quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.263 Da Aquisição da Propriedade Móvel (Da Ocupação) – O que pode ser considerado "BEM"? VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.263

Da Aquisição da Propriedade Móvel (Da Ocupação) – O que pode ser considerado "BEM"? VARGAS, Paulo S. R. 

- Parte Especial - Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.263) Capítulo III – Da Aquisição da Propriedade Móvel - Seção II – Da Ocupação –  digitadorvargas@outlook.com

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 Art. 1.263. Quem se assenhorear de coisa sem dono para logo lhe adquire a propriedade, não sendo essa ocupação defesa por lei.

 Na visão de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame mantém o conteúdo do art. 592 do Código Civil de 1916, com nítida melhoria em sua redação. Condensou em único e breve período que a coisa móvel sem dono torna-se propriedade de quem dela se apoderar, desde que não haja vedação legal. Eliminou o Código Civil de 2002 do instituto da ocupação o rol das coisas passíveis de apropriação, como de modo infeliz fazia o art. 593 do Código Civil revogado, pois daquele catálogo constavam hipóteses reguladas de modo diverso por leis especiais. O instituto da ocupação se circunscreve aos bens móveis, uma vez que os imóveis ou são públicos ou são particulares, não se cogitando de prédios sem titularidade dominial (cf. CC 1.276 do CC). A apropriação de coisas imóveis, portanto, somente gera aquisição da propriedade pela usucapião, antes estudada. A ocupação é modo originário de aquisição da propriedade móvel, por não ter a coisa dono, de tal modo que inviável é o estabelecimento de relação jurídica com anterior proprietário. No dizer de Caio Mário da Silva Pereira, a essência da ocupação “reside, pois, na apropriação da coisa sem dono pelo simples fato, acrescentando-se, de apreendê-la, possuindo-a como própria” (Instituições de direito civil, 18. ed. Rio de Janeiro, Forense, v. IV, p. 159). A coisa sem dono pode sê-lo por duas razões: porque nunca teve dono (res nullius); ou teve dono, mas foi abandonada (res derelicta). Para caracterização do abandono, não basta a falta de posse do dono, que deve ser somada ao elemento psíquico, consistente na intenção de renunciar à propriedade da coisa (animus abandonandi). Tal ânimo não se presume, mas também não exige declaração expressa, podendo tal propósito se inferir do comportamento concludente do dono da coisa.

Os casos mais frequentes, como alerta Caio Mário da Silva Pereira, são aqueles “constantes de cláusulas adjetas a talões de empresas de serviços (lavanderia, sapataria, transportadora), consignando que se consideram abandonados os objetos não procurados num prazo determinado” (op. cit., p. 160). Não é razoável presumir a renúncia daquele que deixa objeto para reparo, pelo singelo fato de deixar de buscá-lo dentro de certo prazo estipulado unilateralmente em tabuleta ou impresso no cupom. Ainda que se estipule expressamente e com destaque tal cláusula, no regime das relações de consumo será ela abusiva, se houver descompasso entre o valor da coisa abandonada e o ressarcimento dos custos do fornecedor, valor do reparo, ou da guarda do objeto. A parte final do artigo destaca que o instituto da ocupação somente é admitido se não for proibido por lei. A regra, portanto, é a possibilidade de apropriação das coisas sem dono, salvo os casos de vedação legal. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.266. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 08/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Em artigo de Suellen Aguiar, publicado em abril de 2.016, intitulado “Noções gerais acerca da aquisição da propriedade móvel no Direito brasileiro e na legislação francesa”, o artigo visa, sobretudo, explicar as linhas gerais acerca da aquisição originária no que tange à propriedade móvel, explicitando suas principais classificações, modalidades, e regras legais aplicáveis. Em especial, o artigo aborda um comparativo com o direito francês, pois as muitas diferenças entre os ordenamentos jurídicos internacionais denotam importância de compará-los, na medida em que se mostram as falhas e os acertos de cada jurisdição, de acordo com cada jurisdição, de acordo coma aplicação dentro do seu país. Segundo a autora, o regime dos bens não é apenas uma pluralidade de técnicas que os organizam e repartem entre pessoas. E ele tem por objeto, da mesma forma,, as transferências de valores, e os fenômenos necessários à passagem dos mesmos. O estado das coisas muda com frequência, pois suas vantagens e desvantagens se transmitem de um titular a outro. por isso, os modos de aquisição que realizam tais operações são altamente diversificados, valendo de acordo com o direito ao qual são aplicados, posto que os direitos reais não se constituem como os direitos pessoais. Esses modos de aquisição podem mudar de acordo com o objeto dos seus direitos, por exemplo, a venda de um imóvel não se processa da mesma forma que um imóvel. Dessa forma, surgiu a teoria geral dos modos de aquisição, que se repartiu entre aquisição de bens móveis e imóveis. A despeito da grande importância dos bens imóveis, ante o seu valor, e ante a sua imutabilidade, os móveis vêm, ultimamente, ganhando repercussão, ante o crescimento populacional, e maior procura aos bens de consumo, de origem naturalmente descartável. Vem daí a grande importância do seu estudo, pois é preciso a sua regulação de acordo com os interesses da sociedade.

 

No Brasil, o contrato não é instrumento suficiente para a transferência da propriedade, pois vige ainda a máxima romana “traditionibus, non nudis pactis, dominia rerum transferuntur”, sendo necessária a tradição para os bens móveis e transcrição do título aquisitivo para os bens imóveis (de valor acima de determinado montante). Esse modelo se assemelha com o direito alemão, que instituiu a transferência fundada no registro imobiliário, mas nada tem em comum com o direito Francês, já que, como será visto, nesse ordenamento se exige apenas o contrato de per si para aperfeiçoamento da aquisição, bastando o simples pacto para a transferência da propriedade. Vale transcrever os ensinamentos de Venosa, concernentes ao direito francês: “Para o sistema francês, a transcrição no registro imobiliário não é constitutiva de direito real. O efeito translativo decorre do próprio contrato de compra e venda, doação, permuta etc. O contrato é, ao mesmo tempo, obrigação e fato gerador do direito real. Transfere-se a propriedade pelo simples consentimento. Quanto aos imóveis, existem nesse direito duas fases distintas: quando do contrato, a propriedade transfere-se, acarretando efeito entre as partes; com o registro imobiliário, o direito alcança o efeito erga omnes. O registro tem apenas o efeito de tornar o negócio público e oponível perante terceiros.” (VENOSA, Silvio de Salvo. 2005. p. 193). Nosso ordenamento, apesar de fortemente baseado no registro, não o vislumbra com caráter absoluto, pois a presunção é relativa, iuris tantum, podendo o registro ser alterado por decisão judicial ou mesmo por outro registro, como bem demonstra o CC 1.245 e seus parágrafos, mais adiante. (Suellen Aguiar, publicado em abril de 2.016, intitulado “Noções gerais acerca da aquisição da propriedade móvel no Direito brasileiro e na legislação francesa”, no site Jus.com.br, Acessado 08/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Pode-se e deve ser feita uma explanação em relação ao conceito de bens e sua classificação, é de extrema necessidade esta pontuação, para que estudantes do Direito tenham convicção sobre cada elemento que está tratando durante sua vida de causídico (Grifo VD). Extraído do site DireitoNet.com.br, postado em 25 de out de 2008, atualizado até a MP nº 871/2019 (04/abril/2019).


Para que a que pessoa tenha um direito, imprescindível faz-se a presença de um objeto sobre o qual ela exercerá sua pretensão subjetiva. Em regra, o objeto de uma relação jurídica é um bem. No mundo jurídico, o conceito de bem abrange o conceito de coisa, porém, não é sempre que esses conceitos caminham conjuntamente. Por vezes, bem é tido como uma espécie de coisas e, por outras, estas são tidas como espécies de bens. A fim de evitar esse conflito de conceitos, o Código Civil excluiu o vocabulário coisa de seus artigos, referindo-se apenas aos bens.

Conforme leciona Carlos Roberto Gonçalves, "bens são coisas materiais ou concretas, úteis aos homens e de expressão econômica, suscetíveis de apropriação". Portanto, os bens que podem ser objetos de direito são os corpóreos (que possuem existência física, sendo passíveis de alienação), os incorpóreos (de existência abstrata, que somente podem ser objetos de cessão), determinados atos humanos (prestações), e até mesmo outros direitos (usufruto de crédito, por exemplo) e atributos da personalidade (direito a imagem, por exemplo). Ao conjunto de bens pertencentes à um particular dá-se o nome de patrimônio. Neste, não estão abrangidas as qualidade pessoais do proprietário, embora por vezes a lesão a esses bens possa acarretar em direito à indenização. As coisas comuns são os bens insuscetíveis de apropriação pelo homem, razão pela qual não podem ser objeto de relações jurídicas, salvo se for possível sua apropriação em porções limitadas. As coisas sem dono podem ser apropriadas livremente pelas pessoas, bem como as coisas abandonadas.

