sábado, 8 de dezembro de 2018

DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 22, 23, 24 – Da Curadoria dos Bens do ausente – Vargas, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 22, 23, 24 –
 Da Curadoria dos Bens do ausente – Vargas, Paulo S. R.

TITULO I – Das Pessoas Naturais (art. 1 a 39)
Capítulo IIIDA AUSÊNCIA
Seção I - Da Curadoria dos Bens do ausente
vargasdigitador.blogspot.com

Art. 22. Desaparecendo uma pessoa do seu domicílio sem dela haver notícia, se não houver deixado represente ou procurador a quem caiba administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Público, declarará a ausência, e o nomear-lhe-á curador. 1, 2, 3 , 4

1.        Ausência e incapacidade

Desaparecendo uma pessoa do seu domicílio, de tal modo que não seja possível saber qual é seu atual paradeiro, e sem que a pessoa tenha deixado qualquer representante ou procurador com poderes para administrar-lhe os bens, poderá qualquer interessado ou o próprio Ministério público requerer a declaração de ausência e a nomeação de um curador. Note-se que nessa situação, a pessoa não é considerada incapaz, uma vez que a ausência física da pessoa não importa em nenhuma redução de sua capacidade civil. É por essa razão que a curadoria é dos bens do ausente, e não de sua pessoa. Todavia, sendo evidente que a ausência física, e prolongada da pessoa a impossibilita de administrar os próprios bens, torna-se necessário assegurar a preservação de seu patrimônio. O instituto da ausência, dessa forma, tem por escopo, num primeiro momento, resguardar o patrimônio do ausente e apenas num segundo momento tutelar os interesses de seus herdeiros.

2.        Registro de ausência

A sentença que declara a ausência de uma pessoa deve ser registrada no Registro Civil das Pessoas Naturais (Lei n. 6.015/73, art 29, VI), no cartório do último domicílio do ausente e deverá necessariamente conter (i) a data do registro, (ii) o nome, idade, estado civil, profissão e domicílio anterior do ausente, a data e o cartório em que foram registrados o nascimento e o casamento, bem como o nome do cônjuge, se for casado, (iii) o tempo de ausência até a data da sentença, (iv) o nome do promotor do processo, (v) a data da sentença, o nome e vara do Juiz que a proferiu e (vi) o nome, estado, profissão, domicílio e residência do curador e os limites da curatela (Lei n. 6.015/73, art 94). Havendo aparecimento do ausente, a cessação da ausência deve ser averbada no Registro Civil das Pessoas Naturais (Lei n. 6015/73, art 104).

3.        Arrecadação de bens procedimento e interesse de agir

O procedimento para declarar a ausência da pessoa é disciplinado pelos artigos 1.159 e ss., do CPC/1973 e art 741, no CPC/2015, que tem início com a arrecadação dos bens do ausente (arts. 744 e 745, Dos Bens do Ausente, no CPC/2015). Uma vez arrecadados, mandará o juiz publicar editais na rede mundial de computadores, no sítio do tribunal que estiver vinculado e na plataforma de editais do Conselho Nacional de Justiça, onde permanecerá por 1 (um) ano, ou, não havendo sítio, no órgão oficial e na imprensa da comarca, durante 1 (um) ano, reproduzida de 2 (dois) em 2 (dois) meses, anunciando a arrecadação e chamando o ausente a entrar na posse de seus bens. Passado o prazo de 1(um) ano da publicação do primeiro edital, sem que se saiba do ausente e não tendo comparecido seu procurador ou representante, poderão os interessados requerer que se abra provisoriamente a sucessão, momento em que cessa a curadoria (CPC/2015, art 745 e §§) e tem início a sucessão provisória (CC, arts 26 a 36).

Além disso, pode o procedimento ter início pela conversão do depósito feito em ação de consignação em pagamento, em arrecadação de bens do ausente. É isso o que diz o art 548, do CPC/2015: “No caso do art 547: I – não comparecendo pretende algum, converter-se-á o depósito em arrecadação de coisas vagas; II – comparecendo apenas um, o juiz decidirá de plano; III – comparecendo mais de um, o juiz declarará efetuado o depósito e extinta a obrigação, continuando o processo a correr unicamente entre os presuntivos credores, observado o procedimento comum”.

