quarta-feira, 6 de maio de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 955, 956, 957- contínua Das Preferências e Privilégios


Direito Civil Comentado - Art. 955, 956, 957- contínua  
Das Preferências e Privilégios
Creditórios - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título X – Das Preferências e Privilégios
Creditórios - (Art. 955 a 965) – vargasdigitador.blogspot.com

Art. 955. Procede-se à declaração de insolvência toda vez que as dívidas excedam à importância dos bens do devedor.

Na visão de Amorim, o patrimônio do devedor é a garantia das suas dívidas, mas quando há insuficiência patrimonial, para evitar prejuízo a alguns credores, instaura-se o procedimento de insolvência, visando a uma liquidação geral de modo a partilhar os bens do devedor, após a liquidação, com a organização de concurso de credores. O conceito de insolvência é econômico, tendo como fundamento o desequilíbrio patrimonial (passivo superior ao ativo). Será falência quando o devedor for comerciante e insolvência civil quando for pessoa física não ligada ao comércio. O Código de Processo Civil regula a execução por quantia certa contra devedor insolvente (CPC, art. 1.052, no antigo CPC/1973 refere-se aos arts. 748 e ss, nota VD), sendo processo autônomo, não se admitindo a transformação de execução contra devedor solvente em insolvência civil. É importante salientar que as preferências no recebimento dos créditos devem ser respeitadas.

Recentemente tivemos a edição da nova Lei de Recuperação e Falências (Lei n. 11.101, de 09.02.2005), em que surgem novas figuras como o administrador judicial, o administrador-gestor, o comitê de credores e a assembleia geral de credores, não se podendo deixar de salientar que na própria sistemática deste Código (CC 966 a 982), a falência passou a ser aplicada aos empresários e às sociedades empresárias. A insolvência capaz de levar à falência depende da identificação das causas expressas no art. 94 da supra referida Lei.

A declaração de insolvência poderá ser requerida por qualquer credor, pelo próprio devedor, ou ainda, pelo inventariante ou espólio, caso seja falecido. Em regra, nasce, a declaração de insolvência, de um cumprimento de sentença em que se constata a insuficiência patrimonial do devedor. Haverá a nomeação de administrador dos bens e de edital de convocação de todos os possíveis credores, sendo que com a declaração as dívidas do devedor insolvente vencer-se-ão antecipadamente; seus bens serão arrecadados, desde que penhoráveis; e instala-se o concurso universal de credores, regulado pelos arts. 748 a 786-A do CPC/1973, contidos no atual livro do CPC/2015 no art. 1.052 (Até a edição de lei específica, as execuções contra devedor insolvente, em curso ou que venham a ser propostas, permanecem reguladas pelo Livro II, Título IV, da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Nota VD). (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 967 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Vê-se na doutrina de Ricardo Fiuza pontos a destacar, como Privilégios creditórios: A origem do termo vem de “privilegium”, que em latim significa uma lei instituída em benefício privado; vale dizer que estabelece para determinado caso especial um sistema mais favorável. Nesse sentido é a lição de Hector Lafaille “En latinprivelegium’ sinifica una ley instituída em beneficio privado; o em otros términos, que establece para um caso especial, um sistema más favorable que el derecho común. Si este consagra cual critério de la igualdad dentre todos los acreedores, el ‘privilegio’ lo substrae excepcionalmente a esa regla para colocarlo antes que los demás. Por eso puede usarse de esa palabra,, o bien de los vocablos ‘prelación’ o ‘preferencia’, que a este respecto serían equivalentes” Tratado de las obligaciones, Buenos Aires, ediar, 1947, v. I, p. 568). O próprio Lafaille esclarece, no entanto, que não se pode confundir privilégios creditórios com concessões arbitrárias e casuísticas a favor de determinado credor em detrimento dos outros:

“No estamos por certo ante favores o toncesiones arbitrarias. Tampoco se basan en la simple calidade de las personas, como en otro tiempo; ni responden a la mera tradicción histórica. Por un deber de justicia, el legislador antepone el pago de un crédito a todos los restantes o al de ciertos otros, porque há sido necesario o conveniente para todos o una parte de los postergados. De otra manera, estos obtendían ventajas en detrimento de aquéllos; y por tal razón la teoria de los privilegios presenta notable afinidad com el enriquecimento sin causa” Itratado de las obligaciones, Buenos Aires, Ediar, 1947, v. I, p. 569).

O nosso Código não define o que seja preferência ou privilégio creditório, ao contrário do que fez o Código Civil português, nos termos seguintes: “Art. 733, Privilégio creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito concede a certos credores, independentemente do registro, de serem pagos com preferência a outros”. O Código civil argentino traz definição semelhante: “Art. 3.785. El derecho dado por la ley a um acreedor para ser pagado com preferencia a outro, se llama em este Código privilegio”. Em resumo, podemos definir o privilégio creditório como o direito, previsto em lei, que determinado credor possui de receber o seu crédito em primeiro lugar, sempre que vários credores pretenderem receber seus créditos ao mesmo tempo e o patrimônio do devedor comum não for suficiente ao pagamento integral de todos.

Declaração de insolvência: Dá-se a insolvência toda vez que as dívidas excederem a importância dos bens do devedor (v. arts. 748 a 786-A do CPC/1973, contidos no atual livro do CPC/2015 no art. 1.052 (Até a edição de lei específica, as execuções contra devedor insolvente, em curso ou que venham a ser propostas, permanecem reguladas pelo Livro II, Título IV, da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Nota VD). Declarada a insolvência, sempre por decisão judicial, o devedor perde o direito de administrar seus bens. Nesse sentido, o Código Civil espanhol contém dispositivo expresso: “Art. 1914. La declaracción de concurso incapacita al concursado para la administracción de sus bienes y para cualquiera otra que por la ley le corresponda”. O CC/2002, tal qual fez o anterior, preferiu que a norma constasse exclusivamente da legislação processual (CPC/1973, art. 752: “Declarada a insolvência, o devedor perde o direito de administrar os seus bens e de dispor deles, até a liquidação total da massa” – hoje, no atual livro do CPC/2015 no art. 1.052, (Até a edição de lei específica, as execuções contra devedor insolvente, em curso ou que venham a ser propostas, permanecem reguladas pelo Livro II, Título IV, da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Nota VD).

Digna de elogios a substituição da expressão “concurso de credores por ‘declaração de insolvência’, tendo em vista que é esta a denominação dada ao instituto pelo vigente Código de Processo Civil. Efetivamente a indispensabilidade da uniformização dos nomes dos institutos jurídicos, na legislação substantiva e na processual, justificou a alteração.