Esmiuçando, discrimina-se a classificação com base em critérios de importância científica sendo que, segundo o critério de classificação adotado, o bem possuirá regras próprias. Vejamos as principais classificações:

a) Bens considerados em si mesmos - Móveis ou Imóveis: é a principal classificação. Conforme seja um ou outro o regime jurídico a ser adotado será diverso. Logo será visto cada uma dessas espécies e suas peculiaridades:

Bens móveis: nos termos do artigo 82 do CC, são bens suscetíveis de movimento, que podem ser transportados de um lugar para o outro sem que seja alterada sua substância ou sua destinação econômico-social. Dentre suas principais características está o fato de serem adquiridos por simples tradição, ocupação ou invenção, sem necessidade de outorga uxória, escritura pública e registro; ter o lapso de prescrição aquisitiva inferior ao do usucapião de bens imóveis; de sujeitarem-se a penhora, e não a hipoteca; de não serem suscetíveis de direito real de superfície, porém de mútuo; e, por fim, de sujeitarem-se ao ICMS, e jamais ao ITBI. Navios e aeronaves, embora sujeitem-se a hipoteca, são considerados bens móveis. O gás, por seu turno, também o é.

Os bens móveis podem ser classificados em:

Móveis por natureza: são aqueles que possuem movimento próprio. Eles subdividem-se em semoventes (que se movem por força própria, como um animal, por exemplo) e propriamente ditos (se movem por força alheia, como uma cadeira, por exemplo);

Móveis por determinação legal: estão regulamentados no artigo 83 do CC, que considera móveis, para efeitos legais, as energias com valor econômico; os direitos reais sobre móveis, com as ações correspondentes; e os direitos pessoais de caráter patrimonial com suas respectivas ações. Observa-se, portanto, que o Código Civil confere natureza de bem móvel a bens imateriais visando facilitar a proteção jurídica destes. Como exemplo podemos citar o fundo de comércio; as cotas das sociedades; os créditos; os direitos autorais etc.;

Móveis por antecipação: são os bens que se incorporam ao solo com a intenção de futuramente separar-se deste, convertendo-se em móvel. Como exemplo podemos citar as árvores que são plantadas justamente para serem cortadas posteriormente.

Bens imóveis: são bens insuscetíveis de movimento, que não podem ser transportados de um lugar para o outro sem serem destruídos. Podem, ainda, ser considerados imóveis por determinação legal, conforme estabelece o artigo 79 do CC, o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente. Dentre suas principais características podemos citar que são adquiridos por escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis, com exigência de outorga uxória; que seu lapso de prescrição aquisitiva é superior ao dos bens móveis; que estão sujeitos a hipoteca; que embora não sejam suscetíveis de mútuo, é a única espécie de bem que admite o direito real de superfície; e, por fim, que se sujeitam ao ITBI, e não ao ICMS. Como os bens móveis, eles também podem ser classificados como:

● Imóveis por natureza: somente o solo, com sua superfície, subsolo e espaço aéreo;

● Imóveis por acessão natural: tudo que se adere naturalmente ao solo, como as árvores, os frutos pendentes, os acessórios etc. Como visto acima, as árvores se destinadas ao corte, serão móveis por antecipação, e, se plantadas em vasos, também serão móveis, pois serão removíveis; 

● Imóveis por acessão artificial ou industrial: é a aderência de um bem ao solo por força humana, como as construções e as plantações, que não podem ser retiradas sem destruição, modificação, fratura ou dano ao bem. Tendo em vista o conceito, nele não se abrange as construções provisórias, como as barracas de feira, por exemplo.

Nestas hipóteses, não perderá o caráter de imóvel as edificações que separadas do solo não perderem sua unidade, e os materiais separados provisoriamente do prédio que voltarão a integrá-lo futuramente; Imóveis por determinação legal: são bens que são considerados imóveis por força de lei para dar maior segurança a determinadas relações jurídicas. Eles estão previstos no artigo 80 do Código Civil, dentre os quais podemos citar os direitos reais sobre os bens imóveis e suas respectivas ações e o direito a sucessão aberta (razão pela qual, inclusive, a renúncia da herança deve ser dar por escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis).

Fungíveis ou Infungíveis: essa classificação possui inúmeras importâncias práticas, como, por exemplo, se um bem é fungível, sobre ele recairá o mútuo, ao passo que, se infungível, sobre ele recairá o comodato. Vejamos as principais características de cada um deles:

Fungíveis: são bens móveis que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade, ou seja, podem ser determinados por peso, número ou medida. O Código Civil os define em seu artigo 85, como sendo "fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, quantidade e qualidade", como dinheiro, ovos etc. Seu empréstimo chama-se mútuo. Em regra, ele somente abrange bens móveis, porém, excepcionalmente podem englobar imóveis.

 

Infungíveis: são bens que não podem ser substituídas por outros em virtude de uma característica própria que tenham, que o torne individual, como um quadro, por exemplo. Seu empréstimo chama-se comodato.

 

A fungibilidade, portanto, é relativa, posto que não resulta apenas da vontade da Lei, podendo, por vezes, resultar da vontade humana. Assim, determinado bem pode ser fungível até que lhe seja atribuída determinada característica específica. Por exemplo, um relógio pode ser um bem fungível, você entrega para uma pessoa e ela pode te devolver outro igual, porém, caso o relógio seja de uma marca ou modelo específico ele não poderá ser substituído, por possuir características próprias que somente nele são encontradas.

 

A fungibilidade pode existir tanto nas obrigações de dar como nas de fazer. Assim, se um serviço puder ser realizado por qualquer pessoa ele será fungível, como, por exemplo, a lavagem de um carro - não importa quem vá fazer o serviço, o importante é que o carro seja lavado, não importando a pessoa do lavador, posto que esse pode ser substituído a qualquer momento. Porém, se um pintor é contratado para pintar uma tela pelas suas características pessoais como artista, ele não poderá ser substituído por outra pessoa, ainda que este venha a ser um artista melhor do que ele. Isso se dá porque essa obrigação é infungível, também chamada de intuitu personae, ou seja, aquele pintor somente foi contratado em virtude das qualidades pessoais que possui.

 

Consumíveis e Inconsumíveis: esta distinção é importante posto que determinados direitos não podem recair sobre bens consumíveis, como, por exemplo, o usufruto (caso recaia sobre ele, será denominado de usufruto impróprio e, ao final, o usufrutuário deverá devolver os bens que ainda existirem além de outros equivalente em gênero, quantidade e qualidade).

 

Bens Consumíveis: o Código Civil, em seu artigo 86, afirma que "são consumíveis os bens móveis cujo uso importa a destruição imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados a alienação". Assim, bens consumíveis são bens que são destruídos após serem utilizados, como o dinheiro, a comida, o livro para o vendedor etc. Nos bens consumíveis por natureza o seu simples consumo implica em sua destruição. Porém, também será considerada consumível a coisa destinada à alienação, como, por exemplo, um rádio: para o vendedor da loja ele é considerado um bem consumível, tendo em vista que, com a venda, ele se desfará dele, porém, para o comprador, ele será um bem inconsumível, uma vez que, ao adquirir sua propriedade irá usá-lo sem destruí-lo.


Os bens consumíveis podem tornar-se inconsumíveis pela vontade das partes, como uma garrafa de um vinho raro que foi emprestada para uma exposição, por exemplo. Em relação ao sentido econômico dos bens eles podem ser:

● Consumíveis de fato: são os bens natural ou materialmente consumíveis, cujo uso importa na destruição imediata da própria substância do bem, como uma fruta, por exemplo.

● Consumíveis de direito: são os bens destinados a alienação, como o dinheiro, por exemplo. Não se pode confundir bens consumíveis com bens fungíveis, embora geralmente as coisas fungíveis sejam consumíveis e as infungíveis inconsumíveis.

● Bens inconsumíveis: são bens que não são destruídos pelo seu uso. Eles admitem o uso reiterado sem alteração de sua substância. Ex.: carro, livro para o estudante. Os bens inconsumíveis podem transformar-se em juridicamente consumíveis, como, por exemplo, um livro colocado a venda em uma livraria.

Divisíveis e Indivisíveis:

Bens divisíveis: a priori, todos os bens são divisíveis, como, por exemplo, um carro, que pode ser desmontado. Porém, para o Direito Civil, o conceito de divisibilidade está relacionado com a perda ou não da propriedade da coisa, pois, no exemplo acima, se desmontado um carro suas partes não terão mais a mesma utilidade, pois o carro, em si, não terá mais utilidade. Neste sentido, proclama o CC em seu artigo 87, que "bens divisíveis são os que podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam". Assim, o bem será divisível quando, ao ser partido, formar partes reais distintas, mantendo sua substância e formando cada qual um todo perfeito. Ex.: água, ouro.

