segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 113, 114 Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 113, 114
Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.
 
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo I – Disposições Gerais
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.1, 2

1.        A boa-fé como critério de interpretação do negócio jurídico

No Código Civil atual, diversos valores sociais foram expressamente reafirmados, dentre os quais o princípio da boa-fé, de extrema relevância pra o direito privado. A doutrina moderna capitaneada no Brasil por Judith Martins-Costa costuma afirmar que a cláusula geral de boa-fé apresenta uma tripla função, ora funcionando como um cânone hermenêutico dos contratos, ora como uma norma geral criadora de deveres jurídicos acessórios e ora como uma limitação ao exercício de direitos subjetivos. O artigo 113 do Código Civil cuida da importância da boa-fé como elementos de interpretação dos negócios jurídicos. Por força dessa regra interpretativa, dentre as diversas e variadas possíveis interpretações de um negócio jurídico deve o intérprete privilegiar aquela que corresponda aos padrões ditados pela boa-fé. Ou seja, à conduta justa e correta que se espera que alguém adote naquelas circunstâncias.

2.        Os usos do lugar de sua celebração

Os usos do lugar em que o contrato é celebrado são de extrema relevância para a interpretação dos negócios jurídicos na medida em que ajudam a determinar a forma como a declaração de vontade é socialmente vista naquela circunstância. Naturalmente, entretanto, tais usos podem varia de acordo com o lugar em que o negócio é celebrado. Basta pensar na medida de área denominada alqueire, que varia de lugar para lugar. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 04.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente. 1

1.        Interpretação restritiva dos negócios benéficos e da renúncia

Os negócios jurídicos benéficos são aqueles em que apenas uma das pessoas obtém vantagem com sua celebração, não existindo equilíbrio entre os benefícios e as obrigações assumidas pelas diferentes partes. Basta pensar na doação, em que apenas um dos contratantes recebe todas as vantagens de sua celebração enquanto que à contraparte cabem todas as obrigações. Por sua vez, a renúncia é um ato de disposição e abandono de um direito em favor de outrem. Em ambos os casos, como se vê, há expressa vantagem de uma pessoa em detrimento da outra. Para evitar que esse desequilíbrio seja ainda maior, o legislador estabeleceu um critério interpretativo restritivo para tais negócios jurídicos. Assim, por exemplo, numa situação em que alguém tenha doado um imóvel guarnecido por diversos móveis, sem nada dizer sobre eles, a regra de interpretação restritiva dos negócios jurídicos benéficos força a conclusão de que tais móveis não foram contemplados no objeto da doação.  (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 04.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Negócio jurídico é um ato ou uma pluralidade de atos, entre si relacionados, quer sejam de uma ou de várias pessoas, que tem por fim produzir efeitos jurídicos, modificações nas relações jurídicas no âmbito do direito Privado.

Miguel Reale preleciona que “negócio jurídico é aquela espécie de ato jurídico que, além de se originar de um ato de vontade, implica na declaração expressa da vontade, instauradora de uma relação entre dois ou mais sujeitos tendo em vista um objetivo protegido pelo ordenamento jurídico. Tais atos, que culminam numa relação intersubjetiva, não se confundem com os atos jurídicos em sentido estrito, aos quais não há acordo de vontade, como, por exemplo, se dá nos chamados atos materiais, como os da ocupação ou posse de um terreno, a edificação de uma casa no terreno apossado etc. Um contrato de compra e venda, ao contrário, tem a forma específica de um negócio jurídico...”. Antônio Junqueira de Azevedo, depois de criticar a teoria voluntarista, que dá ênfase à manifestação da vontade como elemento fundamental do negócio jurídico, e também a teoria objetivista, que vislumbra no negócio jurídico antes um meio concedido pelo ordenamento jurídico para produção de efeitos jurídicos que propriamente um ato de vontade – dissensão está agravada com o debate entre a teoria da vontade (Willenstheorie) e a teoria da declaração (Erkla nungstheorie) -, conceitua o negócio jurídico, sob o critério estrutural e encarando-o como fato jurídico concreto, como “todo fato jurídico consistente em declaração de vontade, a que o ordenamento jurídico atribui os efeitos designados como queridos, respeitados os pressupostos de existência, validade e eficácia impostos pela norma jurídica que sobre ele incide.” Para Renan Loturo, “Negócio jurídico é o meio para a realização da autonomia privada, ou seja, a atividade e potestade criadoras, modificaras ou extintoras de relação jurídicas entre particulares.” (Negócio jurídico. Existência, validade e eficácia, p. 16. A representação, cit., p. 140-141: Renan Lotufo, Código Civil, cit., p. 206/207, Apud Direito Civil Comentado – Parte Geral, Roberto Gonçalves, V. I, p. 318, 2010, Saraiva – São Paulo.