4.        Existência de bens e interesse de agir

Apesar de a ausência ter como escopo declarado assegurar a preservação do patrimônio do ausente, cujo procedimento tem início exatamente com a arrecadação de seus bens, de modo acertado o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a efetiva existência de bens não é pressuposto para a propositura da ação de arrecadação de bens e declaração de ausência. Nesse sentido: “Direito Civil e Processual civil. Ausência. Curadoria dos bens do ausente. Comprovação de propriedade em nome do desaparecido. Desnecessidade. – A nova tônica emprestada pela CF/88 do CC/02, no sentido de dar ênfase à proteção da pessoa, na acepção humana do termo, conjugada ao interesse social prevalente, deve conciliar, no procedimento especial de jurisdição voluntária de declaração de ausência, os interesses do ausente, dos seus herdeiros e do alcance dos fins sociais pretendidos pelo jurisdicionado que busca a utilização do instituto. – Resguarda-se, em um primeiro momento, os interesses do ausente, que pode reaparecer e retomar sua vida, para, após as cautelas legalmente previstas, tutelar os direitos de seus herdeiros, porquanto menos remota a possibilidade de efetivamente ter ocorrido a morte do desaparecido. – A preservação dos bens do ausente constitui interesse social relevante, que busca salvaguardar direitos e obrigações tanto do ausente quanto dos herdeiros que permaneceram à deriva, durante longo período de incertezas e sofrimentos causados pelo abrupto de um ente querido. – Essa incerteza gerada pelo desaparecimento de uma pessoa, deve ser amparada pelo intérprete da lei como necessidade de adoção de medidas tendentes a proteger o ausente e sua família, quanto aos direitos e obrigações daí decorrentes. – Se o ausente deixa interessados em condições de sucedê-lo, em direitos e obrigações, ainda que os bens por ele deixados sejam, a princípio, não arrecadáveis, há viabilidade de se utilizar o procedimento que objetiva a declaração de ausência. – O entendimento salutar para a defesa dos interesses do ausente e de seus herdeiros deve perpassar pela afirmação de que a comprovação da propriedade não é condição sine qua non para a declaração de ausência nos moldes dos arts 22 do CC/02 e arts 1.159 e 1.160 do CPC/1973, atualmente condensados no art. 744 do CPC/2015 “Arrecadação e Nomeação de Curador – Após a declaração de ausência por meio de sentença. O juiz mandará arrecadar os bens do ausente e nomear-lhe-á um curador. Tanto a arrecadação como a nomeação do curador seguirão as regras procedimentais previstas para a ação de herança jacente. Cuida o art 25 do CC da ordem legal que deve ser respeitada na indicação do curador. A preferência é pelo cônjuge – também o companheiro – do ausente, desde que não esteja separado judicialmente, ou de fato, por mais de 2 anos antes da declaração da ausência. Caso não haja cônjuge ou companheiro, ou apesar de sua existência não se preencham os requisitos do art 25, caput, do CC, a curadoria será dos pais do ausente ou dos descendentes, nessa ordem, desde que não haja impedimento que os iniba a exercer o cargo. Entre os descendentes se prefere os mais próximos, e havendo identidade de proximidade caberá sorteio. Se nenhuma das situações analisadas se verificar no caso concreto caberá ao juiz a escolha do curador. Conforme corretamente ensina a melhor doutrina, a curatela do ausente não se confunde com a curadoria de ausentes, prevista no art 72, II e parágrafo único do atual CPC, até porque no primeiro caso, há uma representação de direito material, com o curador administrando o patrimônio do ausente, enquanto no segundo há meramente uma representação processual, com atuação procedimental do curador em favor do ausente.Acaso certificada a veracidade dos fatos alegados na inicial, por todos os meios de prova admitidos pela lei processual civil, considerada não apenas a propriedade como também a posse na comprovação do acervo de bens, deve o juiz proceder à arrecadação dos bens do ausente, que serão entregues à administração do curador nomeado, fixados seus poderes e obrigações, conforme as circunstâncias e peculiaridades do processo” (STJ, REsp n. 1.1016.023-DF, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 27.05.08). (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 23. Também se declarará a ausência, e se nomeará curador, quando o ausente deixar mandatário que não queira ou não possa exercer ou continuar o mandato, ou se os seus poderes forem insuficientes. 1

1.        Ausente que deixa representante ou procurador

Mesmo que uma pessoa tenha se ausentado de seu domicílio, sem deixar qualquer notícia de seu paradeiro, não se declarará sua ausência, se a pessoa tiver deixado um representante (CC/02, art 115) ou mandatário com poderes para administrar seus bens e interesses. Todavia, caso o procurador se recuse a administrar seu patrimônio, não possa ou não queira exercer o mandato (CC/02, art 682), ou ainda não tenha poderes suficientes para administrar todos os bens ou interesses da pessoa desaparecida, surgirá a necessidade de declaração de sua ausência com a consequente nomeação de um curador. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 24. O juiz, que nomear o curador, fixar-lhe-á os poderes e obrigações, conforme as circunstâncias, observando, no que for aplicável, o disposto a respeito dos tutores e curadores. 1

1.        Poderes e obrigações do curador

Ao nomear o curador, deve o juiz analisar as circunstâncias do desaparecimento da pessoa, seu patrimônio, o estado e os diferentes lugares em que se encontram os bens do desaparecido, se existem outras pessoas com poderes para gerir parte dos bens e interesses do desaparecido, e adotá-las como fundamentação necessária (CF, art 93, IX; art 371 e 489, II do CPC/2015) para fixar os limites dos poderes e obrigações do curador nomeado, determinando detalhadamente todas as providências necessárias, bem como as incumbências e responsabilidades que lhe caberão. Além disso, determina o art 24 do CC/2002 que deverão ser aplicadas, no que couberem, as regras relativas à tutela e curatela (CC, arts 1.728 a 1.783), sendo de particular utilidade as regras relativas aos deveres de prestação de contas (CC/02, arts 1.755 a 1.762). (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 18, 19, 20, 21 – Dos Direitos da Personalidade – Vargas, Paulo S. R.



DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 18, 19, 20, 21 –
Dos Direitos da Personalidade – Vargas, Paulo S. R. 

TITULO I – Das Pessoas Naturais (art. 1 a 39)
Capítulo II - Dos Direitos da Personalidade
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Art. 18. Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial. 1

1 Aspectos patrimoniais do nome e da imagem da pessoa

Atualmente o conteúdo do direito à imagem e ao nome é entendido sob um duplo aspecto, marcado pela união de um elemento subjetivo, referente aos aspectos do nome e da imagem como direitos da personalidade de um indivíduo (right of privacy). Carlos Alberto Bittar esclarece que “a doutrina é tranquila a respeito, tanto no exterior, como em nosso país, pois a proteção que se confere à imagem e ao nome preserva à pessoa, simultaneamente, a defesa de componentes essenciais de sua personalidade, e, de outro, o respectivo patrimônio, pelo valor econômico que representa” (ver nota 4 ao art 11) (1). Explicando esse natural interesse comercial que recai sobre o nome de pessoas notórias, o autor explica que: “de fato, o relacionamento de pessoas a produtos e a empresas, na divulgação pelos diferentes veículos de comunicação, de sua existência e de sua atuação, conferiu destaque próprio aos direitos à imagem e ao nome, permitindo-se-lhes, em razão de sua disponibilidade jurídica, a atribuição de valor econômico expressivo e progressivo, na exata medida da posição de evidencia do retrato e do espectro da campanha publicitária. O fenômeno ganha vulto em nossos tempos, em que a vinculação publicitária de pessoas bem sucedidas em suas atividades representa estímulo ao consumo, mediante a atração que exercem junto ao público: assim acontece com os grandes estadistas, políticos, artistas, escritores, esportistas. Explora-se, nesse passo, a ânsia do espectador em identificar-se com os seus ídolos, com os seus hábitos, os seus gostos, as suas preferencias, levando-o, pois, ao consumo do produto anunciado, direta ou indiretamente, conforme o caso” (2). Assim é que, sob o aspecto patrimonial, a proteção que o direito confere à imagem e ao nome de uma pessoa obedece às mesmas diretivas daquela que é conferida ordinariamente a um bem in comercio. Ou seja, seu valor patrimonial não pode ser explorado sem a autorização de seu titular e toda subtração ilegítima de seu valor de mercado deve ser reparada. Daí o artigo 18 do Código Civil explicitamente exigir a autorização da pessoa para que possa usar seu nome em propaganda comercial. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Carlos Alberto Bittar, Danos Morais: cálculo da indenização por violações à imagem e ao nome de pessoa notória, LEX: JTACSP, 1990, v.24, n. 121, pp. 6-7.
(2)      _______________________________

