terça-feira, 19 de maio de 2020


Direito Civil Comentado - Art. 981, 982, 983 - continua
Da Sociedade - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Do Direito de Empresa
Título II – DA SOCIEDADE (Art. 981 ao 985) Capítulo Único – Disposições Gerais
– vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

Aos neófitos e aos pesquisadores que desejam realmente fazer um bom trabalho e se orgulharem do que fazem, prestem atenção: Se um título para um determinado trabalho tem, por exemplo, cinco artigos, como este, onde aqui só contém três, porque existe um limite de caracteres que o site aceita, para que o seu trabalho fique completo, você tem obrigação de se esforçar um pouco e buscar o conhecimento e os comentários sobre os outros dois artigos, que os levarão à glória. Nota do Editor: Vargas Digitador (VD).

Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.

Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados.

No entender de Barbosa Filho, o contrato de sociedade apresenta peculiaridades internas e funcionais extremamente importantes, que lhe garantem atenção especial do legislador, estabelecido grande número de regras próprias a tal negócio jurídico e o deslocamento de sua disciplina para o Livro II do Código Civil, distante dos demais contratos, em razão de sua vinculação com a criação do empresário coletivo.

O presente artigo fornece um conceito inicial, uma definição primária, que encontra consonância no art. 1.363 do Código Civil 1916, fornecendo cada um dos elementos fundamentais à caracterização de tal tipo contratual. Trata-se de um negócio jurídico, conquanto sujeitos de direito, atuando a partir de sua vontade livre e consciente, declaram sua vontade e escolhem, por si mesmos, os efeitos derivados, mas, diferentemente da maioria dos demais contratos, os interesses dos contratantes são concorrentes, i. é, apresentam idêntico direcionamento, perseguindo-se a união de esforços comuns. Vendedor e comprador, locador e locatário, mutuário e mutuante, por exemplo, contrapõem-se; as prestações devidas são destoantes e condicionam condutas contrastantes. Ao contrário, aqui, os interesses conjugados não são colidentes. A cooperação e a identidade qualitativa das prestações exigidas dos contratantes singularizam a sociedade, não sendo possível enquadrar o presente contrato como unilateral ou como bilateral. Todos os contratantes se obrigam a fornecer uma contribuição patrimonial, sob a forma de bens ou serviços para que seja viabilizada a realização de uma atividade econômica (empresarial ou não) e, executado o contrato, ao final, seja obtido um resultado, correspondente aos ganhos ou às perdas patrimoniais decorrentes do sucesso ou do insucesso no exercício dessa mesma atividade. Persiste uma plurilateralidade, nascendo, do contrato de sociedade, vínculos múltiplos e idênticos entre todos os contratantes. Como elementos essenciais do contrato de sociedade, cinco devem ser elencados:

a) As partes contratantes são, nesse tipo contratual, chamadas de sócios e correspondem aos sujeitos de direito (pessoas físicas ou jurídicas) que, declarando sua vontade, assumem o dever de contribuir e conjugar esforços visando à proporcional divisão do futuro resultado. São necessários, ao menos, dois sujeitos de direito para contratar sociedade. Não há contrato de sociedade sem a pluralidade de sócios, podendo ela, apenas excepcional e temporariamente, ser superada, diante do interesse social na preservação da integridade da atividade econômica realizada;

b) o consentimento constitui um elemento comum a todo negócio jurídico e, aqui, apresenta-se sob uma roupagem particular e diferenciada, dada a conjugação de vontades idênticas, nomeada affectio societatis. Essa conjugação precisa subsistir não somente no momento da celebração do contrato de sociedade, mas no curso de toda sua execução e até sua extinção, ou seja, até a dissolução da sociedade. Quando da celebração, a affectio societatis nasce e, depois, se renova continuadamente, subsistindo enquanto os sócios entendem ser de seu interesse a manutenção do vínculo que os une;

c) uma atividade-fim, chamada objeto social, é sempre eleita pelos sócios, no momento da celebração do contrato, para ser empreendida e concretizada, constituindo elemento fundamental de sua agregação. O objeto social pode oferecer maior ou menor extensão, conforme os sócios entendam mais conveniente concentrar a atividade econômica exercida ou dispersá-la. Os sócios ostentam liberdade para tanto, mas, uma vez estipulado um objeto social, ele cria um limite para a atuação no âmbito do contrato de sociedade, não podendo ser utilizado o esforço comum reunido para uma atividade não escolhida como final;

d) há, na sociedade, o agrupamento de bens, fornecidos pelos sócios e destinados à realização do objeto social, conformando o capital social. Tais bens apresentam natureza diversa (corpóreos e incorpóreos, moveis e imóveis, fungíveis e infungíveis etc.) e podem estar dispersos ou reunidos, sendo organizados e escolhidos conforme a necessidade de eficiência no empreendimento da atividade-fim eleita pelos sócios;

e) a duração do contrato de sociedade, como ressaltado pelo parágrafo único, é bastante variável, devendo ele ser executado dentro de um período de tempo determinado ou indeterminado, conforme o interesse das partes. Há sociedades efêmeras e outras de longa duração, que subsistem por anos, décadas ou séculos. Em todos os casos, trata-se do mesmo tipo contratual, o qual, em geral, apresenta uma execução continuada. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 992-993 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua doutrina, Ricardo Fiuza conceitua sociedade, remontando-a ao Código de Manu (Índia, 1400 a.C.), o qual estabelecia que, “Quando vários homens se reúnem para cooperar, cada um com seu trabalho, em uma mesma empresa, tal é a maneira por que deve ser feita a distribuição das partes” (art. 204). A sociedade, assim, é um contrato bilateral ou plurilateral em que as partes, ou seja, os sócios, combinam a aplicação de seus recursos com a finalidade de desempenhar certa atividade econômica, com a divisão dos frutos ou lucros por ela gerados. Três são os elementos essenciais da sociedade definidos por este CC 981: 1) a reunião de recursos, sob a forma de capital ou de trabalho, com cada sócio colaborando na sua formação; 2) o exercício em comum de atividade produtiva; e 3) aí partilha ou divisão dos resultados econômicos da exploração da empresa. De acordo com o parágrafo único do CC 981 a sociedade pode constituir-se tanto para executar um objeto delimitado como para desempenhar uma atividade econômica contínua. Esse preceito procura alcançar, simultaneamente, a ideia de unidade e pluralidade no ato de constituição da sociedade. O elemento subjetivo da norma indica que pode integrar uma sociedade qualquer pessoa, seja ela física ou jurídica. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 513, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na cooperação de José Carlos Fortes, modernamente o código em seu artigo 981 trás o conceito básico de sociedade em sentido amplo, não se vinculado neste caso somente ao aspecto empresarial. Assim, pelo diploma legal, celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.

Pelo exposto, identificamos que não há nem proibição e nem exclusividade quanto ao tipo de pessoas. Portanto, pode compor a sociedade na condição de sócios, tanto pessoas físicas (naturais), quanto pessoas jurídicas.

Por outro lado, pelo conceito legal, as pessoas não são sócias da sociedade. De forma substancial, na sociedade as pessoas são verdadeiramente sócias umas das outras, diferente do que ocorre com as associações em que cada participante é associado da entidade.

Na mesma ótica da vinculação do associado de uma entidade, está tendendo o acionista das companhias (Lei das Sociedades Anônimas n. 6.404/76 –). Nelas as pessoas não são acionistas umas das outras e sim, acionistas da empresa. Alguns defendem que a própria identificação “companhia” é mais adequada do que “sociedade anônima”, pois para este tipo jurídico a rigor não haveria sócios e sim acionistas. (José Carlos Fortes, Portal da Classe Contábil, classecontabil.com.br, publicado em 2011, Novo Código Civil reflexos nas atividades empresarial e contábil 9ª parte, acessado em 19/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais.

Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa.

No conceito de Barbosa Filho, são classificadas em duas categorias diversas: as sociedades empresárias e as sociedades simples ou não empresárias. Tal classificação apresenta enorme interesse prático, já que condiciona a incidência de numerosas normas especiais, destinadas apenas a uma das categorias enfocadas. O objeto social continua sendo o elemento de fundamental importância para a definição da natureza de uma sociedade, questionando-se, quando feita sua análise, a empresariedade, e não mais a comercialidade. A empresariedade é muito mais ampla do que a comercialidade, o critério vigente na legislação revogada pelo novo Código Civil. A comercialidade era identificada diante da inclusão no objeto social e do exercício de atos de compra, revenda e locação de coisas móveis, operações de câmbio ou bancárias, industriais, de mediação, tráfico marítimo e aéreo ou atos a estes conexos. 

Adotado o novo critério legal, há de persistir um exercício contínuo de atos encadeados e voltados para a produção ou circulação de bens destinados ao mercado, a fim de que a empresariedade esteja presente e possa ser identificada. As sociedades cujo objeto seja a prestação de serviços não vinculados ao exercício de uma profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, bem como aquelas em que o exercício da profissão constitua elemento de empresa, devem ser sempre consideradas empresárias, em contraste com o que ocorria na vigência da legislação revogada. O critério a ser utilizado para identificar a empresariedade como predicado de uma sociedade sempre é de ordem material. Pouco importa a forma sob a qual é constituída a sociedade, a não ser que a própria lei, excepcional e compulsoriamente, lhe imponha uma natureza específica, como é o caso das sociedades cooperativas, que, conforme o parágrafo único do presente artigo, são sempre consideradas simples.

