Código Civil Comentado – Art. 447
- Da Evicção – VARGAS, Paulo S. R.
- vargasdigitador.blogspot.com –
digitadorvargas@outlook.com -
Parte Especial - Livro I – Do Direito
das Obrigações
Título V – Dos Contratos em Geral -
Capítulo I – Disposições
Gerais - Seção VI – Da Evicção (art. 447
a 457)
Art.
447. Nos contratos onerosos, o alienante
responde pela evicção. Subsiste esta garantia ainda que a aquisição se tenha
realizado em hasta pública.
Na conceituação dos autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria
Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Capítulo V
– 2.1. EVICÇÃO Comentários ao CC, art. 447: Ocorre a evicção, segundo
conceito clássico, “quando o adquirente vem a perder a propriedade ou posse
da coisa em virtude de sentença judicial que reconhece a outrem direito
anterior sobre ela” (Gomes, 1979, p. 117). A essa concepção se deve somar a
perda da posse ou propriedade também por ato administrativo (ato estatal em
geral), visando proteger a boa-fé subjetiva do adquirente e concretizar a
proibição do enriquecimento sem causa do alienante.
É uma garantia legal
que se dá ao adquirente, nos contratos cumulativos que visam transferir a
propriedade, de que não perderá a posse ou propriedade da coisa em virtude de
uma sentença judicial (till ekzempel: comporá de imóvel perdido, posteriormente, em ação de usucapião,
perda do imóvel adquirido por existência de decreto desapropriatório já ao
tempo da alienação).
Veja que o direito de
terceiro que se reconhece deve ser, portanto, anterior à alienação. Assim, nos
contratos onerosos, o alienante responde pela evicção. Subsiste esta
garantia ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública, embora
possam as partes, em qualquer caso, desde que por cláusula expressa,
reforçar, diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção.
Chama-se o adquirente que
sofre a evicção de evicto; o terceiro ao qual é reconhecido o direito sobre
a coisa, de evictor; e a coisa sobre a qual foi declarada a evicção, de coisa
evicta ou evencida.
A respeito, a Lei
13.097/2015 estatui, ao parágrafo único do seu art. 54, que “não poderão ser
opostas situações jurídicas não constantes da matrícula no Registro de Imóveis,
inclusive para fins de evicção, ao terceiro de boa-fé que adquirir ou receber
em garantia direitos reais sobre o imóvel, ressalvados o disposto nos arts. 129
e 130 da lei n. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 e as hipóteses de aquisição e
extinção da propriedade que independam de registro de título de imóvel”.
Os arts. 129 e 130 da Lei
11.101/2005 tratam do devedor falido realizados antes da falência que são
ineficazes com relação à massa falida. Já no âmbito de hipóteses de aquisição e
extinção da propriedade que independam de registro de título de imóvel pode-se
exemplificar com a aquisição decorrente de usucapião ou herança ou extinção
igualmente oriunda desses mesmos fatores. Nessas situações, portanto, podem ser
opostos direitos anteriores à aquisição, inclusive para fins de evicção, ainda
que não haja registro ou averbação no Registro do Imóvel.
A Lei 13.797/2015 criou uma
espécie de imunidade à evicção para o caso de alienação ou oneração de
unidades autônomas integrantes de incorporação imobiliária, parcelamento do
solo ou condomínio edilício, devidamente registrada. Para tais situações,
protege-se o direito dos adquirentes, em contexto de incorporação imobiliária,
em detrimento de eventuais credores ou titulares de direitos anteriores sobre o
imóvel de propriedade do incorporador. Para amenizar essa situação, os credores
do alienante ficam sub-rogados no preço ou no eventual crédito imobiliário, sem
prejuízo das perdas e danos imputáveis ao incorporador ou empreendedor,
decorrentes de seu dolo ou culpa, bem como da aplicação das disposições
constantes da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do
Consumidor).
São os requisitos para caracterização
da evicção, registradas pelos autores no tópico 2.3.a) que a entrega da
coisa se dê em virtude de contrato oneroso (art. 447, em pauta). Se o
contrato for gratuito, o caráter de liberalidade impõe ao
adquirente/beneficiário a resignação quanto à perda da coisa.
