segunda-feira, 30 de abril de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 510, 511, 512 – DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA – VARGAS, Paulo. S. R




CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 510, 511, 512 – DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA – VARGAS, Paulo. S. R.


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIV  – DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA - vargasdigitador.blogspot.com

Art 510. Na liquidação por arbitramento, o juiz intimará as partes para a apresentação de pareceres ou documentos elucidativos, no prazo que fixar, e, caso não possa decidir de plano, nomeará perito, observando-se, no que couber, o procedimento da prova pericial.

Correspondência no CPC/1973, art 475 D, com a seguinte redação:

Art 475 D. requerida a liquidação por arbitramento, o juiz nomeará o perito e fixará o prazo para a entrega do laudo.

1.     PROCEDIMENTO

O único dispositivo legal que prevê o procedimento da liquidação por arbitramento é o art 510 do CPC, sendo totalmente omisso quanto ao início dessa espécie de liquidação. A formalidade desse início dependerá do momento processual: sendo a liquidação uma fase incidental, o início se dará por meio de mero requerimento, enquanto se a liquidação der início ao processo sincrético, deverá haver uma petição inicial, nos termos do art 319 deste mesmo Código Processual Civil.

          O dispositivo legal, ora comentado, é omisso quanto à possibilidade de apresentação de defesa pelo demandado, prevendo apenas a intimação das partes para a apresentação de pareceres ou documentos elucidativos. Entendo que essa intimação só deve ocorrer depois de admitida a liquidação de sentença no caso concreto, de forma que antes dela, em respeito ao princípio do contraditório, o demandado deve ser intimado (quando a liquidação for fase intermediária) ou citado (quando a liquidação for fase inicial), sempre na pessoa de seu advogado, para que ofereça sua defesa no prazo geral de 5 dias (art 218, § 3º, deste CPC).

          Decorrido o prazo de 5 dias, caso o demandado tenha apresentado defesa, o juiz deverá, sempre que possível, resolvê-la de plano. Sendo acolhida alguma defesa peremptória (por exemplo, inadequação da forma de liquidação), a liquidação será extinta, e, sendo acolhida alguma defesa dilatória (por exemplo, incompetência do juízo), as medidas cabíveis serão tomadas. Sendo rejeitada a defesa, ou não tendo sido apresentada, o juiz, nos termos do art 510 do CPC, intimará as partes para a apresentação de pareceres ou documentos elucidativos, no prazo que fixar, tendo tal medida o objetivo de municiar o juiz de elementos de convicção suficientes para a prolação de decisão, fixando o valor devido sem a necessidade da realização da perícia. Apesar da nobre intenção do legislador, considerando-se o custo e demora da prova pericial, a experiência no tocante ao tema não é animadora, considerando-se a extrema raridade na praxe forense da dispensa da perícia motivada por documentos apresentados pelas partes.

          Registre-se que não há, na liquidação de sentença, os efeitos da revelia na hipótese de o demandado deixar de se manifestar, até porque não existem fatos que possam se presumir verdadeiros. Ademais, tendo advogado constituído nos autos, o demandado continuará a ser regularmente intimado. Na realidade, a intimação/citação tem como objetivo o convite ao demandado para que participe da prova, respeitando-se assim o princípio do contraditório.

          Caso o juiz não consiga decidir de plano, o que fatalmente ocorrerá no caso concreto, o art 510 do CPC prevê a nomeação do perito, observando-se a partir daí, no que couber, o procedimento da prova pericial.

          Com relação ao pagamento dos honorários do perito, há interessante entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que incumbe ao executado a antecipação desses valores, pois, na fase de conhecimento, esse ônus é do autor somente porque não se sabe ainda quem será o vencedor da demanda. O autor adianta os valores, mas quem paga é quem perde o processo, ou seja, a parte sucumbente. Na liquidação, entretanto, já se parte da premissa de que o vencedor é o liquidante, de forma que não teria sentido aplicar nesse caso a previsão consagrada no art 95 do atual CPC, exigindo dele um adiantamento para depois cobrar o valor do réu (Informativo 541/STJ, 2ª Seção, REsp 1.274.466/SC, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 14.05.2014, DJe 21.04.2014). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 860/861. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIV  – DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA - vargasdigitador.blogspot.com

Art 511. Na liquidação pelo procedimento comum, o juiz determinará a intimação do requerido, na pessoa de seu advogado ou da sociedade de advogados a que estiver vinculado, para, querendo, apresentar contestação no prazo de 15 (quinze) dias, observando-se, a seguir, no que couber, o disposto no Livro I da Parte Especial deste Código.

Correspondência no CPC/1973, art 475 – F com a seguinte redação:

Art 475-F. na liquidação por artigos, observar-se-á, no que couber, o procedimento comum (art 272).

1.     PROCEDIMENTO

Para a alegação e prova de um fato novo, a liquidação em muito se assemelha a um processo – ou fase procedimental – de conhecimento, tanto assim é que o art 511 do CPC prevê que após a intimação do requerido e do transcurso de seu prazo de 15 dias para a contestação será observado, no que couber, o disposto no Livro I da Parte Especial do diploma processual.

