quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 672, 673, 674 - Das Obrigações do Mandatário - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 672, 673, 674
- Das Obrigações do Mandatário - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 667 a 674) Seção II – Das Obrigações do Mandatário –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 672. Sendo dois ou mais os mandatários nomeados no mesmo instrumento, qualquer deles poderá exercer os poderes outorgados, se não forem expressamente declarados conjuntos, nem especificamente designados para atos diferentes, ou subordinados a atos sucessivos. Se os mandatários forem declarados conjuntos, não terá eficácia o ato praticado sem interferência de todos, salvo havendo ratificação, que retroagirá à data do ato.

Na leitura de Claudio Luiz Bueno de Godoy, sabemos, o dispositivo consagra as formas pelas quais se pode apresentar o mandato conferido, por um mesmo instrumento, a mais de um mandatário e que são: a) mandato solidário (in solidum), em que cada mandatário pode agir isoladamente, independentemente da ordem de nomeação; b) mandado conjunto (coletivo e simultâneo), em que os mandatários só podem agir juntos; c) mandato fracionário (ou distributivo), em que os mandatários recebem cada qual poderes distintos dos demais, para operações diversas; d) mandado sucessivo, em que os mandatários só atuam um na falta do outro, conforme a ordem de nomeação. Tal a mesma diferenciação que se continha no preceito do art. 1.304 do CC/1916.

A fundamental alteração, porém, está em que, no Código Civil anterior, se nada tivesse sido explicitado, o mandato a mais de um mandatário era considerado sucessivo. Já agora, ao revés, e como está no texto da norma vertente, o mandato conferido a mais de um mandatário, no silêncio, será considerado solidário. Se explicitamente se designarem mandatário de forma conjunta, assenta a lei a ineficácia do ato praticado sem a interferência de todos, ressalvando, todavia, a ratificação, que não se exige seja expressa e a qual, quando quis, o Código Civil exigiu (CC 667, § 3º). Já quanto ao mandato sucessivo, persiste o mesmo elastério extensivo quanto à falta daquele nomeado em primeiro lugar, e que justifica possa o seguinte agir. Cuida-se não só de não poder o primeiro mandatário desincumbir-se do encargo como também de não querer fazê-lo. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 696 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 18/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Enquanto em sua doutrina, Ricardo Fiuza apresenta o mandato, como visto, pode ser conferido a um ou mais mandatários, para a realização de um mesmo negócio, ou para atuações distintas, em negócios isolados. Quando se apresenta a pluralidade de mandatário, mister é saber como se declarou no contrato: se foram constituídos para agir isoladamente, ou em conjunto, e, depois de ultrapassado esse óbice, em que ordem podem exercer os poderes a eles imputados.

Quando dois ou mais mandatários forem nomeados num único instrumento para negócios distintos, não haverá problema algum, porque se conservam independentes, autônomos, agindo separadamente, cada qual cumprindo, sozinho, os poderes que lhe foram especificamente delineados no mandato, sem se importar com as atribuições daquele que, com ele, fez-se mandatário no mesmo instrumento contratual. E o chamado “mandato fracionário ou distributivo”, em que se estabelecem atribuições privativas, sem qualquer conexidade ou conjunção de poderes. Na realidade, nada os prende um ao outro, a não ser a unidade do ato que os constituiu. Relembre-se que tal distributividade deve vir positivamente declarada, sob pena de se reputar sucessivo o mandato.

Por outro lado, se, embora nomeados no mesmo instrumento, não se faz qualquer menção aos poderes de cada um, presumir-se-á que o mandato é sucessivo, no sentido de que um só poderá agir na falta do outro, segundo a ordem de nomeação. Para que o segundo mandatário possa executar o mandato, é preciso que o primeiro, não possa ou esteja impedido de fazê-lo. No silêncio da pluralidade de mandatários, presume-se a sucessividade, de modo, é claro juris tantum, a admitir a prova de que atuam em conjunto ou de que são solidários.

Se expressamente declarado no contrato que os mandatários são conjuntos ou simultâneos, não poderão agir separadamente, pois são solidários. Todavia, declarando-se textualmente que os vários mandatários são solidários, cada qual poderá praticar todos os atos independentemente do concurso dos demais ou de qualquer ordem de nomeação, como se fosse o único procurador. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 361 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 18/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na balada de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o mandato é singular ou plural conforme a outorga de poderes seja feita a uma só ou a várias pessoas. O mandato plural pode ser: a) Solidário (in solidum): autoriza que todos os mandatários ajam separadamente em nome do mandante; b) Substitutivo ou sucessivo: estabelece uma ordem de ação entre os mandatários, segundo a qual, um mandatário somente age na falta do que o antecede; c) Conjunto: exige que os mandatários ajam conjuntamente; d) Fracionário: atribui a cada mandatário uma esfera delimitada de atuação.

Se a procuração plural não estabelecer o modo como deve ser coordenada a atuação dos mandatários, o dispositivo manda presumir-se que seja solidário, isto é, que cada mandatário possa, sozinho, exercer todos os poderes de representação. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 18.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 673. O terceiro que, depois de conhecer os poderes do mandatário, com ele celebrar negócio jurídico exorbitante do mandato, não tem ação contra o mandatário, salvo se este lhe prometeu ratificação do mandante ou se responsabilizou pessoalmente.

Na visão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, com diferença apenas de redação, o CC 673 mantém o princípio que já se continha no art. 1.306 do CC/1916, mas que se completava pela disposição do art. 1.305, este não repetido. Vale dizer, no Código revogado dispunha-se, no primeiro dos preceitos citados, que o mandatário era obrigado a apresentar o instrumento do mandato (rectius: a procuração) a terceiros com quem negociasse, sob pena de responsabilidade pessoal por atos cometidos em excesso de poderes. Porém, no artigo seguinte acrescia-se que, apresentada a procuração, nenhuma responsabilidade teria o mandatário por atos excessivos se o terceiro conhecesse a extensão dos poderes conferidos. Apenas se ressalvava ação do terceiro contra o mandatário se este tivesse se obrigado a obter ratificação do mandante ou se tivesse se responsabilizado pessoalmente. Pois pese embora a ausência de reprodução do art. 1305, entende-se que a sistemática permaneça exatamente a mesma. Na regra do Código Civil, obrando o mandatário nos limites dos poderes recebidos, não se obriga pessoalmente, vinculando, pelo contrário, o mandante, em cujo nome tenha agido. Se age em seu próprio nome, mesmo no interesse do mandante, obriga-se, então, pessoalmente (CC 663). Se, da mesma forma, age sem poderes, com poderes insuficientes ou com excesso de poderes, também se obriga pessoalmente, sem qualquer vinculação para o mandante (CC 662, supra). Aí, coloca-se a disposição exceptiva em comento. Posto ausentes poderes, ou seja, mesmo agindo o mandatário além dos poderes recebidos (ultra vires), se disso tinha ciência o terceiro então, excepcionalmente, o mandatário deixa de responder pessoalmente. O terceiro passa a correr o risco de ter negociado com mandatário que excedia seus poderes, i.é, que de maneira geral não tinha poderes para aquele negócio, o eu era da sua ciência e o que, já antes inexistente qualquer ação ajuizável contra o mandante, não vinculado por ato a cuja consumação não outorgou poderes, atualmente passa a impedir qualquer demanda também contra o mandatário. O terceiro ciente do excesso apenas terá ação contra o mandatário se este tiver prometido a ratificação do mandante, quando então a hipóteses se regra pelo contido nos CC 439 e 440, ou desde que o mandatário se tenha responsabilizado pessoalmente, vale dizer, tenha se obrigado por si, malgrado no interesse, que seja, do mandante.