domingo, 6 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 110, 111, 112 - Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 110, 111, 112
Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo I – Disposições Gerais
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Art. 110. A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento. 1, 2

1.        A vontade e sua manifestação

Não é a vontade do agente que determina o conteúdo do negócio jurídico e sim a forma como essa vontade é externada socialmente. O ordinário é que a vontade real do sujeito coincida com a vontade que foi publicamente manifestada. Pode ocorrer, entretanto, um descompasso entre a vontade real e a vontade manifestada. Enfrentando essas situações de descompasso duas teorias extremas surgiram. A teoria subjetiva, que funda toda a essência do negócio jurídico na vontade real do sujeito, protegendo-a ante sua exteriorização errônea e a teoria objetiva, mais moderna, a qual reconhece como elemento essencial do negócio jurídico, e não a vontade íntima do sujeito, que não vindo a ser exteriorizada, não adquire relevância jurídica. Eduardo Ribeiro bem observou que o legislador do Código Civil buscou amenizar os extremos dessas duas teorias ora privilegiando a vontade real (CC, art 167), ora protegendo a vontade declarada (CC, art 154). Observa-se de todo modo, que prepondera no Código Civil a chamada teoria da confiança, segundo a qual deve-se preservar a confiança legitimamente criada no destinatário da declaração de vontade de que a vontade declarada corresponde à vontade real do agente. (1)

2.        Reserva mental

A reserva mental ocorre quando o agente voluntariamente declara sua vontade em descompasso com sua vontade real. É a divergência propositalmente causada entre o animus e a declaração. Em tal caso, como regra geral, prevalece o conteúdo da vontade que foi exteriorizada pelo agente. É ela que irá produzir efeitos jurídicos. A vontade real, que o agente voluntariamente guardou para si, será irrelevante para o direito. a situação será diferente, entretanto, se o destinatário dessa declaração tiver conhecimento de que ela não corresponde a real intenção de quem a declarou. Isso porque, neste caso, entende a doutrina que sequer há declaração de vontade, caracterizando verdadeira hipótese de inexistência de negócio jurídico. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 03.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Eduardo Ribeiro de Oliveira, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Comentário ao Código Civil: das pessoas, (art 79ª a 137), Vol. II, Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 229-230.

Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa. 1

1.        O silêncio como manifestação de vontade

Expressão máxima do princípio da liberdade das formas é que até mesmo o silêncio pode ser reconhecido como forma de exteriorização da vontade. Usualmente, entretanto, o silêncio corresponde à mais absoluta ausência de declaração de vontade. Em situações excepcionais, entretanto, se as circunstancias negociais assim permitirem, ou mediante previsão expressa da lei, o silêncio pode ser visto como uma forma de anuência e, portanto, de manifestação de vontade. É o que ocorre, por exemplo, com a assunção de dívida. Diz o parágrafo único do art 299 que: “qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa” (CC, art 299, parágrafo único). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 03.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. 1