          Em virtude da própria complexidade dessa espécie de liquidação de sentença, após a intimação/citação do demandado, sempre na pessoa de seu advogado ou da sociedade de advogados a que estiver vinculado, a resposta do requerido poderá ser a mais ampla possível, dentro apenas dos limites do procedimento estabelecido. Apesar de certa divergência quanto à possibilidade de o demandado responder à sua intimação/citação com intervenções de terceiros ou reconvenção, o que me parece admissível desde que haja, no caso concreto, o preenchimento dos requisitos legais (o que certamente se mostrará difícil), não resta muita dúvida de que a contestação poderá ser a mais ampla possível, com defesas processuais dilatórias e peremptórias e defesas de mérito direta e indireta.

          Diferente da liquidação por arbitramento, na qual não há fatos novos que precisem de prova, de forma que não há nenhuma lógica em falar em presunção de veracidade dos fatos alegados pelo demandante diante da ausência de defesa do demandado, na liquidação ora analisada a situação é outra. Nessa espécie de liquidação, o demandante indica expressamente em sua peça inaugural – petição inicial ou requerimento – quais são os fatos que pretende provar como verdadeiros para chegar à fixação do quantum debeatur, de forma que a ausência de defesa do demandado, configura sua revelia e, ainda mais importante, a geração de presunção de que os fatos que o demandante pretendia provar são verdadeiros.

          Deve-se recordar que a liquidação pelo procedimento comum, conforme já afirmado, é uma verdadeira fase de conhecimento de cognição limitada, seguindo o procedimento comum, donde de pode concluir que tudo o que se aplica em fase de conhecimento que siga o procedimento comum, deva também se aplicar à liquidação pelo procedimento comum, outrora chamada de liquidação por artigos. Esse pensamento, naturalmente, se estende à revelia, em especial quanto à presunção de veracidade dos fatos alegados, até porque, quanto à desnecessidade de intimação, não haverá a geração de tal efeito, pois, uma vez representado nos autos, o demandado será regularmente intimado por meio de seu advogado. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 861/862. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIV  – DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA - vargasdigitador.blogspot.com

Art 512. A liquidação poderá ser realizada na pendencia de recurso, processando-se em autos apartados no juízo de origem, cumprindo ao liquidante instruir o pedido com cópias das peças processuais pertinentes.

Correspondência no CPC/1973, art 475-A (...) § 2º, com a mesma redação.

1.     LIQUIDAÇÃO NA PENDÊNCIA DE RECURSO RECEBIDO NO EFEITO SUSPENSIVO

O art 512 do CPC permite a liquidação da sentença ainda que no processo exista pendente de julgamento um recurso que tenha sido recebido no efeito suspensivo. Parece que nesse ponto o legislador incluiu ao lado de outros fenômenos processuais – a hipoteca judiciária é o mais tradicional deles (Informativo 417/STJ, 3ª Turma, REsp 981.001/SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 24.11.2009. DJe 02/12/2009) – a liquidação como um dos efeitos secundários da sentença, ou seja, aquele efeito que é gerado automaticamente com a prolação da sentença, independentemente de pedido expresso do demandante ou da pendencia de recurso com efeito suspensivo.

          Segundo o art 512 do CPC, a liquidação será autuada em autos em apenso, decorrência logica da existência de um recurso pendente de julgamento, o que fará com que os autos principais estejam no respectivo tribunal aguardando julgamento. Mesmo desenvolvendo-se em autos próprios, a liquidação de sentença continuará a ser uma mera fase procedimental, ainda que excepcionalmente, nesse caso, ela se desenvolva concomitantemente com a fase cognitiva em sede recursal.

          A liquidação de sentença, a exemplo do que ocorre no cumprimento de sentença, só ocorrerá mediante provocação da parte interessada, ainda mais na hipótese de liquidação provisória, na qual o demandante assume todos os riscos de começar a liquidar uma sentença que poderá ser modificada pelo recurso pendente de julgamento. Ainda que seja aplicável na liquidação provisória, a teoria do risco-proveito, sendo a atividade desenvolvida de natureza cognitiva, sem atos de constrição de bens ou de restrição de direitos, o risco que o autor corre é infinitamente menor do que aquele a qual se submete na execução provisória. O menor risco nesse caso se justifica porque o proveito também é menor: em vez da satisfação de seu direito, o autor obtém apenas a fixação do quantum debeatur.

          O requerimento inicial – aqui também se dispensa a petição inicial -, sem maiores formalidades, deverá ser instruído com “cópias das peças processuais pertinentes”, cuja pertinência deverá ser analisada pelo demandante no caso concreto, sendo possível, mas não obrigatória, a aplicação por analogia do ar 522 deste atual Código.

          No que concerne à instrução, duas observações são interessantes (i) as peças não precisam ser autênticas, sendo dispensável inclusive a declaração de autenticidade pelo próprio advogado, como previsto pelo art 425, IV, do CPC; (ii) eventual falha na instrução não gera o indeferimento de plano da liquidação, devendo-se conceder ao demandante a oportunidade de juntar as peças que o juiz entender indispensáveis no caso concreto.

