Direito Civil Comentado
- Art. 630, 631, 632 - Continua
- Do
Depósito Voluntário- VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(art. 481 a 853) Capítulo IX – Do Depósito -
(art. 627
a 652) Seção I – Do Depósito voluntário –
vargasdigitador.blogspot.com
-
Art. 630. Se o depósito se entregou fechado,
colado, selado ou lacrado, nesse mesmo estado se manterá.
Na lógica apontada por
Nelson Rosenvald, se a obrigação principal do depositário se traduz na restituição
da coisa em perfeito estado de conservação, preservando-se exatamente as
condições que ela possuía ao tempo da tradição, é elementar que, quando da
entrega de objeto fechado, colado, lacrado ou selado, retorne ele intacto ao poder
do depositante.
Portanto, salvo
autorização expressa do depositante, caberá ao depositário completo respeito ao
dever de sigilo, responsabilizando-se civilmente pela inexecução do dever de abstenção
pelo simples fato de abrir a caixa ou lacre em que estava depositado o objeto,
independentemente de qualquer avaria ou dano que concretamente a coisa tenha
sofrido.
O sigilo, ou segredo, situa-se em uma
esfera menor que a da própria intimidade e compreende a prerrogativa de manter
indevassadas as comunicações da pessoa. São diversos os aspectos da vida
pessoa, familiar ou profissional da pessoa em que não se deseja intrusão por
parte de terceiros (privacy ou right to be alone). Assim, o
desrespeito ao direito fundamental à inviolabilidade da intimidade e da vida
privada (CF, 5º, X), também direito da personalidade do depositante (CC 21), só
será facultado caso o dano seja justificado pela tutela do próprio depositário
ou da ordem pública (v.g., dúvida séria sobre a segurança ou salubridade
do bem depositado). Enfim, cuida-se de hipóteses de ponderação de direitos
fundamentais, resolvidos à luz do princípio da proporcionalidade. (ROSENVALD
Nelson, apud Código Civil Comentado:
Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar
Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 660 - Barueri, SP: Manole,
2010. Acesso 27/11/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).
Como aponta Ricardo
Fiuza em sua doutrina, das obrigações de guarda, conservação e posterior
restituição da coisa depositada intacta resulta o comando do CC 630.
Assim, salvo autorização
expressa do depositante, se o depósito se entregou fechado, colado, selado ou
lacrado, deve o depositário “respeitar o segredo da coisa sob sua guarda”
(Maria Helena Diniz, curso de direito civil brasileiro: teoria das
obrigações contratuais e extracontratuais, 16. ed., São Paulo, Saraiva,
2001, v. 3, p. 296) e “ter não só a delicadeza moral, como a obrigação jurídica,
de conservá-lo nesse estado” (Washington de Barros Monteiro. Curso de
direito civil: direito das obrigações, 4. ed., São Paulo, Saraiva, 1965, v.
2., p. 234), sob pena de presunção de culpa do depositário e consequente
responsabilidade deste por eventuais perdas e danos.
Cabe lembrar, ademais,
que devidamente autorizado pelo depositante, poderá o depositário abrir o
depósito que lhe foi entregue fechado. Entretanto, ainda assim, estará ele
obrigado a guardar segredo da coisa, exceto em caso de ato ilícito. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza
– p. 338 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 27/11/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Concluindo com Marco Túlio de Carvalho Rocha, o depositário obriga-se
a devolver ao depositante a coisa no estado em que a recebeu. Se a coisa
estiver lacrada, deve devolvê-la lacrada, salvo a ocorrência de caso fortuito
ou força maior, como a determinação do Poder Público para que a embalagem seja
aberta. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 27.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 631. Salvo disposição em contrário, a restituição
da coisa deve dar-se no lugar em que tiver de ser guardada. As despesas de
restituição correm por conta do depositante.
Segundo leciona Nelson
Rosenvald, a norma trata de dois temas ligados à restituição do bem: o local da
devolução e a titularidade das despesas decorrentes da entrega da coisa. A matéria
não era versada no CC de 1916, daí a oportunidade de o legislador se
manifestar.
Em regra, o local do
pagamento será o domicílio do devedor, ou seja, as obrigações são quesíveis (CC
327). Excepciona-se a regra geral quando as partes convencionarem diversamente,
ajustando obrigações portáveis, ou quando a própria lei ou as circunstâncias
firmarem a necessidade do pagamento em local diverso ao domicílio do devedor.
Em razão da própria natureza
da obrigação do depositário de guardar a coisa com toda a diligência e cuidado –
e, de modo geral, graciosamente -, seria exagerado também impor a ele a
obrigação de transportar o bem a qualquer outro local, até mesmo a seu próprio
domicílio, pois não é necessário que o local do depósito coincida com o local
em que o depositário estabeleça a sua vida ou os seus negócios.
Portanto, mesmo
tratando-se da restituição e bens móveis, o legislador cuidou de disciplinar a matéria
de forma semelhante ao que é preconizado para as obrigações de pagamento
envolvendo bens imóveis (CC 328), prevalecendo o local em que a coisa está
situada.
No que tange às despesas
provenientes da restituição da coisa, serão elas debitadas ao depositante. Aqui
também se preserva o princípio do equilíbrio ou justiça contratual, haja vista
que o negócio jurídico foi realizado objetivando precipuamente a satisfação do
credor, não sendo razoável ampliar os sacrifícios do depositário a ponto de ele
ter de responder pelo transporte e perfeito acondicionamento da coisa móvel.
