quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Comentários ao Código Penal – Art. 9º Pena Cumprida no Estrangeiro – VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com –

 

Comentários ao Código Penal – Art. 9º
Pena Cumprida no Estrangeiro
– VARGAS, Paulo S. R.
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Parte Geral – Título I – Da Aplicação da Lei Penal

 

Eficácia da sentença estrangeira

Art. 9ª. A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para: (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11-7-1984.)

I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis; (Incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

II - sujeitá-lo a medida de segurança. (Incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984. )

Parágrafo único. A homologação depende: (Incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

a) para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte interessada; (Incluído pela Lei n& 7.209, de 11/7/1984.)

b) para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença, ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça. (Incluído pela Lei ns 7.209, de 11/7/1984.)

Em relação à eficácia da sentença estrangeira, veja o que leciona Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao art. 9º do CP, p. 23:

 

Eficácia da sentença estrangeira: A sentença judicial é um ato de soberania do Estado. Contudo, seria de todo ineficaz é insuficiente se não pudéssemos executá-la, afim de fazer valer a decisão nela contida. Como regra, sua execução, como ato soberano, deveria ficar adstrita aos limites territoriais do Estado que a proferiu.

 

Mas, como bem observa Alberto Silva Franco, “para combater com maior eficiência, dentro de suas fronteiras, a prática de fatos criminosos, o Estado se vale, por exceção, de atos de soberania de outros Estados, aos quais atribui certos e determinados efeitos. Para tanto, homologa a sentença penal estrangeira, de modo a tomá-la um verdadeiro título executivo nacional, ou independentemente de prévia homologação, dá-lhe o caráter de fato jurídico relevante”. (Silva Nucci, Guilherme de Souza. Código penal comentado, p. 83).

 

Competência para homologação da sentença estrangeira:  Compete ao Superior Tribunal de justiça, nos termos da alínea /, acrescentada ao inciso I do art. 105 da Constituição Federal pela Emenda n2 45/2004, a homologação das sentenças estrangeiras que, anteriormente, era levada a efeito pelo Supremo Tribunal Federal, de acordo com a revogada alínea h, I, do art. 102.

 

Da mesma forma, o art. 475-N, inciso VI, acrescentado ao Código de Processo Civil pela Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, assevera: Art. 475-N (Vide art. 515 no CPC-2015. Nota VD).  São títulos executivos judiciais: f...j   VI - a sentença estrangeira, homologada pelo Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 420 do STF. Não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova do trânsito em julgado.

 

Para se conceder a homologação de sentença estrangeira não é indispensável carta de sentença. Basta que a sentença se revista das formalidades externas necessárias à sua execução, contenha os elementos indispensáveis à compreensão dos fatos em que se fundou, seja motivada e tenha conclusão.

 

No tocante ao objeto da condenação, não é preciso que seja determinado, sendo suficiente que seja determinável (STF, HSE, Rel. Min. Thompson Flores, DJU 24/10/1975, p. 7.759). (Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao art. 9º do CP, p. 23. Ed.Impetus.com.br, acessado em 19/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Segundo as apreciações de Paulo Guimarães, publicado no estrategiaconcursos.com.br, há cinco anos, intitulado “Código Penal Militar modificado pela Lei n. 13.491/2017”:


Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:

II – os crimes previstos neste Código, e os previstos na legislação penal, quando praticados: (embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados):

Pela redação original, para que tivéssemos um crime militar com base no inciso II do art. 9º (lembre-se de que também há os crimes previstos apenas no CPM), a conduta praticada pelo agente deveria necessariamente ser prevista como crime no Código Penal Militar. Agora, ao que nos parece, para ser considerada crime militar com base no inciso II do art. 9º, a conduta praticada pelo agente pode estar tipificada no Código Penal Militar ou na legislação penal comum.

