quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 101, 102, 103 Dos Bens Públicos - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 101, 102, 103
Dos Bens Públicos - VARGAS, Paulo S. R.

TÍTULO ÚNICO – Das Diferentes Classes de Bens (art. 79 a 103)
Capítulo III – Dos Bens Públicos –
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 101. Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei. 1

1.        Livre disposição dos bens públicos dominicais

Os bens dominicais são do domínio privado do Estado. Se nenhuma lei houvesse estabelecido normas especiais sobre essa categoria de bens, seu regime jurídico seria o mesmo que decorre do Código Civil para os pertencentes aos particulares. Sendo alienáveis, estariam inteiramente no comércio jurídico de direito privado e poderiam ser objeto de usucapião e de direitos reais, como também poderiam ser objeto de penhora e de contratos como os de locação, comodato, permuta, arrendamento.

No entanto, “o fato que as normas do direito civil aplicáveis aos bens dominicais sofreram inúmeros ‘desvios’ ou derrogações impostos por normas publicísticas”. Assim, se afetados a finalidade pública específica, não podem alienados. Em caso contrário, podem ser alienados por meio de institutos do direito privado, como compra e venda, doação, permuta ou do direito público. Tais bens encontram-se, portanto, “no comércio jurídico de direito privado e de direito público”, (Maria Sylvia Zanella di Pietro. Direito administrativo, cit. p. 427, apud, Roberto Gonçalves, Direito Civil Comentado, 2010 – pdf –parte geral).

Estando livres de qualquer destinação específica, pode a administração pública fazer desses bens o uso que melhor lhe aprouver, inclusive dispondo desses bens, como se fossem bens particulares. Para tanto, deve apenas observar as exigências legais para a prática desses atos de disposição (CF, art 37, XXI, lei n. 8.666/93). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 01.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 102. Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião. 1, 2

Nesse mesmo sentido, já proclamava anteriormente a Súmula 340 do Supremo Tribunal Federal: “Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião” Trata-se de um daqueles “desvios” que sofreu o regime jurídico dos bens dominicais.

Encontra-se hoje totalmente superada a discussão que outrora se travou no País a respeito da possibilidade de bens públicos serem adquiridos por usucapião, mormente os dominicais, visto que a Constituição de 1988 veda expressamente, nos arts 183, § 3º e 191, parágrafo único, tal possibilidade, tanto no que concerne aos imóveis urbanos como aos rurais. (Roberto Gonçalves, Direito Civil Comentado, 2010 – pdf –parte geral, p. 310).

Na vigência do Código Civil 1916, se entendia a jurisprudência que os bens dominicais podiam ser objeto de usucapião. Tal possibilidade foi completamente afastada com a vigência do Código Civil de 2002, que expressamente afirmou que “os bens públicos não estão sujeitos a usucapião”. Sem ter feito qualquer tipo de ressalva em tal dispositivo, fica evidente que tal predicado atinge todos os bens públicos, inclusive os dominicais (STF, Súmula 340).

2.        Usucapião de terras devolutas

Devoluto é tudo o que está vago, desocupado. Assim, as terras devolutas são os terrenos públicos aos quais nunca se deu utilidade alguma. São os terrenos que nunca pertenceram a nenhum particular, tampouco tem nenhuma destinação pública. Diz a Constituição Federal que pertencem à União “as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei” (CF, art 20, II). Todas as demais terras devolutas, por sua vez, pertencem aos Estados (CF, art 26, IV). Por fim, diversos estados membros passaram a transferir a propriedade de suas terras devolutas aos municípios, como forma de viabilizar sua formação e desenvolvimento. Ensina Benedito Silvério Ribeiro que “no Estado de São Paulo, a primeira Lei de Organização Municipal, sob n. 16, de 13 de novembro de 1891, conferiu às Municipalidades, para formação de cidades, vilas e povoados, as terras devolutas adjacentes às povoações de mais de mil almas em raio de círculo de seis quilômetros, a partir da praça central (§ 1º do art 38). A Lei 14.916, de 6 de agosto de 1945, também de São Paulo, aumentou o raio de abrangência para 12 quilômetros no Município de São Paulo e 8 nos demais casos, até que sobreveio a Lei Orgânica dos Municípios (Dec. Lei Complementar n. 9, de 31.12.1969), dispondo constituir bens municipais, todas as coisas móveis e imóveis, direitos e ações que, a qualquer título, pertençam ao Município (art 59). Estabelecia o art 60 pertencer-lhe ‘as terras devolutas que se localizem dentro do raio de oito quilômetros, contados do ponto central da sede do Município e de doze contados da Praça da Sé no Município de São Paulo’. Integram, igualmente, o patrimônio municipal, as terras devolutas localizadas dentro do raio de 6 quilômetros, contados do ponto central de seus distritos (parágrafo único)”. (1) Vê-se, pois, que as terras devolutas podem pertencer à União, aos Estados e aos Municípios, tendo todas, a característica comum de não lhes ter sido dada utilidade alguma. Por essa razão, buscando compatibilizar o princípio da imprescritibilidade dos bens públicos com a função social da propriedade, doutrina e jurisprudência passaram a admitir que as terras devolutas municipais e estaduais fossem objeto de usucapião. Nesse sentido (TJ-SP, Apelação n. 0010125-96.2009.8.26.0168, rel. Des. Cesar Ciampolini, j. 30.4.13). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 01.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Benedito Silvério Ribeiro, Tratado de Usucapião, 8ª ed., São Paulo, Saraiva, 2012, p. 606-607