Art. 19. O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome. 1

1 Proteção ao pseudônimo

Pseudônimo, de origem grega, pseudônimos, de pseudes (falso) e onoma (nome) entende-se a denominação ou o nome falso ou suposto, escolhido ou adotado por uma pessoa, para ocultar sua verdadeira identidade ou seu verdadeiro nome, no exercício de qualquer atividade”. (1) É normalmente utilizado no meio artístico e literário (lei n. 9.610/98), recebendo, dada sua importância no meio em que é utilizado, a mesma proteção que se confere ao nome, tanto em sua vertente patrimonial quanto sob a ótica dos direitos da personalidade. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      De Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico, 27ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2007, p. 1.131.

Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias a administração da justiça ou a manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinares a fins comerciais. 1, 2, 3, 4, 5

Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. 6

1.        Imagem-retrato e imagem-atributo

De acordo com Maria Helena Diniz, “a imagem-retrato é a representação física da pessoa, como um todo, ou em parte separadas do corpo (nariz, olhos, sorriso etc.) desde que identificáveis, implicando o reconhecimento de seu titular, por meio de fotografia, escultura, desenho, pintura, interpretação dramática, cinematografia, televisão, sites etc., que requer autorização do retratado (CF, art 5º, X). A imagem atributo é o conjunto de caracteres ou qualidades cultivados pela pessoa, reconhecidos socialmente (CF, art 5º V), como habilidades, competência, lealdade, pontualidade etc. a imagem abrange também a reprodução romanceada em livro, filme ou novela, da vida de pessoa de notoriedade”.(1) Sob essas diferentes vertentes é que deve ser analisada a proteção conferida pelo direito à imagem da pessoa. Tem a pessoa o inequívoco direito de defender a forma como ela é vista na sociedade (imagem-atributo), insurgindo-se contra toda e qualquer divulgação não autorizada que prejudique ou atente contra essa sua boa-fama, proibindo sua divulgação e exigindo a respectiva reparação. Em tais situações, para que se configure a violação da imagem da pessoa, nos termos do próprio artigo 20, é necessário que a divulgação não autorizada da imagem atinja “a honra, a boa fama ou a respeitabilidade” da pessoa. Além disso, tem a pessoa o direito de opor-se à mercantilização não autorizada de sua imagem, pelo simples fato de que a pessoa pode não querer ser associada a qualquer marca ou produto ou porque, sem ter autorizado o uso da imagem, foi ainda privada da respectiva remuneração caso esse uso tivesse sido autorizada. Nesse outro viés da proteção a imagem da pessoa, o Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido que a simples exibição da imagem não autorizada dá ensejo à reparação, independentemente da existência de prova de prejuízo (STJ, Súmula 403). Atualmente, entretanto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça parece delinear uma tendência de aproximar essas duas e diferentes situações, afirmando que “a ofensa ao direito à imagem, materializa-se com a mera utilização da imagem sem autorização, ainda que não tenha caráter vexatório ou que não viole a honra ou a intimidade da pessoa, e desde que o conteúdo exibido seja capaz de individualizar o ofendido” (STJ, REsp 794.586-RJ, rel. Min. Raul Araújo, j. 15.03.12).

2.        Pessoa retratada em situações públicas

Em tal hipótese, entende-se que não é necessária uma expressa e formal autorização para a utilização da imagem da pessoa. Acertadamente, entende-se que a pessoa que conscientemente se expõe, abrindo mão de sua privacidade não pode opor-se à utilização de sua imagem. Há, em tais casos, uma legitima presunção de que a autorização foi tacitamente conferida pela pessoa. Nesse sentido: “não se pode cometer o delírio de, em nome do direito de privacidade, estabelecer-se uma redoma protetora em torno de uma pessoa para torna-la imune de qualquer veiculação atinente à sua imagem. Se a demandante expõe sua imagem em cenário público, não é ilícita ou indevida sua reprodução pela imprensa, uma vez que a proteção à privacidade encontra limite na própria exposição realizada” (STJ, REsp 595.600-SC, rel. Min. Cesar Asfor rocha, j. 18.03.04); “danos morais – Direito de imagem – Participação em concurso de trajes sumários, evento aberto ao público em um clube, com convite aos órgãos de imprensa – Modelo que voluntariamente posa para os fotógrafos presentes de seios nus – Contexto das fotografias que demonstra desejo explícito de exibir-se ás lentes dos fotógrafos – Consentimento tácito à publicação da fotografia em jornal popular, em matéria sobre o evento, dois dias após” (TJ-SP, Apel n. 9173602-75.2004.8.26.0000, rel. Des. Francisco Loureiro, j. 12.04.07).