Imagine, por exemplo, que um oficial da Marinha comete crime de discriminação contra colega de farda em razão de sua deficiência. Esse crime está previsto na Lei n. 13.146/2015 e não no CPM, e por isso, antes da mudança, seria de competência da Justiça comum, mas agora será considerado crime militar mesmo sem encontrar previsão específica como crime militar.

Crimes Dolosos Contra A Vida Praticados Por Militar Contra Civil

Em regra, crimes praticados por militar em serviço contra civil são considerados crimes militares, de acordo com a redação do art. 9o, II, “c”, que não foi modificada.

O crime doloso contra a vida praticado por militar contra civil, porém, tem tratamento diferente. Até então estes crimes eram de competência da Justiça Comum, nos termos do parágrafo único do art. 9o. Essa regra foi modificada, mas tome muito cuidado. Aqui é preciso analisar com carinho as modificações…!

Redação Anterior: Art. 9o - Parágrafo único. Os crimes de que trata este artigo quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão da competência da justiça comum, salvo quando praticados no contexto de ação militar realizada na forma do art. 303 da Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica.

Nova Redação:

Art. 9o

§1o Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares contra civil, serão da competência do Tribunal do Júri.

§2o Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência da Justiça Militar da União, se praticados no contexto:

I – do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente da República ou pelo Ministro de Estado da Defesa; 

II – de ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar, mesmo que não beligerante; ou 

III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da ordem ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com o disposto no art. 142 da Constituição Federal e na forma dos seguintes diplomas legais:

a) Lei no 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica;

b) Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999;

c) Decreto-Lei no 1.002, de 21 de outubro de 1969 – Código de Processo Penal Militar; e

d) Lei no 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral.


Perceba que, como regra, os crimes dolosos contra a vida praticados por militar contra civil continuam sendo de competência da Justiça Comum (Tribunal do Júri). O que mudou foi a quantidade de exceções a essa regra geral. Na realidade agora são tantas exceções que quase sempre o militar vai terminar sendo julgado na Justiça Militar.

Para entender bem o que isso significa, é preciso saber que uma das funções das Forças Armadas é a garantia da lei e da ordem, e por isso essas instituições atuam excepcionalmente (infelizmente não tão excepcionalmente assim) em ações de segurança pública, reforçando o contingente policial e participando de operações. Frequentemente vemos notícias na imprensa sobre isso.

Como essa modalidade de emprego das Forças Armadas depende de decisão do Presidente da República, na prática o crime doloso contra a vida praticado por militar contra civil nessas operações será sempre julgado pela Justiça Militar, incidindo no:

§ 2o, I. A mesma lógica se aplica a outras atividades atípicas das Forças Armadas, que também dependem de decisão do Presidente da República ou do Ministro da Defesa, como, por exemplo, a atuação do Exército em obras públicas, que também é muito comum. Nos últimos anos o Exército atuou, por exemplo, na duplicação da BR-101 e na transposição do Rio São Francisco.

A segunda hipótese é a ação que envolva segurança da instituição militar ou de missão militar, ainda que não beligerante. Se a sentinela atira contra indivíduo que tentava invadir a organização militar, ainda que com intenção de matar (animus necandi), estaremos agora diante de um crime militar.

A terceira hipótese é a ampliação (e muito) da exceção que já existia antes, e que dizia respeito ao tratamento dado a aeronave que entra no espaço aéreo nacional, previsto no Código Brasileiro de Aeronáutica, que pode chegar até ao tiro de destruição. A apuração de fatos relacionados à derrubada dessa aeronave já era de competência da Justiça Militar, mas perceba que agora não há mais menção ao art. 303, podendo a exceção alcançar outros dispositivos do Código Brasileiro de Aeronáutica, assim como a Lei Complementar n. 97/1999 (que estabelece normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas), o Decreto-Lei n. 1.002/1969 (Código de Processo Penal Militar) e a Lei n. 4.737/1965 (Código Eleitoral).