Tudo isso, todavia, faz sentido se se admite incumbir ao mandatário provar seus poderes, permitindo seu conhecimento a terceiro. daí aceder-se à assertiva de Sílvio de Salvo Venosa no sentido de que a regra do art. 1.305 do Código anterior, embora não repetida, foi absorvida pela disposição do CC 673, ora comentado (Venosa, Silvio de Salvo. Direito civil, 3. ed. São Paulo, Atlas, 2003, v. III, p. 273-4). E mais. Se, como se viu no comentário ao CC 653, o Código Civil de 2002 permanece a pressupor haja representação no mandato, então a regra do art. 1.305 do CC/1916 encontra-se perfeitamente reproduzida no CC 118, segundo o qual o representante deve provar sua qualidade e extensão dos poderes recebidos a terceiro, sob pena de responder pelos atos excessivos. Em diversos termos, se o Código Civil dispõe, já na parte geral, que os requisitos e efeitos da representação voluntária são os da parte especial (CC 120) e se, na parte especial, preceitua que o instrumento do mandato seja a procuração, mercê da qual, na verdade, outorga-se a representação, então o mandatário, que, na regra do Código, é também representante, deve provar sua representação (CC 118). Se não é representante, atua, mesmo que à conta do mandante, mas em nome próprio, aí obrigando-se pessoalmente (CC 663). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 697 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 18/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como leciona Ricardo Fiuza, o terceiro que, conhecendo plenamente os poderes do mandatário, com este celebrar contrato exorbitante desses poderes, agiu por sua conta e risco não tendo, por isso mesmo, ação nem com o mandatário se este lhe prometeu ratificação por parte do mandante, ou se responsabilizou pessoalmente pelo contrato -, nem conta o mandante, a não ser que este confirme o excesso cometido pelo mandatário.

Caso o mandatário se mantenha inerte quanto à prometida ratificação a ser efetuada pelo mandante, ao terceiro compete, então, acionar o primeiro, visando à indenização de todos os prejuízos decorrentes daquele contrato, assim também pelas perdas e danos suportados em razão da não ratificação. De igual modo, caberá ação do terceiro contra o mandante, quando este não cumprir a ratificação do excesso. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 361 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 18/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a regra contempla o princípio da boa-fé objetiva e interdita ao terceiro o venire contra factum proprium. Se mesmo tendo conhecimento de que o mandatário não possui poderes para a realização de determinado negócio em nome do mandante, vem o terceiro a realizar o negócio, terá agido com má-fé, salvo se o mandatário lhe tiver prometido a ratificação do mandante ou se tiver se responsabilizado pessoalmente, uma vez que o terceiro tenha agido de má-fé, a lei o proíbe de exercer pretensões ressarcitórias contra o mandatário.

O conluio entre o mandatário e o terceiro deve restar claramente provado, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa daquele em detrimento deste. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 18.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 674. Embora ciente da morte, interdição ou mudança de estado do mandante, deve o mandatário concluir o negócio já começado, se houver perigo na demora.

Na balada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a regra, inalterada em relação ao que dispunha o Código anterior, representa exceção à obrigação que tem o mandatário de suspender a execução do mandato, ou nem iniciá-la, se torna conhecimento de causa extintiva do ajuste. E, com efeito, dentre essas causas de extinção, expressas no CC 682, infra, estão a morte, interdição ou mudança do estado do mandante. Pois nessas específicas hipóteses extintivas do mandato, excepcionalmente deverá o mandatário concluir negócio já começado, desde que haja perigo da demora. Ou seja, dois serão os pressupostos pra que o mandatário, a despeito da extinção do mandato, ultime sua execução. Um, à evidência, se se menciona a conclusão do negócio, está em que a execução do mandato deve ter sido iniciada. Outro, o de que sua interrupção possa trazer prejuízo ao mandante ou seus sucessores, o que se quer evitar, como imperativo de lealdade que permeia as relações obrigacionais.

Veja-se, todavia, que, da mesma forma do quanto previsto no CC/1916, apenas diante das causas extintivas elencadas no preceito em comento é que afeta ao mandatário a obrigação de cumprir integralmente o mandato, quando iniciada sua execução e quando houver periculum no seu abandono. Não assim, portanto, quando concorra hipótese outra também de extinção do mandato, como a revogação ou renúncia, muito embora, quanto a esta última, se exija notificação a tempo de o mandante substituir o mandatário (CC 688). Sempre que se configurar situação em que o mandatário deva ultimar o negócio, e desde que ele o tenha omitido, ficará sujeito à composição dos prejuízos que seu inadimplemento provocar. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 698 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 18/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Assim, na doutrina explicada por Ricardo Fiuza, em verdade, como a lei preserva os interesses em jogo, deve o mandatário, mesmo sabendo do óbito, interdição ou mudança de estado do constituinte, ultimar o negócio já começado, desde que haja perigo na demora da substituição pelos herdeiros. Mesmo sabendo que as hipóteses extinguem, lindamente, o mandato, ainda persiste um dever fundamental a ser respeitado pelo mandatário, que é o da lealdade. Prosseguir no exercício do mandato, a despeito de configuradas tais situações, significa que o mandatário, de fato, preocupa-se em evitar prejuízos à parte interessada.

Sendo a orientação jurisprudencial, “o mandatário terá a obrigação de concluir, com lealdade, o negócio já começado, se houver perigo na demora, ou seja, se da sua inação advier grave dano para o mandante ou seus herdeiros, apesar de ter ciência da morte, interdição ou mudança de catado do mandante, causas de extinção do mandato. O procurador que assim não proceder, causando dano com sua omissão ao mandante, poderá ser responsabilizado por isso, devendo pagar perdas e danos”. E mais: “o perigo a que se refere o texto não é só o relativo ao mandante, ou seus sucessores; compreende também o daqueles com os quais contrata o mandatário”. (Arquivo Judiciário 97/71). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 362 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 18/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na balada de Marco Túlio de Carvalho Rocha, de acordo com o CC 682, a morte, a interdição ou a incapacidade superveniente do mandante determinam a extinção do mandato (incisos II e III). Tais fatos podem ocorrer em momento no qual a interrupção da execução represente prejuízos aos interesses dos sucessores do mandante. Exemplo: Em mandato outorgado para a venda de imóvel, o mandante falece após ter o mandatário realizado promessa definitiva. A extinção do mandato poderia impedir que a parte vendedora cumprisse a obrigação de outorga da escritura no prazo ajustado, sujeitando-a às sanções civis. A necessidade de complementação do negócio autoriza o mandatário à realização do ato em nome e por conta dos sucessores do mandante falecido. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 18.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 669, 670, 671 - continua - Das Obrigações do Mandatário - VARGAS, Paulo S. R.