Art. 103.  O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem. 1

Nova modalidade de revogação de Lei?

A Lei n. 9.992, de 24 de julho de 2000, estabelece que o DNER/DNIT transfira para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT, 10% (dez por cento) do que for arrecadado pelo uso das faixas de domínio pelas empresas de telecomunicações (CF art 1º). Essa Lei, em pleno vigor, vem sendo cumprida regularmente pela Autarquia rodoviária. Ora, pela decisão do STJ, que nega a validade da cobrança, ela estaria revogada (revogação implícita), modalidade não incluída na Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto Lei nº 4.657, de 04.09.1942).

O Direito brasileiro engloba as seguintes modalidades de revogação (total ou parcial) de leis, quais sejam: revogação (expressa) por lei posterior; Ação Direta de Inconstitucionalidade – Adin julgada procedente pelo STF; Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC julgada improcedente pelo STF; perda da vigência pré-estabelecida; Resolução do Senado Federal nos casos de reiteradas decisões de inconstitucionalidade em controle difuso pelo STF, nos ditames do art 52, X da CF; e, dependendo dos casos, Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF julgada procedente pelo STF.

Em se tratando de matéria que envolve empresas econômicas e politicamente poderosas, inclusive multinacionais, o entendimento do Judiciário merece ser veementemente questionado. (Alberto J. Marques, OAB/ES nº. 1895, Procurador Federal Aposentado, Advogado e Articulista, Diretor Jurídico da FIBRAS – Assessoria e Consultoria Ltda e Allysson Silva Lima, OAB/GO n. 32.480, Advogado e Articulista, Diretor do Controle Interno da Câmara Municipal de Alexânia – GO, INTEGRANTES DO NÚCLEO DE ESTUDO DE RECEITA PÚBLICA, Publicado há cinco anos no site da JusBrasil, coletado em 01.01.2019, por Vargas Digitador)

1.        O uso comum dos bens públicos pode ser oneroso ou gratuito

Dizer que o uso comum dos bens públicos de uso comum é livre e indiscriminado, significa apenas que esse uso não depende de nenhuma autorização ou licença administrativa para tanto. Isso não significa, contudo, que esse uso não possa sofrer certas restrições ou mesmo ser remunerado. Em muitos casos a conservação e a guarda de determinados bens será extremamente custosa, justificando, pois, que seu uso pelo povo seja remunerado. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 01.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 98, 99, 100 Dos Bens Públicos - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 98, 99, 100
Dos Bens Públicos - VARGAS, Paulo S. R.

TÍTULO ÚNICO – Das Diferentes Classes de Bens (art. 79 a 103)
Capítulo III – Dos Bens Públicos –
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 98. São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem. 1, 2.

1.        Classificação dos bens em relação à pessoa

São bens públicos aqueles que pertencem às pessoas jurídicas de direito público interno (União, Estados, Municípios, autarquias e associações públicas – CC, art 41). Invocando a lição de Clóvis Bevilaqua, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery ensinam que o verdadeiro critério que subjaz a essa classificação se apoia mais no modo pelo qual se exerce o domínio sobre os bens do que pelas pessoas às quais eles pertencem. (1) Partindo de tal critério o que o Conselho da Justiça Federal aprovou o enunciado n. 287 da IV Jornada de Direito Civil, segundo o qual: “O critério da classificação dos bens públicos, podendo ainda ser classificado como tal o bem pertencente a pessoa jurídica de direito privado que esteja afetado à prestação de serviços públicos” (Enunciado 287, da IV Jornada de Direito Civil). Por exclusão, todos os demais bens que não sejam bens públicos, seja qual for a pessoa a que pertencerem, recebem o tratamento jurídico de bens privados.