Bibliografia: João Luiz Alves, Código Civil anotado, Rio de Janeiro, E Briguiet, 1917; Álvaro Villaça Azevedo, Teoria geral das obrigações, 9. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001; Clóvis Beviláqua, Código Civil comentado, 4. ed., Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1934; J. M. de Carvalho Sena, Código Civil brasileiro interpretado, 10. ed., Rio de Janeiro, Freitas Bastos; Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 6. ed., São Paulo, Saraiva, 1990-1991, e Código Civil anotado, São Paulo, Saraiva, 1995; Hector Lafaille, Tratado de las obligaciones, Buenos Aires, Ediar, 1947, v. 1; Abílio Neto, Código Civil anotado, 11. ed.. Lisboa, EDIFORUM, 1997; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil, 15. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1997; Silvio Rodrigues, Direito civil, 24. ed., São Paulo, Saraiva, 1996; Miguel Maria de Serpa Lopes, Curso de direito civil, 2. ed., Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, 1957; Silvio de Salvo Venosa, Direito civil, São Paulo, Atlas, 2001, v. 2; Código Civil de la Republica Argentina (Código Civil argentino), Buenos Aires. Zavalia Ed., 1974; Codigo Civil (Código Civil espanhol), 5. cd., Madrid, Ministerio de Justicia y Bolctin Oficial Dcl Estado, 1968; 11 Nuovo Codice Civile (Código Civil italiano), Milano, Editore Ulrico Hoepli, 1942; Compilación de leyes civiles de Venezuela (Código Civil venezuelano), Caracas, Paz Perez. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 497/498, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o patrimônio do devedor é a garantia de seus bens. No entanto, quando há insuficiência de bens para evitar o prejuízo de seus credores, há a insolvência do devedor. O artigo 748 citado pelos autores, é o espelho do acima comentado em relação às modificações do CPC/1973 X CPC/2015 com o art. 1.052, replicando o Livro II, Título IV, da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Nota VD), estendendo-se em seu art. 750 do CPC/1973, quando o código estabelecia a presunção de insolvência nos casos em que: (i) o devedor não possuísse outros bens livres e desembaraçados para nomear à penhora ou (ii) nos casos de aresto fundado em tentativa de dilapidação de bens (CPC/1973, art. 813, I a III). O Diploma Adjetivo vigente não trouxe dispositivo semelhante.

Na hipótese de insolvência, qualquer credor, munido do título que ampara seu crédito, pode invocar a jurisdição, para que se instale o concurso de credores e se apure daí o direito de cada concorrente. O próprio devedor ou inventariante, no caso de falecimento do devedor, também tem legitimidade para pedir a instalação do concurso universal de credores.

Usualmente, o concurso de credores instala-se em cumprimento de sentença, quando se verifica a insuficiência de bens do devedor. Nesse momento, há o vencimento antecipado das obrigações (CC 333, I), a arrecadação dos bens penhoráveis e a convocação de todos os possíveis credores, mediante edital, instaurando-se o concurso universal. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 06.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 956. A discussão entre os credores pode versar quer sobre a preferência entre eles disputada, quer sobre a nulidade, simulação, fraude, ou falsidade das dívidas e contratos.

Como sustenta Amorim, cada credor poderá utilizar os meios que entender cabíveis para a defesa de seus créditos, arguindo nulidade, simulação, fraude ou falsidade, visando a excluir créditos indevidos capazes de diminuir a capacidade de pagamento por parte do devedor quando da liquidação patrimonial (legitimidade do crédito). O que se procura evitar efetivamente é que o devedor possa se valer de expedientes diversos para diminuir o seu débito pela criação de falsos créditos. A natureza da obrigação será determinante para definir eventual disputa pela preferencia, porque outorgará vantagem de um credor sobre os outros. Muito embora este artigo trate das discussões entre credores, é lícito ao devedor também oferecer impugnação aos créditos apresentados, discutindo sua existência ou validade por meio de exceções.

A discussão entre credores terá início com a convocação, por edital, de todos para que, em vinte dias, apresentem suas declarações acompanhadas dos respectivos documentos comprobatórios. Relacionadas as declarações, novamente terão os credores vinte dias para manifestações, evitando-se assim sejam arrolados créditos inexistentes ou preferências indevidas.

No âmbito da falência, publicada a sentença declaratória da falência acompanhada da relação de credores, estes terão quinze dias para apresentar impugnações ao administrador judicial, que após analisa-las fará publicar nova relação nominal, a partir da qual fluirá o prazo de dez dias para impugnação. Sobrevirá sentença nos autos de impugnação, quando os credores nela relacionados serão considerados admitidos e inseridos no quadro geral de credores. Cabe também a impugnação por parte do devedor (Lei de Recuperação e Falências, art. 8º). (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 969 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina de Ricardo Fiuza, cada um dos credores poderá opor ao crédito do outro as defesas que tiver, quer impugnando a preferência estabelecida a favor de um deles, quer alegando a nulidade, a simulação, a fraude ou a falsidade das dívidas.

No CPC/1973, art. 768, (sem correspondência no CPC/2015, nota VD), tem-se: “Findo o prazo, a que se refere o n. II do art. 761, o escrivão, dentro de cinco (5) dias, ordenará todas as declarações, autuando cada uma como seu respectivo título. Em seguida intimará, por edital, todos os credores para, no prazo de vinte dias, que lhes é comum, alegarem as suas preferências, bem como a nulidade, simulação, fraude, ou falsidade de dívidas e contratos.

Também o devedor poderá impugnar quaisquer dos créditos que lhe sejam apresentados (CPC, art. 768, parágrafo único). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 499, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como sugere Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a intenção do dispositivo é evitar que o devedor valha-se de expedientes diversos, criando falsos créditos para assim se beneficiar e em prejuízo dos demais credores. Nessa medida, qualquer um destes poderá impugnar créditos arrolados pelo devedor, questionando sobre sua existência, validade ou mesmo qualidade. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 06.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 957. Não havendo título legal à preferência, terão os credores igual direito sobre os bens do devedor comum.

Esclarece amorim que, no artigo precedente tratou-se da preferência entre credores, que se define pela natureza da obrigação de cada um. Porém, inexistindo preferência, o que significa serem todos da mesma categoria, consideram-se iguais seus direitos creditórios, levando ao rateio proporcional do que for apurado na liquidação do patrimônio do devedor. (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 970 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo referência de histórico, o dispositivo em tela não foi alvo de nenhuma espécie de alteração, seja por parte do Senado Federal, seja por parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. Trata-se de mera repetição do art. 1.556 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de redação.

