Direito Civil Comentado - Art.
1.142, 1.143, 1.144 - continua
Do Estabelecimento - VARGAS,
Paulo S. R.
Parte Especial -
Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Capítulo Único –
Disposições
gerais (Art. 1.142 a 1.149) Título III – do estabelecimento
Art. 1.142. Considera-se
estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa,
por empresário, ou por sociedade empresária.
Na palavra de Marcelo
Fortes Barbosa Filho, Considerada a empresa, tal qual afirmado no CC 966, como
uma estrutura complexa e capaz de ser examinada de quatro ângulos ou perfis
diferenciados, o estabelecimento empresarial corresponde a seu perfil
patrimonial. A produção ou a circulação de mercadorias ou serviços precisa,
para ser desenvolvida, do agrupamento de bens corpóreos e incorpóreos dotados
de destinação econômica específica, organizados e dispostos racionalmente para
a execução da atividade profissional própria à empresa. Forma-se, assim, uma
universalidade, ou seja, um bem coletivo que conforma um todo único, mas
heterogêneo. A vontade de um empresário, manifestada por meio de decisões
individuais e interligadas, envolve o conjunto composto por uma quantidade
variável de bens singulares, de identidade e qualidade totalmente díspares,
vinculando-o a uma mesma finalidade econômica e dotando-o, por isso, de
unidade. Surge, então, como universalidade de fato, dado seu enquadramento na
definição contida no caput do art. 90, o estabelecimento empresarial. Seja qual
for o empreendimento realizado, haverá sempre um estabelecimento, pois o
empresário necessitará se aproveitar de algum suporte material, somando-se, por
exemplo, materiais de escritório, bens de capital, marcas, patentes ou
veículos, tudo integrado pelos mesmos desígnios volitivos. O estabelecimento
pode ser simples, concentrando-se todos os bens num único local geográfico,
mas, também, assume a forma complexa e pode apresentar ramificações,
estendendo-se a locais diferentes, sob a forma de sucursais ou filiais, de
acordo com a magnitude e o conteúdo da atividade escolhida. A variabilidade é
bastante grande, contrastando, inclusive, o estabelecimento urbano, voltado
para o comércio ou para a indústria, com o estabelecimento rural, voltado para
a agricultura ou a pecuária. (Marcelo Fortes Barbosa
Filho, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.108. Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 06/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Na doutrina de Ricardo Fiuza o estabelecimento
regulado por este título sempre foi denominado pela doutrina estabelecimento
comercial ou fundo de comércio. Desse modo, só haverá estabelecimento no âmbito
da atividade empresarial, afeta a negócios e atos mercantis. Em uma definição
sintética, o estabelecimento é “o instrumento da atividade do empresário”
(Rubens Requião, Curso de direito comercial, São Paulo, Saraiva, v. 1, p. 185).
A partir do capital e do patrimônio realizado na empresa pelo seu titular, são
captados e reunidos os recursos humanos, físicos, tecnológicos, assim como os
bens incorpóreos, a exemplo do nome empresarial, das marcas e patentes. A forma
como esses recursos são reunidos e organizados pelo empresário, que caracteriza
o modo como a empresa vai atuar na realização de negócios, representa,
exatamente, o estabelecimento comercial. O estabelecimento compreende dois
atributos principais: o aviamento, entendido como a capacidade de a empresa
auferir lucros a partir da organização dos fatores de produção, e a clientela, que
é o conjunto de pessoas que se relacionam com a empresa. O célebre jurista
francês Georges Ripert chegava mesmo a se referir ao estabelecimento comercial
como “o direito a uma clientela”. As pessoas tornam-se clientes de uma empresa
exatamente em razão dos atributos do estabelecimento comercial. Assim, o
enunciado por este artigo define o estabelecimento como o complexo ou conjunto
de bens, corpóreos e incorpóreos, organizados para o exercício da empresa. O
novo Código Civil considera empresário apenas o titular de firma individual. A
sociedade empresária representa o próprio empresário, enquanto seus sócios ou
acionistas diretores ou administradores são definidos, no rigor da terminologia
jurídica, como “empreendedores ou investidores” (Fábio Ulhoa Coelho, Curvo de
direito comercial, São Paulo, Saraiva, v. 2, p. 6). Ainda que não se atenda ao
rigor técnico da lei, continuarão sendo designados como empresários também os
sócios administradores da sociedade empresária, uma vez que são eles, pessoas
físicas, os verdadeiros titulares do aviamento incorporado ao estabelecimento
comercial. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 592,
apud Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 06/08/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Segundo a
Revista Âmbito Jurídico, artigo publicado em 01/06/2009, por Marcelo
Gazzi Taddei, de acordo com
o O Código Civil de 2002 e a disciplina legal do estabelecimento
empresarial, a definição legal de
estabelecimento presente no Código Civil brasileiro é baseada no Codice
Civile italiano de 1942, conforme se observa pela leitura do seu art.