Cada uma dessas leis trata de atribuições e ações específicas das Forças Armadas, e o crime doloso contra a vida de civil cometido nesse contexto passa a ser de competência da Justiça Militar.

Toda essa lógica que acabamos de estudar se aplica apenas aos militares das Forças Armadas. Os militares dos estados (policiais militares e bombeiros militares) continuam sendo julgados pela Justiça Comum nos crimes dolosos praticados contra a vida de civil. O § 2o do art. 9o é bastante específico ao mencionar os militares das Forças Armadas, e, além disso, o § 4o do art. 125 da Constituição Federal também traz essa previsão em relação aos militares estaduais. (Paulo Guimarães, publicado no estrategiaconcursos.com.br, há cinco anos, intitulado “Código Penal Militar modificado pela Lei n. 13.491/2017”, acessado em 19/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Segundo as apreciações de Flávio Olímpio de Azevedo, Comentários ao art. 9º do Código Penal, publicado no site Direito.com: Esse artigo estabelece regras para homologação da sentença estrangeira, objeto de homologação no brasil para que não tenham aplicação, apenas no país onde foi prolatada e propicie ao condenado a fuga para outro país a fim de livrar-se da pena imposta pela conduta delituosa.

 

É requisito a homologação da sentença pelo Judiciário brasileiro para surtir o regular efeito e “Não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova do trânsito em julgado, conforme Súmula 420 do Superior Tribunal de Justiça”.

 

A competência do STJ para homologar sentença estrangeira que constitui ato de soberania de estado é preceituada número 105, L, “i”, da Constituição Federal com os requisitos emanados pelos artigos 787 a 790 do Código de Processo Penal.

 

Reparação de Danos: o inciso I estabelece a reparação de danos ocasionados pelo delito e determinado na sentença condenatória para reparar a vítima do dano sofrido.

 

A sentença estrangeira homologada transmuda para um título executivo para eficácia do dever de indenizar. Se não houver valores indenizatórios na sentença a discussão é na órbita do quantum debeatur representativo da reparação.

 

Medida de Segurança: Preceituado no inciso II. As medidas de segurança são aquelas que são fixadas na sentença pelo Estado prolator e considerado apenado considerado inimputável portador, desde que seja de acordo com legislação penal brasileira.

 

Essa medida de segurança somente poderá ser aplicada se o réu for4 inimputável ou semi-imputável. Não há previsão legal no Brasil para medidas restritivas para os imputáveis.

 

Provocação da parte interessada: Parágrafo único “a”: De acordo com a Resolução 09/2005 do STJ em seu artigo 3º em concordância com o artigo em comento: Art. 3º. A homologação de sentença estrangeira será requerida pela parte interessada, devendo a petição inicial conter as indicações constantes da lei processual, e ser instruída com a certidão ou cópia autêntica do texto integral da sentença estrangeira e com outros documentos indispensáveis, devidamente traduzidos e autenticados.

 

Existência de Tratado – Parágrafo único, “b”: Homologabilidade de sentença estrangeira depende que haja tratado de extradição com Estado prolator da sentença ou na falta de tratado requisição ao Ministro da Justiça.

 

Na falta de tratado conforme normatiza Portaria n. 217, de 27-2-2018 do Ministério da Justiça para prisões cautelares reza do princípio da reciprocidade: Art. 3º: O pedido de extradição e de prisão cautelar para fins de extradição passiva e ativa será efetuado com base em tratado internacional do qual o Brasil é signatário ou em reciprocidade manifestada por via diplomática.

 

Parágrafo único. Na ausência de tratado, o Ministério da Justiça provocará o Ministério das Relações Exteriores para obtenção, junto ao Estado requerente, da promessa de reciprocidade necessária à instrução do pedido.

