por
exemplo, num contrato de locação, os aluguéis e encargos inadimplidos até o
instante do falecimento do devedor são ainda de sua responsabilidade e, dessa forma,
por eles respondem os herdeiros. Já locativos posteriormente vencidos não podem
ser imputados à responsabilidade dos sucessores do fiador.
Há que ver, todavia, que a responsabilidade acaso afeta aos
herdeiros será sempre limitada à força da herança recebida, de novo corolário
do princípio geral expresso no CC 1.997. Vale anotar ainda que, em se tratando
de garantia pessoal, também a morte do afiançado tem-se entendido provocar a
extinção da fiança. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 860 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 05/03/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
No entendimento de Ricardo Fiuza, de rigor, a morte do fiador
extingue a fiança, mas a obrigação correspondente passa aos seus herdeiros,
limitada, porém, às forças da herança e _aos débitos existente até o momento do
falecimento. Com efeito, os Herdeiros do fiador morto continuam a ser
responsáveis pelo débito surgido no momento do óbito, desde que não ultrapasse
as: forças da herança. De igual modo, a morte do afiançado não extinguirá a
fiança, pois os herdeiros serão seus continuadores.
Embora a fiança represente contrato personalíssimo, de caráter intuitu personae, em relação ao fiador,
suas obrigações se transmite mortis causa, desde que – repita-se – nascidas até
o momento da abertura da sucessão. Bem é dizer os efeitos da fiança produzidos
até a morte do fiador vinculam os seus herdeiros intra vires hereditates. (Arnoldo Wald. Curso de direito civil brasileira: obrigações e contratos, 8 ed.,
São Paulo. Revista dos Tribunais. 1989 (p.348-9) (Direito
Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 439 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em
05/03/2020, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Encerrando o capítulo com Luís Paulo Cotrim Guimarães
e Samuel Mezzalira, para quem a doutrina ensina que o fiador possui
responsabilidade (obligatio), mas não
o débito (debitum). Ele passa à
condição de devedor somente quando o devedor principal deixa de adimplir a
obrigação afiançada. O dispositivo faz uso dessa distinção doutrinária. A morte
do fiador extingue o contrato de fiança e a responsabilidade do fiador. O que
passa aos herdeiros é o débito constituído até o momento da morte do fiador.
Conforme a regra estabelecida no CC 1.792, o herdeiro não responde por encargos
superiores às forças da herança. A mesma regra é desnecessariamente repetida na
parte final do dispositivo ora comentado.
A lei é omissa, mas a jurisprudência do STJ é uniforme no
sentido de que a morte do afiançado extingue a fiança: REsp 439.945-RS, 5ª T.,
Rel. Min. Felix Fischer, j. 27-08-02; REsp 147.813-RJ, 6ª T., Rel. Min.
Fernando Gonçalves, j. 02-12-97; REsp 128.691-SP, 5ª T., Rel. Mi. José Arnaldo
da Fonseca, j. 24-6-97; REO 34000055736-DF, 6ª T., Rel. Min. Daniel Paes
Ribeiro, j. 30-04-01, p. DJ 01.06.01.
A morte do credor
não extingue a fiança. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 05.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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