A natureza empresária ou não empresária da sociedade depende, primordialmente, do objeto escolhido por seus sócios e, mais, do conteúdo da atividade efetivamente desenvolvida, considerada esta como um encadeamento de negócios jurídicos instrumentais dirigidos a um escopo determinado. Assim, a consumação de um ato isolado não chegará nunca a qualificar como empresarial uma sociedade, pois a atividade deve receber uma valoração autônoma com referencia a seus componentes individuais (os negócios jurídicos), submetendo-se a um exame de conjunto, de totalidade. As sociedades não empresárias são identificadas por exclusão. Toda sociedade que não se qualifica como empresária é considerada simples. Ressalte-se, ainda, que tanto uma sociedade não empresária quanto uma sociedade empresária obtêm uma remuneração pelo implemento de sua atividade-fim e buscam auferir lucros, a serem distribuídos, de conformidade com o disposto em seus atos constitutivos, entre os sócios. A distribuição de lucros constitui o elemento distintivo entre a sociedade e a associação, visto que, nesta última, mesmo obtida uma remuneração pelo exercício da atividade-fim e auferido superávit, este não será compartilhado e distribuído entre os associados, mas reinvestido. As associações empreendem atividades não destinadas a proporcionar interesse econômico aos associados, buscando atingir finalidades de ordem moral. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 993-994 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Pelo histórico, este dispositivo não foi objeto de emenda durante sua tramitação no Congresso Nacional. O Código Civil de 1916, em seu art. 1364, estabelecia a divisão formal, entre as sociedades civis, reguladas pela legislação civil, e as sociedades comerciais, regidas pela lei comercial. A Lei n. 6.404/76, no tocante às sociedades anônimas, em seu art. 2º, § 1º, estabelece que, “Qualquer que seja o seu objeto, a companhia é mercantil e se rege pelas leis e usos do comércio”. No que tange às sociedades cooperativas, a Lei n. 5.764/71 define que “As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil” (art. 4 Q) Estas são as definições e distinções básicas contidas na legislação em vigor a respeito do tipo de natureza das sociedades civis e comerciais antes da vigência do novo Código Civil.

Segundo Ricardo Fiuza, a norma deste CC 982 vem a instituir uma nova divisão entre as formas societárias até então definidas pelo direito privado brasileiro. Se adotarmos um paralelismo simétrico, a antiga sociedade comercial passou a ser denominada sociedade empresária, enquanto a sociedade civil, regulada pelo Código de 1916, passou a ser definida como sociedade simples. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 513, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na sequência José Carlos Fortes, aponta a empresa ou o empreendimento como ente econômico, pode ser explorado por uma pessoa física (empresário individual) ou pessoa jurídica (sociedade empresária legalmente registrada). Como sociedade empresária, pessoa jurídica é a sociedade constituída de sócios e legalmente registrada no órgão competente, para explorar atividades de empresa, constituída na sua grande maioria no Brasil como sociedade limitada ou sociedade anônima (companhia).

No direito brasileiro, até antes da vigência do novo código, existiam dois tipos de sociedades: a sociedade comercial, utilizada na exploração de atividades mercantis, outrora regulada pelo código comercial, e a sociedade civil, vinculada a área de prestação de serviços, até então regulada pelo código civil de 1916.

Hoje com a vigência do novo código civil, fazendo um paralelo entre o que existia e o que agora está posto, a sociedade comercial passou a ser identificada como sociedade empresária (CC 982), aquela que explora a atividade típica de empresário (produção, circulação de bens e serviços). Já a sociedade civil corresponde hoje à sociedade simples (CC 997).

Assim, pelo que determina o código e ressalvando eventuais casos excepcionais, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro. Este registro está previsto no artigo 967, sendo obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, antes do início de sua atividade. As sociedades que não explorarem atividades de cunho empresarial serão consideradas sociedades simples.

Assim, pelo que determina o código e ressalvando eventuais casos excepcionais, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro. Este registro está previsto no artigo 967, sendo obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, antes do início de sua atividade. As sociedades que não explorarem atividades de cunho empresarial serão consideradas sociedades simples.

A sociedade anônima possui legislação especial (Lei 6.404/76) que regula sua constituição, funcionamento e expressa detalhadamente as características deste ripo societário. Por esta razão o código não cuida de suas particularidades. Faz referência apenas em dois artigos, reforçando o que estabelece a legislação especial.

Por ser um dos tipos societários previstos no direito brasileiro e em virtude do código regular o direito de empresa (Livro II da Parte Especial), não poderia deixar de cita-la, e o fez expressando que na sociedade anônima (companhia), o capital divide-se em ações, obrigando-se cada sócio ou acionista somente pelo preço de emissão das ações que subscrever ou adquirir. Destaca ainda que, embora regida por lei especial, nos casos omissos serão aplicadas às disposições do código (CC 1.088 e 1.089).

Ressaltamos ainda que de acordo com o parágrafo único do artigo 982 do código, a exemplo do exposto § 1º do artigo 2º da Lei 6.606/76, as sociedades anônimas, independente do seu objeto, serão sempre consideradas sociedades empresárias. Portanto, em nenhuma hipótese poderá ser constituída uma sociedade simples (não empresária) na modalidade de companhia ou S/A. (José Carlos Fortes, Portal da Classe Contábil, classecontabil.com.br, publicado em 2011, Novo Código Civil reflexos nas atividades empresarial e contábil 9ª parte, acessado em 19/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 983. A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias.

Parágrafo único. Ressalvam-se as disposições concernentes à sociedade em conta de participação e à cooperativa, bem como as constantes de lei especiais que, para o exercício de certas atividades, imponham a constituição da sociedade segundo determinado tipo.

No lecionar de Barbosa Filho, as sociedades, para assumirem a posição de empresários coletivos, precisam ostentar personalidade jurídica, tendo o legislador, para elas, estabelecido uma tipicidade estrita, vinculando a validade de sua constituição à obediência de um dos modelos já regrados no texto legal, concebidos especialmente para seu funcionamento tornou-se imperiosa, assim, a utilização de um dos tipos disciplinados entre os CC 1.039 e 1.092, podendo as sociedades empresárias assumir a forma de sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples, sociedade limitada, sociedade anônima ou sociedade em comandita por ações. Cabe, no momento da celebração do contrato de sociedade, a escolha de um dos cinco tipos, delimitado o âmbito de atuação de sua vontade. No que respeita às sociedades simples, a liberdade dos contratantes é maior, podendo ser escolhido um dos tipos aqui enumerados, quando, então, nascerá uma sociedade simples com forma empresarial, ou, ainda, apresentada qualquer outra concepção específica, devendo-se ressaltar a possibilidade de ser adotada fórmula semelhante à da antiga sociedade de capital e indústria, que deixou de ser tipificada pelo Código de 2002. Neste último caso, as regras peculiares às sociedades simples (CC 997 a 1.034) seriam aplicadas com exclusividade, enquanto, no primeiro, as regras formais, próprias ao tipo escolhido, seriam aplicadas em concomitância com essas mesmas regras materiais, atinentes às sociedades simples. 

No parágrafo único, o legislador apresentou uma ressalva, excepcionando, quanto às sociedades em conta de participação e cooperativas, além daquelas cuja forma tiver sido, em razão do objeto social eleito, imposta por lei, a regra constante do caput. A exceção deriva da ausência de personalidade jurídica das sociedades em conta de participação, da disciplina específica da sociedade cooperativa (CC 1.093) e da inclusão, na legislação especial, de regras impositivas da adoção de determinado tipo societário em razão da singularidade da atividade exercida. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 994-995 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 19/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o histórico, o dispositivo em tela não foi objeto de qualquer alteração quando da tramitação do projeto no Congresso Nacional. Além da sociedade civil regulada pelos arts. 1363 a 1.409 do Código Civil de 1916, o Código comercial de 1850, complementado pelo Decreto n. 3.708/19 e pela legislação das sociedades por ações (Lei n. 6.404/76), conceituava e definia sete tipos de sociedades comerciais que, validamente, poderiam ser constituídas no âmbito de nosso sistema de direito positivo, a saber: 1) sociedade em comandita (arts. 311 a 314); 2) sociedade em nome coletivo (arts. 315 e 316); 3) sociedade de capital e indústria (arts. 317 a 324); 4) sociedade em conta de participação (arts. 325 a 328); 5) sociedade por quotas de responsabilidade limitada.

Na doutrina, Ricardo Fiuza aponta os CC 1.039 a 1.092 do novo Código, que definem cinco tipos de sociedades: 1) Sociedade em nome coletivo (CC 1.039 a 1.044); 2) Sociedade em comandita simples (CC 1.045 a 1.051); e) Sociedade limitada (CC 1.052 a 1.087); 4) Sociedade anônima (CC 1.088 e 1.089) e 5) Sociedade em comandita por ações (CC 1.090 a 1.092). Essas sociedades são consideradas como sendo personificadas, i. é, adquirem personalidade jurídica após regularmente constituídas. Além destas, temos que podem ser constituídas outras três modalidades societárias, não empresárias, subdivididas em sociedades não personificadas e sociedades personificadas. É sociedade simples não personificada a sociedade em comum (CC 986 a 990). São sociedades simples personificadas a sociedade em conta de participação (CC 991 a 996) e as sociedade cooperativa (CC 1.093 a 1.096).

Quando as sociedades simples adotarem uma das formas de sociedade empresária, subordinam-se às normas especiais que regem o tipo societário adotado, devendo seus atos constitutivos ser levados para arquivamento perante o Registro Público de Empresas Mercantis, com exceção da sociedade em conta de participação e da sociedade cooperativa, que somente podem ser constituídas sob essa forma específica. A antiga sociedade comercial de capital e indústria foi extinta pelo novo Código Civil. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 514, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 19/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em artigo publicado em 07/2005 com o título “Sociedade simples e o art. 983 do Código Civil de 2002 – ao qual chama de imprecisão terminológica, Cláudio Calo Sousa, traz uma inteira visão à qual passa-se ao escrutínio geral:

Com a entrada em vigor do Código Civil/2002, o legislador infraconstitucional, acolhendo a teoria da empresa consubstanciada no Código Civil italiano de 1942, também importou a denominada "sociedade simples", estando esta regulada nos artigos 997 ao 1.038 do referido diploma legislativo, tendo, ainda, o legislador procurado utilizar a expressão simples em diversos dispositivos legais, podendo-se citar como exemplos os artigos 982 e 983 do CC/2002, os quais não estão inseridos no capítulo I que abrange aqueles dispositivos legais.