          Cumpre por fim fazer mais um registro. Já foi afirmado que o demandante assume todos os riscos de ingressar com a liquidação enquanto a decisão ainda não for definitiva. Na realidade, isso náo é uma exclusividade da liquidação como efeito secundário da sentença, também havendo a aplicação da teoria do risco-proveito na liquidação realizada enquanto pendente de julgamento o recurso sem efeito suspensivo. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 862/863. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

sábado, 28 de abril de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 509 – DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA



CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 509 – DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIV  – DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA - vargasdigitador.blogspot.com

Art 509. Quando a sentença condenar ao pagamento de quantia ilíquida, proceder-se-á à sua liquidação, a requerimento do credor ou do devedor:

I – por arbitramento, quando determinado pela sentença, convencionado pelas partes ou exigido pela natureza do objeto da liquidação;

II – pelo procedimento comum, quando houver necessidade de alegar e provar fato novo.

§ 1º. Quando na sentença houver uma parte líquida e outra ilíquida, ao credor é lícito promover simultaneamente a execução daquela e, em autos apartados, a liquidação desta.

§ 2º. Quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá promover, desde logo, o cumprimento da sentença.

§ 3º. O conselho Nacional de Justiça desenvolverá e colocará à disposição dos interessados programa de atualização financeira.

§ 4º. Na liquidação é vedado discutir de novo a lide ou modificar a sentença que a julgou.

Correspondência no CPC/1973, nos seguintes artigos e ordem:

Art 475 A – para o caput – Quando a sentença não determinar o valor devido, procede-se à sua liquidação.

Art 475 C – para o inciso I – Far-se-á a liquidação por arbitramento quando:
I – determinado pela sentença ou convencionado pelas partes;
II – o exigir a natureza do objeto da liquidação.

Art 475 E – para o inciso II – Far-se-á a liquidação por artigos, quando, para determinar o valor da condenação, houver necessidade de alegar e provar fato novo.
Art 475 F  - ainda para o inciso II – Na liquidação por artigos, observar-se-á, no que couber, o procedimento comum (art 272).

Art 475 I. (...) § 2º - referente ao § 1º do art 509 do CPC/2015 – Quando na sentença houver uma parte líquida e outra ilíquida, ao credor é lícito promover simultaneamente a execução daquela e, em autos apartados, a liquidação desta.

Art 475 B – referente ao § 2º do art 509 do CPC/2015 – Quando a determinação do valor de condenação depender apenas de cálculo aritmético, o credor requererá o cumprimento da sentença, na forma do art 475 J desta Lei, instruindo o pedido com a memória discriminada e atualizada do cálculo.

Art 475 G - referente ao § 4º do art 509 do CPC/2015 – É defeso, na liquidação, discutir de novo a lide ou modificar a sentença que a julgou.

1.     NATUREZA JURÍDICA DA LIQUIDAÇÃO

Não resta dúvida de que a atividade desenvolvida na liquidação da sentença tem natureza cognitiva, já que nela não são praticados atos de execução. Na realidade, excepcionalmente a atividade cognitiva é dividida em duas fases: na primeira há a fixação do na debeatur e na segunda do quantum debeatur. A divisão dessa atividade em duas fases não é, naturalmente, capaz de afastar a sua natureza jurídica cognitiva.

          A lição, tradicional e que não encontra resistência, é importante para justificar a opção do CPC em vigor, em não prever a liquidação da sentença no Livro II, destinado à execução. A liquidação de sentença vem prevista no Capítulo XIV do Título I (Do procedimento comum), da Parte Especial do Livro I (Do processo de conhecimento e do cumprimento de sentença). Compreende-se a opção do legislador porque, além da natureza não executiva da liquidação de sentença, por vezes a atividade cognitiva nela desenvolvida gera justamente a frustração da execução. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 856. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    CONCEITO DE LIQUIDEZ E OBRIGAÇÕES LIQUIDÁVEIS

Liquidar uma sentença significa determinar o objeto da condenação, permitindo-se assim que a demanda executiva tenha início com o executado sabendo exatamente o que o exequente pretende obter para a satisfação de seu direito. Apesar de ser pacífico na doutrina esse entendimento, há uma séria divergência a respeito de quais as obrigações que podem efetivamente ser liquidadas.

          Segundo a corrente ampliativa, a liquidação poderá ter como objeto qualquer espécie de obrigação, sendo possível liquidar a obrigação de fazer, não fazer, entrega de coisa e pagar quantia certa. Outra corrente doutrinária entende serem excluídas do âmbito da liquidação algumas espécies de obrigação que materialmente não podem ser liquidadas, porque, sendo a certeza da obrigação precedente à liquidez, o que faltará a essas obrigações é a certeza, e não a liquidez. Tal circunstância se verifica nas obrigações de fazer e não fazer, porque a certeza de uma obrigação dessa espécie é justamente indicar o que deve ser feito ou o que deve deixar de ser feito.

          Tratando-se de obrigação alternativa ou de entregar coisa incerta, ao título executivo não faltará propriamente liquidez, tanto que a demanda executiva poderá ser imediatamente proposta. A individualização do bem, disciplinada pelos arts 811 a 813 do CPC, desenvolver-se-á por meio de um procedimento incidental na própria demanda executiva sem que se confunda com a liquidação de sentença. Fenômeno similar ocorre na obrigação alternativa de entrega de coisa certa, na qual não se fará necessária a liquidação de sentença, mas a especificação do bem a ser entregue ao exequente (art 800 do CPC). Por outro lado, na hipótese contemplada pelo art 324, I, do CPC (demanda que tenha coo objeto uma universalidade de bens), parece correto concluir pela necessidade de liquidação, ainda que se trate de obrigação de entrega de coisa.