Em sua Doutrina, Ricardo Fiuza alerta para o fato de, inexistindo crédito privilegiado, todos os credores concorrerão em igualdade de condições, respeitada a proporcionalidade de seus créditos, complementando serem os Créditos quirografários, créditos comuns, sobre os quais não haverem preferências ou privilégios. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 499, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Também Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira só dão destaque para o caso de não haver credores com alguma preferência, haver o rateio proporcional entre todos daquilo que for arrecadado no processo de insolvência. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 06.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 5 de maio de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 953, 954 Da Indenização - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 953, 954
Da Indenização - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título IX – Da Responsabilidade Civil
(Art. 944 a 954) Capítulo II – Da Indenização
– vargasdigitador.blogspot.com

Art. 953. A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido.

Parágrafo único. Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, equitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstâncias do caso.

Na interpretação de Godoy, o preceito tem por fundamento a tutela do direito à honra e cuida da indenização devida em caso de sua violação mercê das condutas típicas descritas na cabeça do artigo. Mas, por identidade de motivos, é aplicável seu comando não só quando se configurem essas situações descritas de injúria, difamação ou calúnia, mas também quando haja, por exemplo, denunciação caluniosa ou comunicação falsa de crime. Mais, até, bem poderia o atual CC ter abandonado a referencia ás figuras típicas do Código Penal (arts. CP 138 a 140), dado que qualquer ofensa à honra do indivíduo, um de seus direitos da personalidade, cuja fonte é a dignidade humana, princípio fundamental de índole antes de tudo constitucional (art. 1º, III), suscita tutela jurídica, preventiva ou corretiva. Sem contar que a sanção civil reparatória e/ou compensatória independe, nas hipóteses do artigo, da verificação de condenação criminal.

De qualquer sorte, injúria, difamação e calúnia vêm definidas nos preceitos, acima citados, do Código Penal, pela primeira infringindo-se a chamada honra subjetiva do sujeito sua autoestima, enquanto, pela segunda, afronta-se sua honra dita objetiva, vale dizer, sua reputação, a estima e consideração de que desfruta perante os outros. Quanto à calúnia, trata-se, especificamente, da falsa imputação de fato criminoso a outrem. Uma novidade que contém a nova redação do preceito está na alusão à difamação, omitida no art. 1.547 do CC/1916, mas que, em doutrina, já se considerava causa suficiente à indenização.

Em verdade, porém, novidade maior, e ainda problemática, reside na fixação do quantum indenizatório. Isso pelo que está no parágrafo, quer do atual CC 953, quer do anterior art. 1.547 do CC/1916. É certo que, na cabeça de ambos os dispositivos, consagrava-se e consagra-se agora a genérica reparação do dano que resulte da ofensa à honra, por qualquer de suas formas. Todavia, dizia-se, no parágrafo do antigo art. 1.547, que, não podendo a vítima provar prejuízo material, teria direito a receber do ofensor o dobro da multa no grau máximo. A redação suscitava dupla ordem de problemas. O primeiro estava em saber se, na ausência de prova de prejuízo material, se estava a estabelecer, pela fixação de um importe ressarcitório correspondente à multa criminal, uma indenização material presumida, ou seja, uma reparação arbitrada a forfait, veja-se, ela sim, sempre tarifável ou limitável pelo legislador, afinal se dele emana uma concessão indenizatória apriorística, para quando não se consiga provar efetivo prejuízo, mas por se o presumir sempre ocorrido, ou se tratava de indenização moral, e, pior, aí só incidente se não se provasse dano material, como se não fosse cumuláveis (Súmula n. 37 do STJ), mas lembrando-se ilimitado o dano moral (art. 5º, X, da CF/88). De outra parte, valor indenizatório atrelado à multa penal, se esta se fixava originariamente em valores ínfimos, no Código Penal, depois da reforma de sua parte geral e da instituição dos dias-multa passou a viabilizar um arbitramento excessivo, mesmo se se tornasse a referencia do parágrafo como um limite, e como se se admitisse limite ao dano moral, se disso se cuidava.

Pois esses problemas foram em parte solucionados pelo CC/2002. É que, hoje, aboliu-se, como se viu em comentário ao CC 949, a adstrição de indenização civil à multa criminal, portanto afastando-se a ideia de limitação ou tarifação ressarcitória, tanto mais se se agita de dano moral, estatuindo o parágrafo do artigo em comento que, nas hipóteses de que trata, a indenização se dará de forma equitativa, assim por arbitramento judicial, consideradas as circunstâncias subjetivas e objetivas do caso. Mas manteve-se a ressalva de que essa indenização equitativa será devida se não se provar prejuízo material, destarte persistindo a dúvida sobre se se cuida mesmo de indenização moral ou de indenização material presumida, com as consequências daí advindas e logo antes explicitadas.

Bem de ver, porém, que já antes do CC/2002 prevalecia o entendimento de que o parágrafo do então art. 1.547 se referia a verdadeira hipótese de dano moral, só que cumulável com o dano material (art. 5º, V e X, da CF/88, e Súmula n. 37 do STJ) e não autorizada, pelos mesmos dispositivos constitucionais aludidos, nenhuma limitação. Mais, mesmo o CC/2002 ao prever uma indenização equitativa, no parágrafo do artigo presente, parece indicar uma indenização moral. Entretanto, vem bem a calhar a alteração proposta no Projeto de Lei n. 276/2007 para explicitar que “a indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação dos danos materiais e morais que delas resultem ao ofendido”. E, como é da regra geral, fixada a indenização material de acordo com a extensão do prejuízo e a moral por arbitramento judicial.

Por fim, vale anotar que as ofensas à honra perpetradas pelos meios de mídia encontram regramento em lei especial, a chamada Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67), mas com as seguintes e resumidas observações: a) a verificação da ofensa deve ter em conta a igual dignidade do direito à honra mas, também, do direito à informação, ambos direitos da personalidade, fundados na dignidade humana, vocacionados a um conflito que se deve superar mercê do juízo da proporcionalidade, de uma necessária ponderação dos interesses em jogo no caso concreto (técnica do ad hoc balancing), com frequente socorro a critérios como o da consideração sobre se se trata de pessoa pública ou notória, se se cuida de pessoas comuns mas envolvidas em acontecimentos da atualidade ou expostas em locais públicos, sem que se dê sua descontextualização do cenário, se se tem fato criminoso e as circunstâncias de sua divulgação, ou se se exerce direito de crítica e seus termos, nessa esteira incluídas a sátira humorística e a caricatura, assim e enfim verificando-se, sempre na hipótese fática, a qual dos direitos em situação de antinomia real deve ceder; b) além da tutela corretiva, em tese caberá sempre a preventiva, sem que só por isso se possa falar em censura; c) a tutela indenizatória pode ser exercida não só diante da empresa jornalística como, ainda, perante o autor do escrito, notícia ou transmissão; e d) são inconstitucionais, por encerrar restrição a direito fundamental não autorizada pela Constituição Federal, as disposições da lei especial que impõem prazo decadencial para o exercício do direito indenizatório e limitação do respectivo valor (arts. 52, 53 e 56). As justificativas mais detalhadas de cada qual dessas conclusões tive a oportunidade de expor em A liberdade de imprensa e os direitos da personalidade. São Paulo, Atlas, 2001.