De se registrar que, antes do Código Civil de 1916, ora revogado, as sociedades se dividiam em sociedades civis e sociedades comerciais, sendo que, em regra, a diferença se fazia através do objeto social (prática de atos de comércio ou não), salvo nas hipóteses em que o legislador, independentemente do objeto, conferia à sociedade natureza mercantil, como por exemplo a Sociedade Anônima (artigo 2º, § 1º, da Lei nº 6.404/1976).
Após o afastamento do sistema francês, ou seja, da teoria dos atos de comércio, e com o acolhimento da teoria da empresa, surgiram algumas orientações no sentido de que a sociedade não empresária seria a antiga sociedade civil, enquanto que a sociedade empresária seria a antiga sociedade comercial.
Com a devida vênia, não se pode compartilhar de tal posicionamento, vez que a alteração realizada pelo legislador foi de fundo e não apenas terminológica, sendo certo também que não é critério diferenciador o objetivo (que não se confunde com o objeto social) de ambas, até porque as duas, por serem sociedades, têm sempre fim lucrativo, ao contrário das associações. No entanto, a sociedade não empresária, apesar de explorar uma atividade econômica, não o faz de forma organizada, ou seja, não há conjugação de fatores de produção (capital, trabalho, tecnologia e matéria prima), em outras palavras, o modo pelo qual o objeto é explorado não se faz de forma economicamente organizada, enquanto a sociedade empresária exerce seu objeto de forma organizada, caracterizando-o como empresa (atividade economicamente organizada).
Portanto, o traço distintivo entre sociedade não empresária e sociedade empresária é a organização, a forma pelo qual o objeto, a atividade econômica é explorada.
Na esteira deste raciocínio, pode-se afirmar que algumas sociedades consideradas civis antes do advento do atual Código Civil, atualmente podem ser consideradas como sociedades empresárias, caso o objeto seja desenvolvido de forma organizada, como empresa, no perfil técnico-funcional do mestre italiano Alberto Asquini.
Veja-se, então, quais as consequências práticas-jurídicas em se definir uma sociedade como empresária ou não empresária. Em sendo a sociedade empresária, tem-se três consequências importantes:
Primeiro, deve arquivar seus atos constitutivos no órgão próprio, precisamente no Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins (CC 1150), que incumbe à Junta Empresarial de cada ente federativo, enquanto que as sociedades não empresárias, em regra, devem ser registradas do Registro Civil de Pessoas Jurídicas (RCPJ).
Segundo, em caso de insolvência, a sociedade empresária fica sujeita, em regra, às Recuperações Judicial e Extrajudicial e à falência, previstas em legislação especial (Lei no. 11.101/2003), com tratamento peculiar, enquanto que as sociedades não empresárias sujeitam-se à insolvência processual civil, prevista nos artigos 748 e seguintes do Código de Processo Civil/1973, que é um sistema de insolvência menos gravoso que o falimentar, com correspondência no art. 1.052 do CPC/2015. Até a edição de lei específica, as execuções contra devedor insolvente, em curso ou que venham a ser propostas, permanecem reguladas pelo Livro II, Título IV, da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Face aos inúmeros efeitos da sentença decretatória de falência.
Terceiro, a escrituração do empresário de suas operações nos livros fica sujeita à regras próprias e mais rígidas do que propriamente aos das sociedades não empresárias (CC 1179 ao CC 1195), vez que nosso ordenamento jurídico adotou o sistema francês quanto à escrituração, em que exige livros comuns e especiais e determina os requisitos extrínsecos e intrínsecos dos mesmos, não conferindo liberdade alguma.
Quatro, o empresário individual e a sociedade empresária, quando a falência é decretada judicialmente, pode haver responsabilização pela prática de crimes falimentares, o que não ocorre com o não empresário. Deve-se ressaltar que, no caso das sociedades empresárias, são os administradores que poderão ser responsabilizados criminalmente, pois são estes que sentem os efeitos penais da falência, não sendo considerados falidos tecnicamente, mas sim a sociedade empresária.
Analisados alguns poucos aspectos da sociedade não empresária e da sociedade empresária, urge esclarecer os sentidos da expressão "simples", até porque o legislador civilista foi impreciso quanto ao uso do termo, causando, consequentemente, interpretações equivocadas, senão vejamos:
Ora, o CC 997 ao 1.038 do CC/2002 regulam a sociedade simples, inaugurando o capítulo das sociedades personificadas, porém nos CC 982 e CC 983, utilizam a expressão sociedade simples, mas em confronto com as sociedades empresárias. Neste sentido, Tem-se que naquele capítulo estão reguladas as sociedades não empresárias, o que se acredita ser inviável.
Inicialmente, não se pode confundir a expressão "simples" utilizada pelo CC/2002, com o termo utilizado pela Lei nº 9.317/1996[5], que se refere apenas ao Microempresário (ME) e ao Empresário de Pequeno Porte (EPP), pessoas jurídicas.
É muito comum encontramos, na condição de consumidores, afixado em determinadas lojas um cartaz ou placa próximo à caixa registradora com a expressão "SIMPLES". Neste caso, não significa que aquela Pessoa Jurídica deva ser considerada sociedade simples sob o enfoque do Código Civil, pois na realidade, aquela expressão está relacionada com o Microempresário (ME) e o Empresário de pequeno porte (EPP), pessoas jurídicas, que exerceram a faculdade de adotar um sistema simplificado de arrecadação de tributos.

Portanto, não se pode confundir a Lei nº 9.317/1997 com o Código Civil, sendo certo que não são atos normativos incompatíveis entre si, até porque pode uma determinada pessoa jurídica ser de pequeno porte (EPP) em decorrência de sua receita bruta anual, mas adotar a forma de sociedade limitada, podendo ser empresária ou não empresária. Neste caso, esta pessoa jurídica, no âmbito tributário, pode ter adotado o sistema simples (e não a forma de sociedade simples), sendo que a sociedade será limitada, regida pelos artigo 1052 ao 1087 do CC/2002 e, dependendo da forma pela qual a atividade econômica é explorada, pode ser enquadrada como empresária ou como não empresária, dependendo se há ou não o exercício da empresa.

No caso do Código Civil, a confusão é flagrante, pois no capítulo I, do subtítulo II, o legislador usou a expressão "Da Sociedade Simples", passando a discipliná-la nos artigos 997 ao 1038, que, inclusive, acaba servindo como fonte supletiva para os demais tipos societários. Portanto, neste caso, o legislador considerou a sociedade simples como um tipo societário, da mesma forma como ocorre com as sociedades em nome coletivo, em comandita simples, limitada, anônima e em comandita por ações[6]. Em outras palavras, é um tipo autônomo, com disciplina própria importado da Itália, porém dificilmente será utilizado na prática, servindo mesmo como fonte supletiva para aqueles tipos societários, caso seus respectivos capítulos seja omissos.
Entretanto, no CC 983, o termo "simples" é empregado de forma mais abrangente, podendo acarretar confusão entre os operadores do direito, in litteris: "A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias" 
Analisando-se a primeira parte do dispositivo, chega-se à cristalina conclusão de que a sociedade empresária (aquela que explora a atividade econômica de forma organizada, ou seja, empresa) tem ("deve") o dever de adotar a forma de sociedade em nome coletivo (CC1039 a 1044), em comandita simples (CC 1045 a 1051), limitada (CC 1052 a 1087), anônima (CC 1088 e CC 1089) ou em comandita por ações (CC 1090 a 1092).
Portanto, não pode a sociedade empresária adotar o tipo sociedade simples, haja vista que esta sociedade encontra-se regulada nos CC 997 ao CC 1038 de 2002, sendo que o CC 983 deste diploma apenas fez menção aos CC 1039 ao 1092, afastando aquele tipo societário. Em suma, a sociedade empresária não pode ser sociedade simples em sentido estrito, ou seja, não adotar o tipo societário previsto nos artigos 997 ao 1.038 do CC/2002, evidenciado, a contrario sensu, que o tipo sociedade simples em sentido estrito só pode ser utilizado se a sociedade for não empresária.
No entanto, na segunda parte do dispositivo legal em comento, o legislador usou a expressão "sociedade simples", porém, não se pode interpretá-la em sentido estrito, ou seja, como sinônimo de tipo societário regulado nos CC 997 ao CC 1038 de 2002, mas sim em sentido amplo, ou seja, como sinônimo de sociedade não empresária (aquela sociedade que explora uma atividade econômica, mas não de forma organizada, ou seja, não exerce empresa). Neste sentido, pode-se afirmar que a sociedade não empresária (simples em sentido amplo) configura o gênero, sendo a sociedade simples em sentido estrito, regulada nos CC 997 ao CC 1038, uma espécie, mas não a única.
Portanto, ao invés de o legislador ter adotado uma expressão com duplo sentido, amplo e estrito, melhor seria se tivesse utilizado o termo sociedade não empresária em contraposição à sociedade empresária e ter deixado o termo simples apenas para o tipo societário, regulado nos CC 997 ao CC 1.038 de 2002.
Em sendo adotada a interpretação literal do artigo 983, 2ª. parte, do CC/2002, chegar-se-á à equivocada conclusão de que a sociedade não empresária (simples em sentido amplo) pode adotar a forma de sociedade em nome coletivo, em comandita simples, limitada, anônima em comandita por ações, sendo que se não optar por nenhum deste tipos, terá que ser regulada pelas normas da sociedade simples em sentido estrito, previstas nos CC 997 ao CC 1038).
Não se pode admitir uma sociedade simples em sentido amplo ou não empresária poder adotar a forma de sociedade anônima ou em comandita por ações. O que nos leva à dúvida de não se dever adotar a interpretação literal. Certamente que não.
Não obstante o artigo 983 CC, em sua primeira parte, fazer menção aos artigos 1039 a 1092 e na segunda parte dispor que a sociedade simples em sentido amplo (não empresária) tem a faculdade ("pode") de adotar "um desses tipos", possibilitando assim a adoção dos tipos previstos nos CC 1088 e  CC 1090, na realidade deve-se abandonar a interpretação literal, adotando-se a sistemática, pois o CC 982, parágrafo único, 1ª. parte, claro, quando preceitua que as sociedades por ações (anônima e em comandita por ações), independentemente do objeto, são empresárias.
Nesta linha de raciocínio, pode-se concluir que a sociedade não empresária (simples em sentido amplo) não poderá adotar a forma de sociedade por ações, mas poderá adotar a forma de sociedade em nome coletivo, em comandita simples e limitada, mas caso não adote um destes tipos, pois é faculdade ("pode"), será considerada sociedade simples em sentido estrito, sendo regulada pelos CC 997 ao 1038 do CC/2002.
Portanto, as sociedades por ações são sempre sociedades empresárias por determinação legal (art. 2º, § 1º, da Lei no. 6.404/1976 e CC 982, parágrafo único, do CC/2002), porém as sociedades em nome coletivo, em comandita simples e limitada, poderão se consideradas empresárias ou não empresárias (simples em sentido amplo), dependendo da forma pela qual o objeto for explorado, ou seja, se o mesmo pode ser considerado ou não empresa (atividade economicamente organizada).
No caso da sociedade simples em sentido estrito, pode-se afirmar que ela configura sempre uma sociedade não empresária (simples em sentido amplo), porém nem toda sociedade não empresária (simples em sentido amplo) pode ser considerada sociedade simples em sentido estrito, pois de acordo com a segunda parte do CC 983, pode a sociedade não empresária adotar a forma de sociedade em nome coletivo, em comandita simples ou limitada.
Ponto finalizando, não se pode deixar de esclarecer que ainda que uma Sociedade Limitada seja empresária, nada impede que sejam utilizadas as regras da sociedade simples em sentido estrito (que é não empresária) como fonte supletiva, desde que o capítulo que regula aquela sociedade seja omisso, face ao que dispõe o CC 1053 de 2002.
Contrapontuando, apesar de a sociedade simples em sentido estrito ser um tipo não empresário, de toda sorte, suas regras podem ser aplicadas supletivamente aos demais tipos societários, independentemente da natureza empresária ou não destes. Conclui-se, assim, que o legislador, quando da elaboração de atos normativos, deve procurar evitar a utilização de expressões com duplo sentido, bem como a importação de termos que não têm tradição no nosso ordenamento jurídico. (Registro Público de Empresas, no site jus.com.br. Publicado por Claudio Callo Souza Elaborado em 01/2002, Publicado em 07/2005, Acessado em 19/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 18 de maio de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 978, 979, 980 Da Capacidade - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 978, 979, 980
Da Capacidade - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Do Direito de Empresa
Título I – Do Empresário (Art. 966 ao 980-A) Capítulo II - Da Capacidade
– vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