 

Nota: Súmula 420 do STJ:  não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova do trânsito em julgado. (Flávio Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 9º do Código Penal, publicado no site Direito.com, acessado em 19/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Direito Civil Comentado - Art. 740, 741, 742 - Do Transporte De Pessoas - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 740, 741, 742
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Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

 (Art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte – Seção II

Do Transporte de Pessoas - (Art. 734 a 742)

 

 

Art. 740. O passageiro tem direito a rescindir o contrato de transporte antes de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem, desde que feita a comunicação ao transportador em tempo de ser renegociada.

 

§ 1º. Ao passageiro é facultado desistir do transporte, mesmo depois de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor correspondente ao trecho não utilizado, desde que provado que outra pessoa haja sido transportada em seu lugar.

 

§ 2º. Não terá direito o reembolso do valor da passagem o usuário que deixar de embarcar, salvo se provado que outra pessoa foi transportada em seu lugar, caso em que lhe será restituído o valor do bilhete não utilizado.

 

§ 3º. Nas hipóteses previstas neste artigo, o transportador terá direito de reter até cinco por cento da importância a ser restituída ao passageiro, a título de multa compensatória.

 

Na balada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo presente trata, a rigor, da desistência do passageiro, em situações diversas, mas de maneira mais abrangente do que dispõe o art. 49 do Código de Defesa do Consumidor, que apenas permite, no prazo de sete dias, arrependimento nos casos de contratação à distância e, conforme interpretação extensiva, de vendas emocionais.

 

Assim, reforçando-se o quanto já expendido nos comentários ao CC 732, ter-se-á, mesmo nas hipóteses em que o transporte envolva, o que não se dá sempre, de maneira necessária, uma relação de consumo, a aplicação do Código Civil, que, nesta parte, é mais afeiçoado ao comando constitucional de proteção do consumidor (CC 5º, XXXII), à ideia básica de equilíbrio e solidarismo nas relações entre as pessoas, também emanada da Constituição (art. 3º, I­).

 

Nesta senda, permite o Código Civil de 2002 que o passageiro rescinda – na verdade, tecnicamente um caso de resilição unilateral, porque de verdadeira desistência ou arrependimento (CC 473) – o contrato de transporte, por sua vontade, com consequências diversas conforme a existência de prévia comunicação e o tempo de sua manifestação. Em diversos termos, o artigo em comento cuida da desistência, com consequências diferentes, nas seguintes situações: a) antes de iniciada a viagem, com direito do passageiro à restituição do valor do trecho faltante, mas só se demonstrado que, efetivamente, outra pessoa foi transportada em seu lugar; b) quando já iniciada a viagem, com direito do passageiro à restituição do valor do trecho faltante, mas só se demonstrado que, efetivamente, outra pessoa foi transportada em seu lugar; c) mesmo antes de iniciada a viagem, mas sem comunicação prévia da desistência, com direito à restituição do valor da passagem apenas quando igualmente se comprovar que outra pessoa foi transportada no lugar do desistente.

 

Nesses casos em que o transportador deve devolver o valor do bilhete, fará jus, como está na lei, à multa de até 5% da importância da restituição. Trata-se de cláusula penal compensatória, pelo que, por um lado, não há antinomia real com o CDC 52, § 1º, que estabelece uma cláusula penal moratória. De outro tanto, não se compreende, se se estatui cláusula penal, por natureza convencional, haver uma estipulação legal, que independa de prévio ato de manifestação de vontade, tanto mais se a lei alude a uma multa de até 5%, portanto o que deverá ser previamente pactuado, aí sim, observado o teto da legislação.

 

Pelo seu silêncio a respeito, bem como pelo que se poderia inferir da interpretação a contrario sensu do artigo, nos casos de o passageiro, antes da viagem, desistir sem comunicar a tempo de haver substituição, ou de desistir durante o percurso sem provar sua substituição no trecho faltante, ser-lhe-ia imposta a total perda do valor do bilhete. Aliás, o Código Civil foi explícito em caso de desistência sem aviso prévio e sem prova de que houve substituição (§ 2º).