2.        Res nullius

Além dos bens públicos e dos bens privados, há ainda os bens que não pertencem a ninguém. São coisas, portanto, que não são nem públicas, nem privadas, das quais são exemplos as coisas abandonadas e os animais em liberdade. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 31.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, Código Civil Comentado, 4ª ed., São Paulo, RT, 2006, p. 231.

Art. 99. São bens públicos:1

I – os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças; 2

II – os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias; 3

III – os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoa, ou real, de cada uma dessas entidades. 4

Parágrafo único. Não dispondo a lei em contrário, consideram –se dominicais os bens pertencentes ás pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado.

1.        Classificação

Diversas são as formas pelas quais os bens públicos podem ser classificados. Cuida o artigo 99 do Código Civil de classificá-los de acordo com a destinação para a qual se destinam os bens públicos. Serão, pois, de uso comum do povo (I) os bens públicos afetados para serem usados e fruídos indistintamente por todos, em igualdade de condições, ou seja, para serem usados e fruídos pelo povo. São bens de uso especial (II) os bens públicos afetados para utilização um determinado serviço público ou que tenham uma destinação específica para cumprir uma função estatal. Por fim, são bens dominicais os bens pertencentes ás pessoas jurídicas de direito público que o Estado pode usar, fruir e dispor livremente por não estarem afetados a nenhum uso especial, tampouco destinados ao uso comum do povo.

2.        Bens de uso comum do povo

São todos os bens destinados ao uso indiscriminado e geral do povo. Podem ter essa destinação tanto por um ato formal de afetação quanto pela sua destinação natural, coo os rios e mares. Diante desse conceito, é até mesmo desnecessário afirmar que o rol trazido pelo inciso I é meramente exemplificativo. O que importa para essa classificação é a destinação a que se dá ao bem. Uma rua, por exemplo, pode ser perfeitamente afetada para ser especificamente utilizada pelo exército, ligando duas bases distintas. Em tal caso, tal ato de afetação fará com que essa estrada deixe de ser um bem público de uso comum do povo. Além disso, é possível ainda que determinado bem de uso comum do povo seja parcialmente afetado para utilização especial por determinada pessoa. É o que ocorre, por exemplo, quando se permite que empresas de transmissão de energia elétrica ou de telefonia utilizem faixas de domínio das estradas para instalação de sua rede de postes de transmissão. Ou ainda quando se reserva parte de praias e mares para serem utilizados com exclusividade por empresas que exploram atividade portuária. Diferentemente do uso comum desses bens, que pode ser feito independentemente de qualquer autorização da administração pública, o uso especial de bem de uso comum do povo exige autorização ou licença da administração. Haverá, então, uso especial de bem de uso comum do povo.

3.        Bens de uso especial

São os bens que pertencem a uma pessoa jurídica e que se encontram afetados para a prestação de determinado serviço ou para a realização de determinada função estatal, tais como “os edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias”. Diferenciam-se dos bens de uso comum do povo por serem utilizados pelo próprio ente público, e não pela coletividade direta e indistintamente.

4.        Bens dominicais

Por exclusão, consideram-se bens dominicais os bens que não sejam bens de uso comum do povo, tampouco sejam bens de uso especial. Ou seja, são aqueles bens destinados ao uso exclusivo de pessoas jurídicas de direito público e que se encontram livres de qualquer afetação específica. Justamente por não estarem afetados a qualquer destinação específica é que a administração pública pode fazer desses bens o uso que melhor lhe aprouver. O elemento caracterizados dos bens dominicais é a ausência de afetação, daí sua definição por exclusão em relação aos bens de uso especial. Por exemplo, prédios públicos desativados. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 31.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 100. Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar.1

1.        Inalienabilidade dos bens públicos de uso comum do povo e dos bens de uso especial

Enquanto permanecerem afetados a determinado serviço ou finalidade, os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial não podem ser alienados. Não só a alienação, mas todo e qualquer ato de disposição fica proibido. Ou seja, não podem ser doados, permutados, dados em garantia etc. Nada impede, entretanto, que tais bens sejam previamente desafetados, perdendo essa sua qualificação judicia, tornando-se, então, bens dominicais passiveis de alienação (CC, art 101). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 31.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 95, 96, 97 - Dos Bens Reciprocamente Considerados - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 95, 96, 97
Dos Bens Reciprocamente Considerados - VARGAS, Paulo S. R.
 