Art. 978. O empresário casado pode, se necessidade de outorga conjugal, qualquer que seja o regime de bens, alienar os imóveis que integrem o patrimônio da empresa ou gravá-los de ônus real.

No entendimento de Barbosa Filho, o CC 978 dispensa a outorga conjugal para a alienação de bens imóveis, bem como a instituição de ônus real, desde que incluídos no ativo do empresário individual casado. Cuida-se de uma dispensa específica e que se refere tanto ao ativo circulante, quanto ao permanente, tudo dependendo da destinação conferida à coisa, excepcionando a regra geral exposta no inciso I do CC 1.647 e sempre incidente quanto o regime de bens adotado não é o da separação absoluta. Pretende-se dar maior liberdade ao empresário individual evitando fique ele tolhido na necessidade de agilidade e rapidez na celebração de negócios jurídicos, i.é, extirpando obstáculos ao desenvolvimento da atividade empresarial. A falta da aquiescência do cônjuge do empresário individual, portanto, não causará qualquer mácula à validade de alienações e constituições de direitos reais incidentes sobre imóveis utilizados no exercício da empresa, merecendo aplausos a inovação legislativa. Os bens enfocados continuam, no entanto, compondo a comunhão de bens mantida pelo casal, sendo passíveis, inclusive, ao final da sociedade conjugal, de partilha, mas estão, simplesmente, submetidos a um regime jurídico diferenciado e mais benéfico ao empresário. Merecerá cuidado, nestas circunstâncias, para a prevenção de litígios, a elaboração do instrumento público tendente à aquisição, alienação ou oneração de imóveis, devendo constar, expressa e claramente, se possível, com detalhes, a vinculação do imóvel à atividade empresarial. A afetação de bens imóveis precisa, ainda, ser divulgada e para que a outorga conjugal seja dispensada, é preciso promover específica averbação junto às respectivas matriculas, com o assentimento do próprio cônjuge do empresário individual.

O presente dispositivo legal não tratou, porém, da concessão da outorga uxória para a consecução do aval, inovação trazida pelo atual Código que mereceria maior atenção. É possível compatibilizar as restrições decorrentes da necessidade do consentimento do cônjuge com as regras estabelecidas, de modo a concluir que a concessão de aval pelo empresário individual, visando a expansão de sua atividade profissional, prescinde da obtenção da outorga uxória, ou seja, a declaração cartular não pode ser anulada, se bem que seus efeitos não possam, também, ser opostos ao cônjuge que não forneceu sua aquiescência. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 990 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 18/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Referindo-se ao histórico do artigo em comento, em sua redação original, o dispositivo constante do projeto proposto pela Câmara estabelecia que “O empresário casado pode, sem necessidade de outorga conjugal, qualquer que seja o regime de bens, hipotecar ou alienar os imóveis que lhe são próprios e os adquiridos no exercício da sua atividade”. Emenda da iniciativa do Senador Gabriel Hermes promoveu a alteração adotada na redação final. Ainda que o Código Civil de 1916, em sua redação primitiva, não contivesse norma semelhante, o art. 30 da Lei n. 4.121/62 (Estatuto da Mulher Casada) veio a prescrever que, “pelos títulos de dívida de qualquer natureza, firmado por um só dos cônjuges, ainda que casados pelo regime de comunhão universal, somente responderão os bens particulares do signatário e os Comuns até o limite de sua meação”. Essa norma, segundo a melhor doutrina comercialista (Rubens Requião, Curso de direito comercial, São Paulo, Saraiva, 1971, v. I, p. 62; Waldírio Bulgarelli, Direito comercial, São Paulo, Atlas, 1987.)

Como dispõe a doutrina de Ricardo Fiuza, esse dispositivo constante do CC 978 veio a consolidar o entendimento mais evoluído de que qualquer dos cônjuges pode, sem necessidade de outorga uxória, alienar ou gravar de ônus reais bens que integrem o patrimônio da empresa de que cada um, isoladamente, participe.

No caso das sociedades comerciais, a aplicação desse princípio decorre, diretamente, da separação patrimonial objetiva entre os bens da sociedade e os bens particulares dos sócios. No que se refere às firmas individuais, que não adquirem personalidade jurídica própria, a norma em referência estabelece que, relativamente ao patrimônio imobiliário destinado pelo empresário para o exercício de sua atividade, tais bens poderão ser alienados ou gravados de ônus reais sem a necessidade de consentimento do respectivo cônjuge, uma vez que os bens imóveis diretamente afetados à atividade da empresa não estão compreendidos no patrimônio conjugal. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 512, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 18/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Mayara Souza Laureano Schimtz, em seu artigo “O Empresário Individual Casado e A Dispensa (ou Não) da Outorga Conjugal Para Alienar e Gravar Bens do Casal: À Luz dos Artigos 978 e 1.647, Inciso I, do Código Civil de 2002”, remete-se à problemática do artigo, liga o conteúdo dos CC 978 e 1.647, inciso I, todos do código civil brasileiro de 2002, e contrapõe a problemática da (des) necessidade de autorização conjugal para alienar os bens imóveis que integram o patrimônio dos consortes ou ainda gravá-los de ônus real, quando da atuação de um dos cônjuges na esfera empresarial, especificamente na qualidade de empresário individual de responsabilidade limitada. Com a edição do Código Civil de 2002, modificações relevantes foram introduzidas no que concerne às relações empresariais e conjugais. Exemplo desta alteração é a regra do citado artigo 978, que passou a dispensar a outorga conjugal para alienar e gravar bens imóveis, para o caso do empresário individual (pessoa física) casado, isto independente do regime de bens. De outra baila, tem-se ainda a disciplina do artigo 1.647, inciso I, do mesmo diploma legal, que versa sobre a proibição da prática de tais atos sem a anuência do cônjuge. Neste contexto de aparente contradição legal, faz-se necessário elevar o estudo para alcance da compreensão da norma, com vista a extrair a correta interpretação desta aparente antinomia. Isso poderá ser acessado na íntegra (Mayara Souza Laureano Schimtz, publicou no site ambitojuridico.com.br, em 23/07/2019, acesso em 18/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 979. Além de no registro Civil, serão arquivados e averbados, no Registro Público de Empresas Mercantis, os pactos e declarações antenupciais do empresário, o título de doação, herança, ou legado, de bens clausulados de incomunicabilidade ou inalienabilidade.