1.        Interpretação da declaração de vontade

Diferentemente do que uma leitura apressada desse dispositivo poderia transmitir, ao dizer que “nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”, o legislador acabou mais uma vez prestigiando a vontade declarada em detrimento da vontade real do agente. O conteúdo do negócio jurídico é determinado pela declaração de vontade e pelas circunstâncias com que ela foi declarada, não pelo animus subjetivo e íntimo do agente que a declarou. Basta ver que o legislador expressamente conferiu importância interpretativa à intenção do agente que foi de algum modo consubstanciada na declaração de vontade. A vontade íntima do agente que de forma alguma chegou a ser exteriorizada, que não foi consubstanciada na declaração permanece irrelevante para o direito. O parâmetro interpretativo consagrado pelo artigo 112 é o de evitar-se o apego literal ao sentido da linguagem, insensível às circunstâncias que lhe dão significado. De maneira bastante didática, as regras de interpretação dos contratos foram sistematizadas pela doutrina em três diferentes planos, dos quais o intérprete pode valer-se (i) do sentido literal da linguagem (ponto de partida necessário, porém insuficiente); (ii) da contextualização verbal do contrato (interpretação de determinado comando em consonância com a inteireza da avença), e (iii) de sua contextualização situacional. (1) (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 03.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Francisco Paulo de Crescenzo Marino. Contratos coligados no direito brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2009, p. 146.

sábado, 5 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 107, 108, 109 Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 107, 108, 109
Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.
 
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo I – Disposições Gerais
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Art. 107. A vaidade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir. 1

1.        Princípio da liberdade das formas

Já se disse que a forma do negócio jurídico é o meio pelo qual o agente capaz exterioriza sua vontade de praticar determinado negócio jurídico. Como regra geral, vige no direito brasileiro o princípio da liberdade das formas, a qual reputa válida todos os meios de exteriorização da vontade. Em alguns casos, porém, a lei exige determinada forma específica para a validade do ato. Em tais hipóteses, a inobservância dessa forma levará à nulidade do negócio (CC, art 166, IV). É o que se verifica ainda quando o Código Civil diz que a validade do negócio jurídico requer a observância da forma prescrita ou não defesa em lei. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 02.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

É nulo o negócio jurídico quando “não revestir a forma prescrita em lei” ou “for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade” (art 166, IV e V). Em alguns casos a lei reclama também a publicidade, mediante o sistema de Registros Públicos (CC art 221). Cumpre frisar que o formalismo e a publicidade são garantias do direito.

Na mesma esteira do art 166, IV e V, CC, retrotranscrito, estabelece o art 407 do CPC/2015, “Quando a lei exigir instrumento público como da substância do ato, nenhuma outra prova, por mais especial que seja, pode suprir-lhe a falta.” Por sua vez, estatui o art 188 do mesmo diploma: “Os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial.”  Podem ser distinguidas três espécies de formas: forma livre, forma especial ou solene e forma contratual. (Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, Parte Geral, Vol. I, p. 357, Saraiva, 2010).

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país. 1

1.        Forma única

Uma das exceções legais ao princípio da liberdade das formas é a que se refere aos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país. Em tal caso, estipula a lei uma única forma admitida para tais negócios jurídicos. Inobservada essa forma única prescrita em lei, o negócio jurídico será nulo. Contudo, esse próprio artigo 108 expressamente abre a possibilidade de que a lei possa afastar essa obrigatoriedade da escritura pública. é o que acontece com negócios jurídicos de aquisição de imóveis regido pelo regime especial do Sistema Financeiro da Habitação (Lei n. 4.380/64) e os contratos de compra e venda com alienação fiduciária (Lei n. 9.514/97).