Direito Civil Comentado - Art. 669, 670, 671 - continua
- Das Obrigações do Mandatário - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 667 a 674) Seção II – Das Obrigações do Mandatário –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 669. O mandatário não pode compensar os prejuízos a que deu causa com os proveitos que, por outro lado, tenha granjeado ao seu constituinte.

Na esfera de conhecimento de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a regra contida no artigo presente, desde o Código de 1916, em eu se a repetia, sofrer sempre a crítica da ociosidade, dado que, é curial, a compensação reclama, como um de seus requisitos, que as dívidas a compensar sejam recíprocas, i.é, entre credores e devedores que o sejam reciprocamente. Isso significa dizer que, salvo no caso de fiança, ninguém pode compensar crédito alheio com dívida sua. Pois é exatamente o que o artigo em comento dispõe. Os proveitos que o mandatário, na redação do preceito, granjeou em favor de seu constituinte não são seus. São do mandante. Por isso mesmo não lhe é dado socorrer-se desse proveito que não lhe pertence para compensar com dívida consistente no prejuízo que, na execução do mandato, tenha eventualmente provocado ao mandante. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 694 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Consoante com a Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, ao mandatário não cabe compensar os prejuízos a que deu causa e sobre os quais, por isso, é responsável, com as vantagens direcionadas ao seu constituinte, certo que lhe compete desenvolver a sua atividade, procedendo, estritamente, conforme os poderes recebidos.

Em verdade, considerando que os lucros e as indenizações possuem fundamentos distintos, a não ocasionar, necessariamente, a simultaneidade entre devedor e credor, veda-se a compensação, máxime porque, enquanto os primeiros estavam na expectativa normal do negócio, as segundas não estavam.

Consoante valiosa observação empreendida pelo digno Washington de Barros Monteiro, “essa disposição é ociosa: os proveitos pertencem necessariamente ao mandante; conseguintemente, o mandatário não pode contrapô-los aos prejuízos que causou e pelos quais é responsável; não é possível compensação alguma, porque pressupõe esta duas partes reciprocamente credoras e devedoras e, no caso, só o mandante é credor” (Direito civil – direito das obrigações. 2ª parte, 28. ed., 1995, p. 263). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 360 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Marco Túlio de Carvalho Rocha, os proveitos gerados pelo exercício do mandato pertencem ao mandante. O mandatário responde pelos danos que causar culposamente ao mandante. Se, a um só tempo, causar prejuízos por conduta em que haja culpa e obtiver proveito para o mandante, não pode compensar os valores, pois a atuação com culpa não lhe é autorizada. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 17.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 670. Pelas somas que devia entregar ao mandante ou recebeu para despesa, mas em pregou em proveito seu, pagará o mandatário juros, desde o momento em que abusou.

Na balada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo, inalterado em relação ao que o CC/1916 dispunha, determina a incidência de juros sobre importâncias que o mandatário haja indevidamente retido, quando deveria repassá-la ao mandante. Ou, da mesma forma, incidirão os juros sobre quantias que o mandatário haja recebido do mandante, para despesas com a execução do mandato, mas que tenha usado em proveito próprio. Trata-se de hipótese de abuso, portanto de desvio na execução do mandato. Os juros terão incidência desde o instante em que o mandatário haja aplicado somas do mandante em seu benefício sem necessidade de qualquer interpelação ou notificação. É preciso, pois, não confundir incidência de juros, desde o abuso, quando o mandatário se utilize dos recursos do mandante, indevidamente, em seu próprio proveito, com aqueles casos em que o mandatário haja caído em mora na entrega de montante ao constituinte, submetidos, assim, ao regramento geral a respeito instituído. Ou seja, incidirão juros sobre quantias não repassadas ao mandante, ainda que não utilizadas pelo mandatário, em seu próprio proveito, mas então com termo a quo conforme  as regras da constituição em mora, automática (ex re), se no ajuste fixado de antemão prazo para o repasse, ou mediante interpelação, se inexistente esse prazo (ex personae). A taxa dos juros será a legal (CC 406 e 407), a propósito remetendo-se aos respectivos comentários. Tudo sem prejuízo de que, além dos juros, seja o mandatário compelido a compor perdas e danos cuja ocorrência se demonstre. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 695 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, deve o mandatário remeter ao mandante o dinheiro a este pertencente. Se desviou a quantia recebida ou a utilizou em proveito próprio, inclusive a recebida para fazer face às despesas ordinárias, decorrentes do negócio, impõe-se como medida de boa-fé a restituição corrigida do quantum, desde o momento em que se locupletou.

Realmente, desde a aceitação do mandato, assume o mandatário obrigação de não fazer, qual seja, a de não se utilizar, impropriamente, das somas recebidas, que se destinarão, única e tão-somente, aos fins estipulados no mandato. Se se desviar da finalidade, viola o mandatário tal obrigação negativa, ficando constituído em mora, conforme o art. 961 do diploma civil de 1916, desde a prática do ato de que devia se abster. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 360 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob o prisma de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o mandatário deve prestar contas ao mandante. Neste dever, inclui-se o de entregar ao mandante o proveito que é de sua titularidade em razão de o negócio jurídico ter sido realizado em seu nome e por sua conta. A entrega deve ser feita imediatamente ou tão logo seja possível ao mandatário realizá-la. Salvo o desconto dos ressarcimentos que lhe são devidos, em nenhum caso pode o mandatário apropriar-se dos ganhos que obteve na execução do mandato. Se o fizer, ficará obrigado a ressarcir ao mandante os prejuízos sofridos por este em razão da demora e a pagar-lhe juros legais a contar do momento em que cometeu o abuso. A incidência dos juros não exclui, portanto, o direito do mandante ao ressarcimento por outros prejuízos que sofrer. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 17.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 671. Se o mandatário, tendo fundos ou crédito do mandante, comprar, em nome próprio, algo que devera comprar para o mandante, por ter sido expressamente designado no mandato, terá este, ação para obriga-lo à entrega da coisa comprada.

No entendimento de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo presente, que não encontra semelhante no Código revogado, cuidou de positivar princípio e consequência que, porém, já se entendia estivessem implícitos nas disposições dos arts. 1.301 e 1.307 do CC/1916, a par da explicitude do art. 152, mas do Código Comercial. Com efeito, mesmo antes da edição da novel legislação, já se considerava assistir ao mandante ação pra reivindicar do mandatário o que este houvesse adquirido e retido, no exercício do mandato, mesmo que a aquisição se tivesse dado em seu próprio nome. Sustentava-se, a respeito, que não se poderia conferir ao mandatário que tivesse adquirido, para si, bem em seu nome, quando devesse tê-lo feito em benefício do mandante, no exercício do encargo conferido, a escusa da titularidade da aquisição, eis que se estaria a permitir a alegação da própria infidelidade, da própria torpeza, o que o sistema repele (v.g., Marmitt, Arnaldo. Mandato. Rio de Janeiro, Aide, 1992, p. 220-1; Carvalho Santos, J.M. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. XVIII, p. 273).