 

Bem de ver, todavia, que tal orientação não só conflita com o princípio traduzido pela previsão do CDC 53, que pretende vedar a perda total de valores pagos quando inadimplente o consumidor, como, antes, parece não se ajustar aos valores mencionados anteriormente, de equilíbrio e solidarismo nas relações jurídicas, dispostos na Constituição Federal, de que inclusive há exemplos múltiplos no CC/2002, até mesmo quando possibilita a redução, veja-se, de cláusulas penais que o juiz repute excessivas (CC 413). Trata-se de imperativo de equidade que, segundo se entende, determina uma interpretação sistemática, e à luz da Constituição, do artigo vertente, portanto muito além de seu sentido literal.

 

Por isso se poderá reputar abusiva a perda completa do valor pago, acrescentando-se que a abusividade não consubstancia fenômeno de exclusiva repressão na legislação consumerista, na exata medida em que, como se disse, afronta a ideia, diretamente dimanada da Constituição Federal (art. 3º, I), de equilíbrio nas relações jurídicas, posto se a pondere de forma adequada à eventual formação de vínculo entre iguais. De toda sorte, caberá ao juiz, nessas hipóteses, estimar a extensão da perda do valor da passagem, conforme o prejuízo que possa o passageiro ter causado, mas por qualquer de suas modalidades, por qualquer forma de manifestação. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 763-764 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Segundo a doutrina apontado por Ricardo Fiuza, a rescisão unilateral do contrato de transporte tem de ser tempestiva. O passageiro pode desistir da viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem. Mas terá de comunicar o transportador em tempo de ser renegociada a passagem.

 

Mesmo depois de iniciada a viagem, no meio do percurso, portanto, o passageiro pode desistir do transporte, tendo direito à restituição do valor da passagem correspondente ao trecho não utilizado, desde que fique provado que, em seu lugar, outra pessoa foi transportada no percurso faltante.

 

O usuário que deixou de embarcar, que não se apresentou na hora determinada para a partida, que, intempestivamente tenha desistido da viagem, não terá direito ao reembolso do valor da passagem, a não ser que prove que outra pessoa foi transportada em sua vaga, e, aí, ser-lhe-á devolvido o valor do bilhete que não utilizou.

 

Em qualquer dos casos previstos neste artigo, a título de multa compensatória, o transportador terá direito de reter até cinco por cento da importância a ser restituída ao passageiro. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 391 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo dá ao passageiro o direito excepcionalíssimo de rescindir o contrato de transporte antes de iniciada a viagem. Uma vez que o referido direito seja exercido a tempo de o transportador renegociar a passagem, faz jus o passageiro ao reembolso do preço pago, podendo lhe ser descontado o equivalente a 5% do preço a título de multa compensatória.

 

A desistência da viagem após se ter percorrido determinado trecho dá ao passageiro o direito de obter o reembolso do preço proporcional ao trecho por percorrer, desde que o passageiro prove que outra pessoa foi transportada em seu lugar. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 741. Interrompendo-se a viagem por qualquer motivo alheio à vontade do transportador, ainda que em consequência de evento imprevisível, fica ele obrigado a concluir o transporte contratado em outro veículo da mesma categoria, ou, com a anuência do passageiro, por modalidade diferente, à sua custa, correndo também por sua conta as despesas de estada e alimentação do usuário, durante a espera de novo transporte.

 

Sob o prisma de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a regra do artigo presente revela com clareza o risco que o legislador entendeu inerente à atividade de transporte; por isso, impôs-se ao transportador uma responsabilidade independente de culpa e a obrigação, nessa esteira, de concluir viagem iniciada e que se tenha interrompido mesmo que por evento fortuito u de força maior. Em outros termos, e porque lhe é afeta uma obrigação de resultado, caso o transporte se tenha iniciado, é dever do transportador conclui-lo, sempre, mesmo se houver interrupção por fato alheio, que não lhe seja atribuível.