          Para a corrente doutrinária restritiva, a liquidação de sentença é instituto processual privativo das obrigações de pagar quantia certa, inclusive como prevê a redação do art 783 do CPC, que expressamente se refere a “cobrança de crédito”, quando exige, da obrigação, a certeza, liquidez e a exigibilidade.

          Por outro lado, o art 509 deste Código é claro ao prever o cabimento da liquidação quando a sentença condenar ao pagamento de quantia ilíquida, limitando sem qualquer margem à dúvida a liquidação ao valor da obrigação, o que naturalmente afasta desse instituto jurídico o incidente de escolha de bens ou de concentração de obrigações. A previsão legal impede que se confunda liquidação com outros fenômenos processuais, como o incidente de concentração de obrigação ou a escolha da coisa na obrigação de coisa incerta, mas excepcionalmente é possível a liquidação de obrigação de entrega de coisa, que não deve ser a priori excluída do âmbito da liquidação pela interpretação literal do art 509 do CPC. Tal circunstancia se verifica na condenação ilíquida de pedido que tenha como objeto a entrega de uma universalidade de bens art 324, I, deste Código ora comentado). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 856/857. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    ESPÉCIES DE LIQUIDAÇÃO

Com a correta exclusão da “liquidação por mero cálculo aritmético” do CPC, os dois incisos do art 509 preveem apenas a liquidação (I) por arbitramento e (II) pelo procedimento comum. O legislador parece ter acabado com as diferentes espécies de liquidação de sentença, limitando-se a prever dois diferentes procedimentos: liquidação por arbitramento, quando determinado pela sentença, convencionado pelas partes ou exigido pela natureza do objeto da liquidação, e liquidação pelo procedimento comum, quando houver necessidade de alegar e provar fato novo (antiga liquidação por artigos).

          Sempre se entendeu que a liquidação prevista pelo CPC/1973 como liquidação por mero cálculo aritmético era uma pseudo liquidação, já que supostamente estar-se-ia a liquidar o que já era líquido, considerando que a liquidez da obrigação e sua determinabilidade e não sua determinação. Significa dizer que sendo possível se chegar ao valor exequendo por meio de um mero cálculo aritmético, a obrigação já será líquida e por tal razão seria obviamente dispensada a liquidação de sentença.

          O § 2º do art 509 do CPC é extremamente feliz ao prever que quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá promover, desde logo, o cumprimento da sentença. Para facilitar a elaboração de tal cálculo, o § 3º do mesmo dispositivo prevê que o Conselho Nacional de Justiça desenvolverá e colocará à disposição dos interessados programa de atualização financeira.

          Independentemente da espécie de liquidação de sentença cabível no caso concreto, o art 509, § 1º, do CPC, consagra a teoria dos capituos da sentença, permitindo à parte concomitantemente liquidar capítulo ilíquido e executar capítulo líquido. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 857. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    CABIMENTO DA LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO

Segundo o art 509, I, do CPC, a liquidação por arbitramento deve ser realizada em três hipóteses: determinação na sentença; acordo entre as partes; quando o exigir a natureza do objeto da liquidação. O dispositivo legal deve ser criticado porque não foi capaz de expor com clareza quando a liquidação por arbitramento se rafá efetivamente necessária. Bastaria para atingir tal objetivo ter previsto que sempre que o cálculo do valor de um bem, serviço ou prejuízo depender de conhecimentos técnicos específicos, será o caso de liquidar a sentença por arbitramento. Ou, em outras palavras, sempre que se fizer necessária a elaboração de uma perícia para se obter o quantum debeatur, o caminho será a liquidação por arbitramento.

          O juiz somente fixará em sentença essa espécie de liquidação quando entender que o quantum debeatur só poderá ser obtido por meio da realização de uma perícia, o que demonstra a inutilidade dessa previsão, tanto assim que o Superior Tribunal de Justiça sumulou o entendimento de que a liquidação por espécie distinta da constante da sentença não gera nulidade. (Súmula 344/STJ). Da mesma forma, o consenso entre as partes só gerará efeitos se a perícia for necessária e não houver necessidade de alegação e prova de fatos novos. A vontade das das partes não vincula o juiz na determinação da espécie de liquidação, o que demonstra a impropriedade da previsão.

          Registre-se que ao perito não será permitido o enfrentamento de fatos novos, porque essa circunstância necessariamente exigirá que a liquidação seja feita por artigos, ainda que se mostre necessária apenas a prova pericial. A liquidação por arbitramento, portanto, será realizada quando não forem necessárias a alegação e a prova de fato novo, bastando a realização de uma prova pericial a respeito dos fatos já estabelecidos na sentença ilíquida. É possível que o perito tenha, no caso concreto, necessidade de ouvir testemunhas, exigir novos documentos, conforme lhe faculta o art 473, § 3º do CPC para uma melhor elucidação dos fatos já fixados em sentença, providencias que não desvirtuam a natureza da liquidação. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 858. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

5.    CABIMENTO DA LIQUIDAÇÃO POR PROCEDIMENTO COMUM

A liquidação por procedimento comum é a última alternativa no âmbito das liquidações porque é a mais complexa e demorada entre todas as suas espécies, de forma que deverá ser reservada somente para as situações em que não se mostre possível a liquidação por mero cálculo aritmético do credor ou por arbitramento.