TÍTULO ÚNICO – Das Diferentes Classes de Bens (art. 79 a 103)
Capítulo II – Dos Bens Reciprocamente Considerados –
Seção V – Dos Bens Singulares e Coletivos
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Art. 95. Apesar de ainda não separados do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio jurídico. 1, 2

Bens reciprocamente considerados

Depois de visualizar os bens em sua própria individualidade, o legislador muda de critério no Capítulo II do título concernente às diferentes classes de bens, e os considera reciprocamente, levando em conta a relação entre uns e outros. E, dessa forma, classifica-os em principais e acessórios.

Nesse capítulo o legislador distingue bem principal de acessório e formula o conceito de pertenças e de benfeitorias, fazendo ainda referência a outras modalidades de acessórios, como os frutos e os produtos, compreendidos nos primeiros rendimentos.

1.        Frutos e produtos

Frutos são aqueles bens periodicamente produzidos por outro bem, sem que isso lhe altere a substância. A doutrina costuma classificar os frutos quanto a sua origem em naturais, industriais e civis. São frutos naturais aqueles originados pela própria natureza da coisa, como o leite, a soja, a maçã etc. Frutos industriais, por sua vez, são aqueles cuja origem depende da intervenção do homem, tal qual ocorre com a produção de uma fábrica. Por fim, frutos civis são todos os rendimentos oriundos da fruição da coisa. Exemplos de frutos civis são o aluguel e os juros sobre capital. Em oposição ao conceito de frutos, os produtos não são utilidades periodicamente produzidas por determinados bens, razão pela qual sua retirada importa diminuição de sua substância até seu esgotamento. É exatamente o que ocorre com o outro ou o petróleo, por exemplo.

2.        Possibilidade de os frutos e os produtos serem objeto de negócio jurídico

Uma vez separados do bem principal, os frutos e produtos adquirem existência autônoma, sendo evidente que podem ser objeto de negócio jurídico, perdendo, inclusive sua condição de acessório, sendo desnecessária qualquer regra expressa que consagrasse essa possibilidade. Apesar de a possibilidade de os frutos ainda não percebidos serem objeto de negócio jurídico ser reconhecida em diversos ordenamentos que não dispõe de regra semelhante (o próprio Código Civil de 1916 não tinha nenhum artigo correspondente), o legislador do Código Civil preferiu explicitar essa regra. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 31.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias. 1, 2

§ 1º. São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou seja, de elevado valor.

§ 2º. São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem.

§ 3º. São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore.

1.        Conceito e espécies

Benfeitoria é toda obra ou melhoramento destinado a conservar, melhorar ou embelezar a coisa. São voluptuárias as benfeitorias de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor (§ 1º), são úteis as benfeitorias que aumentam ou facilitam o uso do bem e são necessárias as benfeitorias que tê por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore (§ 3º).

2.        Benfeitorias e acessões

Acessão é tudo o que se incorpora, natural ou artificialmente, a uma coisa, tais como plantações ou construções. Apesar de serem figuras distintas, atraindo para si um regramento jurídico próprio, a jurisprudência tem admitido que às acessões se apliquem o regime jurídico das benfeitorias no que se refere ao direito de retenção. Nesse sentido: “a teor do artigo 1.219 do Código Civil, o possuidor de boa-fé tem direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis e, por semelhança, das acessões, sob pena de enriquecimento ilícito”. (STJ, REsp n. 1.316.895, rel. min. Ricardo villas Bôas Cueva, j. 11.06.13). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 31.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 97. Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor. 1.

1.        Benfeitorias e acessões naturais

Apenas se consideram benfeitorias os melhoramentos e acréscimos feitos ao bem por força da ação humana. Melhoramentos ou acréscimos decorrentes de eventos naturais ficam excluídos desse conceito. Os incisos I a IV do artigo 1.248 do Código Civil descrevem as situações pelas quais pode ocorrer a acessão natural (I – por formação de ilhas; II – por aluvião; III – por avulsão; IV – por abandono de álveo). A distinção é importante ao impedir que os melhoramentos e acréscimos decorrentes das acessões naturais venham a ser objeto de indenização por parte de quem em nada contribuiu para sua ocorrência. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 31.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 92, 93, 94 Dos Bens Reciprocamente Considerados - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 92, 93, 94
Dos Bens Reciprocamente Considerados - VARGAS, Paulo S. R. 