 

Além disso, impende fazê-lo, à sua custa, nos mesmos moldes do transporte contratado, ou seja, por veículo da mesma categoria, como a lei determina, só se admitindo meio diverso se houver o passe do passageiro. Até que se implemente o novo transporte para conclusão da viagem, ocasionais despesas com hospedagem e alimentação correm também por conta do transportador. José Maria Trepat Cases (Código Civil comentado, coord. Álvaro Vilaça Azevedo. São Paulo, Atlas, 2003, v. VIII, p. 174-5), com base inclusive em aresto do STJ, lembra que, em virtude da regra em comento, a qual impõe a responsabilidade dos transportadores pela conclusão da viagem iniciada e interrompida, mesmo pelo casus, é dever de todos eles aceitar o passageiro de outro para dar cabo da exigência legal em comento, sob pena de compr perdas e danos. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 764 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Para Fiuza, em qualquer hipótese, ainda que por caso fortuito, se a viagem for interrompida, o transportador fica obrigado a concluir o transporte contratado em outro veículo da mesma categoria, ou, se o passageiro concordar por modalidade diferente, à sua custa. Durante a espera do novo transporte, correm por conta do transportador as despesas de estada e alimentação do usuário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 391 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Sob o prisma de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o transportador tem o dever de resultado de levar o passageiro e sua bagagem em segurança até o destino acertado. Ele não se desobriga nem mesmo diante da ocorrência de fortuito externo que interrompa a viagem. O CDC 84 (Lei n. 8.078/90) dá ao consumidor o direito de exigir o cumprimento específico da obrigação pelo fornecedor. Caso o transportador não proceda no sentido de reduzir os prejuízos sofridos pelos passageiros, ainda que em razão de fortuito externo, violará seu dever legal e ficará obrigado a indenizar os passageiros pelos danos morais e materiais que sua falta acarretar. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 742. O transportador, uma vez executado o transporte, tem direito de retenção sobre a bagagem de passageiro e outros objetos pessoais deste, para garantir-se do pagamento do valor da passagem que não tiver sido feito no início ou durante o percurso.

 

Na toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, bem de ver, antes de mais nada, que legislação especial, particularmente acerca do transporte de cargas, já conferia ao transportador o direito de reter coisas transportadas como garantia do pagamento do frete. Assim, o próprio Código Comercial, nos arts. 116 e 117, malgrado referindo a uma não mais existente hipoteca tácita, que foi substituída pela noção de direito de retenção (v.g., Martins, Fran. Contratos e obrigações comerciais, 7.ed. Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 261), dispunha que o transportador podia reter a mercadoria para vendê-la e, com o respectivo produto, ver seu crédito pago. Da mesma forma o vetusto Decreto n. 19.472/30, alterado pelo Decreto n. 19.754/31, previa igual direito ao transportador, de retenção das coisas transportadas.

 

Trata-se mesmo de uma medida inspirada na equidade, de sorte a equilibrar a relação contratual, permitindo ao transportador que retenha consigo coisa transportada ou bagagem e objetos de passageiros, até ser pago o valor ajustado pelo respectivo transporte. É o que o Código Civil explicita para o transporte de pessoas, à semelhança da retenção que faculta ao hoteleiro, para garantia do pagamento do valor da hospedagem, mas sem erigir um penhor legal, tal qual procede no CC 1.467, I.

 

A distinção é relevante porquanto, na retenção que se faz para tornar o penhor legal efetivo, há a necessidade de posterior ato judicial homologatório (homologação de penhor legal), o que não ocorre com o direito de retenção, exercitado extrajudicialmente, eis que não é necessária qualquer formalidade homologatória posterior (ver a respeito: Fonseca, Arnoldo Medeiros da. Direito de retenção, 2.ed. Rio de Janeiro, Forense, 1944, p. 287).