          Essa espécie de liquidação era tradicionalmente chamada de “liquidação por artigos”, sendo tal nomenclatura derivada de antiga tradição, presente em nosso ordenamento desde os tempos das Ordenações. Tradicionalmente, significava que o demandante era obrigado a indicar os fatos novos que pertencia ver provados em forma de artigos, sob pena de indeferimento da peça inicial. É óbvio que atualmente uma espécie de formalismo exacerbado como esse é algo totalmente despropositado, bastando que o demandante exponha com clareza – mas na forma que quiser – quais são os fatos que pretende ver provados. A subtração do termo “artigos” para qualificar a liquidação prevista pelo art 509, II, do CPC provavelmente tem como objetivo consagrar essa maior flexibilidade formal.

          A liquidação pelo procedimento comum é cabível quando forem necessárias para a definição do quantum debeatur a alegação e prova de fato novo, sendo essencial para a compreensão do instituto processual a conceituação de “fato novo”.

          Deve ser evitada na conceituação de fato novo a confusão quanto ao momento em que o fato ocorreu, sendo inadmissível, confundir fato novo com fato superveniente. O fato novo pode ter ocorrido antes, durante ou depois da demanda judicial donde se produziu o titulo executivo ilíquido, não sendo o momento um critério correto para conceituar o fenômeno processual. Por fato novo, deve-se entender aquele que não foi objeto de análise e decisão no processo no qual foi formado o título executivo que se busca liquidar. A novidade, portanto, não é temporal, mas diz respeito ao próprio Poder Judiciário, que pela primeira vez enfrentará e decidirá determinados fatos referentes ao quantum. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 858/859. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

6.    REGRA DA FIDELIDADE AO TÍTULO EXECUTIVO (ART 509, § 4º DO CPC).

A liquidação de sentença tem como único e exclusivo objetivo a fixação do quantum debeatur, sendo vedada, pela própria logica do instituto processual, a discussão de qualquer matéria alheia a esse objetivo. Não se permite que a liquidação se preste a discutir matérias que foram discutidas na fase de conhecimento que gerou a sentença condenatória, ou nela deveriam ter sido discutidas. Significa dizer que qualquer matéria é estranha ao objeto da liquidação.

          Essa vedação à discussão de matérias alheias à fixação do valor da prestação encontra logica no próprio sistema, porque, ao permitir a discussão de outras matérias que não o quantum debeatur em sede de liquidação, estar-se-ia diante de um vício processual: caso a sentença condenatória já estiver transitada em julgado, haverá ofensa à coisa julgada ou à eficácia preclusiva da coisa julgada (Informativo 489/STJ, 4ª Turma, REsp 1.112.858-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 13.12.2011); havendo recurso contra ela pendente de julgamento, haverá litispendência. Num caso ou noutro, há no caso concreto um pressuposto processual negativo, o que gera a nulidade da liquidação. Atento a essa circunstância, o legislador prevê expressamente no art 509, § 4º, do CPC, ser vedado na liquidação discutir de novo a lide ou modificar a sentença que a julgou.

          É até mesmo possível imaginar uma terceira espécie de vício, quando se discutem na liquidação questões referentes ao na debeatur fora dos próprios limites objetivos do pedido condenatório do autor. Nesse caso, não se poderá falar tecnicamente em ofensa à coisa julgada, mas de fixação de valor de uma prestação que não está reconhecida em título executivo judicial. Basta imaginar que numa demanda em que foi pedida a condenação do réu ao pagamento de uma quantia em decorrência de dano moral, a parte busque, na liquidação alegar e provar fatos simples para aumentar o valor da condenação. Nesse caso, haveria ofensa à coisa julgada ou litispendência. Caso, entretanto, se pretenda incluir na liquidação também uma discussão sobre eventuais danos materiais suportados, não se poderá falar em coisa julgada nem em litispendência, porque esse pedido não faz parte da demanda.

          Essa limitação da matéria objeto de cognição na liquidação da sentença, seja para proteger a coisa julgada, seja para evitar a litispendência ou impedir a valoração de dano não reconhecido por título executivo, chamada pela doutrina de regra da “fidelidade ao titulo executivo”, não é absoluta, havendo a excepcional possibilidade de inclusão na liquidação de matéria não posta na fase de conhecimento da qual resultou a condenação genérica. A jurisprudência vem prestigiando uma interpretação lógica da sentença, não se limitando ao aspecto gramatical, para concluir que deve se admitir contido na sentença não só o que está expressamente informado, mas também o que virtualmente se possa presumir como incluído.