Bens indivisíveis: são bens que não podem ser fracionados sem que percam suas propriedades, suas características, sua substância. Ao serem partidos deixam de ser o que era, como ocorre, por exemplo, com a divisão de um relógio, de um carro etc.

O CC em seu artigo 88 prescreve que "os bens naturalmente divisíveis podem tornar-se indivisíveis por determinação da lei ou por vontade das partes". Desta forma, considera-se indivisível não só a divisão que acarreta na perda do valor material do bem, mas também a que prejudica consideravelmente seu valor financeiro ao ser fracionada. Podemos concluir, portanto, que a indivisibilidade de um bem pode resultar de três diferentes fontes:

● da lei (jurídica): como as servidões; as hipotecas; os imóveis rurais, que não podem ser divididos em frações inferiores a um módulo regional; os lotes, que não podem ter área inferior a 125 metros quadrados etc;

● da vontade das partes (convencional): como as ações, por exemplo. Nesta hipótese o acordo tornará a coisa comum indivisa, por não mais que cinco anos, podendo este prazo ser prorrogado posteriormente. Pode, ainda, ser estabelecida pelo doador ou pelo testador.

● da natureza (física ou natural): são os que não podem fracionar sem alteração da sua substância, diminuição de valor ou prejuízo, como, por exemplo, o carro.

Singulares e Coletivos:

Singulares: são bens que, embora reunidos, são considerados distintos, isolados uns dos outros. São considerados em sua individualidade, como, por exemplo, um caderno. Podem ser:

● Simples: bens formados por partes de uma mesma espécie, homogêneas, como, por exemplo, um animal, uma pedra, um vegetal;

● Compostos: bens formados por partes distintas, heterogêneas, como, por exemplo, um automóvel, um edifício, um eletrodoméstico;

● Materiais: bens concretos, corpóreos, como, por exemplo, uma cadeira, um avião, uma bicicleta;

● Imateriais: bens incorpóreos, abstratos, como, por exemplo, um crédito, uma dívida, um direito.

● Coletivos: também chamados de universais ou universalidades, são bens formados por coisas simples que agregados formam um todo. Se considerados conjuntamente esses bens perderão sua autonomia, individualidade. A coletividade será extinta quando as coisas que a formam vão desaparecendo, restando apenas uma delas. Neste sentido, de acordo com o artigo 90 do Código Civil, "constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes a mesma pessoa, tenham destinação unitária". Assim, a universalidade é classificada pela doutrina como:

● Universalidade de fato: conjunto de coisas materiais singulares, simples ou compostas, reunidas em coletividade pela vontade da pessoa, tendo distinção comum, ou seja, objetos iguais, da mesma natureza, como, por exemplo, um rebanho, uma bicicleta, uma frota de automóveis.

● Universalidade de direito: conjunto de coisas materiais ou imateriais, corpóreas ou incorpóreas que tem caráter coletivo. No entanto, a Lei atribui a essas coisas um caráter unitário, como, por exemplo, um patrimônio, uma herança, a massa falida etc. É formado por um complexo de relações jurídicas com vínculo resultante exclusivamente da lei.

O CC1791 estabelece a universalidade do patrimônio e da herança ao prever que "a herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros". Enquanto seu parágrafo único, dispõe que "até a partilha, o direito dos coerdeiros, quanto a propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio".

Não se deve confundir, portanto, coisas compostas com coisas coletivas (universais). Na primeira ocorre a síntese de partes, com a formação de uma coisa inteira, considerada em seu todo, por partes diferentes. Já na segundo ocorre uma reunião, um agrupamento de coisas distintas consideradas em sua individualidade.

Bens reciprocamente considerados:

- Principais: são os bens que existem sobre si mesmos, abstrata e concretamente, não dependendo de nenhum outro. Ex.: o solo.

- Acessórios: bens cuja existência supõe a existência de um principal. Ex.: a cláusula penal, que é acessório de obrigação principal; a árvore, que é acessório do solo; a fiança, que é acessória da locação etc. A regra geral é de que o principal é superior ao acessório, razão pela qual este segue o destino daquele (accessorium sequitur suum principale), salvo disposição expressa em sentido contrário. O contrário, porém, não é verdadeiro. O acessório assume a mesma natureza jurídica do principal. Em regra, o proprietário do principal é também do acessório, salvo exceção legal ou convencional. A classe dos acessórios compreende:

● Frutos: são utilidades que a coisa principal produz periodicamente, cuja colheita não diminui o valor nem a substância da fonte. Eles nascem e renascem periodicamente da coisa. Possuem três requisitos: a periodicidade; inalterabilidade da substância do bem principal; e possibilidade de separação desta. Os frutos podem ser naturais (surgem da força orgânica da própria natureza – maçã); industriais (surgem da força humana – produtos); civis (surgem dos rendimentos produzidos por uma coisa em virtude da utilização por outrem que não o proprietário do bem – aluguel); pendentes (enquanto unidos à coisa que o produziu – maçã no pé ou aluguel não recebido); percebidos ou colhidos (separados da coisa que o produziu – maçã colhida, aluguel recebido); estantes (separados do principal e armazenados para venda – maçã na caixa); percipiendos (deveriam ser colhidos mas não foram – maçã estragada no pé ou direito prescrito); consumidos (não existem mais porque foram consumidos – maçã comida);

● Produtos: são as utilidades que a coisa produz, porém não periodicamente, diminuindo-lhe a quantidade e alterando sua substância até que ele se esgote, como, por exemplo, a extração de carvão em uma mina;

● Pertenças: são móveis que não constituem parte integrante do bem, porém se destinam, de forma duradoura, ao uso, serviço ou aformoseamento de outro. Por exemplo: um trator de uma fazenda; os bens de decoração de uma residência; etc. O artigo 94 do CC diferencia as pertenças das partes integrantes do bem ao afirmar que "negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso". Pode-se concluir, portanto, que a regra de que o acessório segue o principal não se aplica as pertenças.

● Rendimentos: são espécies do gênero frutos, não constituindo uma categoria autônoma. São os frutos civis consistentes em prestações pecuniárias periódicas provenientes do uso da coisa principal, como aluguel, juros etc.

● Benfeitorias: são acessórios incorporados ao bem principal pelo homem, visando conservar, melhorar ou embelezar algo. Nos termos do artigo 96 do CC e parágrafos elas podem ser necessárias (visam conservar a coisa, evitar que ela se deteriore, ou permitir sua exploração econômica); útil (visam facilitar ou melhorar o uso do bem – garagem); voluptuária (visam embelezar a coisa sem aumentar sua utilidade – jardim). Referida classificação não é absoluta tendo em vista que, uma mesma benfeitoria pode enquadrar-se em diferentes espécies conforme as circunstâncias. Assim, uma piscina em uma escola de natação será uma benfeitoria necessária; em um colégio será útil; e, em uma residência, será voluptuária. Elas não devem se confundir com acessões, tendo em vista que são feitas sobre bens já existentes. 

Por fim, cumpre afirmar que não constituem bens acessórios a pintura em relação a uma tela; a escultura em relação a uma matéria prima; e um escrito em relação ao material onde é feito, tendo em vista que, nesses casos, o trabalho acessório terá maior valor em relação ao principal.

c) Bens considerados em relação ao titular do domínio

- Públicos: nos termos do artigo 98 do CC, são os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno, como a União, os Estados ou os Municípios. Segundo sua destinação podem ser:

● Bem de uso comum: são os bens de domínio público do próprio Estado que podem ser usados por qualquer um do povo, sem exigência de qualquer formalidade, como, por exemplo, o mar, os rios, as estradas, ruas e praças. Caso o Poder Público regulamente o uso desses bens, eles não perderão seu caráter de uso comum, como ocorre, por exemplo, com a cobrança de pedágio nas rodovias. Ainda, seu uso pode ser restrito ou vedado por questões de ordem pública. Caso não seja vedado o uso, a população poderá livremente ter acesso a eles, porém seu domínio continuará pertencendo a pessoa jurídica de direito público, que terá poder para guarda, administração e fiscalização deles.

● Bem de uso especial: assim como os primeiros, também são bens de domínio público do Estado, porém possuem uma destinação especial visando a execução de serviços públicos. Exemplos disso, são os edifícios e terrenos aplicados em serviço ou estabelecimento federal, estadual ou municipal, utilizados exclusivamente pelo Poder Público.