3.        Pessoa retratada num contexto genérico ou em meio a uma multidão

A razoabilidade de tal premissa serve para evitar que fotos e filmagens feitas em grandes eventos ou em espaços públicos, dependam da autorização das dezenas ou centenas de pessoas que invariavelmente têm sua imagem captada em tais situações. Em tais casos, desde que a pessoa não seja o foco do cenário retratado, mas apenas parte dele, não é necessária a obtenção de autorização. Todavia, caso o contexto retratado seja desabonador, denegrindo a imagem de pessoa retratada em situação vexatória, caberá reparação pelo uso indevido da imagem. Nesse sentido: “tratando-se de imagem de multidão, de pessoa famosa ou ocupante de cargo público, deve ser ponderado se, dadas as circunstâncias a exposição da imagem é ofensiva à privacidade ou à intimidade do retratado, o que poderia ensejar algum dano patrimonial ou extra patrimonial. Há, nessas hipóteses, em regra, presunção de consentimento do uso da imagem, desde que preservada a vida privada” (STJ, REsp n. 801.109-DF, rel. Min. Raul Araújo, j. 16.6.12).

4.        Pessoa retratada em contexto jornalístico

Como todo direito, a proteção da imagem da pessoa não é absoluta, devendo sempre ser ponderada e relativizada diante de outros direitos e princípios. Tratando-se da proteção da imagem da pessoa, a situação mais corriqueira – problemática – que se apresenta na jurisprudência é a de sua relativização frente à garantia constitucional da liberdade de imprensa. Tratando-se de dois princípios constitucionais, exige-se do operador do direito uma boa dose de razoabilidade e proporcionalidade no confronto entre tais valores. É exatamente isso o que diz o Enunciado 279 da IV Jornada de Direito Civil que “a proteção à imagem deve ser ponderada com outros interesses constitucionalmente tutelados, especialmente em face do direito de amplo acesso à informação e da liberdade de imprensa. Em caso de colisão, levar-se-á em conta a notoriedade do retratado e dos fatos abordados, bem como a veracidade destes e, ainda, as características de sua utilização (comercial, informativa, biográfica), privilegiando-se medidas que não restrinjam a divulgação de informações’. Em situações como essa, a jurisprudência tem reconhecido que a ilustração de reportagens e matérias jornalísticas, com imagens e retratos constitui exercício regular da atividade jornalística “a divulgação, ao público, sobre episódios relevantes ao cotidiano dos brasileiros é dever do Estado, na medida em que a informação é um direito do cidadão. Assim, embora no corpo do texto haja foto do autor preso, houve apenas animus narrandi, o qual não acarreta abalo à honra, porquanto consagra o direito de informação” (TJ-SP, Apel n. 9169035-24.2008.8.26.0000, rel. Des. Coelho Mendes, j. 19.3.13). todavia, essa ampla liberdade de imprensa não pode desviar-se da finalidade informativa e narrativa, sob pena de caracterização do abuso e do consequente dever de indenizar: “A liberdade da divulgação de notícias baseia-se no interesse público da obtenção da informação – Se não houver caráter informativo, interesse público atual e respeito ao decoro, reputação e à vida privada, a divulgação indiscriminada, por qualquer de suas formas, ou de notícia falsa, ainda que não de forma intencional, resulta na obrigação de reparar o dano” (TJ-SP, Apel n. 0020722-43.2011.8.26.0625, rel. Des Alcides Leopoldo e Silva Júnior, j. 14.08.12).

5.        Captação da imagem necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública. Ainda a dispensa de autorização

O exemplo mais didático para essa exceção legal à divulgação da imagem da pessoa por imposição da administração da justiça é o da imagem da pessoa retratada em cartaz de ‘procura-se’. Todavia, as situações concretas são muito mais complexas do que esse exemplo, exigindo um juízo de ponderação e razoabilidade sobre a necessidade de divulgação da imagem de uma pessoa.

6.        Legitimados

Se o ofendido vier a falecer ou encontrar-se ausente, terão legitimidade para reclamar a proteção e a reparação da imagem da pessoa o cônjuge, o companheiro (Enunciado 400 da V Jornada de Direito Civil) os ascendentes ou os descendentes. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro, Vol. I, 24ª ed. São Paulo, Saraiva, 2007, p. 129

Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providencias necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma 1, 2, 3.


1.        Vida privada e intimidade

Apesar de o artigo se referir apenas à vida privada da pessoa. É comum a distinção entre vida privada e intimidade feita pela doutrina. Por intimidade, costuma-se entender os aspectos da vida privada de uma pessoa que ela legitimamente mantém afastada do convívio público. É a parte de sua vida que o indivíduo leva quando se encontra longe de observação de estranhos. A proteção jurídica conferida a esses aspectos da vida íntima da pessoa se traduz no direito que todo indivíduo tem de afastar pessoas estranhas de fatos ou informações pessoais que não queira dividir. É esse o fundamento de onde se extrai a inviolabilidade de seu domicílio, do sigilo de sua correspondência, conversas telefônicas, dados bancários etc. Além disso, a proteção à vida privada da pessoa pode ainda ser entendida como o direito que tem ela de gerir sua vida sem a intromissão de terceiros. É o direito que tem a pessoa de manter o estilo de vida que quiser.

2.        É Legítimo o interesse jornalístico sobre a vida de pessoa famosa

Da mesma forma como ocorre com o direito à imagem, a intimidade de certas pessoas acaba sofrendo certos temperamentos decorrentes de sua notória. Adriano de Cupis explica esse legítimo interesse e essa curiosidade jornalística que recaem sobre a imagem e a biografia de pessoas notórias dizendo que: “as pessoas de certa notoriedade, como não podem opor-se à difusão da própria imagem, igualmente não podem opor-se à divulgação de acontecimentos da sua vida. O interesse público sobreleva, nesses casos, o interesse privado; o povo, assim como tem interesse em conhecer a imagem dos homens célebres, também aspira a conhecer o curso e os passos da sua vida, as suas ações e as suas conquistas; e, de fato, só através de tal conhecimento pode formar-se um juízo sobre seu valor. Mesmo nesses casos, por outro lado, as exigências do público detêm-se perante a esfera íntima da vida privada, e, além disso, as mesmas exigências são satisfeitas pelo modo menos prejudicial ao interesse individual”.(1) Diversas foram as teorias desenvolvidas pela doutrina para justificar a dispensa da autorização para exibição de imagens de pessoas públicas. Na França, surgiu a teoria do consentimento tácito ou do consentimento presumido. Dizia-se que “pessoas notórias se encontrariam em um estado de représentation permanente, aplicável com relação aos fatos da vida, seja da vida pública, como privada. Quando a vontade de divulgar sua personalidade ao público pareça evidente, é extensiva ao direito à imagem”. (Jacques Ravanas). Outros, por outro lado, refutavam a teoria do consentimento presumido, fundando a dispensa de consentimento “no legítimo interesse público que recai sobre tais pessoas” Pierre Kayser).(2)