Tratava-se, como ainda se trata, de verdadeira regra de equidade que, como aponta, em vertusto artigo, Ponciano Ferreira de Oliveira (São Paulo Judiciário, v. XXIII, ano VIII, maio/agosto de 1910, p. 427-43) remonta mesmo à lição de Pothier, muito embora abraçada pelo Código Comercial com ressalvas. É que, em primeiro lugar, exigia-se, como se deve exigir, a demonstração de que a aquisição pelo mandatário se tenha dado no exercício do mandato conferido, com outorga explícita de poderes para que fosse adquirido aquele específico bem.

Mais ainda, o Código Civil de 2002 exigiu também, na esteira do que fazia o art. 152 do Código Comercial – de que, em verdade, a regra em comento se origina -, que essa aquisição infiel pelo mandatário tenha ocorrido com fundos ou crédito pertencentes ao mandante. Tem-se, como se vê, condição de equilíbrio entre desapropriar o mandatário de bem, afinal adquirido em seu nome, e a infidelidade com que para tanto se houve. A opção equitativa e de ponderação, pelo legislador, foi a de abrir a possibilidade de reivindicar-se o bem do mandatário, posto que adquirido em seu nome, mas não quando com fundos próprios. Todavia, mesmo assim, ainda que não se demonstre a aquisição com fundos do mandante, a indenização dos prejuízos comprovadamente havidos será caminho sempre aberto. Afinal, ter-se-á ostentado conduta indevida do mandatário, infiel às instruções recebidas e aos poderes de que foi incumbido, solução que, de resto, e forte na lição de Duranton, já sustentava, no mesmo artigo, Ponciano Ferreira de Oliveira (idem, ibidem). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 695-696 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, cria-se, aqui regra nova, de lógica razoável, almejando, outrossim, a proteção do mandante para eventuais atos ímprobos, praticados pelo mandatário, em flagrante desrespeito à boa-fé e à fidúcia, caracteres inerentes à natureza do mandato. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 360 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como ensina Marco Túlio de Carvalho Rocha, o mandato pressupõe confiança do mandante no mandatário. Embora o mandato possa ser estabelecido do interesse de terceiros e até do próprio mandatário, há nele sempre presente a confiança de que será desempenhado em conformidade com os interesses daquele em nome de quem será exercido. Uma vez que o mandatário aceita a outorga de poderes para a realização de determinado negócio em benefício do mandante, fica tolhido de realizar o negócio para si, em detrimento dos interesses do mandante. Se, ao invés de realizar negócio em proveito do mandante, o fizer em proveito próprio, o mandante poderá reivindicar o bem correspondente que o mandatário adquiriu para si e que deveria ter adquirido para o mandante. O dispositivo cuida, especificamente, da compra. Por analogia, no entanto, é aplicável a qualquer negócio jurídico que implicar a aquisição de bens ou direitos, salvo se a natureza do negócio impedir, por ser personalíssimo. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 17.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 667, 668 - continua - Das Obrigações do Mandatário - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 667, 668 - continua
- Das Obrigações do Mandatário - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 667 a 674) Seção II – Das Obrigações do Mandatário –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 667.  O mandatário é obrigado a aplicar toda sua diligência habitual na execução do mandato, e a indenizar qualquer prejuízo causado por culpa sua ou daquele a quem substabelecer, sem autorização, poderes que devia exercer pessoalmente.

1º. Se, não obstante proibição do mandante, o mandatário se fazer substituir na execução do mandato, responderá ao seu constituinte pelos prejuízos ocorridos sob a gerência do substituto, embora provenientes de caso fortuito, salvo provando que o caso teria sobrevindo, ainda que não tivesse havido substabelecimento.

2º. Havendo poderes de substabelecer, só serão imputáveis ao mandatário os danos causados pelo substabelecido, se tiver agido com culpa na escolha deste ou nas instruções dadas a ele.

§ 3º. Se a proibição de substabelecer constar da procuração, os atos praticados pelo substabelecido não obrigam o mandante, salvo ratificação expressa, que retroagirá à data do ato.

§ 4º. Sendo omissa a procuração quanto ao substabelecimento, o procurador será responsável se o substabelecido proceder culposamente.

No estudo com Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo presente, tal como o anterior art. 1.300 do CC/1916, e seu caput inalterado, inaugura o elenco de obrigações do mandatário, resultantes do contrato de mandato, começando por determinar-lhe todo o zelo e cuidado necessário na execução do ajuste, assentando deva aplicar toda sua diligência habitual ao fazê-lo, o que se deve compreender como a diligencia média, esperável do homem médio, e não aquela que, insuficiente, possa ser a forma habitual de agir do mandatário a respeito de seus próprios negócios.

Além disso, na execução do mandato o mandatário não pode afastar-se das instruções recebidas do mandante, ressalvando-se a hipótese de tê-lo feito em proveito daquele. Assim, por exemplo, se o mandatário recebe instruções para adquirir determinado bem por um valor e o faz por preço superior, e se para alguns autores nesse caso fica privado até de compelir o mandante a receber o bem (v.g. Carvalho Santos, J. M. Código Civil brasileiro interpretado, 5.ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. XVIII, p. 233), para outros, o que se entende melhor, pode obriga-lo ao recebimento, mas respondendo, pessoalmente, pelo plus do preço.

A execução do mandato é indivisível, o que significa a obrigação do mandatário de cumpri-lo por completo, só sendo cogitável a suspensão ou parcial cumprimento se de acordo com as ordens recebidas ou se para evitar prejuízo ao mandante. Da esma forma se pode cogitar do descumprimento mesmo do mandato, todavia por tê-lo percebido o mandatário prejudicial ao mandante. Havido o desrespeito injustificável das obrigações elencadas, responde o mandatário pelos prejuízos que sua conduta houver provocado, o que se deve considerar mesmo no mandato gratuito, e não só no oneroso se, de toda sorte, a aceitação não é obrigatória e se o tratamento legal de ambos se deu de maneira unificada, com mesma existência de zelo e cuidado, por isso que, inclusive, inaplicável a disposição do CC 392 (em sentido contrário, admitindo responda o mandatário sem remuneração, mas mercê de culpa apreciada com menor rigor: Sílvio Rodrigues. Direito Civil, 28.ed. São Paulo, Saraiva, 2002, v. III, p. 293).

E se o mandato, para seu cumprimento, reclama conhecimento técnico do mandatário, deve-se presumi-lo se afinal aceito, por exemplo, não cabendo ao advogado valer-se da escusa, perante o mandante, de que desconhecia certa lei.