TÍTULO ÚNICO – Das Diferentes Classes de Bens (art. 79 a 103)
Capítulo II – Dos Bens Reciprocamente Considerados –
Seção V – Dos Bens Singulares e Coletivos
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Art. 92. Principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessório, aquele cuja existência supõe a do principal. 1

1.        Bem principal e bem acessório

Apesar de se limitar a conceituar os bens principais e os bens acessórios, ao dizer que a existência do bem acessório supõe a existência do principal, o legislador manteve a regra expressa no Código Civil de 1916, art 59, segundo a qual o acessório segue o principal. A regra funda-se na premissa de que a existência de um bem tido por acessório a um bem principal não se justifica. Por essa razão, para que o bem acessório mantenha sua relevância econômica e jurídica, deve ela seguir a sorte do bem principal (CC/02, arts 233, 822, 878, 1.392, 1.435, I, 1454, 1474, 1.712 e 1.937). Tal regra, entretanto, não é absoluta, podendo ser afastada pela vontade das partes ou mesmo pela lei. Havendo omissão, entretanto, a sorte do principal determinará que a importância econômica e jurídica pressupõe que dois ou mais bens permaneçam ligados, nem sempre será fácil identificar qual é o bem acessório e qual é o bem principal. Eduardo Ribeiro exemplifica com a situação em que as edificações ou plantações excedam consideravelmente o valor do bem. Em tais casos, como o próprio legislador reconhece, estando de boa-fé, aquele que plantou ou construiu adquire a propriedade do solo mediante indenização (CC, art 1.255, “Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização.). Diante de tais dificuldades, tem prevalecido o critério que aponta como principal o bem de maior valor econômico. (1) (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 30.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Eduardo Ribeiro de Oliveira, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Comentários ao Código Civil: das pessoas, (arts 79º a 137º). Vol. II, Rio de Janeiro, forense, 2008, p. 92

Art. 93. São pertenças os bens que, não constituindo parte integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outros. 1

1.        Pertenças

As pertenças são bens que se acrescem, como acessórios à coisa principal, daí serem consideradas como res annexa (coisa anexada). Portanto, são bens acessórios sui generis destinados, de modo duradouro, a conservar ou facilitar o uso ou prestar serviço, ou ainda, a servir de adorno do bem principal sem ser integrante”.(1) É o que ocorre, por exemplo, com os móveis que guarnecem uma residência, as máquinas e implementos de uma fazenda, desde que sua vinculação seja duradoura, não se admitindo que tais bens acessórios estejam apenas provisoriamente vinculados ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 30.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Maria Helena Diniz, Código Civil Anotado, 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2012, p. 166.

Art. 94. Os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso. 1.

1.        Inversão da regra de que o acessório segue o principal

Diferentemente do que ocorre com os bens acessórios, cuja sorte encontra-se vinculada à do bem principal, como regra geral, na omissão da lei ou das partes, o negócio jurídico que tenha como objeto o bem principal não abrange as pertenças. Trata-se de uma notória inversão da regra de que o acessório segue o principal. Isso ocorre porque a relação de pertinência que se estabelece entre a pertença e o bem principal é meramente econômica e não lógica como ocorre com os bens acessórios. Trata-se, portanto, de um liame de natureza diversa, de menor intensidade. A simples existência de um bem acessório já pressupõe a existência de um bem principal. O mesmo não ocorre com as pertenças. A existência de uma máquina, de uma estátua, de um fogão, não pressupõe, por si só, a existência de outros bens. Tais bens continuam tendo relevância jurídica e econômica autônomas, daí a razão da inversão da regra de que o acessório segue o principal (TJ-SP, apelação n. 0003413-22.2009.8.26.0417, rel. Edgard Rosa, j. 24.4.13). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 30.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

domingo, 30 de dezembro de 2018

DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 89, 90, 91 Dos Bens Singulares e Coletivos - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO. Arts. 89, 90, 91
Dos Bens Singulares e Coletivos - VARGAS, Paulo S. R.