2.555, in verbis: “Art. 2555. Nozione. – L’azienda
è il complesso dei beni organizzati dall’imprenditore per l’esercizio
dell’impresa (2082)” (CODICE
CIVILE, 2007, p.408).
Portanto, o estabelecimento empresarial pode ser definido como o conjunto de
bens corpóreos e incorpóreos organizados pelo empresário para a exploração da
atividade econômica (empresa). Apresentando-se como um conjunto ou complexo de
bens, não se resume, conforme visto, ao local de desenvolvimento da empresa. Na
exploração de uma atividade empresarial é necessária a organização de vários
bens, sem a organização desses bens não é possível dar início à exploração da
atividade econômica. O estabelecimento empresarial é essencial para o exercício
da empresa, correspondendo a um dos elementos da empresarialidade. O empresário
pode exercer sua atividade em mais de um estabelecimento, destacando-se o
estabelecimento principal (sede ou matriz) e os secundários (filiais).
Alguns autores, entre os quais Rubens Requião, Fran Martins, Waldirio
Bulgarelli, utilizam as expressões fundo de comércio (influência francesa)
e azienda (influência italiana, significa negócio, empresa,
firma) como sinônimas de estabelecimento empresarial. Para Fábio Ulhoa, fundo
de comércio, que ele prefere chamar de fundo de empresa, não pode ser
considerada expressão sinônima de estabelecimento empresarial, porque
corresponde ao valor agregado do estabelecimento (conjunto de bens
organizados), sendo um atributo do estabelecimento (COELHO, v.1, 2007, p.98).
O Código Civil não utiliza a denominação estabelecimento empresarial.
Entretanto, diante do conteúdo da definição legal e por ser um dos elementos da
empresarialidade, o acréscimo do termo empresarial deve ser
feito. Nesse sentido, Marcelo Andrade Féres entende que: “por
ter-se amoldado à teoria da empresa, dado o conceito que fornece de
estabelecimento, vinculando este à figura do empresário ou à da sociedade
empresária, é de melhor técnica usar-se a designação estabelecimento
empresarial” (FÉRES, 2007, p. 5). (A Revista Âmbito
Jurídico, publicou artigo em 01/06/2009, O Código Civil de 2002 e a disciplina legal do
estabelecimento empresarial, Acessado 06/08/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Art.
1.143. Pode o estabelecimento ser objeto unitário de direitos e de negócios jurídicos,
translativos ou constitutivos, que sejam compatíveis com a sua natureza.
No entendimento de Marcelo Fortes Barbosa Filho, qualificado o estabelecimento empresarial como uma
universalidade de fato, resulta, como decorrência natural, a possibilidade de
ser tal bem coletivo objeto de negócios jurídicos. Cada um dos elementos
individuais do estabelecimento pode receber tratamento isolado, mas, nos termos
do proposto pelo parágrafo único do CC 90, pode-se considerá-los como um todo.