Tanto os bens de uso comum como os de uso especial são inalienáveis, imprescritíveis, impenhoráveis e impossibilitados de oneração. Porém, a inalienabilidade pode ser relativa se o bem for suscetível de valorização patrimonial, caso em que poderá ocorrer sua desafetação.

 ● Bens dominicais: são os bens de domínio privado do Estado, como, por exemplo, as terras devolutas, as estradas de ferro, as oficinas e fazendas pertencentes ao Estado. Suas normas são próprias e diferentes das aplicáveis aos bens de uso comum e de uso especial. Se destinados a uma finalidade pública específica não poderão ser alienados, caso contrário, poderão ser por qualquer instituto de direito privado ou do direito público. Porém, essa alienabilidade é relativa, podendo ser perdida através da afetação. É um patrimônio federal, estadual ou municipal como objeto de direito real ou pessoal.

Por fim, cumpre ressaltar que, nos termos do artigo 102 do CC, todos bens públicos são insuscetíveis de usucapião. Corroborando este entendimento encontra-se a Súmula 304 do STF.

 - Particulares: são os bens que não são de domínio nacional, como a casa de alguém, por exemplo. 

 ● Bens considerados quanto a possibilidade de serem ou não negociados

 No comércio: são os bens negociáveis.

- Fora do comércio (extra commercium): são bens insuscetíveis de apropriação (por sua própria natureza) e legalmente inalienáveis (não passíveis de alienação por disposição legal). São bens naturalmente indisponíveis  (ar, água do mar etc.); legalmente indisponíveis (bens de uso comum do povo; bens de uso especial; bens dos incapazes; valores e direitos da personalidade, como a dignidade, liberdade, honra; e órgãos do corpo humano); ou indisponíveis pela vontade humana (bens com cláusula de inalienabilidade - o que implicará na impenhorabilidade e incomunicabilidade dos bens nos termos da Súmula 49 do STF). Assim podem ser:

● Insuscetíveis de apropriação: podem ser tanto os bens não econômicos (valores personalíssimos, como vida, honra etc., e as coisas inúteis ou abundantes, como o ar, água), como as coisas da sociedade, de interesse coletivo (gás, água, energia);

 ● Inalienáveis: por lei (bem de família) ou por vontade (testamento, doação). (Explanação em relação ao conceito de bens e sua classificação, extraído do site DireitoNet.com.br, postado em 25 de out de 2008, atualizado até a MP nº 871/2019 (04/abril/2019), acesso em 08.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.260, 1.261, 1.262 Da Aquisição da Propriedade Móvel (Da usucapião) - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.260, 1.261, 1.262

Da Aquisição da Propriedade Móvel (Da usucapião) - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial - Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.260 ao 1.262) Capítulo III – Da Aquisição da Propriedade Móvel - Seção I – Da Usucapião –

digitadorvargas@outlook.comvargasdigitador.blogspot.com

 

Art. 1.260. Aquele que possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente durante três anos, com justo título e boa-fé, adquirir-te-á a propriedade.

 

Conforme os ensinamentos de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, adquire a propriedade aquele que possui bem móvel durante três anos, de forma ininterrupta e sem oposição, mediante justo título e boa-fé. Para que seja dispensada a prova do justo título e da boa-fé, exige-se que a posse se prolongue pelo lapso de cinco anos ininterruptos, conforme CC 1.261. há precedente do superior Tribunal de Justiça no sentido de que veículo furtado não pode ser adquirido por usucapião ordinário (REsp 247.345). Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, contudo, admitem a possibilidade, aduzindo que “duas razões sustentam a admissibilidade da usucapião pelo ladrão: a) a usucapião extraordinária de bens imóveis e móveis não pede o requerimento da boa-fé. Assim, mesmo aquele que sabe que a coisa pertence a outrem, pode usucapir no longo prazo de cinco anos; b) a usucapião proveniente de aquisição violenta da posse é viável no tocante aos bens imóveis e o termo inicial da prescrição aquisitiva é o instante da cessação da violência (CC 1.208). Assim, também terminará a violência no momento posterior à prática do ilícito de subtração do veículo, daí iniciada a contagem do lustro legal. Note-se que a mansidão e a pacificidade da posse cessam quando o Ministério Público oferece denúncia pelo fato típico, ante o caráter de publicidade emanado da ação penal. Há de ponderar-se que, mesmo sendo julgada procedente a pretensão, o possuidor poderá prejudicar-se reflexamente, pois o magistrado oficiará ao juízo penal sobre o ilícito criminal, e a possível sentença condenatória incluirá como um dos efeitos secundários o perdimento dos bens obtidos com a prática do ilícito” (Direitos reais, Lumen Juris, 4º ed., p. 340).

 

Nos casos de alienação fiduciária em que ocorra o inadimplemento, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de impossibilidade da usucapião, uma vez que “a transferência a terceiro de veículo gravado como propriedade fiduciária, à revelia do proprietário (credor), constitui ato de clandestinidade, incapaz de induzir posse (CC 1.208), sendo por isso mesmo impossível a aquisição do bem por usucapião. De fato, em contratos com alienação fiduciária em garantia, sendo o desdobramento da posse e a possibilidade de busca e apreensão do bem inerentes ao próprio contrato, conclui-se que a transferência da posse direta a terceiros – porque modifica a essência do contrato, bem como a garantia do credor fiduciário – deve ser precedida de autorização” (STJ, Quarta Turma, REsp n. 881.270, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJE 19.03.2010).

 

Súmulas do supremo Tribunal Federal: “340. Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião”. “193. O direito de uso de linha telefônica pode ser adquirido por usucapião”.

 

Enunciado 86 do Conselho da Justiça Federal: “A expressão ‘justo título’ contida nos CC 1.242 e 1.260, abrange todo título jurídico hábil, em tese, a transferir a propriedade, independentemente de registro”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 07.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No lecionar de Francisco Eduardo Loureiro, a usucapião é o primeiro modo de aquisição de coisa móvel previsto no Código Civil de 1916. Em sua substância, o artigo em exame reproduz o que continha o art. 618 e seu parágrafo do Código Civil de 1916, embora com aprimoramento da redação.

 

O objeto da usucapião é coisa móvel, bem corpóreo, de modo que não há usucapião de propriedade imaterial, marca ou patente, na impossibilidade da prática de atos possessórios sobre direitos e créditos. Embora haja quem defenda posição contrária, a jurisprudência majoritária nega a possibilidade de se usucapir bens imateriais, tais como ações de uma sociedade anônima (RJTJESP 69/166) ou direito de marca e nome industrial (TJTJESP 99/197).

 

Inicia o legislador - ao contrário do que ocorre na usucapião sobre coisa imóvel -, por tratar da usucapião na modalidade ordinária, com prazo reduzido de três anos, para disciplinar, no artigo subsequente, a usucapião extraordinária. Não se cogita das modalidades de usucapião especial urbano, rural ou coletivo sobre coisas móveis. Os requisitos da usucapião ordinária são rigorosamente os mesmos, salvo no tocante ao prazo, da usucapião sobre bens imóveis, ou seja: coisa hábil, posse contínua, sem oposição, com animus domini, justo título e boa-fé. A única alteração dos requisitos se refere ao prazo da usucapião, que se reduz de dez para três anos. Remete-se o leitor ao comentário ao CC 1.242, em que se analisou cada um dos requisitos da posse ad usucapionem.

 

Podem ser usucapidos semoventes e coisas inanimadas. Os casos mais frequentes de usucapião sobre coisas móveis recaem sobre direitos de uso de linha telefônica e veículos. Em relação ao primeiro caso, depois de certo titubeio, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 193, do seguinte teor: “O direito de linha telefônica pode ser adquirido por usucapião”. Talvez a solução encontrada pelo pretório não seja a de maior rigor técnico, pois não se pode falar propriamente em posse sobre a linha, mas apenas em direito de uso do assinante em relação a serviço de concessão pública. O entendimento do tribunal, porém, serviu para acomodar e dar solução confortável à situação jurídica na qual o adquirente dos direitos de uso não conseguia formalizar a transferência formal da assinatura para seu nome.

 

Em relação ao segundo caso, cabe, em tese, usucapião ordinária ao terceiro de boa-fé que adquire veículo irregular, ainda que proveniente de furto, desde que tenha posse pelo prazo de três anos, contínua e sem oposição, com ânimo de dono. O justo título se consubstancia no negócio de aquisição do veículo, muitas vezes merecedor de registro no departamento de trânsito, ou seja, potencialmente hábil à transferência da propriedade, mas que padece de vício substancial. Em sentido contrário, porém, decidiu o Superior Tribunal de Justiça, entendendo que o veículo objeto de furto não pode ser possuído “como próprio”, em razão da precariedade da posse (REsp n. 247.345/MG, rel. Min. Nancy Andrighi). Não parece, contudo, ser precária a posse do terceiro adquirente de boa-fé, diante da falta de relação jurídica preexistente com o dono da coisa. Ademais, na accessio possessionis pode o possuidor aproveitar ou descartar a posse do antecessor, de modo que a posse violenta ou clandestina do furtador não contamina necessariamente a do terceiro adquirente de boa-fé.