 

Porém, tanto quanto no penhor legal que tem o hospedeiro sobre a bagagem do hóspede, ou mesmo o do fornecedor de alimento sobre bens do freguês, a ideia do legislador foi garantir de forma especial o pagamento à consideração de que geralmente é desconhecido o usuário do serviço.

 

O transportador que retém a bagagem ou outros objetos pessoais que estiverem com o passageiro por ocasião do transporte passa a ter sobre a res o dever de custódia, empregando na guarda e conservação a diligência que o exigir a natureza da coisa, aqui, de novo, à semelhança do que se dá com o credor pignoratício (CC 1.435, I). Tem, em contrapartida, porquanto possuidor da coisa, o direito básico de defender essa posse, pela utilização dos interditos, e de ser ressarcido pelas despesas de conservação ou prejuízos decorrentes de ignorados vícios da res. A todo esse propósito, vale conferir ainda uma vez, Arnoldo Medeiros da Fonseca (op. cit., p. 267-76).

 

Veja-se, por fim, que o Código Civil concede ao transportador o direito de retenção apenas para garantia do valor da passagem e não de eventuais danos que o passageiro tenha provocado.  (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 765 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 21/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Na doutrina de Ricardo Fiuza, no caso de o viajante não ter pagado a passagem no início ou durante o percurso, terá de fazê-lo ao final, uma vez executado ou concluído o transporte. Não o fazendo, o transportador tem direito de retenção dobre a bagagem e outros objetos pessoais do passageiro, para garantir-se do pagamento do valor da passagem. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 392 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Concluindo com Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo estabelece o direito de retenção da bagagem do passageiro em favor do transportador para o pagamento da passagem. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 21.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 18 de outubro de 2022

Comentários ao Código Penal – Art. 8º Pena Cumprida no Estrangeiro – VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com –

 

Comentários ao Código Penal – Art. 8º
Pena Cumprida no Estrangeiro
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Parte Geral – Título I – Da Aplicação da Lei Penal

Pena Cumprida no Estrangeiro

Art. 8ª. A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas. (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/711984.).

 

Segundo apreciação de Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao art. 8º do CP, p. 23: O Princípio do bis in idem, pela regra contida no art. 8* do Código

Penal, evita-se que o agente seja punido duplamente pelo mesmo fato.

 

Conforme esclarece Guilherme de Souza Nucci, "caso a pena cumprida no exterior seja idêntica à que for aplicada no Brasil (exemplo: pena privativa de liberdade no exterior e pena privativa de liberdade no Brasil), será feita a compensação; caso a pena cumprida no exterior seja diversa da que for aplicada no Brasil (exemplo: multa no exterior e privativa de liberdade no Brasil), a pena a ser fixada pelo juiz brasileiro há de ser atenuada”. (NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado, p. 83.).

 

Não existe qualquer óbice legal para a eventual duplicidade de julgamento pelas autoridades judiciárias brasileira e paraguaia, tendo em vista a regra constante do art. 8º do Código Penal (STJ, HC 41892/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 53T., DJ 22/8/2005, p. 319). (Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao art. 8º do CP, p. 23. Ed.Impetus.com.br, acessado em 18/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Em artigo intitulado “Pena cumprida no estrangeiro: eficácia, prazos, frações da pena e o conflito aparente de normas”, de Isis Virgínia e Ivan Nunes Machado, publicado no site Jus.com.br em 13-04-2015, comentários ao art. 8º do CP, os autores, em interessante crítica, fazem uma explanação sobre a pena cumprida no estrangeiro, a extraterritorialidade condicionada e incondicionada, os tipos de penas idênticas e diversas, a eficácia de frações da pena e o conflito aparente de normas.

 

O art. 8° do CP trata de pena cumprida no estrangeiro, assim este artigo existe para evitar a dupla punição do agente, fala que o mesmo deve ser punido tanto fora quanto aqui pelo mesmo fato. No direito conhecemos este fato pelo termo “ne bis in idem” (que proíbe uma dupla punição). Estamos vendo nesse artigo a extraterritorialidade que está no art. 7° do CP, e esta estão divididas em duas formas distintas: condicionada e incondicionada.