Viabiliza-se, portanto, a celebração de contratos ou a instituição de direitos
reais sobre o todo formado pelo conjunto de bens destinados à produção ou
circulação de bens organizada profissionalmente, unidos por uma mesma
finalidade e colocados sob a disponibilidade do empresário. A consecução desses
negócios jurídicos toma como ponto de partida a obra criadora e organizadora
realizada, realçando-se a alienação do estabelecimento, denominada trespasse, e
seu arrendamento, espécie peculiar de locação. Os valores agregados pela
reunião ordenada dos bens componentes do estabelecimento merecem ser sempre
considerados, sendo imprescindível ter sempre em mente seus predicados
fundamentais. O volume e a qualidade de pessoas com as quais é mantido
relacionamento negociai, ou seja, a clientela, bem como o potencial de lucros
gerado pela concreta situação de dado estabelecimento, correspondente ao
aviamento, se conjugam à eficiência operacional proporcionada pelos locais
físicos ou virtuais nos quais é mantido relacionamento com dito público (pontos
de empresa). Todos os predicados do bem coletivo se somam, diferenciando-se de
mera soma ou reunião desordenada. Obtém-se, então, uma apreciação mais exata da
realidade patrimonial presente na empresa, o que, caso cada bem fosse apreciado
em separado, não ocorreria. Anote-se, por fim, que, muito embora a
universalidade se apresente como um bem móvel, devendo, quando celebrado
negócio jurídico tendo-o por objeto, ser observadas as formalidades próprias a
tal espécie de bem, os imóveis incluídos na universalidade recebem tratamento
peculiar e os atos relativos são feitos em separado, obedecendo a sua
disciplina peculiar. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.108. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/08/2020.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Segundo a doutrina apresentada por Ricardo
Fiuza, o
estabelecimento comercial, como complexo de bens organizados pelo empresário
para o exercício da empresa, possui caráter unitário, representado não só pela
base física onde funciona a empresa (ponto comercial) como por outros elementos
corpóreos e incorpóreos que possuem a capacidade de realizar negócios, atrair
clientes e gerar lucros na atividade mercantil. Desse modo, o enunciado por
este CC 1.143 admite que o estabelecimento pode ser objeto de negócios
jurídicos envolvendo ele próprio, desde que compatíveis com sua natureza
unitária. Assim, o estabelecimento pode ser alienado a terceiros, operação
tradicionalmente denominada trespasse. Pode também o estabelecimento, com todos
os seus recursos e elementos, ser objeto de arrendamento, espécie de locação que
abrange os bens corpóreos e incorpóreos aplicados na empresa. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza
– p. 592, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/08/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Nas palavras de Marcelo Gazzi
Taddei, ainda no ritmo da Revista Âmbito
Jurídico, artigo publicado em 01/06/2009, O
Código Civil de 2002 e a disciplina legal do estabelecimento empresarial, no Brasil, o Código Comercial de
1850 e a legislação comercial vigente não disciplinaram especificamente a
matéria, apenas a antiga e revogada Lei de Falências (art. 52, VIII, Dec.lei nº
7.661/45) referia-se ao estabelecimento prevendo a sua venda e, a Lei do
Inquilinato (Lei nº 8.245/1991), prevê proteção indireta ao estabelecimento,
assegurando no art. 51 proteção ao ponto empresarial por meio da ação
renovatória.
Dentre os
pontos positivos do Código Civil vigente, sem dúvida o tratamento legal
específico atribuído ao estabelecimento merece destaque. O estabelecimento
empresarial constitui elemento da empresarialidade e é essencial para o
desenvolvimento de qualquer atividade econômica. Sua disciplina legal é
imprescindível para atribuir a segurança jurídica necessária para as questões
obrigacionais decorrentes da exploração da empresa, conforme será ressaltado no
presente artigo.
O estabelecimento empresarial, muitas vezes, é relacionado simplesmente ao
local onde o empresário exerce a atividade econômica. Essa noção vulgar não
corresponde à definição jurídica de estabelecimento, que não se resume ao local
de desenvolvimento da empresa. É certo que a noção vulgar integra a definição
jurídica, mas, o estabelecimento empresarial apresenta uma definição bem mais
ampla que o simples local de exploração da atividade econômica, que constitui
um dos elementos do estabelecimento, não se confundindo com ele. É uma
impropriedade técnica resumir a definição de estabelecimento à ideia de local
onde a empresa é exercida.
Natureza do
estabelecimento empresarial: CC 1.143. Muito se discutiu em torno da natureza do
estabelecimento empresarial, existindo várias teorias diferentes sobre a sua
natureza. Atualmente, a doutrina moderna dominante entende que o
estabelecimento empresarial apresenta a natureza de universalidade de fato, já
que corresponde a um conjunto de bens que se mantém unidos, destinados a uma
finalidade, por vontade e determinação do seu proprietário. O estabelecimento,
correspondendo a uma unidade organizada para uma finalidade específica, não se
confunde com o patrimônio do empresário. Não pode ser considerado
universalidade de direito porque esta só se constitui por força de lei, como
ocorre com a herança e a massa falida. Para Marcelo Andrade Féres, “Após a
codificação de 2002, não há espaço para a formação de dissidências. O trato do
estabelecimento, nitidamente inspirado pelo Codice Civile, trilha
o caminho da universalidade de fato” (FÉRES, 2007, p.20).