Caso o credor se recuse a receber a
coisa no lugar em que está depositada, ou então se negue a pagar os custos de
restituição, a fim de se exonerar de eventual responsabilidade pela mora,
incumbirá ao depositário a promoção da consignação em pagamento, nas formas dos
incisos I e II do CC 335. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 660-661 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/11/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Uma das obrigações do depositário,
conforme aponta Fiuza, é a de restituir a coisa depositada assim que reclamada
pelo depositante. O codificador de 1916 silenciou quanto ao local onde a coisa
deveria ser restituída. A doutrina, entretanto, já consagrou que a coisa deverá
ser devolvida no local combinado ou, na falta de estipulação, entretanto, já
consagrou que a coisa deverá ser devolvida no local combinado ou, na falta de
estipulação, no lugar do depósito. O CC/2002 corrige a omissão com o presente
artigo, pelo qual se determina que a restituição da coisa, salvo disposição em
contrário, deverá se dar no local em que tiver de ser guardada.
Por fim, acrescenta o novel dispositivo
que as despesas provenientes da restituição da coisa deverão correr por conta
do depositante. Isto porque o contrato de depósito é negócio feito no interesse
exclusivo do depositante, sendo, portanto, inadmissível exigir-se que o
depositário arque com as despesas provenientes da restituição do objeto. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 338 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 27/11/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Em regra, conclui Marco Túlio de Carvalho Rocha, o depósito é feito e
devolvido no mesmo lugar. Se houver determinação para que seja a coisa transportada
a outro lugar para a entrega, as despesas de transporte correm por conta do
depositante, salvo estipulação em sentido contrário. (Marco Túlio de
Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 27.11.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 632. Se a coisa houver sido depositada no
interesse de terceiro, e o depositário tiver sido cientificado deste fato pelo
depositante, não poderá ele exonerar-se restituindo a coisa a este, sem
consentimento daquele.
Na cartilha de Nelson
Rosenvald, a exemplo do que ocorre com a estipulação em favor de terceiros (CC 436
e 438), é facultado ao depositante efetuar a entrega da coisa ao depositário no
interesse de terceiros e não em proveito próprio. Temos aqui uma espécie de derrogação
do princípio da relatividade contratual, pois o depositário assumirá obrigações
perante uma pessoa que não integrou a relação negocial. A hipótese será vista
com nitidez nos casos em que o depositante se apresenta como um administrador
de bens alheios, cientificando o depositário da sua condição.
A norma é clara ao impor ao depositário
a obrigação de obter o consentimento do terceiro, mesmo quando pretenda
restituir o bem ao depositante. A falta de autorização impõe a obrigação do
depositário de indenizar o terceiro. a não ser que o depositante se reserve o
direito potestativo de substituí-lo, independentemente de sua anuência ou do depositário
(CC 438). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 661 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/11/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Atenção à observação
aplicada na doutrina de Ricardo Fiuza ‘na obrigatoriedade de o depositário
restituir a coisa depositada sofre as restrições elencadas pelo CC 633, (sombreado
pelo art. 1.216 do CC de 1916), quando excetuam-se o embargo judicial do bem, a
constrição judicial sobre a coisa e a suspeita motivada de o bem depositado ter
sido obtido por meio criminoso, e, ainda a do CC 644 (motivado no art. 1.279 do
CC de 1916), correspondente ao direito de retenção do depósito’. Ressalvadas
essas hipóteses para a recusa do depositário em restituir a coisa sob depósito,
e assente a obrigação de restituir como regra, caso haja, porém, da restituição
condicionada. Tal ocorre quando o depósito é feito no interesse de terceiro. tenha-se
o exemplo clássico de o depositante ser procurador ou administrador dos bens e
interesse de terceiros, procedendo, nessa qualidade, o depósito do bem. E certo,
ademais, que assumindo o depositário as obrigações concernentes à natureza do
contrato, e baste ciente do interesse de terceiro (podendo ser este
proprietário ou não do bem), não poderá exonerar-se da obrigação de restituir
sem que, previamente, aquele a cujo favor operou-se o depósito preste a sua
devida e necessária anuência.
A única hipótese de
exonerar-se o depositário da obrigação sem o consentimento do terceiro
interessado encontra-se prevista no CC 635, fazendo-se mister, porém, haja “boa
razão para romper o contrato, tal como a ocorrência de fato que obrigue o depositário
a viajar ou que, de qualquer maneira, torne impossível ou penosa a guarda da
coisa” (Silvio rodrigues, Direito civil: dos contratos e das declarações
unilaterais da vontade, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3, p. 261) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza
– p. 339 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 27/11/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Ratificando com Marco Túlio de Carvalho Rocha, há situações em que
o principal interessado no depósito da coisa é terceiro e não o próprio depositante.
Isto ocorre, por exemplo, quando o depósito da coisa é exigido por terceiro
como garantia de uma obrigação. A coisa depositada é, por exemplo, caucionada
se o depositário tiver conhecimento de que o depósito é feito no interesse de
terceiro, não pode devolver a coisa ao próprio depositante sem a autorização do
terceiro interessado, sob pena de responder por eventual prejuízo que este vier
a sofrer em razão do ato. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 27.11.2019, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).