Ressalte-se, portanto, que a
requisição da coisa por doação gravada de encargo caracteriza contrato
oneroso, o que submete o doador a responder pelos riscos inerentes à evicção.
De igual forma se deve interpretar as transferências de propriedade através de
contratos de mandato, aos quais se configura a chamada cláusula em causa
própria (in rem propriam), pela qual se concedo ao mandatário o
poder de alienar a coisa, inclusive a si mesmo, como já decidido pelo STJ,
através de (REsp 4.589/PR, Rel. Min. Athos Carneiro, 4ª T, julgado em
19-6-1991, p. 16.527). (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel
Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Capítulo V – 2.1.
EVICÇÃO Comentários ao CC, art. 447, p.1023-1026. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 01/07/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Sob apreciação de Nelson Rosenvald,
comentários ao CC art. 447,
p. 508-510, Código Civil Comentado: “Nas relações contratuais, não é suficiente que o
transmitente entregue a coisa, cumprindo a obrigação principal, para haver a
satisfação do outro contratante. As obrigações são complexas, exigindo-se do
alienante que atue conforme a boa-fé, observando os deveres anexos de proteção,
cooperação e informação, a fim de que o bem adquirido possa ser fruído da
melhor forma possível pelo adquirente, tutelando-se as suas legítimas
expectativas quanto ao negócio jurídico realizado.
Contudo, além da obrigação principal e
dos deveres instrumentais oriundos da boa-fé, o sistema jurídico concebe
garantias quanto à tutela física e jurídica do objeto adquirido. Vale dizer que
o adquirente será protegido quanto à existência de vícios ocultos que tornem a
coisa imprópria para o uso (art. 441 do CC), bem como no tocante à legitimidade
do direito que é transferido.
Sobre os vícios redibitórios, já
efetuados comentários. Relativamente à evicção, cuida-se de dever de garantia
diante de eventual perda da coisa em virtude de decisão judicial ou
administrativa que conceda o direito - total ou parcial - sobre ela a um
terceiro estranho à relação contratual em que se deu a aquisição. O terceiro
demonstra a anterioridade de seu direito, por deter a condição de real
proprietário ou possuidor do bem, através de titulação anterior ao negócio que
concedeu o direito ao adquirente. Com a perda da coisa, este passa a se chamar
evicto (excluído). Incumbirá ao evicto dirigir-se ao alienante, pleiteando a
indenização pelos prejuízos decorrentes da transferência de um direito que não
lhe pertencia quando formalizado o contrato.
É fundamental a constatação da
anterioridade do direito do terceiro, sob pena de o adquirente assumir todos os
prejuízos consequentes à perda da coisa cujo feto gerador seja posterior à sua
aquisição. Portanto, se após adquirir o imóvel o comprador se vê na posição de
réu de ação de usucapião, a possibilidade de arguir a evicção em face do
alienante variará conforme se tenha completado o prazo da usucapião: se antes
ou depois (quando tinha condições de interromper a sua fluência) do registro.
Evicção também haverá quando o decreto desapropriatório tiver antecedido o
negócio jurídico, mas não for informado o fato ao adquirente. Certo é que, se
tivesse conhecimento anterior da titularidade alheia do bem adquirido, não
poderia posteriormente agir contra o alienante, figurando o abuso do direito
(art. 187 do CC).
A evicção se impõe nos contratos
onerosos em geral, não apenas na compra e venda, de onde o modelo se originou.
Contratos onerosos são aqueles em que ambas as partes obtêm encargos e
vantagens recíprocas. Basta verificar a evicção na cessão onerosa de crédito
(art. 295 do CC), na dação em pagamento (art. 359 do CC) e na transação (art.
845 do CC).
Nos contratos gratuitos, como a doação,
não se aplica a evicção, pois o adquirente não sofre um prejuízo propriamente
dito, mas apenas a perda de uma vantagem (art. 552 do CC). Contudo, nada impede
que dentro de uma liberalidade o alienante consinta em assumir os riscos pela
perda da coisa. Há que recordar ainda a especial natureza das doações com
encargo, nas quais, apesar da gratuidade, o elemento acidental as converte em
contrato bilateral.