          A Súmula 254 do STF indica a possibilidade de inclusão de juros moratórios na liquidação, ainda que a sentença seja omissa a esse respeito. Ainda que não haja súmula nesse sentido, também a correção monetária (desde que não haja exclusão expressa na da decisão) e as custas processuais poderão ser incluídas nas mesmas circunstâncias. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 859/860. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

sexta-feira, 27 de abril de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 507, 508 – Preclusão e Eficácia da Coisa Julgada - VARGAS, Paulo S.R



CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 507, 508 – Preclusão e Eficácia da Coisa Julgada - VARGAS, Paulo. S.R


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção V – Da Coisa Julgada - vargasdigitador.blogspot.com

Art 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão.

Correspondência no CPC/1973, art 473, com a seguinte redação:

Art 473. É defeso à parte discutir, no curso do processo, as questões já decididas, a cujo respeito se operou a preclusão.

1.     PRECLUSÃO

Segundo a melhor doutrina, o processo, para atingir a sua finalidade de atuação da vontade concreta da lei, deve ter um desenvolvimento ordenado, coerente e regular, assegurando a certeza das situações processuais e também a estabilidade das mesmas, sob pena de retrocessos e contramarchas desnecessárias e onerosas que colocariam em risco não só os interesses das partes em litígios, mas, principalmente, a majestade da atividade jurisdicional.

          Não há dúvida de que a preclusão é instrumento para evitar abusos e retrocessos e prestigiar a entrega de prestação jurisdicional de boa qualidade. A preclusão atua em prol do processo, da própria prestação jurisdicional, não havendo qualquer motivo para que o juiz não sofra seus efeitos, pelo menos na maioria das situações.

          Tradicionalmente, a preclusão é classificada em três espécies, a consumativa, a logica e a temporal.

          A preclusão consumativa se verifica sempre que realizado o ato processual. Dessa forma, somente haverá oportunidade para realização do ato uma vez no processo e, sendo esse consumado, não poderá o interessado realiza-lo novamente e tampouco complementá-lo ou emenda-lo. Essa espécie de preclusão não se preocupa com a qualidade do ato processual, limitando-se a impedir a prática de ato já praticado, ainda que de forma incompleta ou viciada.

          Na preclusão lógica, o impedimento de realização de ato processual advém da realização de ato anterior incompatível logicamente com aquele que se pretende realizar. Exemplo clássico dessa espécie de preclusão é a aquiescência prevista no art 1.000 deste Código atual de Processo Civil, que extingue o direito da parte de recorrer quando pratica ato de concordância, expressa ou tácita, com a decisão.

          Diz-se preclusão temporal, quando um ato não puder ser praticado em virtude de ter decorrido o prazo previsto para sua prática sem a manifestação da parte. Ao deixar a parte interessada de realizar o ato dentro do prazo previsto, ele não mais poderá ser realizado, já que extemporâneo.

          A preclusão temporal pode ser excepcionalmente afastada diante do descumprimento de um prazo próprio se a parte convencer o juiz de que não praticou o ato processual por justa causa, ou seja, em razão de evento alheio à vontade da parte, suficiente para impedir a ela ou a seu mandatário de praticar o ato processual. O Superior Tribunal de Justiça exige que a justa causa advenha de evento imprevisto, alheio à vontade da parte, e que a impossibilite de praticar determinado ato processual no prazo (STJ, 4ª Turma, AgRg no AREsp 19.550/ES, rel. Min. Raul Araújo, j. 22/10/2013, DJe 05/12/2013), devendo ser alegado no prazo de 5 dias após o término da situação que impossibilita a parte a praticar o prazo “sob pena” de preclusão temporal (STJ, 2ª Turma, EDcl no AgRg no AREsp 276.162/MG, rel. Min. Castro Meira, j. 16/05/2013, DJe 24/05/2013). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 853/854. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção V – Da Coisa Julgada - vargasdigitador.blogspot.com

Art 508. Transitada em julgado a decisão de mérito considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido.

Correspondência no CPC/1973, art 474, nos mesmos moldes.

1.    EFICÁCIA PRECLUSIVA DA COISA JULGADA

O art 508 do CPC prevê que com o trânsito em julgado considerar-se-ão deduzidas e repedias todas as alegações e as defesas que a parte poderia ter levado ao processo para fundamentar tanto o acolhimento como a rejeição do pedido. Trata-se da eficácia preclusiva da coisa julgada.

          É simples entender a regra quando aplicada para as possíveis alegações da defesa do réu. Havendo mais de uma matéria defensiva, caberá ao réu apresenta-las em sua totalidade, não lhe sendo possível ingressar com outra demanda, arguindo matéria de defesa que deveria ter sido apresentada em processo já extinto com coisa julgada material. O réu que alega somente o pagamento de dívida e vem a ser condenado a pagá-la não poderá ingressar com outro processo alegando a prescrição e requerendo a repetição de indébito, porque a alegação de prescrição deveria ter sido elaborada como matéria de defesa do primeiro processo..

          Aplicada ao autor, a regra da eficácia preclusiva da coisa julgada gera maior controvérsia. A parcela majoritária tem o entendimento que parece ser o mais correto, a eficácia preclusiva da coisa julgada atinge tão somente as alegações referentes à causa de pedir que fez parte da primeira demanda, porquanto alegado outro fato jurídico ou outra fundamentação jurídica, nãp presentes na primeira demanda, afasta-se do caso concreto a tríplice identidade, considerando-se tratar-se de nova causa de pedir (STJ, 1ª Turma, REsp 875.635/MG, rel. Min. Luiz Fux, j. 16/10/2008, DJe 03.11.2008; REsp 861.270/PR, 2ª Turma, rel. Min. Castro Meira, j. 05.10.2006, DJ 16/10/2006). Alegada a falta de pagamento na ação de despejo fundada em danos causados ao imóvel locado.