O mandato é contrato fiduciário, por isso que intuitu personae, o que significa admitir a obrigação que tem o mandatário de cumpri-lo pessoalmente. Porém, fazendo-se o mandatário substituir, na execução do ajuste, por outrem, o que se dá mediante o chamado substabelecimento (ver comentário ao CC 655), ou seja, a transferência dos poderes que recebeu, reservando-os também e simultaneamente para si, ou não (com ou sem reservas), três podem ser as situações: a) se o mandatário possui poder para substabelecer, os atos praticados pelo substabelecido vinculam o mandante e por eles o mandatário não responde, salvo se, como preceitua o § 2º em comento, tiver agido com culpa na escolha do substabelecido – por exemplo tratando-se de pessoa notoriamente negligente ou insolvente – ou nas instruções a ele dadas; b) se dentre os poderes conferidos ao mandatário não se explicita, mas nem se proíbe o de substabelecer, e, ao contrário do que previa o Código Comercial, nesta parte derrogado (art. 146), tem-se entendido, desde o CC/1916, possível o substabelecimento, não só pelo quanto disposto no caput do preceito em comento, afinal contemplativo da ocorrência de substabelecimento sem autorização, como também porque no CC 661 não exigidos poderes especiais para tanto, só que, então, hoje expressando o § 4º do artigo presente, do Código Civil de 2002, que o mandatário responderá, perante o mandante, pelos prejuízos que lhe forem provocados por qualquer ato culposo do substabelecido; c) se, por fim, ao mandatário se proibiu o substabelecimento, e ele, mesmo assim, o faz, de um lado não se vincula o mandante pelos atos praticados, salvo ratificação, e que, aqui, deverá ser expressa (§ 3º do artigo ora comentado, nesta parte inovado), de outro respondendo o mandatário pelos prejuízos provocados pelo substabelecido, posto que mercê de fortuito, ressalvada a prova de que toda a forma o evento teria sucedido, prova cujo ônus é a ele, substabelecente, afeto. A nova regra do § 3º do artigo em comento importa porquanto sempre se entendeu que, mesmo proibido o substabelecimento, se afinal efetuado, mas a quem, entretanto, acabava praticando ato nos limites dos poderes conferidos ao mandatário, obrigava o mandante. O substabelecimento proibido, portanto, apenas agravava a responsabilidade do mandatário-substabelecente. Agora, pretendeu o Código Civil de 2002 textualmente estabelecer que, se proibido o substabelecimento, não se obriga o mandante, a priori nem mesmo ressalvando os atos praticados nos limites dos poderes outros conferidos, podendo-se argumentar que, a não ser assim, a disposição seria ociosa, ante o que já preceitua o CC 662 atrás examinado. O que, de toda sorte, não deve ser infenso a crítica, bastando pensar em alguém substabelecido, mesmo proibida essa substituição, mas consumando exatamente o negócio que pretendia o mandante, malgrado por intermédio de seu mandatário. Todavia, o fato é que o Código Civil de 2002 parece ter querido igualar a situação do substabelecimento proibido à da falta de poderes (CC 662). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 693 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a Doutrina de Fiuza, como e sabido e ressabido, somente com a aceitação do mandato, ou seja, somente depois que a pessoa se constitui em mandatário de outrem, é que se estrutura, efetivamente, o contrato, derivado da conjunção de duas vontades, que visam ao mesmo resultado. Apenas a partir dessa aceitação, em perfeita contratação, é que o mandatário se vincula nos termos legais. A sua constituição nessa função, antes de sua anuência, configura mera proposta de contrato. Decorrente de ato exclusivamente unilateral, que justamente e ~ razão dessa precariedade pode não se concretizar.

Com a efetiva aceitação do mandato, surge para o mandatário a obrigação legal de aplicar toda diligencia e zelo necessários para o bom desempenho da atribuição que lhe foi cometida. Das insuspeitáveis balizas do mestre Sílvio Rodrigues extrai-se a lição de que à obrigação do mandatário, e que decorre da própria natureza deste contrato, é a de agir em nome do mandante, com o necessário zelo e diligencia, transferindo as vantagens que em seu lugar auferir, prestando-lhe, afinal, contas de sua gestão (Direito civil, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3 – Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade, p. 279).

A obrigação essencial do mandatário deve-se resumir ao fiel cumprimento do encargo a ele atribuído, com a habitual precaução e a observância de todas as instruções recebidas do mandante, até porque o mandato é contato que se assenta na confiança do segundo para com o primeiro, que deve praticar, do melhor modo possível, o encargo a ele incumbido. Em outras palavras, “o mandatário deverá prestar a mesma diligência que empregaria se fosse realizar um negócio que lhe pertencesse” (RT 1011626; RF 87/693).

A despeito do caráter intuitu personae do mandado, cuja execução compete, pessoalmente ao mandatário, a lei lhe autoriza, sem qualquer solução de continuidade, convocar, ou melhor encarregar terceiros de seu cumprimento, pela realização, seja de alguns, seja de todos os atos competentes – contanto que a natureza do negócio não exija a sua atuação pessoal. Nessas situações, pode o mandatário transferir os poderes a ele conferidos mediante substabelecimento, mas continua responsável perante o mandante por qualquer prejuízo causado por culpa sua ou do seu substabelecido, exceto quando expressamente autorizado o substabelecimento.

Se, mesmo com a proibição expressa do mandante, vedando a substituição, o mandatário substabelece, transferindo a outrem os poderes que lhe tenham sido confiados, responderá por todos os prejuízos advindos dessa proibida substituição em desfavor do constituinte, inclusive aqueles decorrentes de caso fortuito, a menos que comprove que o caso teria ocorrido se não houvesse que o caso teria ocorrido se não houvesse o malsinado substabelecimento.

Como visto, é sempre possível substabelecer, variando apenas as consequências; não há nenhuma hipótese a impossibilitar o substabelecimento do mandato, pois, mesmo quando expressamente proibida a substituição, o mandatário pode fazê-la. o que vai acontecer, na realidade, é uma espécie de gradação para se aquilatar a responsabilidade deste último, consoante haja, ou não, a vedação explícita de substabelecer. Impõe-se colher, neste particular, ensinamento do ilustre Orlando Gomes, que averba: “Havendo proibição, ainda assim não estará tolhido de substabelecer, mas sua responsabilidade se agrava. Nesse caso, responde até pelos prejuízos resultantes de caso fortuito, a menos que prove sobreviriam ainda não houvesse substabelecimento” (Contratos, 8. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1981, p. 417).

Se a substituição, porém, é consentida, autorizada, o mandatário não terá nenhuma responsabilidade pela conduta desastrosa do substabelecido, salvo se houver incorrido na chamada culpa in elegendo, ou seja, se, ao fazer a escolha do preposto, escolher mal, arregimentando pessoa desprovida das qualidades essenciais ao desempenho da substituição, circunstância presumida e previamente por ele conhecida.