Aliás, ao contrário dos vícios
redibitórios, localizados nos contratos comutativos (art. 441 do CC), a evicção
se estende aos contratos aleatórios (art. 458 do CC), nos quais há uma
incerteza sobre o ganho e a perda. Com efeito, são eles onerosos, pois existe a
garantia de adimplemento da eventual contraprestação.
Outrossim, o vício sempre se referirá a
uma questão de direito que paira sobre a propriedade ou posse da coisa
adquirida. Essa posse será civil, ou seja, aquela obtida por relação contratual
(v. g. usufrutuário, arrendatário). Aliás, na locação, o art. 568 do
Código Civil bem explicita a questão. Se, porventura, a insurgência do terceiro
disser respeito a aspectos fáticos, ligados à espoliação do bem por terceiros
ou fatos da natureza, o alienante nada indenizará, pois apenas garante a
indenidade jurídica da coisa.
A cláusula que acautela o adquirente em
face da evicção é implícita, mesmo nos contratos efetuados em hasta pública.
Destarte, haverá proteção em prol daquele que arrematou judicialmente em
processo de execução. A grande indagação é a seguinte: quem lhe indenizará pela
coisa evencida? Afinal, não se trata de alienação de um bem, mas sim de uma
hipótese de expropriação praticada pelo Estado. Ademais, propugnar a evicção
contra o antigo dono é uma tarefa árdua, diante de seu estado econômico
precário, a não ser que tenha percebido o saldo remanescente pela alienação. A
outro turno, postular contra os credores da execução gera maiores chances de
sucesso, haja vista que eles levaram o bem à hasta e embolsaram o seu valor.
Poder-se-ia, em princípio, objetar que os credores nunca foram titulares do
bem, porém a cláusula geral da função social do contrato (art. 421 do CC)
propicia que o adquirente alcance aqueles, tendo em vista que o adquirente se
torna vítima de uma relação obrigacional entre o executado e exequentes. Em
suma, o resguardo do princípio da boa-fé objetiva provocará uma solidariedade
passiva entre credores beneficiados e o executado.
Classicamente a evicção era produto
exclusivo de uma decisão judicial favorável a terceiro, proferida em ação que
lhe reconhecesse propriedade ou posse sobre a coisa alienada. Atualmente,
admite-se que a sentença não é indispensável, sendo suficiente um ato de
apreensão do bem por autoridade administrativa, privando o titular do poder
sobre a coisa.
Com efeito, para fins de tráfego
jurídico em uma época de extremo dinamismo nas relações econômicas, não há
acentuada diferença entre a perda de um direito por força de uma sentença e a
sua privação por uma inegável prova quanto à titularidade da coisa pelo terceiro.
Basta cogitar das hipóteses de apreensão, por autoridade administrativa, de
veículos furtados alicerçados em documentação falsificada. É possível mesmo
cogitar da possibilidade de o proprietário abandonar o bem móvel (art. 1.263 do
CC) ou imóvel (art. 1.276 do CC) para ingressar diretamente com o pedido
indenizatório decorrente da evicção, em vez de aguardar passivamente pela
iniciativa do terceiro”. (Nelson Rosenvald, comentários ao CC art. 447, p. 508-510, Código Civil Comentado,
Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar
Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual.
- Barueri, SP, ed. Manole, 2010.
Acessado em 01/07/2022,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Acrescenta-se a conceituação, visão e
exemplificação de Marco Túlio de Carvalho Rocha, apud Direito.com, nos
comentários ao CC, art. 447: “Evicção é a perda total ou parcial de uma
coisa, em virtude de sentença que a atribui a outrem, por direito anterior ao
contrato, de onde nascera a pretensão do evicto” (Clóvis Beviláqua, Código
Civil..., v. 4, p. 281).
A prestação nem sempre pressupõe a
transferência da posse (ex.: há evicção se A cede a B crédito contra c que se
vem a saber ser de titularidade de D).
Antes da efetiva perda do bem, o
adquirente pode requerer a anulação do negócio por erro, a resolução
contratual, exigir caução, opor a exceptio non adimpleti contractus ou
opor a exceptio doli (art. 477, ‘invocável por analogia’). Os vícios de
direito podem ser afastados pelo alienante até o momento da prestação.
Evicção vem do latim evincere = ex
vincere, vender pondo fora; tirando, afastando. Vencedor: evictor; vencido;
evicto.