O CC 1.143, prevê: “Pode o estabelecimento ser objeto unitário de direitos e de
negócios jurídicos, translativos e constitutivos, que sejam compatíveis com a
sua natureza”. Segundo Marlon Tomazette (2004, p. 11), o Código Civil
classifica o estabelecimento empresarial como uma coisa coletiva ou
estabelecimento de fato porque permite que seja como um todo objeto unitário de
direitos e negócios jurídicos, sem, contudo, proibir a negociação isolada dos
bens integrantes do mesmo. O Código Civil define universalidade de fato no CC
90 como a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa,
tenham destinação unitária, podendo, entretanto, ser objeto de relações
jurídicas próprias. Portanto, os bens integrantes do estabelecimento podem ser
objeto de relações jurídicas autônomas ou podem ser negociados de forma
unitária, por meio do trespasse, como um conjunto de bens.
Vale lembrar que o estabelecimento empresarial não se confunde com o
empresário, que é aquele que exerce a atividade empresarial, e nem com a
empresa, que corresponde à própria atividade exercida pelo empresário por meio
do estabelecimento empresarial. O estabelecimento não é sujeito de direito
(sujeito de direito é o empresário) e não possui personalidade jurídica. O
estabelecimento empresarial não é uma pessoa jurídica, é uma universalidade de
fato que integra o patrimônio do empresário individual ou da sociedade
empresária, sendo objeto de direito, pode ser alienado, onerado, arrestado,
penhorado ou objeto de sequestro.
Relacionado
à natureza jurídica do estabelecimento empresarial encontra-se o princípio da
construção continuada do estabelecimento, pelo qual, o complexo organizado de
bens utilizado pelo empresário não é algo estático, é dinâmico, modificando-se
constantemente de acordo com o desenvolvimento da atividade econômica
(circulação das mercadorias, reforma do imóvel, aquisição e venda de
maquinários e veículos). Tudo isso influencia a definição do aviamento e do
valor do estabelecimento. Segundo Marcelo Andrade Féres, o estabelecimento
nunca está pronto e acabado, ele está sempre em evolução (2007, p. 22).
O
estabelecimento empresarial é composto por a) elementos corpóreos (materiais) e
b) incorpóreos (imateriais): a) Os elementos materiais abrangem as mercadorias
do estoque, utensílios, veículos, móveis, máquinas, edifícios, terrenos,
matéria-prima, dinheiro e títulos (atividades bancárias) e todos os demais bens
corpóreos utilizados pelo empresário na exploração de sua atividade econômica;
b) Os elementos incorpóreos (imateriais) do estabelecimento empresarial são,
principalmente, os bens industriais (patentes de invenção e de modelo de
utilidade, registros de desenho industrial e de marca registrada), o nome
empresarial, o título de estabelecimento, expressão ou sinal de publicidade, o
ponto empresarial (local em que se explora a atividade econômica, ponto
físico), o nome de domínio (endereço do empresário na Internet, ponto virtual),
obras literárias, artísticas ou científicas.
Os contratos não integram o estabelecimento empresarial porque não são bens,
como ressalta Marlon Tomazette (2004, p. 16), acompanhando Rubens Requião
(2003, p. 284). Nesse sentido, Marcelo Andrade Féres conclui que entre os bens
integrantes do estabelecimento empresarial não se compreendem dívidas, créditos
ou contratos, para Féres, “as relações jurídicas integram, outrossim, o
patrimônio do empresário, ao lado dos elementos do estabelecimento” (FÉRES, 2007, p. 21).
Do aviamento e clientela: O
valor atribuído ao estabelecimento empresarial não se confunde com a simples
soma dos bens que o compõe, já que o mercado valoriza o investimento realizado
pelo empresário na organização do estabelecimento empresarial. A organização do
estabelecimento influencia a sua potencialidade de gerar lucro ao empresário,
daí a importância do aviamento na definição do preço do estabelecimento. O
aviamento corresponde à potencialidade do estabelecimento empresarial gerar
lucro, estando diretamente relacionado à clientela: quanto maior a clientela,
maior o aviamento. Não se pode considerar o aviamento um bem integrante do
estabelecimento, corresponde a um atributo dele, sua capacidade de gerar
lucros. Esse é o atual entendimento da doutrina. Nesse sentido, Marcelo de
Andrade Féres destaca: “o avviamento constitui um atributo do
estabelecimento, e não da empresa, como pretende parte da doutrina.