Caso a proibição de substabelecer conste da própria procuração, os atos praticados pelo substituto não vinculam o mandante, salvo se ratificados posteriormente pelo mandatário, quando este responderá perante terceiros eventualmente prejudicados. Vale dizer, as pessoas com quem contratar não terão ação contra o mandante, mas apenas diretamente contra o mandatário.

Quando a procuração for omissa quando à possibilidade de substabelecimento, nem o permitindo, nem o proibindo, o mandatário que vier a substabelecer somente responderá se o substituto laborar com culpa. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 359 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o mandatário é obrigado a exercer os poderes que recebeu do mandante segundo a diligencia que lhe própria e que usualmente emprega em seus próprios negócios. A responsabilidade do mandatário segue a regra geral, isto é, ele somente responde civilmente por prejuízos que causar culposamente. Desse modo, se o mandatário contrata com pessoa insolvente, somente será pessoalmente responsável se, pelas circunstâncias, poderia e deveria ter conhecimento da situação do terceiro contrato.

O dispositivo regula, igualmente, a responsabilidade do mandatário em razão de substabelecimento. Há três situações possíveis: a) se o substabelecimento foi permitido, o mandatário somente responde por prejuízos causados elo substabelecido por culpa in elegendo, isto é, se ele, mandatário, tiver escolhido mal a pessoa a quem substabeleceu (§ 2º); b) Se o mandato é omisso quanto à possibilidade de substabelecer, o mandatário responde sempre que o substabelecido tiver causado prejuízo ao mandante agindo com culpa (§4º); c) Se o substabelecimento for vedado o mandatário responde até por caso fortuito (§ 1º) e os atos praticados pelo substabelecido não obrigam o mandante (§ 3º). (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 16.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 668. O mandatário é obrigado a dar contas de sua gerência ao mandante, transferindo-lhe as vantagens provenientes do mandato, por qualquer título que seja.

No lecionar de Claudio Luiz Bueno de Godoy, outra obrigação que o Código Civil impõe ao mandatário, decorrente do contrato de mandato, e na mesma esteira do que já fazia o Código anterior (art. 1.301), é a de prestar contas de sua gestão ao mandante. A propósito, vale não olvidar que o mandatário é alguém que atua no interesse alheio, gere interesse de outrem, por isso que lhe sendo imposto o dever de prestar contas. Essa prestação em regra se dá ao cabo do mandato, vale dizer, quando cumprido o encargo. E com ela se tem por integralmente executado o ajuste. Quer isso dizer que o negócio ou os negócios para os quais outorgado o mandato, vale dizer, quando cumprido o encargo. E com ela se tem por integralmente executado o ajuste. Quer isso dizer que o negócio ou os negócios para os quais outorgado o mandato podem já ter sido consumados que, ainda assim, sem a final prestação de contas o contrato não haverá sido cumprido por completo. Prestações de contas parciais ou antes do término do contrato podem ocorrer conforme o que se tenha ajustado. Mesmo a exoneração do mandato, isto é, a liberação do encargo, não implica a liberação da prestação das contas, que não pode ser presumida. Muito embora a prestação de contas seja inerente ao mandato, eis que contemplativo de hipótese de gerencia de interesse alheio, nada impede que dela seja dispensado o mandatário, por ato do mandante, a quem cabe o direito de exigi-las e que, afinal, dele pode dispor, mesmo por liberalidade.

Caso natural de inexistência de prestação de contas é o da procuração em causa própria, nem bem um mandato, como se verá, assim como o da outorga feita por marido e mulher casados no regime da comunhão universal, quando se esteja a gerir, em última análise, interesse que é comum, portanto quando o seja (a respeito, ver, por todos: De Plácido e Silva. Tratado do mandato e prática das procurações. Rio de Janeiro, Forense, 1989, v. II, p. 764).

Tem-se entendido que a obrigação de prestar contas se transmite aos herdeiros do mandatário.

Por fim, prestadas as contas e apurada vantagem resultante da execução do mandato, deve toda ela ser transferida ao mandante. Explicita a lei que todo e qualquer proveito decorrente do mandato deva ser entregue ao mandante, por exemplo, quando se vende coisa por preço superior ao que foi estipulado pelo mandante, impondo-se a entrega do que sobejar – bem diferente do que se dá no contrato estimatório (CC 534). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 694 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No lecionar de Bonijuris.com.br online, acessado em 15/12/2019, tem-se um artigo intitulado “Direito de exigir prestação de contas do mandatário transmite-se aos herdeiros do mandante” publicado em: 14/05/2012, diz:

Os herdeiros do mandante podem exigir prestação de contas do mandatário constituído pelo falecido. A tese, firmada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ, define que o dever de prestar contas subsiste após a morte do mandante. O relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, atendeu a recurso dos herdeiros, que questionavam decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).

O dever de prestar contras no contrato de mandato está previsto no artigo 668 do Código Civil. Porém, o contrato, por ser personalíssimo, extingue-se com a morte de alguma das partes. A Terceira Turma já se posicionou no sentido de que o espólio do mandatário não está obrigado a prestar contas ao mandante (REsp 1.055.819). Naquele caso, ficou estabelecido que é impossível “obrigar terceiros a prestar contas relativas a atos de gestão dos quais não fizeram parte”.

Porém, em situação inversa, afirmou Sanseverino, quando se questiona o direito de os herdeiros exigirem a prestação de contas do mandatário, não há óbice. “O dever de prestar contas decorre diretamente da lei, não havendo qualquer vinculação à vigência do contato” expôs o ministro.

O caso do recurso julgado trata de mandato de alienação de imóvel, em que o prazo prescricional da ação de prestação de contas somente se deflagra após a realização de seu objeto. Esse entendimento foi firmado no julgamento do REsp 474.983.

O ministro Sanseverino observou que, “se a prescrição somente começa a fluir após a extinção do mandato, é porque a obrigação de prestação de contras subsiste após o término da relação contratual”.

Sucessão

Em outro ponto, e que o TJMG encampou a ideia de que não se poderia exigir prestação de contas porque os herdeiros não possuiriam vínculo negocial com o mandatário, o ministro relator também discordou. Para Sanseverino, não se pode esquecer que os herdeiros ficam automaticamente investidos na titularidade de todo o acervo patrimonial do morto, no qual se inclui eventual crédito do falecido mandante contra seu mandatário.

“Portanto, o vínculo jurídico que se reputou inexistente, na verdade, surgira na data da abertura da sucessão, ou seja, no momento da morte do mandante”, concluiu. Com isso, a Turma atendeu ao recurso e determinou o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau para o processamento da ação de prestação de contas.

(...) Destarte, com base nos fundamentos, conclui-se que o direito de exigir prestação de contas do mandatário tramite-se aos herdeiros do mandante, sendo de rigor o acolhimento da pretensão recursal para afastar a extinção do processo, decretada nas instâncias ordinárias.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para, afastadas as preliminares de ilegitimidade e de ausência de interesse recursal, determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para o regular processamento da ação de prestação de contas. É o voto.