Exemplos (situações que podem configurar
a evicção): o alienante não tem a propriedade do bem; o alienante não tem a
posse do bem; o bem encontra-se gravado com ônus real; terceiro exerce direito
de preferencia sobre o bem; o bem foi penhorado por dívidas do alienante; o bem
foi declarado de utilidade pública para fins de desapropriação.
Não há evicção: a) se o
bem se perde antes de ser prestado; não há evicção se a aquisição do bem
encontra-se sujeita a condição suspensiva não realizada ou pendente de termo
inicial, salvo se já tiver havido adimplemento; b) se o bem
encontrava-se sujeito a condição resolutiva de domínio de que o adquirente
tinha ou deveria ter conhecimento (till exempel: cláusulas de retrovenda ou de preferência, ou preferência
legal); c) na alienação de universalidade se houver a perda de um
bem pertencente a ela, salvo se houver cláusula expressa ou se o bem for
“essencial” (há evicção pela perda da universalidade); d) se não
existir o bem alienado; a responsabilidade a que se refere o art. 295 não
configura responsabilidade pela evicção, mas decorre de nulidade absoluta por
impossibilidade do objeto; e) em razão de limitações legais
(administrativas, civis ou constitucionais) ao direito (v.g., proibição
de exercício de atividade comercial, direitos de vizinhança), porque o direito
existe com as referidas limitações; f) se o alienante
aliena a terceiro o bem que deveria transferir ao adquirente, depois de
realizado o contrato com este (há inadimplemento); g) não é
evicção a anulabilidade por erro nem a resolução contratual, nem a
indenizatória por inadimplemento. O adquirente “tem de escolher o exercício de
urna ou de outra pretensão”. São passíveis pedidos sucessivos alternativos.
A evicção pode ocorrer se entre
alienante e adquirente tiver havido: a) contrato oneroso
comutativo (art. 447) – em geral os em que há obrigação de dar, inclusive os de
uso temporário e os plurilaterais (art. 1.005); b) alienação em
hasta pública (art. 447); c) partilha (art. 2.024); d)
demarcação; e) doação propter nuptias (art. 552).
Ocorre se a perda da coisa dá-se em
razão de ação petitória, possessória, declaratória, anulatória, resolutiva ou
rescisória. A causa da evicção pode ser fato anterior, simultâneo ou posterior
à conclusão do contrato.
A sentença é requisito indispensável à
evicção, embora a lei não a exija expressamente, contudo a tradição jurídica
sim. A necessidade de sentença que decrete a perda da coisa para o adquirente é
do próprio conceito de evicção. O fato de a sentença ser necessária a fim de se
caracterizar à evicção não significa que o adquirente é obrigado a aguardá-la
para reclamar indenização ao alienante. Podendo fazê-lo com base na anulação do
negócio por erro, na resolução contratual, pode exigir caução, opor a exceptio
non adimpleti constractus ou opor a exceptio doli. Tantos
fundamentos jurídicos para pedido tórioizatorio fundado na alienação por pessoa
não legitimada torna ainda mais claro não haver a necessidade de se distorcer o
conceito de um instituto que possui longa tradição histórica e que pertence a
todos os países da tradição jurídica romano-germânica.
Silvio venosa (direito civil. V.
II, p. 586) e Arnoldo Wald (Obrigações e contratos, p. 247), no entanto,
defendem que a evicção pode decorrer de ato administrativo (ex.: apreensão
policial de veículo furtado). Orlando Gomes julga a sentença dispensável se a
evicção decorre de condição resolutiva (Contratos, p. 116). Nestes casos
é mais adequado falar-se em responsabilidade pelo descumprimento contratual. O
dever de garantia é uma das vertentes do princípio da boa-fé objetiva e, uma
vez que o alienante não esteja em condições de assegurar a posse ou a
propriedade do bem pelo adquirente, há infração desse dever. A tese de evicção
sem e sentença judicial tem sido acolhida, o entanto, pelo Superior tribunal de
Justiça”. À propósito: REsp 1.332.112/GO, rel. Min. Luís Felipe Salomão,
julgado em 21/03/2013. (Marco Túlio de Carvalho Rocha, apud Direito.com, nos
comentários ao CC, art. 447, acessado em 01/07/2022, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).