 

Diversa, porém, é a solução no caso do próprio ladrão ou do receptador doloso requererem a usucapião. Embora Nelson Rosenvald alerte que a usucapião extraordinária não exige boa-fé e que a violência cessa quando adquire o furtador a soberania sobre a coisa (Direitos reais, teoria e questões, 2. ed. Niterói, Impetus, 2003, p. 101), na verdade, no caso nem posse há, mas mera detenção. Enquanto o ladrão não dá a conhecer ao esbulhado onde se encontra a coisa, impedindo sua reação e recuperação da res, persiste a clandestinidade, que, na forma da parte final do CC 1.208, antes comentado, impede o nascimento da posse. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.262-63. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 07/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD). 


Em artigo de Felipe Carvalho de Souza, “Usucapião de bem móvel extraordinário e sua incompatibilidade com o princípio da eticidade” publicado em novembro de 2015 no site Jus.com.br, ele comenta: A possibilidade da usucapião extraordinária de bem móvel oriundo de furto ou roubo é questão tormentosa na doutrina na atualidade. Diante disso, demonstra-se aqui, que tal instituto não coaduna com o princípio da Eticidade. O CC 1261 prevê uma modalidade de usucapião para o bem móvel, que independe de boa-fé e da possibilidade da usucapião extraordinária sobre bens oriundos de furto e roubo, já que tal instituto não exige a boa-fé. Em síntese, quer-se saber se o produto oriundo de furto ou de roubo, mesmo quando o proprietário legítimo exerça a função social para aquele bem e busque auxílio do Estado para reavê-lo por ter sido subtraído de forma violenta, se vê impedido pela ineficácia do Estado em garantir a proteção do bem do cidadão. Identifica-se, em dados estatísticos, que dos inquéritos policiais no estado de Minas Gerais que apuram crimes contra o patrimônio, citam-se como exemplos, o furto e roubo, em mais de 80% dos casos não se descobriu a autoria. O grande conflito seria a possibilidade da usucapião sobre bens oriundos de práticas criminosas, pois o instituto seria incompatível com um dos princípios norteadores do Código Civil, qual seja, a Eticidade. Observamos ainda que o produto adquirido de forma ilícita não pode ser passível de posse. Seria mera detenção, pois não há possibilidade do próprio autor do delito se beneficiar do instituto da usucapião para aquisição da ‘’RES’’ produto de furto ou de roubo, fato esse que colidiria com o princípio ora citado.

 

Cabe citar ser o Brasil um dos países mais violentos da América Latina, que, por sua vez, se apresenta como  região mais violenta do mundo, os dados são do “Estudo Global Sobre Homicídios” em pesquisa realizada pela ONU, com dados do ano de 1997, o Brasil foi indicado na quinta posição em quantidade de roubos no mundo. Entende-se que a modalidade de usucapião extraordinária, além de colidir com o princípio da Eticidade, também não condiz com a realidade social de nosso país, que vive um colapso em seu sistema de segurança pública. Sendo assim, com a devida vênia, há que se discordar dos doutrinadores que legitimam a usucapião extraordinária de bem móvel oriundo de furto ou roubo.

 

Conforme assevera Deocleciano Guimarães: “Do latim usucapião, capitação ou aquisição pelo uso prolongado. Seu significado original era de posse. A lei das XII tábuas estabeleceu que quem possuísse por dois anos um imóvel tornar-se-ia proprietário.”

 

Era modalidade de aquisição ius civile, portanto, destinado aos cidadãos romanos. Posteriormente, no direito clássico, surgiu a usucapião que estipulava que quem possuísse um imóvel provincial por certo tempo poderia repelir qualquer ameaça à sua propriedade pela longi temporis praescriptio. Essa alegação poderia ser utilizada tanto pelos cidadãos romanos, como pelos estrangeiros.

 

O fato de a usucapião constituir-se em espécie de prescrição se justifica, em última análise, ao princípio constante na construção jurídica romana, qual seja o direito de proteger aos que vigiam. Pois que seu principal fundamento se baseia no interesse social, e consequentemente, no interesse público, quer no tocante à prescrição extintiva ou liberatória, quer à prescrição aquisitiva. Assim, quando o proprietário de um bem imóvel se mostra negligente diante de uma violação por parte de um ocupante e não reclama a restauração do estado do status quo ante, dentro do prazo que a lei estipula, para o proprietário, opera-se a prescrição extintiva, ao passo que, para o ocupante, poder-se-á verificar a prescrição aquisitiva”. (Guimarães, 2011:582). (Felipe Carvalho de Souza, “Usucapião de bem móvel extraordinário e sua incompatibilidade com o princípio da eticidade” publicado em novembro de 2015 no site Jus.com.br. Acessado 07/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Art. 1.261. Se a posse da coisa móvel se prolongar por cinco anos, produzirá usucapião independentemente de título ou boa-fé.

 

No diapasão de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame reproduz o que continha o art. 619 do Código Civil de 1916, apenas corrigindo antigo defeito de redação, que falava em “título de boa-fé”, agora transformado, de modo adequado, em “título ou boa-fé”. Os requisitos da usucapião extraordinária - posse contínua, sem oposição e com animus domini - foram analisados no comentário ao CC 1.238 do Código Civil, ao qual se remete o leitor. Note-se, como lá acentuado, que não exige a lei a posse ser justa. Ao contrário, ao dispensar a boa-fé dos requisitos desta modalidade de usucapião, admite implicitamente a existência de vícios conhecidos do possuidor. Ressalte-se, porém, que a posse violenta e a posse clandestina são aquelas adquiridas de modo ilícito, cuja causa ofende o ordenamento, mas a clandestinidade e a violência são pretéritas e não mais persistem. Enquanto perdurarem, não nasce a posse, nos exatos termos da parte final do CC 1.208. Tudo o que se afirmou no comentário ao CC 1.238 aqui se aplica, com exceção do tempo da posse, que é de apenas cinco anos. No que se refere ao objeto da usucapião sobre bens móveis, em especial a possibilidade de recair sobre veículos objeto de furto, remete-se o leitor ao artigo anterior. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.272. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 07/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

A Doutrina de Ricardo Fiuza não acrescenta nenhum plus. Caracteriza-se a usucapião extraordinária de bem móvel quando houver posse ininterrupta e pacífica, pelo prazo de cinco anos, sem que se tenha justo título e boa-fé (v. Súmula 445 do STF). A norma é idêntica ao art. 619 do Código Civil de 1916, ressaltando-se que foi suprimido o parágrafo único. Deve, pois, a ela ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 651, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 07/10/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Investindo no saber do unisalesiano.edu.br, Formas De Aquisição Da Propriedade Móvel Formas Originárias E Derivadas” tem-se que, usucapião de bens móveis não é forma originária de aquisição somente da propriedade imóvel, sendo também aplicada aos bens móveis. Assim sendo, há duas formas de usucapião de móveis, a ordinária (CC 1.260) e a extraordinária (CC 1.261). a) Estabelece o primeiro dispositivo citado que aquele que possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente, durante três anos, com justo título e boa-fé, adquirir-lhe-á a propriedade. Esse era o menor prazo de usucapião previsto na lei brasileira. Todavia, com a introdução no Código Civil da nova modalidade de usucapião especial urbano por abandono do lar, o menor prazo passou a ser de dois anos (CC 1.240-A). b) Seguindo no estudo da categoria em apreço, nos termos do CC 1.261, se a posse da coisa móvel se prolongar por cinco anos, produzirá usucapião extraordinária, independentemente de título ou boa-fé. Resumindo, percebe-se que são requisitos da usucapião ordinária de bens móveis: Posse mansa, pacífica em com intenção de dono por três anos. Justo título e boa-fé. Para a caracterização do que seja justo título, aqui também pode ser aplicado o Enunciado n. 86 do CJF/STJ, aprovado na I Jornada de Direito Civil, pelo qual a expressão justo título, contida nos arts. 1.242 e 1.260 do CC/2002, abrange todo e qualquer ato jurídico hábil, em tese, a transferir a propriedade, independentemente de registro. Por outra via, para a usucapião extraordinária de bens móveis, há apenas o requisito da posse de mansa, pacífica e com intenção de dono por cinco anos. Quanto ao justo título e à boa-fé, como ocorre com a usucapião extraordinária de bens imóveis, há uma presunção absoluta ou iure et de iure das suas presenças. Deve ficar claro que as formas constitucionais ou especiais de usucapião imobiliária, obviamente, não se aplicam aos bens móveis. Partindo para a exemplificação, a situação típica de usucapião mobiliária envolvia as linhas telefônicas, nos termos da Súmula 193 do STJ. Porém, como é notório, as linhas telefônicas perderam o valor de mercado de outrora, não tendo, em realidade, valor algum. Sendo assim, perdeu-se o interesse em sua usucapião. (unisalesiano.edu.br,Formas De Aquisição Da Propriedade Móvel Formas Originárias E Derivadas” acesso ao site em 07.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).