3.        Outras limitações à inviolabilidade da vida privada. Gravações de conversas telefônicas; quebra de sigilo bancário; busca e apreensão no domicílio da pessoa.

Apesar de o artigo 21 do Código Civil ter se omitido quanto às limitações que a “administração da justiça ou à manutenção da ordem pública” podem impor aos direito à vida privada da pessoa, não há dúvida que em certas situações a vida privada da pessoa deve ceder a outros interesses. É exatamente isso o que autoriza que, em casos excepcionais, a quebra do sigilo bancário, a gravação de conversas telefônicas ou a realização de buscas dentro do domicílio da pessoa, esmo contra sua vontade. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Adriano de Cupis. Os direitos da personalidade, tradução Adriano Vera Jardim, Lisboa, Livraria Morais, 1961, p. 145
(2)      Regina Saham, Direito à imagem no Direito civil Contemporâneo, São Paulo, Atlas, 2002, pp. 199-200.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018


DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 15, 16, 17 –
Dos Direitos da Personalidade – Vargas, Paulo S. R. 

TITULO I – Das Pessoas Naturais (art. 1 a 39)
Capítulo II - Dos Direitos da Personalidade
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Art. 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica. 1 e 2

1 Regras e princípios que balizam a intervenção médica

Atualmente, costuma-se sistematizar as regras que balizam o tratamento médico e a intervenção cirúrgica em torno de alguns princípios básicos. O princípio da autonomia, que segundo o Relatório Belmont incorpora, ao menos, dois predicados éticos: “primeiro que as pessoas cuja autonomia está diminuída devem ser objeto de proteção”. Tal princípio consagra o domínio que o paciente tem sobre o próprio corpo e sobre a própria vida. Rompendo com o método hipocrático de intervenção médica, o princípio da autonomia consagra a inviolabilidade de corpo e da pessoa humana, fazendo com que nenhuma intervenção médica possa ser feita sem o consentimento do paciente. O princípio da beneficência requer que o atendimento ao paciente seja sempre voltado aos interesses e ao bem estar do próprio paciente. Tal princípio traz ainda como baliza para a pesquisa em seres humanos o imperativo de que os riscos corridos pelo paciente não devem exceder a importância humanitária da experiência. O princípio da não-maleficência que pode ser considerado um desdobramento do princípio da beneficência, costuma ser tratado com autonomia, visto que o dever de não causar um dano intencional ao paciente é, segundo o Relatório Belmont, “mais obrigatório e imperativo que o da beneficência”. Trata-se de uma das mais antigas obrigações médicas, traduzidas no princípio primum non nocere e, abarca, além do dever de não produzir dano atual, também o de prevenir eventuais danos futuros. O princípio da não-maleficência, reconhecidamente amplo e abstrato, é a base de diversos outros princípios, ou “regras menores de efetividade”, tais como o princípio do duplo efeito, da totalidade, do mal menor e dos meios ordinários e extraordinários. Segundo o princípio do duplo efeito, para aquelas circunstâncias em que o ato médico tenha duas ou mais consequências (uma positiva e outra negativa), esse efeito danoso indireto que decorre do ato médico é legítimo, ou melhor, aceitável. Isso porque, o que o princípio da não-maleficência visa a afastar é o dano intencionalmente provocado e que não tenha relação com o processo curativo ministrado ao paciente. Em outras palavras, o dano é tolerado, mas não procurado. À luz desse princípio, por exemplo, será lícita a ablação do útero canceroso de uma grávida de um feto ainda não viável, pois o que se pretende é a vida da mãe, tolerando-se a morte do feto que resulta inevitavelmente da ablação do útero. O princípio de totalidade surge do confronto entre a parte e o todo e da maior plenitude de significado que o todo possui com relação à parte. Numa situação de conflito é necessário preferir o todo. Exemplo clássico de aplicação deste princípio são os tratamentos médicos que implicam em amputações de membros, em que a vida do paciente (todo), prevalece sobre o membro amputado (parte). O princípio do mal menor deverá nortear os casos de intervenção médica em que todos os efeitos da conduta inevitavelmente serão negativos. Tendo em vista que mesmo em situações extremas o médico não pode deixar de agir, e que sabendo que ao agir causará um dano, o médico deve escolher a conduta que causará o menor mal ao paciente. O princípio da justiça impõe que o profissional da saúde haja com imparcialidade e sem discriminação ao distribuir os riscos, os benefícios e os encargos do tratamento médico e das demais formas de prestação de serviços médicos.