Inegavelmente, o avviamento é o sobrevalor que se confere ao
estabelecimento bem organizado. Suponha-se que um empresário, que vende
no varejo calçados de luxo, tenha dois estabelecimentos empresariais, um
situado num bairro nobre e outro numa localidade humilde. No primeiro ponto,
ele tem ótima clientela, as vendas são significativas. No segundo, o movimento
não é suficiente para o pagamento dos custos operacionais. Com certeza, o avviamento não
pode estar relacionado à empresa (atividade), pois ela é idêntica em ambas as
situações. A capacidade de gerar lucro, assim, decorre diretamente da
articulação dos elementos do estabelecimento, inclusive o espacial, o que torna
patente que cada azienda tem seu avviamento” (FÉRES, 2007, p. 34).
De acordo com a doutrina moderna também não se pode incluir a clientela como
elemento do estabelecimento empresarial. Clientela é o conjunto de pessoas que
adquirem habitualmente os produtos ou serviços fornecidos por um empresário.
Não é objeto de apropriação pelo empresário, razão pela qual não se pode
incluí-la entre os elementos do estabelecimento empresarial. Também não se pode
falar em direito à clientela, afinal, corresponde a um conjunto de pessoas que
apresenta alterações no tempo e no espaço, o que afasta um seguro delineamento.
Integrando a clientela, existem pessoas que adquirem os produtos ou serviços de
forma esporádica, ao acaso, ao passo que outras o fazem por conhecerem a marca,
não importando o empresário que celebra o negócio. Por outro lado, existem os
clientes ligados ao estabelecimento por questões pessoais, em razão de
conhecerem empregados, gerentes, sócios ou o empresário individual. De acordo
com Marlon Tomazette: “Não obstante seja incorreto falar-se em direito à
clientela, é certo que há uma proteção jurídica a ela, consistente nas ações
contra a concorrência desleal. Todavia, tal proteção não torna a clientela
objeto de direito do empresário, pois o que se protege na verdade são os
elementos patrimoniais da empresa, aos quais está ligada a clientela, esta
recebe uma proteção apenas indireta” (TOMAZETTE, 2004, p. 14)
Trespasse - O contrato de compra
e venda do estabelecimento empresarial é denominado trespasse. Embora
consagrada pela doutrina para designar a transferência, a expressão trespasse
não foi adotada pelo Código Civil de 2002, mas, a Lei de Falência e de
Recuperação de Empresas (Lei n° 11.101/2005) indica dentre os meios de
recuperação judicial no art. 50, VII, o trespasse. No trespasse há
a transferência do estabelecimento do patrimônio do empresário alienante
(trespassante) para o patrimônio do empresário adquirente (trespassário). O
objeto da venda é o complexo de bens corpóreos e incorpóreos. Para que a
alienação do estabelecimento empresarial produza efeitos perante terceiros deve
preencher os requisitos previstos no Código Civil. O
trespasse constitui contrato bilateral realizado entre o alienante do
estabelecimento (trespassante) e o adquirente (trespassário). O alienante,
assim como o adquirente do estabelecimento, podem ser empresários individuais
ou sociedades empresárias.
O aviamento do estabelecimento, ou seja, a capacidade de gerar lucro ao seu
titular deve ser informado pelo empresário alienante nas negociações
preliminares ao trespasse. Constitui direito do empresário adquirente ser
informado sobre o aviamento do estabelecimento que pretende adquirir, sendo
dever do empresário alienante apresentar informações verídicas, sob pena de
resolução do contrato e da indenização correspondente. Para verificar a
realidade do estabelecimento que irá adquirir, o exercício do direito de
informação pelo empresário adquirente pode ocorrer por meio da due
diligence, que envolve uma análise investigativa sobre a situação
econômica do estabelecimento antes da sua aquisição pelo interessado. A análise
é baseada na escrituração referente ao estabelecimento em negociação, daí a
importância da regularidade da escrituração (CC 1.179), já que as operações
omitidas dos registros contábeis equivalem a negociações não realizadas,
reduzindo, consequentemente, o valor do aviamento.