 Art. 1.262. Aplica-se à usucapião das coisas móveis o disposto nos arts. 1.243 e 1.244.

 Na toada de Francisco Eduardo Loureiro, manteve o legislador tratamento unitário, tal como já fazia o Código Civil de 1.916, quanto ao regime do aproveitamento da posse do possuidor anterior (CC 1.243) e da incidência das causas obstativas, suspensivas e interruptivas da prescrição (CC 1.244), ao prazo da usucapião sobre coisas imóveis e móveis. Remete-se o leitor aos comentários aos aludidos CC 1.243 e 1.244 aplicando-se inteiramente o que lá se disse à usucapião sobre coisas móveis. Em resumo, estendeu o legislador o regime jurídico da usucapião sobre coisas imóveis - salvo no tocante ao prazo - à usucapião sobre coisas móveis. No que se refere a aspectos processuais, algumas distinções persistem. Assim, decidiu o Superior Tribunal de Justiça que se aplica o art. 94 do Código de Processo Civil de 1973, hoje correspondendo no CPC/2015  ao art. 46 §§ 1º ao 5º (Grifo VD), à usucapião sobre coisa móvel, cuja competência é a do foro do domicílio do réu (REsp n. 31.204-1-SP, rel. Min. Eduardo Ribeiro). A reforma processual excluiu do rito sumário a ação de usucapião sobre coisa móvel que, assim, se regula pelo rito ordinário do procedimento comum. Não se aplicam as regras do procedimento especial dos arts. 941 e seguintes do Código de Processo Civil de 1973, Capítulo VII Da Ação De Usucapião De Terras Particulares com reflexos e correspondência no CPC/2015, mantendo-se o art. 941 anterior e o novo art. 246 § 3º do CPC/2015 bem como os arts. 569 do Capítulo IV Da Ação De Divisão E Da Demarcação De Terras Particulares, seção I – disposições Gerais (Grifo VD), expressamente circunscrito à ação de usucapião sobre coisa imóvel, com peculiaridades como a citação de confrontantes e cientificação das Fazendas Públicas incompatíveis com a coisa móvel. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.273. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 07/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).


Sem alteração para a Doutrina de Ricardo Fiuza na usucapião de coisas móveis também é permitido que seja acrescenta à sua posse, a de seus antecessores (CC 1.243). Aplicam-se à usucapião de bens móveis as causas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição (CC 1.244).  É o artigo idêntico ao parágrafo único do art. 619 do Código Civil de 1916, suprimido pelo dispositivo anterior, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 651, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 07/10/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No luzir de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo 1) trata  da aplicação subsidiária das regras relativas à usucapião de imóvel; 2) o possuidor pode, com a finalidade de contar o tempo exigido, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores, desde que todas sejam contínuas e pacíficas. Na hipótese do CC 1.242, também depende de justo título e boa-fé; e 3) se estende ao possuidor o disposto em relação ao devedor acerca das causas que obstam, suspendem ou interrompem a prescrição. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 07.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

terça-feira, 6 de outubro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.257, 1.258, 1.259 Da Avulsão, Do Álveo Abandonado, Das Construções e Plantações - VARGAS, Paulo S. R. -

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.257, 1.258, 1.259

Da Avulsão, Do Álveo Abandonado, Das Construções e Plantações 

- VARGAS, Paulo S. R. - Parte Especial - Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.248 ao 1.259) Capítulo II – Da Aquisição da Propriedade Imóvel

Seção III – Da Aquisição por Acessão – Subseções III, IV e V

digitadorvargas@outlook.comvargasdigitador.blogspot.com

 

Art. 1.257. o disposto no artigo antecedente aplica-se ao caso de não pertencerem as sementes, plantas ou materiais a quem de boa-fé os empregou em solo alheio.

 Parágrafo único. O proprietário das sementes, plantas ou materiais poderá cobrar do proprietário do solo a indenização de vida, quando não puder havê-la do plantador ou construtor.

 Sob o prisma de Francisco Eduardo Loureiro, manteve o legislador em substância o que continha o art. 549 do Código de 1916, alterando apenas a redação do dispositivo. Trata-se, segundo Carvalho Santos, do caso “em que alguém faz plantações ou edifica em terreno alheio, pertencendo as sementes, plantas e materiais a um terceiro, não a ele, plantador ou construtor” Carvalho Santos, J. M. de. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. V II, p. 424). Segundo o mesmo autor, criam-se, em tal caso, relações jurídicas de três ordens, entre os diversos interessados: entre o proprietário do solo e o construtor/plantador; entre o construtor/plantador e o proprietário do material; entre o proprietário do solo e o dono do material (op. cit., p. 424).

 

Inicia o artigo regulando a primeira das relações mencionadas e dispõe que o dono do solo adquire a propriedade das acessões (aplica-se o que contém o artigo anterior), mas indeniza o construtor/plantador por seu valor atual, ainda que o material empregado na obra seja alheio. A indenização a que faz jus o construtor/plantador, portanto, é pela totalidade da acessão e não apenas pelo valor da mão de obra. Tal solução se impõe, por dever o construtor/plantador indenizar o dono do material ou das sementes empregados na acessão. Em termos diversos, o construtor/plantador recebe a indenização do dono do solo, que se beneficiou com a aquisição da acessão, mas repassa o valor do material a seu proprietário.

 

O dono do solo, a princípio, não tem relação jurídica direta com o dono do material. Logo, a responsabilidade primária será do construtor/plantador indenizar o dono do material. Caso isso não ocorra, nasce, então, a responsabilidade subsidiária do dono do solo, que se beneficiou com a incorporação da acessão, frente ao dono do material, como reza o parágrafo único do art. 549 do Código Civil. Como, porém, alerta Carvalho Santos, este último nada poderá receber se o proprietário do solo já pagou a indenização completa ao construtor/plantador. O preceito visa a evitar o enriquecimento sem causa indireto, que ocorre quando existem duas transmissões sucessivas de valor econômico; primeiro, do patrimônio do empobrecido para o de um intermediário e, depois, do intermediário para o beneficiário final. É por isso que, ao contrário do entendimento da doutrina tradicional, se o construtor/plantador nada tiver a receber, por estar de má-fé, ainda assim pode o proprietário do material pedir indenização de seu valor ao dono do solo, que se beneficiou da acessão. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.258-59. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 06/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Em sua Doutrina, Ricardo Fiuza alude a lição de Maria Helena Diniz, “Se terceiro de boa-fé vier a plantar ou construir com semente ou material de outrem, em terreno igualmente alheio, o dono da matéria-prima perderá sua propriedade, mas será indenizado pelo valor dela” (Código Civil anotado, São Paulo, Saraiva, 1995, p. 421). O artigo é idêntico ao Art. 549 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 649, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 06/10/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Pouca acrescenta Alexandre Ferreira simplesmente observando que o parágrafo único, obriga primeiramente a cobrança do plantador ou construtor, para posteriormente, caso não consiga receber, cobrar o proprietário. (Alexandre Ferreira, em 21/10/2003, no site www.direitonet.com.br, Estudos sobre as diversas formas de aquisição da propriedade móvel, Acessado em 06/10/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Seguindo o parecer dos demais, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, hipótese análoga à do artigo anterior, mas em que são utilizados bens de terceira pessoa em terreno alheio. O agente será ressarcido do valor das acessões pelo proprietário das sementes ou materiais. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 06.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 1.258. Se a construção, feita parcialmente em solo próprio, invade solo alheio em proporção não superior à vigésima parte deste, adquire o construtor de boa-fé a propriedade da parte do solo invadido, se o valor da construção exceder o dessa parte, e responde por indenização que represente, também, o valor da área perdida e a desvalorização da área remanescente.

 

Parágrafo único. Pagando em décuplo as perdas e danos previstos neste artigo, o construtor de má-fé adquire a propriedade da parte do solo que invadiu, se em proporção à vigésima parte deste e o valor da construção exceder consideravelmente o dessa parte e não se puder demolir a porção invasora sem grave prejuízo para a construção.