TÍTULO ÚNICO – Das Diferentes Classes de Bens (art. 79 a 103)
Capítulo I – Dos Bens Considerados em Si Mesmos –
Seção V – Dos Bens Singulares e Coletivos
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Art. 89. São singulares os bens que, embora reunidos, se consideram de per si, independentemente dos demais. 1

1.         Bens singulares

São singulares os bens que, embora reunidos, mantêm uma existência autônoma independente dos demais que com eles se encontrem. O Código civil de 1916 costumava distinguir os bens singulares em bens simples e compostos (CC 1916, art 54). Por força de tal distinção, consideravam-se bens simples aqueles formados por um todo uniforme, sem partes autônomas identificáveis. Como um animal ou um livro, por exemplo. Por outro lado, consideravam-se bens singulares compostos aqueles formados pela união de diversas partes, tal como ocorre com uma máquina. Diante da ausência de qualquer relevância prática de tal distinção, o legislador do atual Código Civil abandonou essa classificação aludindo apenas aos bens singulares.

Art. 90. Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária. 1, 2

Parágrafo único. Os bens que formam essa universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias.

1.        Universalidade de bens

Forma-se a universalidade de fato pela reunião de bens homogêneos, pertencentes a uma mesma pessoa, que tenham uma só finalidade econômica. Não é toda simples reunião de bens que tem a aptidão de configurar uma universalidade de fato. É necessário que esses bens homogêneos estejam coordenados, orientados, organizados pela vontade humana para a realização de uma mesma finalidade econômica. É o que ocorre, por exemplo, com uma biblioteca ou um rebanho.

2.        Requisitos

Partindo desse conceito de universalidade, é possível identificar seus requisitos caracterizadores: (a) pluralidade de bens singulares, (b) pertencentes à mesma pessoa e (c) organizados em torno de uma mesma finalidade econômica. Diferentemente do que ocorre com o bem singular composto, na universalidade de bens não existe uma reunião física entre as coisas. Cada um de seus bens singulares mantém sua autonomia em relação aos demais. O parágrafo único deixa isso bastante claro ao afirmar que “os bens que formam essa universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias”. Apesar de o caput do artigo 90 afirmar que a caracterização de uma universalidade de bens exige que todos os bens singulares que a componham pertençam à mesma pessoa, esse requisito tem sido abrandado. É exatamente isso o que diz o Enunciado 288 da IV Jornada de Direito Civil: “A pertinência subjetiva não constitui requisito imprescindível para a configuração das universalidades de fato e de direito” (Enunciado 288 da IV Jornada de Direito Civil). Permanecerá sendo, pois, uma universalidade de bens um rebanho pertencente a mais de uma pessoa em condômino. Por fim, a necessidade de que os bens singulares estejam todos organizados em torno de uma mesma finalidade econômica é exatamente o que confere utilidade a essa categoria de bens. Apesar de a universalidade de bens não constituir um bem jurídico autônomo, diverso dos bens individuais que a compõe, admite o direito que a universalidade de bens seja objeto de relações jurídicas. Assim, por exemplo, uma universalidade por ser objeto de penhor, alienação, usufruto (CC, art 1.392, § 3º), seguro (Estatuto da Terra, art 91) ou mesmo ser apontada como objeto de uma ação judicial (CPC/2015, art 324). Isso ocorre porque, em diversas situações, é a universalidade que adquire importância econômica, e não cada um dos bens isoladamente considerados. É exatamente por isso que a substituição de um ou mais bens individuais, ou mesmo a diminuição ou aumento da quantidade desses bens não descaracteriza a universalidade (CC, art 1.446). Apesar, portanto, da universalidade de bens não atrair nenhuma norma jurídica específica, a caracterização dessa categoria de bens evita que as partes precisem identificar cada um dos bens singulares nesse tipo de negócio jurídico em que apenas a universalidade adquire relevância. Essa consequência apenas aparentemente mostra pouca relevância, pois, na prática comercial contribui enormemente ao simplificar as formalidades necessárias ao aperfeiçoamento das relações. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 27.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 91. Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico.1

1.        Universalidade de direito

Não só as coisas, mas também as relações jurídicas podem adquirir valor econômico, sendo comum atualmente que as relações jurídicas venham a ser objeto de negócios jurídicos. Da mesma forma como fez com as universalidades de fato, conferir unidade ao complexo de relações jurídicas de uma pessoa, dotadas de valor econômico, busca facilitar e incrementar os negócios jurídicos que tenham essas universalidades de direito como objeto. É o que ocorre, por exemplo, com a massa falida, a herança, o patrimônio etc. (DIREITO CIVIL COMENTADO apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site DIREITO.COM em 27.12.2018, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).