Cumpre ressaltar que o trespasse não se confunde com a cessão de quotas sociais
de sociedade limitada ou a alienação de controle da sociedade anônima. Na
transferência da participação societária o estabelecimento empresarial não muda
de titular, tanto antes como após a transação ele pertencia e continua a
pertencer à sociedade empresária, à mesma pessoa jurídica, que apenas tem a sua
composição de sócios alterada. Na cessão de quotas ou alienação de controle, o
objeto da venda é a participação societária, ou seja, as quotas ou as ações,
conforme a espécie societária. (A
Revista Âmbito Jurídico, publicou artigo em 01/06/2009, O
Código Civil de 2002 e a disciplina legal do estabelecimento empresarial, Acessado
06/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Art.
1.144. O contrato que tenha por objeto a alienação, o
usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a
terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da
sociedade empresária, no Registro Público de empresas Mercantis, e de publicado
na imprensa oficial.
No entendimento de Marcelo Fortes Barbosa Filho, os negócios jurídicos
bilaterais referidos no artigo anterior e tendentes à alienação, ao
arrendamento ou à instituição do direito real de usufruto sobre o
estabelecimento empresarial apresentam, como fator condicionante de sua
eficácia, a ampla divulgação de sua consecução. Exige-se, assim, seja tornada
pública a notícia da mutação patrimonial sofrida pelo empresário individual ou
coletivo (sociedade empresária), para que os efeitos do ato realizado possam se
expandir sobre terceiros, não se limitando apenas aos celebrantes de um
contrato, seja este oneroso ou gratuito. Tal publicidade se efetiva, num
primeiro plano, mediante o arquivamento perante Junta Comercial e a inscrição
do empresário do instrumento público ou particular do contrato enfocado,
ressaltando-se haver o texto legal utilizado, de maneira imprópria, a palavra
“averbado”, em contraste com a legislação especial vigente (art. 32, II, e, da
Lei n. 8.934/94). É preciso, num segundo plano, promover a publicação de aviso
pela imprensa oficial do Estado-membro em que está sediado o empresário ou,
tratando-se do Distrito Federal, no Diário Oficial da União (CC 1.152, § Iº).
Ausente uma das duas providências, um terceiro não pode ser atingido pelos
efeitos decorrentes do negócio celebrado; a eficácia só permanece plena ante as
próprias partes. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.109. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/08/2020.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Historicamente, na redação original, o
dispositivo utilizava a expressão “Registro das Empresas”. Emenda de redação
que apresentamos atualizou o texto, que passou a empregar “Registro Público de
Empresas Mercantis”. Não tem paralelo no Código Civil de 1916 ou na legislação
de direito comercial.
Em
sua doutrina Ricardo Fiuza aponta como o estabelecimento comercial, considerado
como instrumento unitário do exercício da empresa, pode ser objeto de
alienação, usufruto ou arrendamento, tal como previsto no CC 1.143, a
realização de qualquer desses negócios depende, para ter eficácia jurídica e
produzir efeitos perante terceiros, da averbação do instrumento respectivo no
Registro Público de Empresas Mercantis, ou seja, na Junta Comercial, com
subsequente publicação na imprensa oficial. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 592, apud Maria Helena Diniz Código
Civil Comentado já impresso pdf 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/08/2020, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Nas
palavras de Marcelo Gazzi Taddei, de acordo com
o CC 1.144, CC 2002, o contrato de trespasse deve ser arquivado na Junta
Comercial junto ao registro do empresário e publicado na imprensa oficial. A
mesma exigência legal vale para os casos de arrendamento ou instituição de
usufruto para o estabelecimento. O descumprimento dos requisitos legais
previstos impede que o negócio referente ao estabelecimento apresente eficácia
perante terceiros. (Marcelo Gazzi Taddei, Advogado, Parecerista, Mestre
em Direito pela UNESP de Franca, SP, Professor de Direito Empresarial, Direito
do Consumidor e Direito Civil I da UNIP – Universidade Paulista, de São José do
Rio Preto, SP e Professor de Direito Empresarial da ESA – Escola Superior de
Advocacia de São José do Rio Preto, SP. A Revista Âmbito
Jurídico, publicou artigo em 01/06/2009, O
Código Civil de 2002 e a disciplina legal do estabelecimento empresarial, Acessado
06/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).