 

Como ensinam Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, ainda que o construtor esteja de má-fé, se invadir área sem que ultrapasse a vigésima parte do solo alheio, poderá adquirir a propriedade invadida, pagando em décuplo as perdas e danos. Neste sentido o Enunciado 318 do Conselho da Justiça federal: “O direito à aquisição da propriedade do solo em favor do construtor de má-fé (art. 1.258, parágrafo único) somente é viável quando, além dos requisitos explícitos previstos em lei, houver necessidade de proteger terceiros de boa-fé”.(Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 06.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No dizer de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame não tinha correspondência no Código Civil de 1916, embora códigos estrangeiros, como, por exemplo, o italiano (art. 938), já adotassem providência similar. O caput do CC 1.258 é desdobramento do que contém o parágrafo único do CC 1.255, anteriormente comentado; ou seja, constitui exceção ao princípio superfícies solo cedit, permitindo ao construtor de boa-fé que construiu em pequena faixa do imóvel vizinho se tornar dono dela, indenizando o proprietário. Cuida-se, novamente, de direito potestativo, assegurando ao esbulhado a alienação compulsória de parte do imóvel invadido. Mais uma vez, procura o legislador tutelar a função econômica e social da propriedade imóvel, evitando a demolição da construção feita de boa-fé, com regra especial para a invasão de pequena monta. A solução legal, de resto, já era adotada pelos tribunais, na vigência do Código Civil de 1916 (R T 493/107,517/201).

 

Como diz Marco Aurélio S. Viana, são requisitos cumulativos da incidência da regra: "a) a construção se tenha feito parcialmente em solo próprio, mas havendo invasão de solo alheio; b) a invasão do solo alheio não pode ser superior à vigésima parte deste; c) a boa-fé do construtor; d) o valor da construção deve exceder o da parte invadida; d) o construtor indenizará o dono do terreno invadido, pagando-lhe o valor da área perdida e a desvalorização do remanescente” (Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XVI, p. 162).

 

Note-se que restringe o legislador a incidência da regra à construção, não abrangendo, portanto, as acessões por plantação. A construção deve estar parcialmente em solo próprio e parcialmente em solo alheio, não se aplicando a regra à construção feita inteiramente em pequena porção do imóvel vizinho. A invasão não pode ser superior à vigésima parle do imóvel vizinho e deve ser erigida de boa-fé pelo construtor, sendo, por consequência, determinante o momento no qual tomou este ciência de que construía em terreno alheio, pois incidirá na regra do parágrafo único do artigo em exame, com efeitos distintos. O valor da construção deve exceder o da porção de solo invadido do prédio vizinho, com a ressalva de que não utiliza o legislador, aqui, a qualificação “consideravelmente”, como fez no parágrafo único do CC 1.255. Logo, basta, utilizando critério econômico, que o valor da construção supere o valor da faixa invadida, sem importar a proporção.

 

Finalmente, determina o legislador a indenização da faixa invadida, por se tratar, como dito, de direito potestativo do construtor à aquisição compulsória, ainda que contra a vontade do vizinho. A indenização engloba o valor da faixa perdida e a desvalorização do remanescente. No referente à faixa perdida, não se computa na indenização, como é evidente, o valor da acessão feita pelo adquirente. O valor é o do solo, contemporâneo à época do pagamento.

 

Para a desvalorização do remanescente, deve ser calculada a diminuição de seu potencial de utilização, levando em conta normas urbanísticas, gabaritos e coeficientes de aproveitamento. Muitas vezes, o remanescente já não tem a mesma utilidade do todo, ou sua desvalorização é desproporcional à faixa perdida, correspondendo tal déficit ao valor complementar a ser indenizado. Pode ocorrer, finalmente, como alerta Marco Aurélio S. Viana (op. cit., p. 163), de o remanescente ficar inaproveitável, caso no qual haverá direito de acrescer, abrangendo a indenização a totalidade do imóvel vizinho, que se transferirá por inteiro ao construtor. O desmembramento do imóvel é feito contra a vontade de seu proprietário, por acessão inversa - modo originário de aquisição da propriedade -, de maneira que o remanescente poderá ter medidas inferiores às exigidas pela Lei n. 6.766/79 ou legislações municipais, sem que tal fato impeça o registro imobiliário. A faixa invadida, por seu turno, será unificada ao prédio vizinho.

 

O parágrafo único do artigo em exame trata da construção feita de má-fé, que invade faixa de até 1/20 da área total do imóvel vizinho. Em caráter excepcional e cercada de requisitos especialíssimos, admite-se a acessão inversa, mediante alienação compulsória da faixa invadida ao construtor. Lida o preceito com dois vetores opostos: de um lado, manter a unidade econômica do imóvel do construtor, evitando a demolição de parte da construção, que comprometa o restante da edificação e a própria função social do prédio; de outro lado, punir o comportamento malicioso do construtor, que erigiu em faixa do imóvel vizinho, ciente de tal circunstância. Da congruência dos dois fatores, extraem-se os requisitos para a acessão inversa ao construtor de má-fé: a faixa invadida não pode superar a vigésima parte do imóvel vizinho; o valor da construção supera consideravelmente o valor da faixa invadida. Note-se que voltou o legislador a qualificar o excesso, tal como fez no parágrafo único do CC 1.255, exigindo desproporção entre os dois valores. Leva-se em conta, para interpretar o termo aberto consideravelmente, o critério econômico primário e os critérios subsidiários do grau de malícia do construtor e da função social dada ao imóvel; a porção invasora não puder ser demolida, sem grave prejuízo para a construção. Leva em conta o preceito critério utilitário de que a perda da porção invasora não comprometa, de modo grave, o restante da construção. Devem-se analisar as circunstâncias do caso concreto, levando em conta a natureza e características da porção invasora e sua conexão com o restante da construção. Claro que algum prejuízo sempre haverá, mas exige o legislador que seja ele grave, ou seja, que impossibilite a utilização ou provoque desvalorização desproporcional do restante, em sacrifício que não seria razoável exigir, mesmo do construtor de má-fé; o pagamento do décuplo das perdas e danos referidas no caput do CC 1.258. Visa a multa a desestimular o comportamento malicioso do construtor, impondo-lhe pesado ônus. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.259-61. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 06/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

O Projeto de monografia de Matheus Pio de Souza, “Acessão Inversa Como Instrumento De Concretização Da Função Social Da Propriedade Imóvel”, versa sobre o instituto da acessão inversa e a possibilidade do mesmo se configurar como instrumento de concretização da função social da propriedade imóvel. A problemática desenvolvida consistiu na dúvida quanto à concretização do princípio da função social da propriedade imóvel diante da implementação do instituto da acessão inversa no ordenamento jurídico Brasileiro. A partir do momento em que o foco principal nos litígios oriundos do universo das aquisições de propriedades imóveis se tornou a proteção da função social da propriedade imóvel, devido à implementação da acessão inversa no ordenamento jurídico, confirmou-se que o instituto é um instrumento capaz de concretizar tal função social, deixando de lado o engessamento da legislação e abrindo portas para inovações que de certa forma acompanham o desenvolvimento da sociedade. O instituto possibilita a utilização de medida alternativa para solução dos conflitos que tratam sobre as invasões de propriedade imóvel, resultadas das construções realizadas parcialmente ou por inteiro em terrenos alheios, levando em consideração uma série de requisitos e garantindo com que o interesse da sociedade se sobressaia ao individual. Após apontamentos doutrinários e jurisprudenciais, a hipótese respondeu afirmativamente ao problema proposto.

 