Uma última ressalva cabe quanto à denunciação caluniosa, referida logo ao início desses comentários. É que, conforme preceitua o CP 339, sua configuração típica não prescinde da instauração, em razão de falsa, portanto dolosa, imputação delituosa, ao menos de inquérito, seja policial, civil ou administrativo. Porém, não se exclui a responsabilização civil se, de qualquer modo, a notícia do crime é infundada. Isso mesmo, conforme acentua Yussef Said Cahali, não se possa confundir denunciação caluniosa com a mera solicitação de investigação que se faça com base em dados concretos e objetivos (Dano moral, 3ª ed. São Paulo, RT, 2005, p. 314). A verdade é que havendo abuso, mesmo não doloso, quando se proceda à notícia, quando se requeria a investigação, pode haver indenização. A propósito, remete-se, ainda, ao comentário do artigo seguinte. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 963-965 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 05/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Sob enfoque de Ricardo Fiuza, este dispositivo estabelece a reparação dos danos por violação à honra que é direito da personalidade composto de dois aspectos: objetivo – consideração social – e subjetivo – autoestima. Nestes dois aspectos está contido o caráter múltiplo ou proteiforme da honra: individual, civil, política, profissional, científica, artística etc. (v. José Castan Tobeõas, Los derechos de la personalidad, Madrid, &l. Reús, 1952, p. 49 e 50, e Carlos Alberto Bittar, Os direitos da personalidade, 3ª ed. Rio de Janeiro, forense Universitária, p. 129).

A injúria ofende a honra subjetiva, conceituada como a “manifestação de conceito ou de pensamento, que representa ultraje, menosprezo ou insulto a outrem” (Carlos Alberto Bittar, Os direitos da personalidade, cit., p. 132).

A difamação atinge a honra objetiva definida com a atribuição de “fato que constitui motivo de reprovação ético-social” (Carlos Alberto Bittar, Os direitos da personalidade, cit., p. 132).

A calúnia viola a honra objetiva, configurada na “imputação de fato qualificado como crime” (Carlos Alberto Bittar. Os direitos da personalidade, cit., p. 132).

Pela violação à honra podem surgir danos materiais e morais.

O dispositivo constante do parágrafo único pode acarretar interpretação pela qual, diante de ofensa à honra, somente o dano material é, em princípio, indenizável, sendo cabível o dano moral somente em face da inexistência de dano material. A possibilidade de cumulação da indenização do dano moral com o dano material está pacificada em nosso direito, inclusive por meio da Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça, pela qual “São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato”. Com a consagração constitucional da indenizabilidade do dano moral, inclusive cumulado com o dano material, não pode remanescer qualquer dúvida quanto à cumulatividade das duas indenizações (CF, art. 5º, incisos V e X). Saliente-se que o art. 5º, inciso V, da Constituição Federal assegura precisamente a indenizabilidade dos danos morais e materiais por ofensa à honra, de modo que o parágrafo único deste artigo deve ser considerado inconstitucional. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 495-496, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 05/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para os autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo em questão tutela o direito à honra, decorrência do princípio da dignidade humana, razão pela qual a indenização não se limitará às hipóteses de injúria, difamação e calúnia, podendo abranger outras hipóteses que igualmente violem referido direito. A título de ilustração, pode-se mencionar outrossim os casos de denunciação caluniosa ou de comunicação falsa de crime.

Caso a violação à honra se dê por meio da imprensa, deverão ser observados os critérios estabelecidos pela Lei da Imprensa.

Súmula STJ 221. São civilmente responsáveis pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação”;

“Súmula STJ 37. São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato”;

“Súmula STJ 281. A indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na Lei de Imprensa”;

“Súmula STJ 370. Caracteriza dano moral a apresentação antecipada de cheque pré-datado”;

“Súmula STJ 385. Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento”;

“Súmula STJ 388. A simples devolução indevida de cheque caracteriza dano moral, independentemente de prova do prejuízo sofrido pela vítima”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 05.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 954. A indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá no pagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e se este não puder provar prejuízo, tem aplicação o disposto no parágrafo único do artigo antecedente.

Parágrafo único. Consideram-se ofensivos da liberdade pessoal:

I – o cárcere privado;
II- a prisão por queixa ou denúncia falsa e de má-fé;
III – a prisão ilegal.

Na matéria apresentada por Godoy, relativa à ofensa à liberdade pessoal vinha, antes, no CC/1916, tratada em dois artigos, o primeiro atinente à consequência indenizatória propriamente dita (art. 1.550) e o segundo contemplativo de hipóteses descritivas de quando se considerava haver a afronta (art. 1.551). Tais preceitos foram agora concentrados em um só artigo, posto com parágrafo que, a rigor, reproduz o art. 1.551 e descreve as hipóteses, mas sempre reputadas meramente exemplificativas, de ofensa à liberdade pessoal. Aliás, o Projeto de Lei n. 276/2007, de alteração da nova legislação, pretende explicitar o caráter exemplificativo do rol inserido no parágrafo único do artigo, portanto sem excluir casos outros de privação indevida da liberdade da pessoa.

Para a hipótese de prisão por queixa ou denúncia indevidas, já à luz da anterior legislação se vinha admitindo nem sempre necessária a comprovação da má-fé, mas apenas a notória imprudência ao noticiar a suposta ocorrência de fatos típicos. Ou seja, mesmo sem má-fé, a imputação temerária de fatos delituosos a outrem, dissociada de qualquer relevante dado a justifica-la, pode também ensejar a responsabilização civil do agente.

Por fim, ainda que o dispositivo se refira a casos de privação de liberdade, igualmente não se furta à devida responsabilização, mesmo que pela regra geral, quem, posto que sem provocar prisão, noticie a prática de crime de forma temerária, o que, não raro, acontece nas relações envolvendo empregador e empregado, sempre e tão somente, é certo, quando infundada a denúncia. Conforme se acentuou no comentário ao artigo antecedente, a hipótese é mesmo de abuso, de injustificado descuido na formulação da notícia do suposto delito. Daí porque importa verificar se essa notícia se baseia em dados concretos, objetivos, que justifiquem o socorro à autoridade.