          Outra parcela doutrinária entende que a eficácia preclusiva da coisa julgada é mais ampla, atingindo alegações alheias à causa de pedir presente na demanda que produziu coisa julgada material. Para essa parcela da doutrina, o art 508 do CPC atinge todos os fatos jurídicos deduzíveis na ação, o que naturalmente o faz atingir inclusive fatos jurídicos alheios à causa de pedir narrada pelo autor.

          É possível ainda indicar uma terceira corrente doutrinária, intermediária entre as duas mais comuns, que entende que a eficácia preclusiva da coisa julgada atinge todos os fatos da mesma natureza conducentes ao mesmo efeito jurídico, mas não fatos de natureza diversa ou fatos de mesma natureza que produzam efeitos jurídicos diversos.

          Interessante notar que a eficácia preclusiva da coisa julgada não contraria os limites objetivos da coisa julgada. Numa análise apressada e superficial, poder-se-ia questionar a regra do art 508 do CPC, no sentido de que, se nem mesmo as alegações feitas e decididas na fundamentação fazem coisa julgada, como poderiam se tornar imutáveis e indiscutíveis alegações que nem ao menos foram feitas e enfrentadas pelo juiz? A visão é equivocada porque não compreende a função instrumental da eficácia preclusiva da coisa julgada, a impossibilidade de discutir alegações não realizadas em novo processo só se justifica nos limites da proteção à coisa julgada material. Dessa forma, sempre que o enfrentamento dessas alegações puder levar à decisão que contrarie o dispositivo de decisão protegido pela coisa julgada material, aplica-se a regra da eficácia preclusiva da coisa julgada para impedir a decisão a seu respeito (STJ, 1ª Turma, REsp 739.811/MG, rel. Min. Luiz Fux, j. 14.11.2006, FJ 14.12.2006). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 854/855. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

quinta-feira, 26 de abril de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 506 – Coisa Julgada e Efeitos da Decisão – Vargas, Paulo S. R.



CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 506 – Coisa Julgada e Efeitos da DecisãoVargas, Paulo S. R.


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO I – DO PROCEDIMENTO COMUM CAPÍTULO XIII  – DA SENTENÇA E DA COISA JULGADA – Seção V – Da Coisa Julgada - vargasdigitador.blogspot.com

Art 506. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros.

Correspondência no CPC/1973, art 472, com a seguinte redação:

Art 472. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houvessem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros.

1.    COISA JULGADA E EFEITOS DA DECISÃO

A doutrina, acertadamente, ensina que todos os sujeitos – partes, terceiros interessados e terceiros desinteressados – suportam naturalmente os efeitos da decisão, mas a coisa julgada os atinge de forma diferente. As partes, inclusive o Ministério Público quando participa de processo como fiscal da ordem jurídica (STJ, 4ª Turma, REsp 1.155.793/DF, rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 01/10/2013, DJe 11/10/2013), estão vinculadas à coisa julgada, os terceiros interessados sofrem os efeitos jurídicos da decisão, enquanto os terceiros desinteressados sofrem os efeitos naturais da sentença, sendo que em regra nenhuma espécie de terceiro suporta a coisa julgada material.

          A segunda parte do art 472 do CPC/1973 aparentemente excepcionava essa regra, estabelecendo que nas ações relativas ao estado de pessoa, a sentença produziria coisa julgada em relação a terceiros. A inadequada redação do dispositivo legal, entretanto, somente consagrava a regra da coisa julgada inter partes, porque exigia que todos os interessados fossem citados no processo em litisconsórcio necessário. Dessa forma, somente os terceiros desinteressados não participariam do processo como parte, e estes não suportariam a coisa julgada material, porque não têm legitimidade para discutir judicialmente a decisão. Parece que o dispositivo legal confundia os efeitos da decisão com a coisa julgada material, considerando-se que todos suportam os efeitos dessa decisão – os divorciados não estão divorciados somente entre eles, mas também perante terceiros -, mas evidentemente os terceiros – nesse caso todos terceiros desinteressados – não suportam a cosa julgada material.

          O CPC ora comentado, bem notou a impropriedade do dispositivo legal e não o repetiu, o que deve ser saudado pela comunidade jurídica e pelo operador do direito. Afasta-se do sistema processual dispositivo legal que confundia efeitos e imutabilidade, confusão já superada há tempos pela doutrina processual. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 850/851. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA

O art 506 do CPC, que regula os limites subjetivos da coisa julgada, acertadamente retira essa segunda parte do art 472 do atual CPC/1973. E traz outra novidade que deve suscitar interessante questionamento. Segundo o dispositivo legal, a coisa julgada não prejudica terceiros, sendo suprimido do texto legal o prejuízo a terceiros.