Da relevância para a sociedade estar relacionada com o direito de propriedade e as demolições antieconômicas causadas pela realização de obras com pequenas invasões. A construção que invade uma determinada área de um terreno limítrofe não precisa necessariamente ser demolida, é possível que a área invadida se torne propriedade do construtor mediante uma indenização ao verdadeiro dono, evitando assim o dispêndio de recursos econômicos que já foram utilizados para a construção e também os que necessitariam para a demolição. O instituto traz uma alternativa social e econômica em que as medidas a serem adotadas visam beneficiar tanto as partes quanto a sociedade em si. De certa forma o instituto oferece um amparo para o ordenamento jurídico em situações peculiares, resultando em uma maior segurança jurídica no universo das aquisições de propriedades imóveis. A problemática em questão enfrentada se refere às demolições antieconômicas realizadas devido às construções que por algum motivo externo a vontade do construtor, invadem certa área do terreno limítrofe vizinho, causando a destruição da coisa nova e um dispêndio desnecessário de recursos econômicos, descaracterizando por fim a função social inerente à propriedade imóvel. Quando há uma invasão de uma construção a um terreno vizinho limítrofe, a solução para o conflito nem sempre traz consigo o princípio da função social da propriedade, resultando em um dispêndio desnecessário de recursos, além de não cumprir com os interesses da sociedade. O artigo em exame não possuía correspondência no Código Civil de 1.916, embora códigos estrangeiros já adotassem providências similares, como, por exemplo, o Código Italiano - em questão se refere a construções realizadas em terrenos limítrofes que eventualmente invadem o terreno alheio. Ressaltando que há a exigência de que a construção esteja parcialmente em terreno próprio e também parcialmente em terreno alheio. Sendo assim, a construção que invade terreno alheio não sendo ela superior à vigésima parte deste, poderá adquirir a parte invadida o construtor ornado de boa fé. A indenização neste caso é mais ampla, levando em consideração o valor da área perdida e a desvalorização da área remanescente, sendo somadas e devidas ao proprietário do terreno invadido. A função social presente neste artigo é semelhante a do artigo trabalhado anteriormente, pois leva em consideração o valor socioeconômico presente na coisa nova e a partir disso permite que o construtor adquira a propriedade da parte invadida em prol da não demolição da coisa nova que futuramente poderá atender os interesses sociais da sociedade. É importante comentar que mesmo que os casos nos artigos trabalhados sejam diferentes, os proprietários das áreas invadidas ou construídas não são prejudicados, tem total amparo da legislação para serem indenizados de maneira proporcional e direta com a lesão sofrida. Ressalta-se também que a indenização sobre a lesão sofrida é a maneira menos agravada para a solução do conflito, levando em consideração a função social presente na coisa nova, inviabilizando assim a demolição. Conforme mencionado anteriormente, a boa fé seria um pressuposto para que a acessão inversa seja configurada, entretanto, o parágrafo único do CC 1.258 relata da possibilidade do instituto agir mesmo que o construtor esteja desprovido da boa fé. A limitação imposta pelo artigo no que tange ao tamanho da invasão e o valor consideravelmente excedente da coisa nova ainda são necessários, porém, a boa fé deixa se ser afirmada como pressuposto e desta forma o parágrafo único possibilita a aquisição da parte invadida pelo construtor que age de má fé quando for comprovado que a demolição da parte invasora não poderá ser realizada sem causar graves prejuízos para a construção. Apesar de a má fé não ser um empecilho para que o construtor adquira a parte invadida, o mesmo fica obrigado ao pagamento do décuplo das perdas e danos referidas no caput do CC 1258, visando assim desestimular o comportamento malicioso do construtor, impondo-lhe um pesado ônus. Mesmo com a má fé registrada, somada ao risco que a demolição da parte invadida causaria à coisa nova, o valor social econômico ainda se sobressai sobre o particular, evidenciando cada vez mais a concretização da função social da propriedade a partir do instituto da acessão inversa. (Matheus Pio de Souza, “Acessão Inversa Como Instrumento De Concretização Da Função Social Da Propriedade Imóvel”, do Centro Universitário de Brasília – UniCEUB, apresentado em 2017, publicado pela core.ac.uk/download/pdf/. Acessado 06/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Art. 1.259. se o construtor estiver de boa-fé, e a invasão do solo alheio exceder a vigésima parte deste, adquire a propriedade da parte do solo invadido, e responde por perdas e danos que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da área perdida e o da desvalorização da área remanescente; se de má-fé, é obrigado a demolir o que nele construiu, pagando as perdas e danos apurados, que serão devolvidos em dobro.

 

No lecionar de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, se a área invadida ultrapassar a vigésima parte do solo alheio, adquirirá o construtor de boa-fé a propriedade da área invadida, respondendo por perdas e danos que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da área perdida e o da desvalorização da área remanescente. Caso o construtor esteja de má-fé, e a invasão ultrapassar a vigésima parte do solo alheio, deverá demolir a construção, pagando perdas e danos, que serão devidos em dobro. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 06.10.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No artigo de Matheus Pio de Souza, “Acessão Inversa Como Instrumento De Concretização Da Função Social Da Propriedade Imóvel”, o artigo em questão aborda algumas alterações nos pressupostos, oportunidade pela qual traz novamente a boa fé e a limitação quanto ao tamanho da invasão é desnecessária. O construtor de boa fé adquirirá a propriedade da parte do solo invadido mesmo que ela ultrapasse o limite imposto, ou seja, a vigésima parte do solo alheio. No caso em exame, embora não diga expressamente na lei, está implícito dever a acessão exceder o valor da faixa invadida, para que se inverta o princípio da gravitação jurídica, passando o solo a ser acessório da construção. A indenização prevista no artigo é mais complexa devido ao fato da ultrapassagem dos limites impostos. O construtor fica obrigado ao pagamento de indenização pelo valor da faixa perdida, pela desvalorização do remanescente e a sobrevalia da construção que corresponde à valorização desproporcional do imóvel do construtor. O final da disposição do CC 1259 relata o caso mencionado acima, porém com a configuração da má fé do construtor. Neste caso não há o que ser feito e o instituto da acessão inversa fica inerte levando em consideração a total desídia do construtor quanto aos pressupostos. A ausência da boa fé implica a demolição da coisa nova e o pagamento de indenização em dobro pelo construtor neste caso em específico. Apesar do CC 1259 em seu final recorrer pela demolição da coisa nova, tendo em vista ao desrespeito aos pressupostos necessários, em sua maioria acompanha os artigos mencionados anteriormente no quesito de que a função social presente na propriedade é superior aos desejos privados, sendo de uma clareza solar a concretização da função social da propriedade quando configurado o instituto da acessão inversa. (Matheus Pio de Souza, “Acessão Inversa Como Instrumento De Concretização Da Função Social Da Propriedade Imóvel”, do Centro Universitário de Brasília – UniCEUB, apresentado em 2017, fls. 30-32, publicado pela core.ac.uk/download/pdf/. Acessado 06/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Finalizando o Capítulo na lição de Francisco Eduardo Loureiro, cuida-se, novamente, de variante do parágrafo único do CC 1.255, permitindo a acessão inversa no caso de invasão parcial decorrente de construção no imóvel vizinho. A peculiaridade, aqui, está na dimensão da invasão, que supera a vigésima parte do imóvel vizinho, comportando soluções diversas daquelas previstas no artigo anterior. Note-se que a construção deve situar-se parte em terreno do próprio construtor e parte no terreno vizinho. Duas situações são possíveis: a construção de boa-fé e a construção de má-fé que invadem parcialmente o terreno vizinho. No caso da construção de boa-fé, embora não diga expressamente a lei, está implícito dever a acessão exceder o valor da faixa invadida, para que se inverta o princípio da gravitação jurídica, passando o solo a ser acessório da construção. Não se exige, porém, que o excesso seja considerável, diante da falta de qualificação do legislador. A boa-fé, como frisado no comentário ao artigo anterior, deve persistir durante todo o período no qual se erigiu a construção, pois no exato momento em que se converte em má-fé, como se verá, a solução é inversa. A acessão inversa, do dono do solo ao construtor, está subordinada, ainda, ao pagamento de indenização cabal, que abrange o valor da faixa perdida, a desvalorização do remanescente e a sobrevalia da construção. A última verba constitui a peculiaridade do preceito. A aquisição da propriedade da faixa invadida pode, em determinados casos, provocar uma valorização desproporcional do imóvel do construtor, potencializando sua utilização. Em tal caso, esse plus integra a indenização, como mecanismo destinado a evitar o enriquecimento sem causa do construtor. O que foi dito sobre o modo de exercício do direito potestativo e do ingresso do título no registro imobiliário no comentário ao artigo anterior aqui se aplica. No caso de construção de má-fé no terreno vizinho, a solução é diametralmente inversa e se assemelha à da parte final do caput do CC 1.255, já comentado. Diante da maior porção do imóvel vizinho invadido, já não mais há porque exigir sacrifício do dono do solo em proveito do construtor malicioso, ainda que este tenha dado aproveitamento econômico à faixa apossada. Diz a lei que o vizinho esbulhado pode pedir a retomada da posse da porção invadida, e demolir - se quiser - o que nela se construiu, arcando o invasor com seu custo, além de perdas e danos, que serão devidos em dobro. Claro que pode o dono do solo ficar com a acessão, nada pagando por ela, cm solução semelhante à do CC 1.255, diante da má-fé do construtor. A peculiaridade da sanção imposta ao construtor está no pagamento das perdas e danos em dobro, pena não pre­vista pelo legislador no caso de invasão total do imóvel vizinho. Há uma nítida incongruência da lei: aquele que constrói de má-fé na totalidade do imóvel vizinho paga perdas e danos simples, mas o que o faz parcialmente paga em dobro. É, porém, a solução adotada de modo explícito pelo legislador, talvez imaginando que a invasão parcial dificilmente permitirá ao dono do solo aproveitar a acessão ligada funcionalmente ao imóvel vizinho do invasor. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.261-62. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 06/10/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).