Art. 109. No negócio jurídico celebrado com a cláusula de não valer sem instrumento público, este é da substância do ato. 1

1.        Forma especialmente eleita pela vontade das partes

Por ser mais formal, a utilização da escritura pública garante maior segurança jurídica às partes. Em contrapartida, a opção pela utilização da escritura pública acresce custos de transação ao negócio jurídico, já que torna a celebração do negócio mais cara e demorada. Têm as partes, entretanto, liberdade para escolher celebra um negócio jurídico utilizando-se de uma forma mais simples, célere e menos onerosa, ou optar por utilizar uma forma mais segura e custosa. De todo modo, tendo optado pela utilização do instrumento público, a utilização dessa forma será um requisito indispensável para a validade do negócio jurídico. E nem poderia ser diferente, sob pena de esvaziar a própria garantia de segurança jurídica a que buscaram as partes. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 02.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 104, 105, 106 Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 104, 105, 106
Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo I – Disposições Gerais
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Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: 1, 2, 3, 4, 5

I – agente capaz;

II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;

III – forma prescrita ou não defesa em lei.

1.        Fatos jurídicos

São fatos jurídicos os acontecimentos naturais que tenham a aptidão de criar, modificar ou extinguir direitos. Diversos outros fatos podem não ter consequência alguma para o direito, razão pela qual não se amolgam à definição de fatos jurídicos. Uma chuva que caia no meio do oceano, ou o vento que ocorra em um campo, podem ser absolutamente irrelevantes para o direito. Em tais casos, esses acontecimentos são considerados fatos juridicamente irrelevantes. Esses mesmos fatos, porém, podem trazer consequências jurídicas, tornando-se juridicamente relevantes. Basta imaginar se a chuva que cai no meio do oceano vem a afundar uma embarcação, extinguindo o direito de propriedade que uma pessoa tinha sobre ela, fazendo surgir o direito ao recebimento da respectiva indenização securitária, resolvendo um contrato de transporte etc. Em tal caso, esse mesmo acontecimento produz consequências jurídicas, tornando-se relevante para o direito.

2.        Atos jurídicos

São atos jurídicos os acontecimentos causados pela ação humana, com a aptidão de criar, modificar ou extinguir direitos. Em síntese, pode-se apontar que a distinção entre os fatos jurídicos e os atos jurídicos reside justamente no concurso da vontade humana. Se determinado acontecimento juridicamente relevante ocorre sem influência da vontade humana (chuva, por exemplo), caracterizar-se-á um fato jurídico. Por outro lado, se determinado acontecimento juridicamente relevante ocorre por força da vontade humana (plantação em um campo, pintura de um quadro, construção de uma casa), ter-se-á um ato jurídico. Os atos jurídicos comportam ainda classificação quanto à sua licitude, podendo ser divididos em atos jurídicos lícitos e atos jurídicos ilícitos.

3.        Negócios jurídicos

São negócios jurídicos os atos de vontade humanos dirigidos à realização de determinado efeito ou consequência jurídica. Ao praticar um negócio jurídico, o sujeito age com a finalidade de produzir efeitos em sua esfera de direitos. Ao fazer uma oferta de compra de determinado imóvel, o sujeito tem em vista justamente a celebração desse contrato de compra e venda. Neste caso, portanto, o ato jurídico é praticado pelo sujeito visando à realização de um efeito jurídico previamente imaginado e querido. Por força de tal definição, pode-se observar que os negócios jurídicos são uma espécie de ato jurídico. Por essa razão, a doutrina costuma classificar os atos jurídicos em atos jurídicos em sentido estrito e em negócios jurídicos. Enquanto que nos negócios jurídicos o sujeito pratica o ato querendo a produção de determinados efeitos jurídicos, os atos jurídicos em sentido estrito são praticados pelo sujeito com indiferença quanto às suas consequências jurídicas. Diversas são as classificações da doutrina acerca dos negócios jurídicos. Os negócios jurídicos podem ser (a) unilaterais, bilaterais ou plurilaterais; (b) onerosos ou gratuitos; (c) comutativos ou aleatórios; d) inter vivos ou causa mortis; (e) solenes e não-solenes; (f) principais ou acessórios.