Nas palavras de Barbosa Filho, é necessário dar total conhecimento a todos os interessados, das características fundamentais da concreta situação patrimonial do empresário individual, induzidas por seu estado civil e pelas circunstâncias de aquisição de determinados bens. Nesse sentido, o presente artigo ressuscitou norma constante do art. 37, II, da revogada Lei n. 4.276/65, passando a exigir que o empresário individual traga, para arquivamento perante a Junta Comercial competente, os documentos constitutivos ou comprobatórios de tal situação, correspondentes à certidão extraída do instrumento público do pacto antenupcial (CC 1.640, parágrafo único) ou, quando se tratar de bens adquiridos em razão de sucessão causa mortis ou liberalidade e clausulados com a inalienabilidade ou incomunicabilidade (CC 1.848 e 1.911), certidão da transcrição ou matrícula de bens imóveis ou, ainda, quando se tratar de bens móveis, do registro do testamento (art. 735 do CPC em vigor, antigo art. 1.126 do CPC/1973) e, alternativamente, cópia ou certidão do instrumento do contrato de doação. Em todas as circunstâncias aqui apontadas, haverá restrições à disponibilidade dos bens do empresário individual e nem todos eles poderão ser utilizados para a satisfação dos credores, permanecendo excluídos na eventual hipótese de uma execução, impondo-se, por isso mesmo, a divulgação geral de cada uma das situações restritivas, multiplicada a publicidade com o uso adicional do Registro Público de Empresas Mercantis, específico ao presente âmbito de atividade econômico-jurídico. Ressalte-se, enfim, não haver sido prevista específica sanção para o descumprimento do comando inserto no presente artigo, de maneira que a eficácia das restrições patrimoniais enfocadas, desde que já dadas ao conhecimento público, seja pelo registro Civil das Pessoas Naturais, seja pelo Registro de Imóveis, não sofrerá qualquer abalo. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 991 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 18/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 No entendimento de Ricardo Fiuza, para a correta e adequada certificação jurídica dos bens pessoais do empresário que podem ser objeto de garantia em face de suas obrigações diante de credores, afigura-se necessário que terceiros que venham a com ele contratar estejam cientes quanto ao regime de bens adotado no âmbito da respectiva sociedade conjugal. Se o regime for o da completa e total separação de bens, somente o patrimônio pessoal do cônjuge que contraiu a obrigação poderá ser alcançado nas hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica da sociedade de que participe. No caso dos pactos antenupciais, estes estarão sujeitos a registro perante a Junta Comercial da sede da empresa. Já os demais bens sujeitos a restrições de plena disponibilidade, adquiridos a título de doação, herança ou legado, tais condições restritivas deverão ser objeto de averbação no Registro Público de empresas Mercantis, para conhecimento e eficácia perante terceiros. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 512, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 18/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Leonardo Gomes de Aquino, explicita que a norma do art. 979 do CC/2002 tem como destinatários todos os empresários, mas a preocupação fundamental se destina ao empresário individual e os empresários que integrem sociedades não-personificadas ou que se submetam aos riscos da responsabilidade ilimitada, posto que nestes casos os empresários submetam o seu patrimônio à execução de seus credores, em caso de falência ou inadimplemento. Sendo assim, os credores ou consumidores destes empresários contarão com uma garantia maior na fiscalização e controle sobre o patrimônio disponível. (Leonardo Gomes de Aquino, é articulista do Jornal Estado de Direito (estadodedireito.com.br) e responsável pela Coluna descortinando o Direito Empresarial, postado em 07 de novembro de 2019, Acesso em 18/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 980. A sentença que decretar ou homologar a separação judicial do empresário e o ato de reconciliação não podem ser opostos a terceiros, antes de arquivados e averbados no Registro Público de Empresas Mercantis.

No entender de Barbosa Filho, em se tratando de empresário individual, o arquivamento dos documentos comprobatórios da separação judicial e da reconciliação, correspondentes à certidão extraída do assento de casamento, no órgão competente do Registro Público de Empresas Mercantis, i.é, perante a Junta Comercial em que o empresário se achar inscrito, constitui, diante de terceiros, fator de eficácia das implicações patrimoniais de tais alterações do estado civil. Há, portanto, a imprescindibilidade de uma publicidade adicional, além daquela já produzida pelo Registro civil das Pessoas Naturais, condicionando-se, ao arquivamento previsto, a assunção de efeitos da eventual dissolução de uma comunhão e partilha sobre os credores do empresário. O texto legal apresenta três falhas. De início, refere-se à sentença decretatória da separação judicial ou declaratória da reconciliação, quando, pura e simplesmente, deveria fazer referência à própria separação judicial ou à reconciliação, não bastando, para a regular realização do arquivamento, a exibição de certidão da decisão proferida, pois, após seu trânsito em julgado, a publicidade da alteração do estado civil se perfaz, naturalmente, com sua averbação, no Registro Civil das Pessoas Naturais, junto ao assento de casamento, por meio da expedição de mandado (art. 10, I) e, por isso, deve ser exibida, perante a Junta Comercial certidão de dito assento. Persiste, ainda, no presente artigo, uma omissão, deixando de se referir ao divórcio, que, na legislação atual, prescinde da separação judicial, podendo ser pleiteado diretamente e é, ele sim, causa efetiva do rompimento do vínculo conjugal, cabendo seja, também, quando de sua ocorrência, formalizado arquivamento. Ressalte-se, por último, que o parágrafo único do CC 1.577 exclui a possibilidade da reconciliação prejudicar terceiros, não havendo como opô-la a esses mesmos terceiros, apresentando, nesse caso, o arquivamento efeitos mais tímidos. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 991 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 18/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entender da Doutrina de Ricardo Fiuza, o arquivamento da sentença que decretar ou homologar a separação judicial, como também o divórcio do empresário (Lei n. 6.515/77, estará a gerar efeitos civis a partir do momento em que for registrada no cartório de registro civil competente. Todavia, para a produção de efeitos perante terceiros, em especial perante credores comerciais ou financeiros do empresário, essa sentença, que estabelece e homologa a partilha de bens entre os cônjuges, somente terá efeitos após seu arquivamento na Junta Comercial da sede da empresa. Esse procedimento foi adotado com a finalidade de dar publicidade à situação relativa à disponibilidade dos bens do empresário, modificada pela alteração em seu estado civil e na consequente partilha do patrimônio anteriormente detido pelo casal em razão do regime de casamento, pois o divórcio ou a separação judicial, nos casos de comunhão de bens, total ou parcial, após a partilha, sempre implica uma redução do patrimônio do cônjuge que exerce atividade empresarial. (Rubens Requião, Curso de direito comercial, São Paulo, Saraiva, 1971, v. 1; Waldirio Bulgarelli, Direito comercial, São Paulo, Atlas, 1987.); (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 512, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 18/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Não se pode ignorar ao final do artigo, as alterações da MP 881 ao Código Civil - parte II, apontada por Anderson Schreiber, em 18/06/2019, onde merece destaque, em primeiro lugar, a inclusão de um novo parágrafo no artigo 980-A, que disciplina a empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI). Como se sabe, a EIRELI é espécie de pessoa jurídica que se caracteriza por dois elementos: (a) tem composição unipessoal, ou seja, totalidade do capital social concentrada em um único titular; e (b) tem como objeto a exploração de atividade econômica com intuito de lucro. A EIRELI foi introduzida em nosso ordenamento jurídico pela Lei nº 12.441/2011, buscando contornar a exigência de composição pluripessoal que se extraía, tradicionalmente, do próprio conceito de sociedade. Houve, no entanto, forte resistência ao projeto de lei originário que tratava da EIRELI, diante da preocupação de que o instrumento fosse empregado para perpetrar fraudes aos direitos trabalhistas. Tal preocupação acabou por resultar na previsão de algumas cautelas na Lei 12.441/2011, como a exigência de um capital social não inferior a 100 vezes o maior salário-mínimo vigente no País (CC, art. 980-A, caput). O novo §7º, incluído no artigo 980-A pela MP 881, parece ignorar todo esse histórico ao afirmar que “somente o patrimônio social da empresa responderá pelas dívidas da empresa individual de responsabilidade limitada, hipótese em que não se confundirá, em qualquer situação, com o patrimônio do titular que a constitui, ressalvados os casos de fraude.”

Ao que parece, o novo parágrafo pretendeu suprir uma suposta lacuna deixada pelo veto ao §4º do art. 980-A, de redação similar à nova regra. A norma foi vetada, à época, por recomendação do Ministério do Trabalho e Emprego, com receio de que o texto pudesse causar dúvidas acerca da possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica de EIRELI. A própria mensagem de veto explicitava que a distinção patrimonial entre o titular e a pessoa jurídica não restava prejudicada, podendo ser extraída – senão do próprio conceito de pessoa jurídica, que somente pode ser entendida como tal quando dotada de autonomia patrimonial – do §6º do art. 980-A, que manda aplicar subsidiariamente à EIRELI a disciplina das sociedades limitadas, cuja personalidade não se confunde, naturalmente, com a personalidade de seus sócios. O forte consenso doutrinário nessa matéria amparou, inclusive, a aprovação do Enunciado nº 470 da V Jornada de Direito Civil do CJF, em que se lê: “O patrimônio da empresa individual de responsabilidade limitada responderá pelas dívidas da pessoa jurídica, não se confundindo com o patrimônio da pessoa natural que a constitui, sem prejuízo da aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica.”