Quanto à prisão ilegal, é bem de ver que o art. 5º, LXXV, da Constituição Federal garante a indenização, pelo Estado, ao condenado por erro judiciário e a quem permanecer preso além do tempo fixado na sentença. Não se entende necessária, no primeiro caso, a desconstituição prévia da sentença penal, pela via da revisão. Nos casos de prisão provisória ou preventiva, quando a ação, depois, venha a ser julgada improcedente, vem-se reconhecendo o dever indenizatório estatal sempre que a decretação se tenha ostentado desarrazoada.

No tocante à indenização, o dispositivo do Código Civil revogado suscitava as mesmas discussões já enfrentadas em comentário ao artigo anterior, a que ora se remete o leitor. Ou seja, previa-se, no caput do art. 1.550, uma indenização material e o pagamento de uma soma calculada na forma do parágrafo único do art. 1.547, ou seja, o dobro da multa no grau máximo da pena criminal respectiva. Aliás, mais que o art. 1.547 do CC/1916, o art. 1.550, quando se valia da partícula conjuntiva e, dava a entender que a alusão à multa criminal compreendia a previsão de indenização moral, e não indenização material presumida.

De qualquer maneira, o atual CC 954, ao remeter ao parágrafo do dispositivo precedente, acaba com o atrelamento da indenização à multa penal, de resto nem mesmo existente para o cárcere privado ou para a prisão ilegal. E, por outro lado, o Projeto de Lei n. 276/2007, de reforma do Código Civil, cuida de superar a discussão sobre a natureza dessa indenização equitativa, como já se examinou no comentário ao artigo anterior, prevendo que “a indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá no pagamento dos danos que sobrevierem ao ofendido”, aí incluídos os materiais, de acordo com a extensão do prejuízo demonstrado, e o moral, fixado por arbitramento. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 966 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 05/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entender de Ricardo Fiuza, o direito à liberdade, tido como o poder de fazer ou não fazer tudo aquilo que sequer, no âmbito resultante das limitações fixadas pelo ordenamento jurídico (cf. Adriano De Cupis, Os direitos da personalidade, trad. Adriano Vera Jardim e Antonio Miguel Caieiro, Lisboa. Livraria Morais, 1961, p. 95 e ss), tem várias formas de manifestação, como de locomoção, de pensamento e sua expressão, de crença e prática religiosa, de escolha e exercício de atividade profissional, de relacionamento social etc. (v. Carlos Alberto Bittar, Os direitos da personalidade, 3ª ed. Rio de Janeiro, Forense Universitária, p. 101 e 102).

A Constituição Federal, após garantir a inviolabilidade do direito à liberdade (art. 52, caput), reconhece expressamente várias manifestações desse direito: manifestação de pensamento (art. 5º, IV), consciência e crença religiosa (art. 52, inciso VI), convicção filosófica ou política (art. 52, inciso VIII), atividade intelectual, artística, científica e de comunicação (art. 52, inciso IX), atividade profissional (art. 59, inciso XIII), locomoção (art. 59, XV), reunião (art. 52, inciso XVI), associação (art. 52, inciso XVII).

O presente artigo, no seu caput, refere-se à reparação de danos por ofensa à liberdade pessoal, que tem aquele caráter amplo. No entanto, no seu parágrafo único, o artigo cita apenas violações à liberdade de locomoção. Em razão das demais manifestações desse direito, inclusive reconhecidas expressamente na Constituição Federal, considera-se necessária a modificação do parágrafo único do dispositivo, para restar claro seu caráter exemplificativo e não taxativo.

Pelas mesmas razões expostas na nota ao CC 953, não se deve condicionar a reparabilidade do dano moral à inexistência do dano material, como faz este artigo ao referir o parágrafo único do artigo anterior. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 496, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 05/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a má-fé por queixa ou denúncia indevidas não é imprescindível. Para que responsabilize, basta que o ato tenha sido praticado de maneira imprudente. É importante que se verifique se o ato foi praticado com base em dados objetivos e que justifiquem a notícia.

O dispositivo encontra-se em linha com o art. 5º, LXXV, da Constituição Federal: “O Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença.”

Tem-se reconhecido o dever do Estado de indenizar nos casos em que há prisão provisória ou preventiva e, ulteriormente, a ação penal venha a ser julgada improcedente. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 05.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 4 de maio de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 950, 951, 952 - continua - Da Indenização - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 950, 951, 952 - continua
Da Indenização - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título IX – Da Responsabilidade Civil
(Art. 944 a 954) Capítulo II – Da Indenização
– vargasdigitador.blogspot.com

Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.

Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.

Na visão de Cláudio Luiz Bueno De Godoy, o caput do artigo em comento reproduz a regra do anterior art. 1.539 e trata da reparação de danos consistentes na inabilitação ou redução da capacidade laborativa da vítima, portanto com diversa pertinência em relação ao preceito do CC 949, que versa sobre lesão corporal que não seja causa de incapacidade ao trabalho. De qualquer forma, em grande medida está superada a discussão que havia sobre a inacumulabilidade dos arts. 1.538 e 1.539 do CC/1916, porquanto não reproduzidos os §§ 1º e 2º daquele primeiro dispositivo e porque, afinal, sempre é cumulável o dano moral ao material, consoante exsurge da CF/1988 (art. 5º, V e X), e, mais, como se pretende explicitar em nova redação de parágrafos acrescidos ao CC950, por força do Projeto de Lei n. 276/2007, de reforma da legislação presente. Por essa modificação, a denotar, mesmo superada, uma tendência, tenciona-se assentar reparável o dano moral resultante da ofensa que acarreta defeito físico permanente ou durável, inclusive, frise-se, mesmo que sem incapacitação ou depreciação laborativa, da mesma forma que se queria determinar o agravamento das suas consequências se, havendo defeito físico, além de permanente e durável, ele fosse aparente. Serve, ademais, aí sim, a ressalva final do CC 949 à indenização de “qualquer outro prejuízo” que a vítima de lesão corporal demonstre haver experimentado.

Mas, prevê-se, no caso do CC 950, indenização que, além das despesas de tratamento e do que o ofendido houver deixado de auferir até o final da convalescença, compreende uma pensão atinente à importância do trabalho ao qual está inabilitada a vítima ou em razão do qual teve sua capacidade depreciada. Ou seja, é a incapacidade laborativa total ou parcial resultante da ofensa sofrida, que será apurada de acordo com perícia, também mercê da qual se identificará, conforme a hipótese, o grau da redução da aptidão para o trabalho. E como a reparação é de dano consubstanciado na inabilitação laboral, nada se paga, sob o título presente, destarte sem prejuízo de outros danos materiais, se a vítima ao tempo do evento já estava incapacitada ao trabalho.