4.        Elementos de existência, requisitos de validade e fatores de eficácia do negócio jurídico

Tradicionalmente, a doutrina civilista costuma analisar o negócio jurídico em três diferentes planos: o plano da existência, o plano da validade e o plano da eficácia. Para bem compreender o negócio jurídico, portanto, é necessário analisar primeiramente se o negócio jurídico reúne todos os elementos necessários à sua existência. Existindo, deve-se então perquirir se todos esses elementos contêm os predicados necessários à sua validade. Por fim, mesmo existindo e sendo válido, é necessário verificar a presença de eventuais fatores de eficácia, cuja presença ou ausência eventualmente podem impedir o negócio jurídico de produzir seus regulares efeitos. Tornou-se clássica a categorização dos elementos do negócio jurídico de Antonio Junqueira de Azevedo: “a) elementos gerais, isto é, comuns a todos os negócios; b) elementos categoriais, i.é, próprios de cada tipo de negócio; c) elementos particulares, i.é, aqueles que existem em um negócio determinado, sem serem comuns a todos os negócios ou a certos tipos de negócios”. (1) Por sua vez, os requisitos de validade são as exigências que o legislador requer para que esses elementos sejam admitidos pelo direito para a validade do negócio. Assim, por exemplo, o agente é um elemento essencial do negócio jurídico. E sua ausência fatalmente levará à inexistência do negócio jurídico. Por sua vez, exige o legislador que esse agente seja capaz. Sem esse predicado exigido por lei para a validade do negócio jurídico, ele e4xistirá, mas não será válido. Por fim, os fatores de eficácia são todas as circunstâncias que podem influenciar a eficácia de um negócio jurídico. Como regra geral, todo negócio jurídico existente e válido produz efeitos. Contudo, pode ocorrer de existirem circunstâncias que impeçam ou posterguem a eficácia dos negócios jurídicos, como é o caso da condição suspensiva (CC, art 125).

5.        Os requisitos de validade do negócio jurídico:  agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei

Costuma-se apontar que os elementos essenciais a todo e qualquer tipo de negócio jurídico são a forma, o objeto, as circunstâncias negociais (assim entendida como as circunstâncias que fazem com que uma manifestação de vontade seja socialmente vista como dirigida à produção de efeitos jurídicos), o agente, o tempo e o lugar. No que se refere ao tempo, ao lugar e às circunstâncias negociais do negócio jurídico, o legislador não exigiu nenhum requisito de validade geral. Salvo para disciplinar alguns negócios jurídicos específicos, os negócios podem ser realizados em qualquer tempo e lugar e sob quaisquer circunstâncias, sem que isso comprometa sua validade. Por outro lado, quanto aos demais elementos essenciais do negócio jurídico, diz o art 104 do Código Civil que “a validade do negócio jurídico requer: I – agente capaz; II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III – forma prescrita ou não defesa em lei”. Sendo o negócio jurídico, antes de tudo, um ato de vontade praticado pelo agente, exige o legislador que esse agente tenha capacidade jurídica para expressar sua vontade. Para a validade do negócio jurídico, portanto, é necessário que o agente seja capaz. Sendo absolutamente incapaz, o negócio jurídico será nulo (CC, art 166, I). Sendo apenas relativamente incapaz, o negócio jurídico será anulável (CC, 171, I), Além disso, todo negócio jurídico tem necessariamente um objeto. Esse objeto, por sua vez, será exatamente o que as partes almejam conseguir com a realização do negócio jurídico. A doutrina costuma classificar o objeto do negócio jurídico em objeto imediato 9ª ação humana) e objeto mediato (a coisa a que a ação humana se refere). Assim, por exemplo, um contrato de compra e venda de um imóvel. A prestação de dar será o objeto imediato do negócio e o imóvel seu objeto imediato. Para que o negócio jurídico seja válido, é necessário que seu objeto lícito, possível, determinado ou determinável. A licitude refere ao objeto imediato. É a ação humana que pode ser lícita ou ilícita. Uma substância entorpecente ou uma arma, por exemplo, não são ilícitas em si mesmo. É a ação humana de vender substâncias entorpecentes ou armas à população é ilícita. Por outro lado, a compra e venda de armas para equipar a polícia é plenamente lícita. A possibilidade e a determinação do objeto, por sua vez, dizem respeito à própria coisa. Sendo fisicamente impossível, por exemplo, atravessar o oceano correndo, um negócio jurídico com esse objeto será nulo. A impossibilidade pode ainda ser jurídica e não física, como é a disposição da herança de pessoa viva. Além disso, o objeto deve ser determinado ou, ao menos determinável. Ou seja, é necessário que seja precisamente identificado ou ao menos identificável mediante a prévia estipulação de seu gênero e quantidade, por exemplo. A forma do negócio jurídico é o meio pelo qual o agente manifesta sua vontade. Não basta ao agente simplesmente querer a realização de determinado negócio jurídico. Para que esse negócio exista, é necessário que o agente exteriorize essa vontade a qual, manifestada em meio às circunstâncias negociais específicas, será socialmente vista como dirigida à produção de determinados efeitos. Como regra geral, vige no direito brasileiro o princípio da liberdade das formas, a qual reputa válida todos os meios de exteriorização da vontade. Em alguns casos, porém, a lei exige determinada forma específica para a validade do ato. Em tais hipóteses, a inobservância dessa forma levará a nulidade do negócio (CC, art 166, IV). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 02.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Antônio Junqueira de Azevedo, Negócio Jurídico, Existência, Validade e Eficácia. São Paulo, Saraiva, 2002, p. 32.