Nesse cenário, a introdução do novo §7º do art. 980-A revela-se inteiramente desnecessária, pois destinada a explicitar algo sobre o qual não se controverte. Pior: o dispositivo suscita, por sua redação defeituosa, dúvida quanto ao seu real significado. O trecho que alude a “hipótese em que não se confundirá, em qualquer situação”, por exemplo, não esclarece qual seria a “hipótese” contemplada, parecendo ter pretendido tratar não de uma hipótese, mas da própria regra que é a autonomia patrimonial da pessoa jurídica. O maior risco, entretanto, está na parte final do dispositivo, em que restam “ressalvados os casos de fraude”. A expressão promete atrair a mesma dúvida que justificou, no passado, o veto ao §4º: está-se estabelecendo uma hipótese de desconsideração distinta daquela prevista no art. 50 do Código Civil? Com efeito, o art. 50 admite a desconsideração no caso de “abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial”. Não se emprega ali o termo “fraude”. A alusão à “fraude” configura nova hipótese de desconsideração? Cria um regime de desconsideração diverso (mais restrito ou mais amplo) para a EIRELI? Ao aludir genericamente a “casos de fraude” no §7º do art. 980-A, a MP 881/2019 parece ter incorrido em verdadeira incongruência interna: enquanto (a) o acréscimo dos §§1º e 2º ao art. 50 teve o evidente propósito de delimitar os conceitos de desvio de finalidade e confusão patrimonial, (b) o acréscimo deste §7º do art. 980-A abre um oceano de possibilidades interpretativas ao utilizar a imprecisa noção de fraude. De todo modo, resplandece o óbvio: não há qualquer razão para aludir à desconsideração da personalidade jurídica – nem à autonomia patrimonial da pessoa jurídica – na disciplina da EIRELI, que, como pessoa jurídica que é, já sofre a incidência das regras gerais sobre essa matéria. O legislador deve resistir à tentação de repisar matérias em diferentes setores da legislação, sob pena de, não empregando idêntica linguagem, suscitar dúvidas e ambiguidades que deveria evitar.

Ainda no campo do Direito Empresarial, a Medida Provisória 881 acrescentou um parágrafo único ao art. 1.052, que disciplina a sociedade limitada, dispondo: “A sociedade limitada pode ser constituída por uma ou mais pessoas, hipótese em que se aplicarão ao documento de constituição do sócio único, no que couber, as disposições sobre o contrato social.” Introduziu-se, assim, a figura da sociedade limitada unipessoal no direito brasileiro. A figura da sociedade unipessoal não é uma completa novidade em nosso ordenamento: em 2016, a Lei nº 13.247 introduziu nos arts. 15 e 16 do Estatuto da OAB a sociedade unipessoal de advocacia. No plano teórico, contudo, sempre foi controvertida a possibilidade de constituição de sociedade por apenas um sócio, situação encarada com desconfiança por parcela da doutrina, como já destacado – e que havia gerado, como também já visto, o recurso à figura algo assistemática da EIRELI. Agora, contudo, a MP 881 rompe, em definitivo e em termos amplos, com a tradicional exigência de pluripessoalidade, ao menos no âmbito das sociedades limitadas. À parte o fato de que torna inútil a existência da EIRELI no catálogo das pessoas jurídicas – não se vislumbrando porque alguém optaria pela EIRELI em vez de constituir sociedade limitada unipessoal, conforme se verá mais adiante –, esta opção da MP 881/2019, por si só, não merece censura, parecendo mesmo mais afinada à dinâmica empresarial contemporânea e mais adequada ao nosso sistema jurídico que a criação de uma nova espécie de pessoa jurídica, como ocorreu com a EIRELI.

 O novo parágrafo único do art. 1.052, no entanto, não tem a melhor redação. Em primeiro lugar, a palavra “hipótese” também foi aqui empregada de modo incorreto. O termo refere-se necessariamente ao trecho anterior: “ser constituída por uma ou mais pessoas”. A rigor, contudo, a “hipótese” versada no texto é apenas aquela em que a sociedade limitada é constituída por uma única pessoa, quando então “se aplicarão ao documento de constituição do sócio único, no que couber, as disposições sobre o contrato social.” Destaque-se, ainda, que a MP limitou-se a acrescentar o parágrafo único no art. 1.052 sem realizar qualquer outro complemento no regime jurídico das limitadas, todo construído a partir da premissa da pluripessoalidade destas sociedades, o que poderá provocar alguma insegurança na adoção desta nova modalidade de sociedade limitada.

Em uma análise sistemática, repita-se, causa alguma perplexidade a inserção da sociedade limitada unipessoal paralelamente à EIRELI, ambas submetidas a um regime praticamente igual – vale lembrar, nesse sentido, a aplicabilidade à EIRELI das regras previstas para as limitadas, por força do §6º do art. 980-A. Veja-se situação curiosa que decorre desse tratamento: a sociedade limitada que, por qualquer razão, tiver suas quotas concentradas em um único sócio, se converterá em EIRELI, por força do §3º do art. 980-A, e não em sociedade limitada unipessoal, como se esperaria. Há, ainda, inconsistências mais preocupantes. Perdem importância as restrições impostas pelo legislador ao regime da EIRELI, como o já mencionado capital mínimo integralizado e a limitação a que pessoa natural figure como titular de uma única EIRELI (art. 980-A, §2º), não parecendo haver qualquer vantagem na opção pela EIRELI em vez da sociedade limitada unipessoal. Melhor que o remendo apressado feito pelo Poder Executivo seria um debate amplo, em sede legislativa, acerca da conveniência ou não da manutenção destas restrições no regime da EIRELI, criando uma modalidade única de pessoa jurídica unipessoal com fins de lucro, conferindo maior lógica ao sistema e segurança ao mercado. (Anderson Schreiber, em 18/06/2019, Acessada na Carta Forense Mobile em 18/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 15 de maio de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 975, 976, 977 - continua Da Capacidade - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 975, 976, 977 - continua
Da Capacidade - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Do Direito de Empresa
Título I – Do Empresário (Art. 966 ao 980) Capítulo II - Da Capacidade
– vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

Art. 975. Se o representante ou assistente do incapaz for pessoa que, por disposição de lei, não puder exercer atividade de empresário, nomeará, com a aprovação do juiz, um ou mais gerentes.

§ 1º. Do mesmo modo será nomeado gerente em todos os casos em que o juiz entender ser conveniente.

§ 2º. A aprovação do juiz não exime o representante ou assistente do menor ou do interdito da responsabilidade pelos atos dos gerentes nomeados.

Na interpretação de Barbosa Filho, considerada a hipótese consignada no artigo imediatamente antecedente, de exercício da empresa por parte de incapaz, é conjugada a possibilidade de o representante ou assistente (pai, tutor ou curador) ser impedido do exercício da atividade empresarial e, portanto sob pena da configuração de ilícito, não poder, concretamente, agir como dirigente da produção ou da circulação de bens e serviços. Nesse caso, o próprio representante ou assistente deverá deixar de atuar diretamente, designando um ou mais profissionais encarregados da efetiva administração da empresa, chamados gerentes. Este gerentes exercem sua função em caráter precário, por mio de celebração de contrato e sempre mediante aprovação judicial individualizada, concedida para cada qual tendo em conta o exame de sua idoneidade e qualificação técnica. O juiz pode, também, mesmo descaracterizada a hipótese de impedimento, compelir o represente ou o assistente a nomear gerentes, considerada a conveniência técnica ou gerencial concreta. De qualquer forma, os gerentes, frise-se, são escolhidos pelo representante ou assistente do incapaz e são eles os responsáveis in elegendo pelos atos praticados por tais administradores, conferido ao juiz um poder de veto, a fim de impedir a contratação de pessoas tidas como inidôneas. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 988 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 15/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No histórico apresentado na página de Ricardo Fiuza, a disposição do art. 975 não sofreu qualquer alteração durante a tramitação do projeto no Congresso Nacional, ficando mantida sua redação original. O Código Comercial de 1850 somente admitia a designação de um novo gerente ou administrador de sociedade mercantil, na hipótese de falecimento de sócio, caso este estivesse habilitado para o exercício de atividade comercial, i.é, se pudesse ser qualificado juridicamente como comerciante (art. 309). Essa nomeação era sempre dependente de autorização judicial. De acordo com o Código civil de 116 (art. 1.403), também dependia de outorga judicial a participação de herdeiro menor devidamente assistido para a continuidade da sociedade civil, podendo o juiz decidir pela inviabilidade da manutenção do vínculo societário, se presentes riscos patrimoniais que justificassem tal medida. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 510, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 15/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Levando como título o artigo “Da autoridade do juiz para nomear gerentes de empresa continuada por incapaz” Pedro Ribeiro Agustoni Feilke, (graduando de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, postado no blog palcojuridico.blogspot.com.br, em 11/2010, acessado em 15/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD), faz uma análise sistemática sobre o CC 975, em comento.

(...) de fato, é elogiável a posição assumida pelo legislador ao permitir a continuidade da atividade empresarial em tais casos, uma vez que contribui com a economia do país. De certa forma, é incontroverso o disposto do referido artigo e seus respectivos parágrafos, não restando maiores dúvidas quanto à sua compreensão e interpretação.

Contudo, no artigo seguinte, CC 975, há uma falha na interpretação assumida por parte da Doutrina. É letra da lei acima colacionada que, no caso de o representante ou assistente do incapaz ser pessoa impossibilitada de exercer atividade empresarial, deverá ser nomeado por este outro ou outros gerentes, com a aprovação do juiz. No ponto mais polêmico do dispositivo sob comento, o parágrafo primeiro também estende esta nomeação a “todos os casos em que o juiz entender ser conveniente”. Então surte o ponto fulcral deste pequeno estudo.

Respeitada a doutrina diversa, crê-se que o parágrafo primeiro do CC 975, em momento algum tem o condão de dar livre-arbítrio ao juiz para escolher um gerente irrestritamente e sem critério pré-definido. Este é o entendimento adotado por alguns juristas pátrios.

Sustentam, por meio de interpretação vista como equivocada, que o expresso no parágrafo primeiro é um mandamento que se sobrepõe ao restante do artigo, i.é, possui caráter incondicional, podendo ser aplicada em qualquer oportunidade que o juiz entender conveniente.