2 Possibilidade de constranger o paciente a submeter-se a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica

Em regra, não é necessário que o procedimento possa trazer risco de vida ao paciente para que ele possa se recusar a se submeter a ele. Como manifestação do princípio da autonomia sobre o próprio corpo, por qualquer razão que seja, pode o paciente se recusar a tratamento médico. Ilustra essa situação as crenças religiosas contrárias à transfusão de sangue ou a transplante de órgãos, sendo vedado ao médico impor tais tratamentos a quem seja religiosamente contrário a eles. É a essa conclusão que chegou a V Jornada de Direito Civil ao editar o Enunciado 403 “o Direito à inviolabilidade de consciência e de crença, previsto no art 5º, VI, da Constituição Federal, aplica-se também à pessoa que se nega a tratamento médico, inclusive transfusão de sangue, com ou sem risco de morte, em razão do tratamento ou da falta dele, desde que observados os seguintes critérios: a) capacidade civil plena, excluído o suprimento pelo represente ou assistente; b) manifestação de vontade livre, consciente e informada; e c) oposição que diga respeito exclusivamente à própria pessoa do declarante” (lei n. 1.216/01), bem como a internação compulsória em casos de doenças contagiosas, diante da obrigação do Estado em afastar todos os riscos à Saúde Pública. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome. 1, 2

1 Nome da pessoa natural

Nome é o sinal distintivo dado à pessoa natural que a identifica e individualiza na família e na sociedade. É, por essa razão, ao mesmo tempo um direito e um atributo da personalidade. O nome da pessoa natural é composto por dois elementos o prenome, escolhido livremente desde que não exponha a pessoa ao ridículo e o sobrenome (ou patronímico) que indica a procedência da pessoa, sua filiação, a família a qual ela pertence. Consagrando o princípio de que a família é formada não só por laços biológicos, mas também por laços sócio afetivos, além do sobrenome do pai e da mãe biológicos, pode também por laços afetivos, além do sobrenome do pai e da mãe biológicos, pode ainda o adotado adquirir o sobrenome da família adotiva (lei n. 8.069/90, art 47, § 5º) e enteado, havendo motivo ponderável, adquirir o sobrenome da madrasta ou padrasto (lei 6.015/73, art 57, 8º).

2 Modificação do nome

Como regra geral, o registro do nome e do prenome da pessoa natural é definitivo, podendo sofrer modificações posteriores apenas em casos excepcionais, por sentença judicial desde que ouvido o Ministério Público (lei 6.015/73. Art 57). Todavia, a jurisprudência tem reconhecido como situações excepcionais aptas a justificar a alteração do nome, a situação em que o nome exponha a pessoa ao ridículo (TJ-SP, Apel. n. 3004702-94.2008.8.26.0000, rel. Des. Neves Amorim, j. 14.8.12) e modificações do gênero do nome de quem passa por cirurgia de transexualização (TJ-SP, Apel. n. 0627715-81.2008.8.26.0100, rel. Des. Salles Rossi, j. 23.5.12). (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

 Art. 17. O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória1.

1 Proteção da honra objetiva

O dispositivo trata do direito que tem a pessoa de proteger seu bom nome perante a sociedade. Sendo o nome um dos aspectos que identificam a pessoa na família e na sociedade, nada mais natural que a pessoa tenha o interesse do direito de construir um bom nome, uma boa reputação no ambiente em que vive. Por essa razão, terceiros que por meio de publicações ou representação atentem contra esse bom nome devem responder pelo dano causado ainda que não haja intenção difamatória. Em caso de violação, “são civilmente responsáveis pelo ressarcimento do dano decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação” (STJ Súmula, 221). (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 12, 13, 14 Dos Direitos da Personalidade – Vargas, Paulo S. R.



DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 12, 13, 14
     Dos Direitos da Personalidade – Vargas, Paulo S. R. 

TITULO I – Das Pessoas Naturais (art. 1 a 39)
   Capítulo II - Dos Direitos da Personalidade
vargasdigitador.blogspot.com
Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou ao lesão, a direito da personalidade¹, e reclamar perdas e danos², sem prejuízo de outras sanções previstas em lei³.
Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau 4.
¹ Tutela dos direitos da personalidade. Sem prejuízo de obter a respectiva reparação, pecuniária ou específica, advinda de uma violação a um direito da personalidade, o legislador assegura ao ofendido a possibilidade de requerer toda e qualquer medida necessária a fazer cessar a ameaça ou a lesão a direito da personalidade. Elucidando a forma com que tal possibilidade deve ser exercida, o Enunciado 140 da III Jornada de Direito Civil afirma que “a primeira parte do art 12 do Código Civil refere-se às técnicas de tutela especifica, aplicáveis de ofício, enunciadas no art 497, do CPC/2015, que substitui o art 461 do CPC/1973, devendo ser interpretada com resultado extensivo”. Na justificativa apresentada para a redação do enunciado, o autor Erick Frederico Gramstrup afirma que “para que seu devido alcance seja estabelecido, a leitura deve ir além da mera literalidade e, onde se fala em ordem de cessação, deve-se compreender a possibilidade de o juiz ordenar todas as medidas exemplificadas no art 461, do CPC/1973, e seus parágrafos, isto é, obrigações de fazer e não fazer, com ameaça de sanção pecuniária, bem como providencias de alteração material das circunstâncias que envolvem as partes, replicadas condensadamente, no art 497, parágrafo único, do atual CPC/2015. Essa hermenêutica ampliativa tem apoio na releitura constitucional do Direito Privado, que deve servir de amparo à proteção da dignidade da pessoa humana. Assim, lesado ou ameaçado o direito da personalidade, pode o juiz não apenas ordenar ao agente que deixe de agir (ou que aja), sob pena de multa, como também determinar, diretamente, a modificação do estado de coisas exterior ao processo, para que a lesão não venha a se exaurir, e, tanto quanto possível, seja revertida in natura”. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).
² Reparação pecuniária e específica por violação aos direitos da personalidade.
Além do natural e intuitivo direito que a vítima tem de pedir que o agressor cesse a ameaça ou a lesão a um direito da personalidade, caso o dano não tenha sido evitado, vindo a efetivamente ocorrer, terá o lesado direito à sua reparação. Essa reparação poderá ser pecuniária, traduzindo-se numa soma em dinheiro, cujo escopo é compensar a vítima pelo dano sofrido e, sempre que possível, especifica, visando a reconduzir a vítima à condição em que se encontrava antes do dano. Um bom exemplo dessa reparação específica de um dano a direito da personalidade é o direito de resposta, entendido como o direito que uma pessoa tem de se defender de críticas e ofensas públicas no mesmo veículo de mídia em que elas foram publicadas (CF, art 5, V). (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).
³ Sanção por violação aos direitos da personalidade.
Da mesma forma como ocorre com praticamente todos os direitos, a violação aos direitos da personalidade pode trazer consequências de âmbito civil, penal e administrativo, cuja incidência são relativamente independentes e autônomas. Por essa razão, a tutela dos direitos da personalidade não fica restrita à reparação de âmbito civil, podendo gerar consequências penais e administrativas. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).
4 Legitimados