O cálculo da pensão deve tomar por base a remuneração auferida pelo ofendido. Se não houver renda determinada, ou se se exercia atividade doméstica, o cálculo se faz de acordo com o salário-mínimo. Mesmo aos menores se vem reconhecendo a indenização presente, ainda que não trabalhem, se a lesão prejudica o exercício de qualquer profissão. A perda da capacidade de produzir renda é, de fato, um dano certo. E, aqui, de novo, utilizando-se o salário-mínimo como critério.

Alguma discussão se coloca quando a vítima, apesar de inabilitada completamente à profissão ou ocupação remunerada a que se dedicava, não fica impedida de exercer outra atividade. O princípio, ao que se entende, é que, nessas hipóteses, a indenização deverá ser integral, salvo caso específico em que se demonstre que o ofendido acabou encontrando outro trabalho, que exerce normalmente sem maior esforço ou sacrifício de qualquer ordem, portanto sem que seja suficiente, à redução da pensão, a mera conjectura sobre a possibilidade de desempenho de outra ocupação.

A pensão paga no caso do preceito em comento é vitalícia e traz ínsita a cláusula rebus, a propósito remetendo-se o leitor ao comentário do CC 948, de toda maneira aqui se acrescendo a hipótese de eventual agravamento das lesões sofridas, o que deve ensejar revisão da indenização.

Por fim, o parágrafo único instituiu a possibilidade de o pagamento da indenização arbitrada se dar de uma só vez, de resto na esteira, veja-se, de jurisprudência formada inclusive na hipótese de pensão devida por homicídio, já daí porque não se entende que se deva limitar a previsão aos casos de pensão por inabilitação por trabalho. Ao revés, será nessa hipótese inclusive que mais sobressaltará a dificuldade de se arbitrar a indenização e de se fazer a execução de uma só se, afinal, e ao contrário da previsão do CC 948, a pensão é vitalícia, sugerindo Carlos Roberto Gonçalves que o cálculo se faça pelo tempo de vida provável da vítima (Comentários ao Código Civil, coord. Antônio Junqueira de Azevedo. São Paulo, Saraiva, 2003, v XXI, p. 547), mas restando então o problema da sobrevida do ofendido e da eventual possibilidade de suplementação do valor ressarcitório. Melhor é considerar que a opção pelo pagamento de uma só vez exclua a possibilidade de postular complementação pelo tempo que a vítima vier a viver a mais do que a idade provável tomada para cálculo da indenização, como também se exclui qualquer crédito do ofensor pelo tempo que o ofendido viva a menos que o período tomado para cálculo da reparação paga de uma só vez. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 960-961 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na interpretação de Ricardo Fiuza, este dispositivo trata de ofensa à integridade física que acarreta defeito que impossibilite ou diminua a capacidade de trabalho da vítima, estabelecendo indenização pelos danos materiais: despesas de tratamento, lucros cessantes até o fim da convalescença e pensão correspondente à importância do trabalho pra que se inabilitou ou da depreciação sofrida.

Desse modo, este artigo não faz referencia aos danos morais e estéticos, sendo que, com a eliminação da norma constante do § 1º do art. 1.538 do Código Civil de 1916, no CC 949 deste Código, que se referia ao aleijão ou deformidade permanente, essa omissão é de suma gravidade e precisa ser suprida.

A ofensa à integridade física da pessoa pode ou não gerar deformidade permanente. Para que a deformidade seja permanente, deve ser irreparável ou de difícil ou longínqua reparabilidade (v. Yussef Said Cahali, Dano moral, 2ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p. 208 e 209). A deformidade permanente pode ou não ser aparente. Se não houver deformidade permanente poderá acarretar dano material – despesas de tratamento e lucros cessantes – e moral – ofensa à honra, resultante do motivo ou da natureza injuriosa da agressão. Se houver deformidade permanente poderá acarretar dano material – despesas de tratamento, lucros cessantes e incapacidade ou diminuição da atividade laborativa – e moral – ofensa à honra e à integridade física. Se a deformidade permanente for aparente poderá acarretar dano material – despesas de tratamento, lucros cessantes e incapacidade ou diminuição da atividade laborativa – e moral pelo comprometimento estético.

Dano estético é definido por Teresa Ancona Lopez como a “modificação duradoura ou permanente na aparência externa de uma pessoa, modificação esta que lhe acarreta um ‘enfeamento’ e lhe causa humilhações e desgostos, dando origem portanto a uma dor moral” (O dano estético: responsabilidade civil, 2ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p. 38).

No entanto, o dano estético não se constitui em categoria de dano diferenciada do dano moral (v. Teresa Ancona Lopez, O dano estético: responsabilidade civil, cit., p. 16 e 17; e Miguel Kfouri Neto, Responsabilidade civil do médico, 3ª ed. São Paulo Revista dos Tribunais, 1998, p. 93-5.

Dano moral é aquele que atinge um direito da personalidade do lesado. A origem do dano estético reside na ofensa à integridade física. Assim, por esse critério não há como distingui-lo do dano moral, que é aquele que atinge um direito da personalidade. Quanto à caracterização do dano moral por seus efeitos, refere-se aos aspectos sentimental ou afetivo, intelectual ou social da personalidade do lesado. Recordando a utilíssima distinção feita pelos irmãos Mazeaud: os danos morais podem ser divididos em duas categorias: 1º) os que afetam a “parte social do patrimônio moral” (ofensa à consideração social, que podem sofrer as pessoas naturais e jurídicas); e 2º) os que atingem a “parte afetiva do patrimônio moral”, alcançando o indivíduo em suas afeições (dor sentimental, que somente as pessoas naturais podem sofrer) (Henri e Leon Mazeaud. Traité théorique et pratique de la responsabilité civil delictueile encontractuelle, 4ª ed. Paris, Sirey, 1947, t. I, p. 319).

Quanto à constatação dos efeitos do dano estético, atinge ao mesmo tempo duas esferas da personalidade do lesado: esfera sentimental ou afetiva e esfera social da personalidade do lesado. Desse modo, também por esse critério trata-se de dano moral. No entanto, é aí que reside o agravamento das consequências do dano estético: atinge, concomitantemente, dois aspectos da personalidade do lesado, já que causa dor moral, sentimento negativo, de caráter interno, e também atinge o indivíduo socialmente, já que sua aparência física é alterada, é o aspecto exterior da personalidade do lesado que é atingido. O dano estético, pela transformação física, geral, ao mesmo tempo, sofrimento interior e dano à consideração social do indivíduo.