Primeiramente, partindo de argumentos puramente semântico-interpretativos, entende-se ter sido o artigo em comento, inserido no ordenamento para proteger o incapaz. Entretanto, tal proteção não é contra o comportamento temerário do representante ou assistente impossibilitado de exercer a atividade empresarial, mas sim uma forma de vencer tal impedimento do seu representante ou assistente. Em outras palavras, o texto legal não visa à proteção do incapaz contra o seu representante ou assistente, mas uma alternativa de continuidade outra que a administração dos bens daquele por estes.

Em tal contexto, é sugerido que o representante ou assistente do incapaz atuará em seu melhor interesse, uma vez que é este o seu papel. Assim, é o represente ou assiste do incapaz a pessoa indicada para nomear gerentes para a administração da atividade empresária, conforme preleciona o caput do CC 975.

Prosseguindo naturalmente tal raciocínio, o parágrafo único apenas dá al juiz um poder maior de nomear gerentes em outras ocasiões, no entanto, poder que não é absoluto, mas apenas de veto a gerente que não seja conveniente ao magistrado.

Em síntese, ao juiz é conferido o poder amplo e irrestrito de veto à nomeação de gerentes, sem critério de conveniência estabelecido previamente. No entanto, não é dado ao magistrado a faculdade de iniciativa de escolha a fim de nomear gerente não indicado pelo representante ou assistente do incapaz. Esta é a orientação de todo nosso ordenamento direito civil e processual.

Por último, cabe reafirmar alguns pontos do referido artigo. Como já mencionado, a intelecção do texto legal leva a crer que o legislador pretendeu dar o poder de decisão do gerente ao representante do incapaz, uma vez que este já foi escolhido por juiz da área cível, e não pode representar uma ameaça aos interesses do incapaz, do contrário, estaria o ordenamento jurídico pondo em cheque a decisão do juiz civil para contrapor a ela o juiz da área empresarial.

A restrição feita no CC 975 e em seu parágrafo primeiro nada tem a ver com a intenção, a integridade e o caráter do representante. O que se está discutindo é a questão técnica, isto é, a capacidade técnica do representante de exercer a atividade empresarial, e é isto que o juiz deve analisar, uma vez que esta é a sua competência.

Deste modo, o caput do CC 975 quer garantir a continuidade da atividade empresária nos casos em que a lei do Direito Empresário proíbe o representante de atuar como tal. O parágrafo único do referido artigo complementa o caput, estendo ao juiz um poder de avaliar a impertinência do representante ou de eventual gerente nomeado de atuar como empresário, em análise técnica, muito embora o critério de conveniência não faça qualquer restrição ao magistrado.

O que não se pode aceitar, de certo, é a nomeação feita livremente pelo juiz de eventual gerente, uma vez que tal ato destoaria por completo do nosso ordenamento jurídico, sendo o juiz parte estranha e imparcial no caso. O que pretendeu dizer o parágrafo único do CC 975 ao dispor que “será nomeado gerente em todos os casos que o juiz entender ser conveniente”, é que independente da impossibilidade do exercício da atividade empresária pelo representante do incapaz, o juiz pode compeli-lo a nomear gerente, por critério de conveniência deixado à escolha livre do magistrado.

Reforçando os argumentos ora esposados, o parágrafo segundo do CC 975 dá a maior prova de que o gerente deve ser sempre e invariavelmente nomeado pelo representante do incapaz (passando, claro, pelo crivo de conveniência do juiz), uma vez que a este é imputada a responsabilidade in eligendo pelos atos perpetrados pelo gerente nomeado.

Ora, se conferíssemos ao juiz o poder de livre escolha de um gerente e este nomeasse um que o representante sequer conhece, seria uma afronta jurídica sem precedentes imputar uma responsabilidade in eligendo ao representante que sequer escolheu o gerente! Neste sentido é claro o parágrafo segundo do CC 975, ao ressalvar que, mesmo tendo o juiz aprovado o gerente nomeado, a responsabilidade do representante ou assistente não é elidida.

Entra em choque com a teoria pátria de reparação de dano, neste particular, a ideia dos que defendem que cabe ao juiz este livre poder de escolha. Como pode haver dever de reparação sem a existência de uma ação? Ou esquecem os juristas empresariais que o Direito não é um mapa retalhado, onde as diferentes áreas não se interpenetram, não sectorizam-se sem ligação alguma? A tríade para a configuração de um dano ressarcível e o consequente dever de reparação depende de uma ação ou omissão, um dano e um nexo causal.

Somente haveria um dano, sem ação do representante nem tampouco nexo causal. Por estes motivos aqui esposados creio ser extremamente discutível a posição dos que creem estar o juiz incumbido de um livre poder de escolha dos gerentes da atividade empresária desenvolvida pelo incapaz. (Pedro Ribeiro Agustoni Feilke, (graduando de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, postado no blog palcojuridico.blogspot.com.br, em 11/2010, acessado em 15/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD)

Art. 976. A prova da emancipação e da autorização do incapaz, nos casos do art. 976, e a eventual revogação desta serão inscritas ou averbadas no Registro Público de empresas Mercantis.

Parágrafo único. O uso da nova firma caberá, conforme o caso, ao gerente; ou ao representante do incapaz; ou a este, quando não puder ser autorizado.

Assim pensa Barbosa Filho que, visando ao regular exercício da atividade empresarial, o incapaz, se menor, não tendo atingido ainda os dezoito anos de idade, deverá obter sua emancipação, ganhando plena capacidade ou, em todos os casos, pelo menos, uma autorização judicial, quando, então os pais ou o tutor, respaldados na decisão prevista no CC 974, atuarão em nome e por conta do incapaz ou, simplesmente, assisti-lo-ão quando da celebração de cada negócio jurídico. Em qualquer das duas hipóteses, dada sua gravidade, exige-se a documentação escrita. Se efetivada a emancipação, em correspondência com o inciso I do parágrafo único do art. 5º, a certidão extraída do instrumento público firmado pelos pais, da decisão judicial do assento de casamento ou relativa à colação de grau em curso de ensino superior deverá ser apresentada à Junta Comercial competente, visando a seu arquivamento, de modo a atestar, totalmente, a plena capacidade civil. Se concedida autorização lastreada no CC 974, a certidão da decisão autorizativa será, da mesma forma, levada ao órgão de registro público das empresas mercantis, assim como, diante da precariedade de sua natureza, a mesma documentação decorrente de sua eventual revogação. Efetivada a inscrição do incapaz, a firma, como demonstração da vinculação efetiva quando da celebração dos negócios jurídicos, será utilizada pelo representante do incapaz ou pelo gerente designado e, excepcionalmente, pelo próprio incapaz, desde que sua incapacidade não seja absoluta, mediante autorização específica, concreta e pontual de seu responsável, materializada, também, em documento escrito. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 989 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 15/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segue-se o histórico que, da redação final deste dispositivo é a mesma constante do projeto original, salvo emenda de redação apresentada pelo Relator, para adequação da norma à vigente legislação do Registro Público de Empresas Mercantis. Tem paralelo no Código Civil de 1916, que previa a emancipação do menor por outorga dos pais ou pelo exercício de atividade mercantil (art. 92, § 1º, I e IV). O Código Comercial de 1850, por sua vez, regulava dois regimes diferenciados para o exercício de atividade empresarial por parte de menor com mais de dezoito anos: o regime de autorização, de natureza precária e revogável (art. 1º, III, primeira parte), e o regime definitivo da emancipação, cuja idade mínima foi reduzida em face do Código Civil de 1916 (art. 1º, n. 4, segunda parte). A Lei n. 8.934/494 estabelece a obrigatoriedade de arquivamento dos atos e documentos que, por determinação legal, como ocorre no caso de autorização ou emancipação do menor empresário, sejam atribuídos ao Registro Público de empresas Mercantis (art. 32, fl. e).

Na doutrina apontada por Ricardo Fiuza, o CC 976 enuncia que, em caso de emancipação do menor empresário, o título ou documento de emancipação, que deve constar de escritura pública, de natureza irrevogável, deve ser inscrito na Junta Comercial. Quando ocorrer a hipótese de autorização, que é um ato precário e revogável, esse ato de autorização será averbado na Junta Comercial. O uso da firma, ou seja, o exercício dos poderes de gerência e administração da empresa, caberá ao gerente designado pelo juiz, pelo representante do incapaz, se habilitado para o exercício de atividade empresarial, ou, na hipótese de o menor ser autorizado ou emancipado, a ele próprio. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 511, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 15/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Os itens 9 e 10 do Registro Público de Empresas, apontado por Rogério Zompero, apresentando uma revisão bibliográfica sobre as características mais relevantes da atividade registrária, incluindo o tratamento dado aos novos tipos de sociedades empresariais surgidas no país, a partir do item 2.9.2 – Das inconsistências nos atos de registro, apontam a documentação necessária e a respeito da obrigatoriedade de emancipação nos seguintes termos: 9) Documento de identificação: Documentos admitidos - cédula de identidade, certificado de reservista, carteira de identidade profissional, Carteira de Trabalho e Previdência Social ou Carteira Nacional de Habilitação (modelo com base na Lei no 9.503, de 23/9/97). Se a pessoa for estrangeira, é exigida identidade com a prova de visto permanente e dentro do período de sua validade ou documento fornecido pelo Departamento de Polícia Federal, com a indicação do número do registro (Vide Instrução Normativa DREI nº 10). A(s) cópia(s) do documento de identificação deverão ser apresentadas em cópia autenticada; 10) Emancipação: Maior de 16 e menor de 18 anos, apresentar Certidão de Emancipação em cópia autenticada ou indicar sua forma (artigo 976, CC); Quando se tratar de Empresário é necessário o arquivamento da respectiva Certidão de Emancipação (01 via original e as demais em cópia autenticada) em requerimento próprio selecionando o ato apropriado no Cadastro VRE. (Registro Público de Empresas, acessado no site jus.com.br. Acessado em 15/05/2020, publicado por Rogério Zompero em 02/2018, elaborado em 10/2015 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 977. Faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não tenham casado no regime de comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória.