No ritmo de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o mandatário tem, em regra, o dever de prestar contas ao mandante, o que inclui o dever de transferir ao mandante as vantagens obtidas no uso dos poderes que recebeu, uma vez que agiu em nome e por conta do mandante. A prestação de contas inclui o desconto de eventuais créditos que possuir o mandatário em relação ao mandante (CC 664). A dispensa do dever de prestação de contas deve ser expressa. Pode ser anterior ou posterior ao cumprimento do mandato.

O STJ entende que o dever de prestar contas extingue-se com a morte do mandatário e, por isso, não passa aos herdeiros deste (REsp 1.055.819). Tal solução não tem amparo no sistema, uma vez que a prestação de contas é dever de natureza patrimonial e, portanto, não personalíssimo. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 16.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 665, 666 - Do MANDATO - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 665, 666
- Do MANDATO - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 653 a 666) Seção I – Disposições Gerais –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 665. O mandatário que exceder os poderes do mandato, ou proceder contra eles, será considerado mero gestor de negócios, enquanto o mandante lhe não ratificar os atos.

A regra do artigo presente, sob prisma de Claudio Luiz Bueno de Godoy, complementa aquela que se contém no CC 662 logo antes examinado, impondo-se o exame e interpretação conjuntos de ambos os preceitos. Quer isto dizer, de um lado, que persiste o princípio geral de que alguém não se vincula por atos que outrem tenha praticado em seu nome sem poderes para tanto, sem poderes suficientes ou além dos poderes conferidos, senão quando havida ratificação, expressa ou tácita. De outro, insta compreender de forma extensiva o comando do CC 665, atinente não só à situação do mandatário que atua em excesso de poderes como também daquele que atua sem os mesmos poderes suficientes que, assim, e sem a ratificação, será considerado mero gestor de negócios. Afinal, quem atua além dos poderes recebidos atua sem poderes ou sem poderes suficientes para a prática daquele determinado ato.

Ainda mais, a interpretação conjunta dos preceitos citados leva à conclusão de que, se o mandatário abusa dos poderes, ou seja, age nos seus lindes, porém contra o interesse do mandante, este só não se vincula se o conflito for ou devesse ser do conhecimento do terceiro com quem se negocia, como, de resto, e a todo esse propósito, já se viu no comentário do CC 662, a que se remete.

Mas, enfim, dizer que quem age por outrem sem poderes, sem poderes suficientes ou com excesso de poderes será considerado mero gestor de negócios significa explicitar a vinculação pessoal deste que atua perante terceiros com quem negocia, mas também significa, de outra parte, ressalvar direito a ressarcimento se a gestão tiver sido útil e tiver trazido proveito ao mandante. É o que se estatui no capítulo próprio da gestão de negócios (ver comentários aos CC 871 a 875) e, mais, é a mesma regra que se faz explícita no CC 695, parágrafo único, que trata, justamente, da comissão exercida com excesso, espécie contratual a que, a rigor, são aplicáveis os mesmos princípios do mandato, como se verá (cf. comentários dos CC 693 e 709). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 690 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na esteira de Ricardo Fiuza, sabe-se, em demasia, que a responsabilidade exprime o dever jurídico em que se coloca a pessoa, seja em virtude de contrato, seja em face de fato ou omissão que lhe sejam imputados, pra satisfazer a pretensão convencionada ou para suportar o encargo, que lhe é imposto. A par desse axioma, observa-se que a responsabilidade atribuída ao mandatário fundamenta, em relação ao mandante ou ao terceiro, o direito de exigir dele o cumprimento da obrigação que se lhe impunha. Vale dizer que a responsabilidade do mandatário concerne, a rigor, à própria execução do mandato, ou resulta da má execução dele.

Além de serem inidôneos, para vincular o mandante, os atos do mandatário praticados após a extinção do mandato (RT 173/886), o mandatário que exceder os limites do mandato, ao assumir obrigações com terceiros, sem que haja ratificação do mandante, estará obrigado, perante estes, a responder, pessoalmente e a qualquer tempo, pelo excesso cometido (Iff 445/178), reputando-se como mero gestor de negócios.

Deve o mandatário assumir e solver as despesas e encargos decorrentes dos atos que praticou com excesso de poderes, ou mesmo daqueles praticados em contratos que em tal situação firmou, caso não tenham sido ratificados pelo mandante. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 357 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na balada de Marco Túlio de Carvalho Rocha, se uma pessoa age em nome e por conta de determinada pessoa, sem ser autorizada por esta, seus atos conformam gestão de negócios. A gestão de negócios é ato jurídico lícito ou ilícito, conforme as condições em que se dê. Se o dono do negócio ratificar o ato praticado em seu nome e por sua conta, a gestão transforma-se em mandato com efeitos retroativos ao momento da realização do ato.

Do mesmo modo ocorre no caso de o mandatário exorbitar os poderes que lhe foram conferidos. Considera-se, em relação aos atos exorbitantes, mero gestor. Tais atos exorbitantes não vinculam o mandante enquanto não convalidados. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 13.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 666. O maior de dezesseis e menor de dezoito anos não emancipado pode ser mandatário, mas o mandante não tem ação contra ele senão de conformidade com as regras gerais, aplicáveis às obrigações contraídas por menores.

Como reza Claudio Luiz Bueno de Godoy, manteve o Código de 2002 a regra, contida já na disposição do art. 1.298 do CC/1916, permissiva da outorga de mandato a um específico relativamente incapaz, ou seja, o menor entre 16 e, agora, 18 anos, quando se completa a maioridade civil, isso independentemente da manifestação de vontade de seu assistente. O pressuposto do comando estava, como a inda está, na consideração de que o menor relativamente incapaz, enquanto mandatário, gere interesses alheios, assim comprometendo patrimônio que não é seu, portanto sem causa suficiente à incidência dos preceitos protetivos que inspiram todo o regramento das incapacidades.

Mais, e na mesma esteira, desde o Código Civil anterior, o que se mantém no atual, estatui-se que o mandante, a quem é afeto o fisco de outorgar poderes ao chamado menor púbere, mas porque nele deposita confiança, característica do mandato, não tenha contra ele qualquer ação pelo mal cumprimento do encargo que lhe foi cometido, segundo a lei cabendo tão somente ações conformes às regras gerais aplicáveis contraídas pelo menor. A propósito, sempre exemplificou a doutrina com a ação de enriquecimento sem causa ajuizável pelo mandante contra o mandatário menor que se tenha beneficiado, pessoalmente, no desempenho do mandato. Devem ser acrescentadas, porém, hipóteses em que o menor retenha consigo, indevidamente, bens do mandante, ou sempre que ele tenha agido com dolo, como adverte Arnaldo Marmitt (Mandato. Rio de Janeiro, Aide, 1992, p. 134), afora a incidência da regra geral contida no CC 180.

Superada, com a unificação das obrigações civis e comerciais, vale dizer, com o tratamento unificado das obrigações e, dentre elas, dos contratos, revogada a primeira parte do Código Comercial, a discussão sobre se o mandatário mercantil podia ser menor, em face do que se continha no dispositivo genérico do art. 129, I, da Lei Comercial, mas que muitos já consideravam inaplicável ao mandato mercantil (v.g., DE PLÁCIDO E SILVA. Tratado do mandato e prática das procurações. Rio de Janeiro, forense, 1989, v. I, p. 135).