          Nos processos individuais, havia entendimento tradicional na vigência do diploma processual revogado de que a coisa julgada se operava inter partes, ou seja, ela vincula somente as partes, não atingindo os terceiros, que não serão por ela beneficiados ou prejudicados. A par das discussões doutrinárias a respeito do conceito de parte, entende-se que a coisa julgada vincula o autor, réu e terceiros intervenientes, à exceção do assistente simples, que suporta a eficácia da intervenção prevista pelo art 123 do atual CPC.

          A eficácia inter partes justificava-se em razão dos princípios da ampla defesa e do contraditório, não sendo plausível que a sentença de mérito se tornasse imutável e indiscutível para sujeito que não participou do processo. Essa justificativa só tinha algum sentido quanto aos terceiros interessados (que têm interesse jurídico na causa), porque no tocante aos terceiros desinteressados (não mantêm nenhuma relação jurídica objeto da demanda), número infinito de pessoas, faltaria interesse processual para discutir a decisão transitada em julgado, de forma que a sua imutabilidade torna-se uma consequência natural da impossibilidade processual de modificar a decisão.

          Esse entendimento restava consagrado expressamente no art 472 do CPC/1973, mas não foi totalmente repetido pelo Atual Livro do CPC, o que pode levar a uma alteração significativa dos limites subjetivos da coisa julgada nos processos individuais.

          Reitere-se, segundo o art 506 do CPC, a coisa julgada não prejudica terceiros, sendo suprimido do texto legal o prejuízo a terceiros. Não sei se o objetivo da supressão foi transforma a coisa julgada secundum eventum litis in utilibus para terceiros, mas aparentemente é possível extrair tal conclusão da redação do dispositivo legal. Significa que terceiros poderão se aproveitar da coisa julgada material, que apenas não poderá prejudicá-los. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 851. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    CREDORES SOLIDÁRIOS

Registre-se que essa espécie de coisa julgada material, além de ser regra no processo coletivo, mesmo no processo individual já existia antes da atualização do CPC.

          Segundo o art 274 do CC, sendo interposta demanda por um ou alguns dos credores solidários em litisconsórcio, sendo julgado procedente o pedido e condenado o réu ao pagamento, o julgamento aproveita a todos os demais credores solidários, mesmo que não tenham participado do processo. Significa dizer que todos estão legitimados a executar a sentença condenatória e que poderão alegar a exceção de coisa julgada material como matéria de defesa em ação declaratória de inexigibilidade de débito promovida pelo devedor.

          No caso de julgamento de improcedência, a coisa julgada material só vincula o credor ou credores que tenham interessado com a demanda, ou seja, os credores solidários que foram parte. Conforme reconhecido pela melhor doutrina, trata-se da técnica da coisa julgada secundum eventum litis, ou seja, a vinculação à coisa julgada material dos redores solidários que não propuseram a demanda judicial dependerá de seu resultado. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 852. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    COISA JULGADA PRO ET CONTRA ULTRA PARTES NA TUTELA INDIVIDUAL

A regra de que a coisa julgada não pode prejudicar terceiros tem duas exceções de forma que os sucessores e os substituídos processuais, ainda que não participem do processo como partes, suportam negativamente os efeitos da coisa julgada. São titulares do direito e dessa forma não haveria sentido que não suportassem os efeitos, ainda que negativos, da coisa julgada material.

          Os sucessores assumem os direitos e obrigações do sucedido, transmitindo-se também a esses a imutabilidade decorrente da coisa julgada. Registre-se que, havendo sucessão do direito durante o processo judicial, impõe-se, como pressuposto da extensão da coisa julgada ao sucessor, a informação da existência da demanda judicial. A regra se aplica na hipótese de alienação de coisa litigiosa, na qual o adquirente deve ter ciência dessa situação da coisa para suportar a vinculação à decisão em processo do qual não participou.

          Os substituídos são representados na demanda por sujeito que a lei ou o sistema considera apto à defesa do direito em juízo, sendo que nessa excepcional hipótese admite-se que a coisa julgada atinja titulares do direito que não participaram como parte no processo. Registre-se moderna posição doutrinária no sentido de excluir a coisa julgada a terceiro que não tenha tido oportunidade de participar da demanda na qual seu direito material foi decidido. Essa corrente doutrinária entende que, não tendo oportunidade de participar do processo, o substituído processual não poderia suportar a coisa julgada material em respeito aos princípios da ampla defesa e do contraditório.

          O ainda Projeto deste Código de Processo Civil, aprovado originariamente no Senado Federal parecia consagrar tal entendimento no art. 18, parágrafo único, a prever que o substituído processual deveria ser intimado, podendo, inclusive, assumir o polo da demanda em sucessão processual ao substituto. A redação final do dispositivo foi substancialmente modificada, sendo previsto apenas que, havendo substituição processual, o substituído poderá intervir como assistente litisconsorcial. Na verdade, essa intervenção já é admitida atualmente, não sendo necessária uma previsão específica nesse sentido para legitimá-la. A redação final do dispositivo na realidade não modifica a situação atual do substituído processual, porque, ao dispensar sua intimação, ao menos para ter ciência da existência do processo, dá a entender que esse terceiro estará `sujeito à coisa julgada material independentemente de ter tido ciência da existência do processo. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 852/853. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).