Tendo em vista que diversos direitos da personalidade não se extinguem com a morte da pessoa, é natural que se confira legitimação para que outras pessoas possam proteger tais direitos após o falecimento de seu titular. É exatamente isso o que fez o parágrafo único do art 12 do Código Civil, conferindo ao cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau a legitimação para tutelar os direitos da personalidade da pessoa falecida. Apesar da omissão desse parágrafo, se aceita ainda que o companheiro também tenha essa legitimação. É isso o que diz o Enunciado 275 da IV Jornada de Direito Civil: “o rol dos legitimados de que tratam os arts 12, parágrafo único, e 20, parágrafo único, do Código Civil também compreende o companheiro”. Nestas situações mesmo que tenha o dano recaído sobre o falecido, a legitimidade será ordinária, posto que o cônjuge, companheiro ou parente próximo defende direito próprio. Nesse sentido dispõe o Enunciado 400 da V Jornada de Direito Civil que “os parágrafos únicos dos arts 12 e 20 asseguram legitimidade, por direito próprio, aos parentes, cônjuge ou companheiro para a tutela contra lesão perpetrada post mortem”. Há pois, um dano próprio do marido que vê a honra da esposa violada, sendo ele o titular da respectiva indenização pecuniária por dano moral. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes ¹.

Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial ².

¹ Disposição do corpo por exigência médica

Toda pessoa tem direito a dispor do próprio corpo, desde que essa disposição não resulte em diminuição permanente da integridade física ou contrarie os bons costumes. Amputações e extrações de órgãos ou tecidos, bem como qualquer deformação permanente do próprio corpo ficam vedadas por este dispositivo, sujeitando médicos ou terceiros que auxiliem a pessoa em tais atos à responsabilidade civil ou mesmo penal. Exceção a essa vedação reside na diminuição permanente da integridade física feita por exigência médica como ocorrem em casos de amputações por gangrena de extremidades, ou para retirada de órgãos e tecidos cancerígenos. Por exigência médica, entende-se não só a busca do bem estar físico, mas também a busca do bem-estar psicológico. Tal ideia foi consolidada pelo Enunciado 6 da I Jornada de Direito Civil: “exigência médica” contida no art 13 refere-se tanto ao bem-estar físico quanto ao bem-estar psíquico do disponente”. Amparado em tal conceito, o Enunciado 276 da IV Jornada de Direito Civil explicitou que “o art 13 do Código Civil, ao permitir a disposição do próprio corpo por exigência médica, autoriza as cirurgias de transgenitalização, em conformidade com os procedimentos estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina, e a consequente alteração do prenome e do sexo no Registro Civil”. Atualmente, a questão não suscita mais controvérsia como ocorria no passado, sendo possível a realização do Processo Transexualizador pelo próprio Sistema único de Saúde – SUS (Portaria 457, de 19 de agosto de 2008). Ressalta-se, todavia, que as cirurgias de transgenitalização apenas serão permitidas com amparo nessa exceção quando haja comprovada existência de transtorno psicológico que recomente a cirurgia. Fora dessa hipótese, a mudança imotivada de sexo tem sido entendida como alteração permanente da integridade física que ofende os bons costumes (TJ-MG, proc. nº 1.0672.150614/001, rel. Des. Almeida Melo, j. 15.05.05). (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

² Transplante de órgãos e tecidos.

Atualmente, o transplante de órgãos e tecidos é regulamentado pela lei n. 9.434/97.

Art. 14. É válida, como objetivo, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte ¹ ²

Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo³.

¹ Disposição do corpo para fins científicos ou altruísticos

Naturalmente a disposição total do corpo apenas pode se dar para depois da morte. Por outro lado, admite-se a disposição gratuita de parte do próprio corpo para fins altruísticos (transplantes) ou científicos. A disposição de parte do corpo em vida para fins científicos ou de transplante é um negócio jurídico necessariamente gratuito que depende de uma manifestação de vontade livre e esclarecida do doador. Ou seja, é necessário que ao doador seja explicitada em linguagem simples, leiga e compreensível a natureza, o procedimento, bem como todas as consequências e riscos da intervenção a ser realizada. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