No entender de Barbosa Filho, o presente artigo encontra-se deslocado, visto não conter regras próprias ao empresário individual, mas, isso sim, à validade da contratação de sociedade para a formação do empresário coletivo quando os sócios se qualificarem como cônjuges. Os sócios não são empresários e as regras gerais acerca da contratação da sociedade constam dos CC 981 a 985. Abrange-se, aqui, a hipótese de os contratantes serem unicamente o marido e a mulher, bem como quando os dois cônjuges, em conjunto, celebram sociedade com terceiros, permanecendo sócios entre si. Em geral, a contratação é permitida, podendo um cônjuge figurar como sócio do outro. Com o fim de evitar seja a contratação da sociedade mera ficção ou instrumento para a realização de fraudes, ficou proibida, porém, a sociedade celebrada por cônjuges quando o regime de bens adotado for o da comunhão universal de bens ou o da separação obrigatória. No primeiro caso, ao casar, foi formado um único patrimônio, abarcando todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, enquanto, no segundo caso, afastada, levando em consideração a condição pessoal dos cônjuges, a possibilidade de qualquer confusão patrimonial, seria promovido um tangenciamento da incidência das normas de específica proteção. A nova regra criou, inicialmente, certa incerteza, pois, dado o silêncio da legislação pretérita, havia, no Brasil, grande número de sociedades entre cônjuges, mesmo ante antigas discordâncias de caráter doutrinário. As sociedades constituídas antes do início da vigência do novo Código não foram atingidas, dado o princípio da preservação do ato jurídico perfeito, inserido no art. 5º, XXXVI, da Constituição da República, como o reconhecido pelo Departamento Nacional do Registro do Comércio (Parecer DNRC/Cojur n. 125/03, descartada, então, a necessidade de alteração do quadro social ou do regime de bens adotado. Apartado o problema intertemporal, considerada a prática de atos após o início da vigência do Código de 2002, se, ao reverso, já tiver sido constituída a sociedade e ocorrer a posterior celebração do matrimonio entre os sócios, restará materializada uma hipótese de nulidade superveniente, o que implicará, para a preservação da sociedade, na necessidade de adoção de regimes diferentes dos vedados, fazendo-se lavrar pacto antenupcial, ou, de maneira mais radical, da retirada de um dos nubentes. Problema interessante decorrerá, por fim, quando os nubentes forem sócios e tiverem de assumir o regime obrigatório de separação de bens (CC 1.641), pois surgem apenas duas opções: a) um dos nubentes retirar-se-á da sociedade; b) será abandonada a ideia de celebrar o casamento, surgindo uma situação de fato, que poderá culminar em uma união estável. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 989/90 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 15/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

De acordo com histórico apresentado sem a doutrina de Ricardo Fiuza, o dispositivo em questão não foi alvo de qualquer espécie de alteração quando da tramitação do projeto do Código Civil no Congresso Nacional. Não tem precedente no Código Civil de 1916. Na redação primitiva do Código Comercial de 1850 (art. 1º, n. 4) a mulher casada somente poderia exercer atividade comercial, separadamente de seu marido, se por este fosse autorizada. Com o novo regime jurídico regulado a partir do Estatuto da Mulher Casada (Lei n. 4.121/62), com a instituição da garantia da meação da mulher sobre o patrimônio do casal, a jurisprudência passou a inclinar-se na direção da possibilidade jurídica da constituição de sociedade comercial entre cônjuges. Essa orientação jurisprudencial dominante, originária do Supremo Tribunal Federal, vem agora a ser reconhecida e consagrada pelo Código Civil de 2002, em vigor. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 511, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 15/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob orientação do Dr. Stolze, uma sociedade formada por cônjuges de acordo com o
Código Civil/2002, em seu CC 977, do Livro de Direito de Empresa, dispõe ser "facultado aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não tenham casado no regime da comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória".
Tal dispositivo, duramente criticado pela doutrina, deverá causar controvérsias e colocar em difícil situação determinadas sociedades que, há anos, atuam no mercado. Advirta-se, aliás, que nos termos do seu art. 2031, "as associações, sociedades e fundações, constituídas na forma das leis anteriores, terão o prazo de um ano para se adaptarem às disposições deste Código, a partir da sua vigência", abrindo-se igual prazo aos empresários.
Naquilo, pois, que os atos constitutivos dessas pessoas jurídicas forem incompatíveis com a nova disciplina legal, o legislador abriu o prazo de um ano para que se procedessem com as necessárias modificações. Com isso, uma primeira interpretação do Código conduz à ideia de que a sociedade formada com a presença de marido e mulher, desde que casados sob o regime da comunhão universal ou da separação obrigatória, tem o prazo de um ano para ter o seu contrato social modificado, com a saída de um ou de outro, e o ingresso de um terceiro, sob pena de ser considerada ineficaz.
A impressão que se tem é de que a lei teria "oficializado a figura do laranja". Tudo isso porque, inadvertidamente, o legislador firmou uma espécie de "presunção de fraude" pelo simples fato de os consortes constituírem sociedade, impondo-lhes o desfazimento da sociedade, se forem casados sob os regimes referidos pelo CC 977.
Não concordamos com essa postura. A condição de casados, por si só, ou a adoção deste ou daquele regime, não poderia interferir na formação de uma sociedade, sob o argumento da existência de fraude.
Toda fraude deve ser apreciada in concreto, e não segundo critérios apriorísticos injustificadamente criados pelo legislador.
O que dizer, então, daquela sociedade formada há anos por pessoas casadas em regime de comunhão universal de bens. Desfazer-se da empresa. Providenciar um substituto às pressas?
Em nosso entendimento, a solução está na alteração do regime de bens, desde que não haja prejuízo a terceiros de boa fé, especialmente os credores.
Como sabemos, o 1639, § 2°, admite a "alteração do regime, no curso do casamento, mediante autorização judicial, em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas, e ressalvados os direitos de terceiros".
Já defendemos, aliás, que, a despeito de o art. 2.039 determinar que "o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei n. 3.071, de 1° de janeiro de 1916, é por ele estabelecido", esta regra apenas explicita que para os casamentos anteriores ao Código de 2002, o juiz, quando da separação ou do divórcio, não poderá lançar mão das regras do novo Código Civil referentes às espécies de regimes de bens (arts. 1658 a 1688), para efeito de partilhar o patrimônio do casal. Deverá, pois, aplicar ainda os dispositivos do Código de 1916 (arts. 262 a 311).
Entretanto, no que tange à sua modificação (inovação do Código de 2002 – art. 1639), pelo fato de o regime de bens consistir em uma instituição patrimonial de eficácia continuada, gerando efeitos durante todo o tempo de subsistência da sociedade conjugal, até a sua dissolução, a alteração poderá ocorrer mesmo em face de matrimônios anteriores à nova lei (1).
Aliás, essa possibilidade de incidência do Código novo em face de atos jurídicos já consumados, mas de execução continuada ou diferida, apenas no que tange ao seu aspecto eficacial, não é surpresa, consoante se pode constatar da análise do CC 2035 do presente Código, referente aos contratos.
E note-se que mesmo as pessoas casadas sob o regime de separação obrigatória poderão, excepcionalmente, e desde que o juiz avalie a justa causa da medida, realizar a mudança do regime. Darei um exemplo. Imagine que dois jovens se casem por força de suprimento judicial (art. 1517, parágrafo único). Neste caso, o regime é o de separação obrigatória (art. 1641, III). Teria sentido, pois, à luz da mudança de paradigmas proposta pelo novo Código, que estas pessoas vivessem 40, 50 ou 60 anos unidos sob o intransponível regime da separação obrigatória? Ou não poderia o julgador, analisando com cautela o caso concreto, afastar a rigidez da norma e, sem prejuízo aos terceiros de boa fé, permitir a modificação de regime? (2)
Por tudo que se expôs, concluímos que, mesmo casados antes de 11 de janeiro de 2003 – data da entrada em vigor do novo Código -, os cônjuges poderiam pleitear a modificação do regime, eis que os seus efeitos jurídico-patrimoniais adentrariam a incidência do novo diploma, submetendo-se às suas normas.
Tal providência se nos afigura bastante útil especialmente para as centenas – senão milhares – de pessoas casadas sob o regime de comunhão universal e que hajam estabelecido sociedade comercial antes da entrada em vigor do novo Código.
É preciso, diante das perplexidades existentes em inúmeros pontos do novo diploma, que afastemos formalismos inúteis, visando imprimir plena eficácia à nova lei, sem prejuízo da dinâmica das relações econômicas, e, principalmente, dos ditames constitucionais, a exemplo da valorização social do trabalho e da livre iniciativa.
Por isso, defendemos a possibilidade da mudança do regime de bens, a critério do magistrado, a quem se incumbe a tarefa de avaliar, ouvido sempre o Ministério Público, em procedimento de jurisdição graciosa e com ampla publicidade, a conveniência da medida.
NOTAS
1 - Este também é o pensamento de LUIZ EDSON FACHIN e SILVIO DE SALVO VENOSA, consoante palestras ministradas pelos ilustrados juristas na inauguração do Curso Satelitário IELF-PRIMA (SP), por ocasião do Seminário sobre o Novo Código Civil coordenado por PABLO STOLZE GAGLIANO.
2 - Assim pensa SILVIO VENOSA, segundo nos foi passado pessoalmente pelo ilustre professor paulista, em consulta que fizemos a respeito do tema.
 (* Dr. Pablo Stolze Gagliano é Juiz de Direito, professor de Direito Civil da Faculdade de Direito da UFBA, professor de Direito Civil Convidado da EMAB, ESMIP e do Curso JusPodivm. Instituto de Registro Imobiliário do Brasil, IRIB, Acesso 15/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).