É evidente que a pensão equivalente à inabilitação ao trabalho ou diminuição da capacidade laborativa, prevista neste artigo, tem caráter indenizatório do dano material. Não prevê o dispositivo a reparação dos danos morais oriundos de ofensa que acarrete defeito físico permanente e durável. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 492-93, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em comunhão com Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o valor da pensão deverá ser apurado conforme perícia técnica a ser realizada no curso do processo. Se, antes do acidente, a vítima já era inabilitada ao trabalho, nenhuma indenização a esse título será devida, sem prejuízo da concessão de eventual dano moral. Para as pessoas que não trabalhavam, não tinham renda fixa ou mesmo a menores, tem-se tomado com base para a pensão o valor do salário mínimo. A pensão, a despeito de vitalícia, poderá ter seu valor alterado, caso se alterem as condições da vítima.

O pagamento da indenização integral em só uma parcela é feita com base na expectativa de vida da vítima (vide comentários ao CC 948), o que traz consigo o problema de eventual sobrevida daquela para além do período que foi estimado. Como mostrado acima, na primeira parte do artigo em comento, Godoy defende que, em casos tais, exclua-se esse valor adicional da indenização, tal qual não se considera a hipótese de que a vítima tenha de devolver quaisquer valores em decorrência de falecimento anterior à idade estimada (Godoy, Cláudio Luiz Bueno de. Comentário ao artigo 950 do Código Civil. In Peluso, Cezar (coord.). Código Civil Comentado, Barueri: Manole, 2015.).

Enunciado CEJ n. 381. O lesado pode exigir que a indenização, sob a forma de pensionamento, seja arbitrada e paga de uma só vez, salvo impossibilidade econômica do devedor, caso em que o juiz poderá fixar outra forma de pagamento, atendendo à condição financeira do ofensor e aos benefícios resultantes do pagamento antecipado”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 04.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

Conforme aponta Godoy, trata o artigo presente da responsabilidade por homicídio ou lesão corporal, só que afeta a quem desempenhe atividade profissional, segundo o CC/1916 médica, farmacêutica ou ortodôntica (art. 1.545), redação agora ampliada para abarcar qualquer profissional de saúde que, com sua conduta, provoque dano ao paciente, como está na lei. A bem dizer, o dispositivo mais se ocupa de explicitar que as mesmas verbas indenizatórias contempladas pelos CC 948 a 950 são também aplicáveis aos casos de homicídio ou lesão causados no desempenho de atividade de atendimento à saúde. Nem precisaria afirma-lo. E, mais, quando alude à imprudência, negligencia ou imperícia, pode criar alguma perplexidade diante da responsabilidade objetiva de empresas prestadoras de serviços ligados à área da saúde, nos termos da legislação do consumidor.

Destarte, o CC 951 deve ser interpretado em consonância com a Lei n. 8.078/90, com sua previsão de responsabilidade subjetiva, é certo, para os profissionais liberais (art. 14, § 4º), mas por atuação pessoal, ressalvando-se a responsabilidade sem culpa para os fornecedores pessoas jurídicas, nos termos da mesma normatização.

No mais, vale remissão, ainda, no que toca a esses profissionais liberais que exercem atividade indutiva de especial risco, à ressalva que já se fez no comentário ao CC 927, parágrafo único, no mesmo sentido, para esses casos específicos da regra no preceito em tela disposta. É ao que se remete o leitor. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 961-962 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na analogia de Ricardo Fiuza, enquanto o art. 1.545 do CC/1916 referia a responsabilidade civil dos médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e dentistas que, por imprudência, negligência ou imperícia, causem a morte, inabilitação de servir ou ferimento ao paciente, o artigo em análise torna mais amplo o dispositivo, de modo a abranger todas as pessoas que em sua atividade profissional, com culpa em sentido estrito, causem dano ao paciente.

A responsabilidade civil de que trata este artigo é contratual. No campo contratual a classificação das obrigações de meio e de resultado direciona a prova da culpa: nas obrigações de meio cabe ao credor provar ao devedor (obrigou-se a empregar todos os meios e esforços para a consecução de um objetivo e não a alcançar certa finalidade), e nas obrigações de resultado presume-se a culpa do devedor (não alcançou a finalidade a que se obrigou) (v. Teresa Ancona Lopez. O dano estético, 2ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p. 53-5).

As pessoas que atuam profissionalmente na área da saúde assumem obrigações, via de regra, de meio. Desse modo, a responsabilidade é subjetiva, porque, se a obrigação é de meio e não de resultado, deve a vítima ou lesado provar que o profissional não se utilizou de todos os meios a seu alcance para obter o direito à indenização. É preciso provar a culpa, ou seja, a atitude negligente, imprudente ou imperita do lesante, na utilização dos meios adequados para a cura ou o tratamento do paciente (v. Teresa Ancona Lopez, Responsabilidade civil dos médicos, in Responsabilidade civil, coord. Yussef Said Cahali, 2ª ed. São Paulo, Saraiva, 1988, p. 319-21).

No entanto, há obrigações assumidas na área da saúde que são de resultado: na cirurgia plástica de caráter estético e eletiva (embelezadora e não coactiva), nos exames laboratoriais, nos cuidados necessários a que o paciente não contraia infecção (infecção hospitalar). Nesses casos, a obrigação assumida é de alcançar a finalidade almejada. Aqui, basta a prova de que não foi alcançado o resultado. Somente nestes casos, de obrigação de resultado, tem aplicação a presunção da culpa, cabendo ao profissional provar a inexistência de culpa ou que o dano decorreu de caso fortuito ou força maior (v. na doutrina: Teresa Ancona Lopez, Responsabilidade civil dos médicos, in Responsabilidade civil, cit.; e Rui Stoco, Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial, 4ª ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, p. 287-303; na jurisprudência: RT, 554/234. 556/191, 566/192, 638/89, 713/125. 718/270; RJTJSP, 157/105; RSTJ, 33/555). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 494, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o artigo em questão, ontologicamente, relaciona-se, principalmente, mas não exclusivamente, a profissionais da área da saúde – seu artigo correspondente no Diploma anterior (CC 1916, art. 1.545) fazia referência a médicos, farmacêuticos e ortodontistas. A responsabilidade aquiliana prevista no dispositivo em questão aplica-se apenas a profissionais liberais, contratados pela vítima em função de vínculo pessoal e de confiança com o profissional. Nos casos em que a contratação dos serviços se dá por meio de sociedade de profissionais liberais, em que inexiste a relação de pessoalidade, aplica-se a responsabilidade objetiva pela prestação de serviços prevista no Código de Defesa do Consumidor. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 04.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 952. Havendo usurpação ou esbulho do alheio, além da restituição da coisa, a indenização consistirá em pagar o valor das suas deteriorações e o devido a título de lucros cessantes; faltando a coisa, dever-se-á reembolsar o seu equivalente ao prejudicado.