² Pesquisa científica envolvendo seres humanos

O primeiro e talvez historicamente mais importante documento que tratou da pesquisa em seres humanos foi o Código de Nuremberg, composto por dez enunciados que traçavam diretrizes gerais para a realização de pesquisas em seres humanos e que, ainda que não o fizesse expressamente, consagrou os atuais princípios básicos da bioética. Posteriormente, o Código de Nuremberg foi substituído pela Declaração de Helsinque, promulgada em 1962 e foi redigida pela Associação Médica Mundial em 1964. Posteriormente, foi revisada 7 vezes, sendo sua última revisão em outubro de 2013. No Brasil, dois são os artigos da Constituição Federal que tratam das pesquisas biomédicas. O primeiro deles é o artigo 199, § 4º da CF, ao dizer que: “a lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização”. O segundo é o artigo 225, § 1º, II, o qual afirma que: “[incumbe ao Poder Público] preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético”. Tais artigos, como se vê partem do fundamental direito de liberdade da expressão científica, consagrado pela Constituição Federal (art 5º, IX). No Brasil, a resolução 196/96 (CNS, 1996) configurou-se como o primeiro marco nacional para a regulamentação de pesquisas envolvendo seres humanos, sendo seguida pelo Resolução 466/2012 (CNS, 2012). Nessas resoluções, no entanto, foi possível identificar nitidamente a prioridade atribuída à biossegurança dos participantes, em uma configuração sanitária e positivista que nem sempre se mostrava adequada às especificidades das pesquisas em CHS. Amaral Filho (2017) relacionou a influência biomédica nas resoluções a uma questão de poder e critica a área biomédica por querer regular as CHS, uma vez que desconhece suas especificidades. À época, a resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, definia pesquisa em seres humanos como “todo procedimento de qualquer natureza envolvendo o ser humano, cuja aceitação não esteja ainda consagrada na literatura científica (...) os procedimentos referidos incluíam outros, os de natureza instrumental, ambiental, nutricional, educacional, sociológica, econômica, física, psíquica ou biológica, fossem eles farmacológicos, clínicos ou cirúrgicos e de finalidade preventiva, diagnóstica ou terapêutica”. (Res. CNS nº 196/96, Aspectos Éticos da Pesquisa Envolvendo Seres Humanos, III, n. 2). Como se vê, ao afirmar que todo procedimento de qualquer natureza caracteriza pesquisa em seres humanos, o Conselho Nacional de Saúde propositalmente atribuiu um conceito extremamente amplo para a expressão pesquisa em seres humanos. Fica albergada no conceito de pesquisa científica em seres humanos, não só a experimentação científica em seu sentido clássico, mas também a intervenção médica curativa que emprega técnica, medicamente ou qualquer outro procedimento cuja eficácia ainda não tenha sido consagrada na literatura científica. Naturalmente, ao lado do respeito à vida e à dignidade da pessoa humana, os quatro grandes princípios da bioética (autonomia, beneficência, não-maleficência e justiça), formam as linhas mestras que devem nortear todo procedimento biomédico, em especial a potencialmente lesiva pesquisa em seres humanos. Tais princípios, além de autoaplicáveis, servem ainda de suporte para diversas outras regras mais específicas no campo da pesquisa médica em seres humanos. Assim, por exemplo, ocorre com a regra que explicita a necessidade de obter o consentimento esclarecido do paciente que se sujeita a uma pesquisa médica (Código de Ética Médica, art 123 e Res. CNS n. 196/96 (III, 3, letra g), (1)(2) a qual tem apoio no princípio da autonomia. Ainda apoiada no princípio da autonomia, a Res. nº 196/96 dispõe ainda que a pesquisa em ser humano deve “ser desenvolvida preferencialmente em indivíduos com autonomia plena. Indivíduos ou grupos vulneráveis não devem ser sujeitos de pesquisa quando a informação desejada possa ser obtida através de sujeitos com plena autonomia, a menos que a investigação possa trazer benefícios direitos aos vulneráveis. Nestes casos, o direito dos indivíduos ou grupos que queiram participar da pesquisa deve ser assegurado, desde que seja garantida a proteção à sua vulnerabilidade e incapacidade legalmente definida” (Res. CNS n. 196/96, III, 3, letra j), devendo, “assegurar aos sujeitos da pesquisa as condições de acompanhamento, tratamento ou de orientação, conforme o caso, nas pesquisas de rastreamento; demonstrar a preponderância de benefícios sobre riscos e custos” (Res. CNS n. 196/96, III, 3, letra q). Além disso, a pesquisa médica deve previamente estar apoiada num juízo de ponderação entre os riscos e os benefícios (ou seja, em atenção aos princípios da beneficência e da não-maledicência) para o participante, a comunidade e o avanço técnico científico. Exceção à regra de ponderação, é a da pesquisa médica inserida numa atividade curativa, a qual exige que a pesquisa seja dirigida exclusivamente ao bem do paciente (CEM, art 129 e 130). Por fim, destrinchando e efetivando o princípio da justiça, toda pesquisa biomédica em ser humano deve proporcionar aos sujeitos que dela participem os proveitos que dela resultem, indenização por eventuais danos e garantia de máximo esforço e diligência para evitar que tais danos ocorram. Todas essas preocupações mostram-se evidentes nas demais normas dispostas na Res. CNS 196/96. Além de tais regras abstratas e aplicáveis a toda pesquisa realizada em ser humano, diversos outros limites podem ser encontrados em áreas específicas da pesquisa biomédica, como a pesquisa que envolva engenharia genética (lei n. 11.105/05) e transplante de órgãos (lei n. 9.434/97, regulamentada pelo decreto n. 2.268/97), e disciplinam a utilização de medicamentos experimentais (lei n. 6.360/76). (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

³ Possibilidade de revogação do ato de disposição

A perfeita compreensão da possibilidade de revogação do ato de disposição do próprio corpo naturalmente significa que tal revogação não poderá trazer qualquer responsabilização para o doador por eventuais custos já incorridos em função da expectativa desse ato de disposição. Entender o contrário, responsabilizando o doador arrependido caracterizaria uma indevida limitação a esse direito de arrependimento. Todavia, não podem os familiares revogar o ato de disposição feito em vida pelo próprio doador. Havendo divergência entre a vontade de doador e de sua família para os fins desse artigo, deve prevalecer a vontade do doador. Neste sentido é o Enunciado 277 da IV Jornada de direito Civil “o art 14 do Código Civil, ao afirmar a validade da disposição gratuita do próprio corpo, com objetivo científico ou altruístico, para depois da morte, determinou que a manifestação expressa do doador de órgãos em vida prevalece sobre a vontade dos familiares, portanto, a aplicação do art 4º da lei 9.434/97 ficou restrita à hipótese de silêncio do potencial doador”. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 03.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      “É vedado ao médico realizar pesquisa em ser humano, sem que este tenha dado consentimento por escrito, após devidamente esclarecido, sobre a natureza e consequências da pesquisa” (CEM, art 123”).
(2)      – “A pesquisa em qualquer área do conhecimento, envolvendo seres humanos deverá observar as seguintes exigências: Contar com o consentimento livre e esclarecido do sujeito da pesquisa e/ou seu representante legal” (Res. CNS n. 196/96, III, 3, letra g).