Problema, na verdade, havia e ainda há na consideração sobre se a norma presente deve ser considerada excepcional e, assim, excludente da possibilidade de outorga de mandato a menor púbere, o Código Civil exclui, ao revés, a outorga a outros incapazes, ao menos de sorte a que se vincule o mandante, perante terceiros, por atos de que incumbido o mandatário incapaz. Por exemplo, sustenta De Plácido e silva (op. cit., p. 127-33) que, a rigor, o princípio, em relação aos demais incapazes, na sua visão mesmo os que o sejam de forma absoluta, não é diferente daquele que ilumina o preceito vertente. Afinal, a seu ver, se o mandate escolhe e confia poderes ao incapaz, qualquer que seja a incapacidade, não lhe pode ser dado valer-se dessa circunstância para subtrair-se aos efeitos do negócio ajustado. E mesmo sob a perspectiva do incapaz, persiste o mesmo pressuposto de que não obriga o próprio patrimônio, na exata medida em que gere interesse alheio, por isso, enfim, a crítica no sentido de que a opção do Código Civil deveria ser uniforme a esse respeito. Isso sem contar especificamente a situação do pródigo, a quem só se vedam os atos de alienação e gravação, enfim, de comprometimento de seu próprio patrimônio, também o que não se dá com o mandato. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 691 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Antes do comentário à Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, há um histórico apontando que, da análise do presente, verifica-se que a redação original do dispositivo, tal como for enviado ao Senado, apresentava-se nos seguintes termos:

“Ai. 666. O maior de dezesseis e menor de vinte e um anos não emancipado pode ser mandatário, mas o mandante não tem ação contra ele senão de conformidade com as regras gerais, aplicáveis às obrigações contraídas por menores”. Emenda da lavra do eminente Senador Josaphat Marinho compatibilizou o dispositivo com a nova redação dos ais. 42, 52 e 1.548 do projeto, no que se refere à diminuição da maioridade civil de vinte e um para dezoito anos.

Nessa toada, como bem justificou o ilustre senador Galvão Modesto, autor da emenda n. 1, “A tendência prevalecente é no sentido de fixar a maioridade civil em dezoito anos. Assim a estabelecem o Código Civil italiano, de 1942, (ai. 2 -), o português, de 1966, com as alterações de 1977 (ai. 130), o francês, com as inovações da Lei de 1974 (art. 488). Esta é a consagração, também, da Constituição espanhola de 1978 (art. 12). Acresce que nossa Constituição prestigia essa tendência. Restringe a inimputabilidade penal aos menores de dezoito anos, sujeitando-os a legislação especial (art. 228). Considera o alistamento eleitoral e o voto obrigatórios para os maiores dessa idade e facultativos para os maiores de dezesseis anos (ai. 14, § P, I e II. c). E estipula a idade de vinte e um anos como condição de elegibilidade ‘para deputado federal, deputado estadual ou distrital, vice-prefeito e juiz de paz’, bem assim a de 18 para vereador (ai. 14, § LV, VI, c e d), o que corrobora a fixação da maioridade aos dezoito anos. Essa inclinação legislativa repousa, também, na certeza de que os meios de comunicação tramitem, permanente e crescentemente, conhecimentos e informações, que ampliam o poder de observação das pessoas e de discernimento dos fatos. Há de presumir-se, mesmo, que assim se teria orientado o Projeto, se sua elaboração houvesse sido posterior à Carta de 1988”.

Corresponde ao art. 1.298 do CC de 1916, obviamente com a alteração da sobredita antecipação da maioridade civil.

Dentro da doutrina, o insigne e saudoso mestre Clóvis Beviláqua, de antanho, já discordava dessa medida, julgando-a inoportuna e desnecessária, ao argumento de que “nem há necessidade de recorrerem os mandantes aos menores para os encarregarem de seus negócios, porque melhor os podem gerir os maiores” (apud De Plácido e Silva. Tratado dos mandatos e prática das procurações. Rio de Janeiro. Forense, 1963, v. 2, p. 145).

Todavia, não se afigura razoável dita objeção, porque, em verdade, a própria essência do mandato não se contrapõe à instituição de mandatário em nome do relativamente incapaz, a exemplo dos menores púberes não emancipados, para praticar atos sob responsabilidade do mandante. Isso em razão de que, instituindo-se menor púbere como mandatário, não se apronta a função basilar do mandato, certo que o relativamente incapaz não age por si, mas como intermediário, em nome e sob responsabilidade do mandante, permanecendo, daí, isento de qualquer responsabilidade perante terceiros, desde que não atue com excesso de poderes.

Dessa regra pode-se afirmar que, na realidade, o mandatário não contrata efetivamente, pois as obrigações surgidas de sua atuação e os consequentes riscos de não se poder exigi-las correm à conta do mandante. Bem é dizer: não se toma em consideração a capacidade do mandatário, eis que este, ao tempo em que obriga diretamente o mandante, não se obriga ele próprio pela operação contratada. Realmente, para o terceiro, é irrelevante que o mandatário seja, ou não, capaz de contratar, porque quem vai responder, ao final é o mandante. Basta apenas verificar se o mandante é capaz de outorgar o mandato e se o ato a ser praticado pelo mandatário não excedeu os limites do instrumento.

Aviventa-se, neste contexto, a expressiva lição de Serpa Lopes: “o menor relativamente incapaz que for designado mandatário não responderá por perdas e danos em consequência da má execução que venha a dar ao mandato recebido, nem dele se pode reaver qualquer elemento patrimonial em composição do dano produzido. Todavia, isso não importa converter uma medida de proteção em acobertação de enriquecimento ilícito” (apud José Lopes de Oliveira. Contratos. 1. ed., Recife. Livrotécnica, 1978, p. 183). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 358 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Marco Túlio de Carvalho Rocha, maior de dezesseis anos e menor de dezoito anos não emancipado é relativamente incapaz. Tal condição permite que ele, em regra, realize atos jurídicos devidamente assistido.

Pode, no entanto, assumir a condição de mandatário e cumpri-la sem a necessidade de qualquer assistência. A excepcionalidade deve-se ao fato de o mandatário não ser, a rigor, a fonte última da vontade a ser manifestada no negócio a que se destina o mandato. Fonte da manifestação de vontade é o mandante. É também o mandante quem sofre as consequências dos atos que tiver autorizado o mandatário a realizar em seu nome. Assim, a capacidade plena do mandante, ou a incapacidade do mandante suprida pelo representante legal deste, é garantia de que os poderes outorgados dizem respeito a atos que se conformam à consciência e à vontade interna do mandante. O mandatário é mero condutor dos desideratos do mandante e o relativamente incapaz, maior de 16 anos, menor de 18 anos, possui maturidade suficiente para comunicar a vontade do mandante a terceiros. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 13.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).