Art. 105. A incapacidade relativa de uma das partes não pode ser invocada pela outra em benefício próprio, nem aproveita aos co-interessados capazes, salvo se, neste caso, for indivisível o objeto do direito ou da obrigação comum. 1, 2

1.        Incapacidade relativa como exceção pessoal

Como precisamente qualificado por Maria Helena Diniz, a incapacidade relativa é uma exceção pessoal. Ou seja, apenas pode ser alegada por quem a aproveita. Nada mais natural, afinal de contas, sendo um instituto voltado à proteção da pessoa natural que não tenha ainda o necessário discernimento para a prática de determinados atos da vida civil, seria uma subversão à finalidade desse instituto permitir que outras pessoas a invocassem em prejuízo do próprio relativamente incapaz. Assim, por exemplo, não pode a pessoa que se obrigou a determinada prestação em fazer de uma pessoa com dezessete anos invocar essa sua condição para se livrar dessa respectiva prestação.

2.        Incapacidade relativa ante a indivisibilidade do objeto

A individualidade do objeto invariavelmente impõe que se adote a mesma solução jurídica, ainda que existentes diferentes interessados em seu objeto. Sendo esse o caso, os co-interessados capazes poderão invocar a incapacidade relativa em favor do incapaz e de si mesmos. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 02.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 106. A impossibilidade inicial do objeto não invalida o negócio jurídico se for relativa, ou se cessar antes de realizada a condição a que ele estiver subordinado. 1, 2
1.        Impossibilidade relativa do objeto

Impossibilidade relativa do objeto do negócio jurídico é aquela que não se mostra possível de ser cumprida pela pessoa do devedor, mas que pode ser cumprida por outra pessoa. É o que ocorre, por exemplo, com um contrato por meio da qual o dono de um imóvel celebra um contrato com uma pessoa para futuramente reformá-lo, enquanto essa pessoa está em processo de recuperação de uma moléstia que a impede de trabalhar. Nesse exemplo, o contratado encontra-se impossibilitado de cumprir o objeto do contrato. Contudo, outras pessoas podem fazê-lo, razão pela qual o negócio é válido. Se a impossibilidade relativa do objeto do negócio jurídico for posterior à sua celebração sem culpa das partes, o negócio se resolve liberando as partes de suas obrigações. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 02.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).