Parágrafo único. Para se restituir o equivalente, quando não exista a própria coisa, estimar-se-á ela pelo seu preço ordinário e pelo de afeição, contanto que este não se avantaje àquele.

No instituto de Cláudio Luiz Bueno De Godoy, a norma em comento procurou concentrar em seus termos as disposições relativas às consequências indenizatórias da prática de ato de apropriação de coisa alheia, móvel ou imóvel, o que, antes, no CC/1916, se fazia em três artigos (arts. 1.541 a 1.543) e, de resto, conforme já se contém no CPC 555 atual.

No caput, primeira parte, reproduz-se a regra do anterior art. 1.541, prevendo-se que, havida usurpação ou esbulho, se deve procurar a restituição in natura, sem prejuízo da indenização por eventual deterioração da coisa (danos emergentes), e, agora, o que constitui inovação que supera discussão que a respeito se travava, também por lucros cessantes, como, no exemplo de Sílvio Rodrigues (Direito civil, 19 ed. São Paulo, Saraiva, 2002, v. IV, p. 246), quando alguém fica privado de imóvel destinado à renda.

Na sua segunda parte, o artigo consagra a reparação substitutiva em pecúnia, para quando não mais haja a possibilidade de restituição, o que não deve excluir suplemento indenizatório, da mesma forma provados não só outros danos emergentes como, também, lucros cessantes. O cálculo do equivalente da coisa em dinheiro se faz na forma do parágrafo único do CC 952, que, de seu turno, repete a regra do art. 1.543 do CC/1916. E, a propósito, estabelece-se, como no Código anterior, que, à estimativa do preço ordinário da coisa, se venha a avaliar e se acresça o chamado preço de afeição, conforme o caso. Trata-se de evidente hipótese de dano moral, em tese devido, segundo se crê, não só no caso de se inviabilizar a restituição da coisa, como também quando seu titular fique dela privado, posto que por certo tempo e ainda que outro seja o importe compensatório. Nem se considera que a fixação necessariamente precise ser feita, como sempre se defendeu, com um plus percentual ao preço de restituição, assim sem possibilidade de que o dano moral supere a importância da indenização material a ressarcir, a respeito estabelecendo a parte final do parágrafo em comento uma ressalva à reparação do prejuízo moral que a Constituição garantiu integral, sem nenhuma limitação, tanto mais quando se constata cuidar-se de agravo a direito da personalidade, fundado na dignidade humana, princípio fundamental da República, destarte cuja preservação se exige, sempre de forma completa, conforme se tornará a examinar no comentário ao artigo seguinte.

Por fim, o CC/2002 não reiterou a regra do art. 1.542 do diploma anterior, que impunha a restituição mesmo que por terceiro que detivesse a coisa, mas mediante indenização devida por quem tivesse desapossado o ofendido. Em primeiro lugar, tinha-se mesmo dispositivo mal alocado, eis que concernente à controvertida questão da possibilidade de ação possessória diante de terceiro que eventualmente esteja de boa-fé, perante quem, para alguns, somente é cabível reivindicação, de toda sorte a propósito remetendo-se o leitor ao comentário do CC 1.212 atual. Em segundo, a previsão de indenização pelo desapossador e não por terceiro de boa-fé – mesmo que sujeito à restituição, alhures discutindo-se, como se disse, se só na via reivindicatória ou também possessória -, como se o defende, por exemplo, Carlos roberto Gonçalves, conclusão a seu ver, inclusive inferível do preceito dos CC 1.220 e 1.221 (Comentários ao Código Civil, coord. Antônio Junqueira de Azevedo. São Paulo, Saraiva, 2002, v. XXI, p. 551), não exige dispositivo próprio e deve seguir as regras gerais sobre a responsabilidade civil. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 962-963 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na visão de Ricardo Fiuza, há duas formas de reparação de danos: reparação natural ou específica, com a entrega do próprio objeto, e reparação pecuniária ou indenizatória, em que é paga uma importância em dinheiro.

Em princípio, a reparação deve ocorrer in natura, ou seja, deve haver a restauração da situação alterada pelo dano, de modo que a indenização pecuniária é subsidiária. No entanto, em face das dificuldades inerentes à reparação natural, a reparação pecuniária ou indenizatória é a mais comum.

Na avaliação do dano material, o prejuízo é quantificado por meio de comparação entre o estado atual do patrimônio e sua situação se o dano não tivesse ocorrido. Aplica-se a chamada “teoria da diferença”, na qual há a apuração da diferença entre a situação real do patrimônio do lesado e a situação hipotética desse patrimônio se o dano não tivesse ocorrido, e a compensação das vantagens perdidas, devida sempre que o evento danoso tenha produzido ao lesado não apenas danos efetivos, mas, também, perda de lucros (Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das obrigações, 7ª ed. Coimbra, Almedina, 1998, p. 687-9).

Em suma, na indenização do dano material busca-se a reposição do patrimônio do ofendido, de modo a recompor-se a situação ideal em que se encontraria se tivesse inexistido o ilícito.

O parágrafo único deste dispositivo estabelece a indenizabilidade do dano moral por ofensa a um bem material, quando este não mais existe. O dano pode ser identificado como moral ou material de acordo com dois critérios básicos: 1) a verificação da origem do dano, relacionada ao bem violado e respectiva natureza; e 2) a constatação dos efeitos do dano, referente à natureza das consequências ou dos reflexos produzidos na esfera Jurídica violada. De acordo com o segundo critério, o dano material tem como efeito um prejuízo econômico ou pecuniário, mensurável por cálculos e o dano moral refere-se aos aspectos sentimental ou afetivo. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 495, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o artigo está em linha com o disposto no artigo 955 do CPC.

A indenização pela afeição refere-se, em realidade, à hipótese de dano moral e que, por se fundar em direito da personalidade, não deverá, conforme defende Godoy, ter o valor de indenização limitado pelo valor do dano material. (Godoy, Cláudio Luiz Bueno de. Comentário ao artigo 952 do Código Civil. In Peluso, Cezar (coord.). Código Civil Comentado, Barueri, Manole, 2015. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 04.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).