 

Na pena condicionada quando a pena foi cumprida no estrangeiro o Brasil não terá mais interesse em punir o agente, já o art. 8º do CP vai trabalhar com a vertente incondicionada, pois nesta observa-se dois tipos de penas que são as idênticas e as diversas. Nas idênticas é quando é o mesmo crime, as penas foram aplicadas da mesma forma, haverá uma compensação que é quando será computada uma pena já cumprida lá fora nas penas que ainda faltam a ser cumpridas aqui no Brasil e quando a pena for diversa ela será atenuada na medida em que for possível.

 

O conflito aparente de normas, nada mais é que duas ou mais normas penais que apresentam ser aplicáveis ao mesmo caso de modo divergente, ainda que uma delas prevaleça sobre a outra. Assim sendo, o embate é somente fictício, por isto chama-se aparente e pode ser resolvido através dos critérios para tais problemas.

 

O princípio da especialidade que está consagrado na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). Neste princípio a norma especial prevalece em relação à norma geral. Já o princípio da subsidiariedade ocorre quando há um tipo penal maior e quando este não for aplicável ou não for possível a sua aplicação, aplica-se um tipo penal menor, subsidiário. Na subsidiariedade tácita, é aquela em que ocorrem apenas as análises do tipo penal e na expressa, é quando alguns tipos penais tornam expressa menção, a sua aplicação subsidiária.

 

Tem-se ainda o Princípio da Consunção ou Absorção, neste haverá absorção do crime meio pró-crime-fim, como exemplo praticar lesão corporal com intuito de praticar homicídio. E por último, finalizando, tem o Princípio da Alternatividade, que é aplicado quando a norma dispuser de várias formas de realização do delito de forma que caso o agente for praticar um ou mais atos do delito e desde que exista o nexo causal entre as condutas, configurará apenas a incidência de um crime.

 

A pena cumprida no estrangeiro em alguns casos concretos causa muita polêmica, como no caso que intrigou algumas pessoas no Brasil e no mundo do brasileiro Marco Archer que cumpriu sua pena por tráfico de drogas na Indonésia e mesmo com pedidos de clemência para que ele cumprisse sua pena aqui no Brasil, o presidente de lá negou e no início deste ano o brasileiro foi executado através de fuzilamento já que na Indonésia o tráfico de drogas tem como sanção a pena de morte.

 

O interessante é que o mesmo governo da Indonésia que pune os traficantes de drogas com pena de morte e nega os pedidos de clemência para os estrangeiros que lá foram presos, está pedindo clemência para uma mulher indonésia condenada à morte por homicídio na Arábia Saudita. Ainda há muito que se pesquisar. Os defensores dos Direitos Humanos estão caindo em campo para ver essas questões de pena de morte de estrangeiros, pois na Indonésia mesmo ainda há vários presos no corredor da morte por tráfico de drogas. (Isis Virgínia e Ivan Nunes Machado, em artigo intitulado “Pena cumprida no estrangeiro: eficácia, prazos, frações da pena e o conflito aparente de normas”, publicado no site Jus.com.br em 13-04-2015, comentários ao art. 8º do CP, acessado em 18/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No comentário de Flávio Olímpio de Azevedo, Comentários ao art. 8º do Código Penal, publicado no site Direito.com, esta é outra norma que consagra o princípio do “bis in idem”, ou seja, dupla punição pelo cometimento do mesmo crime”.

 

“Duas hipóteses são previstas: a diversidade qualitativa e da diversidade quantitativa das penas aplicadas. Se a divergência for de natureza qualitativa, a atenuação se faz imperiosa, ficando o quantum da pena a critério do magistrado. Se a divergência for meramente quantitativa o magistrado deverá deduzir, da pena a ser aplicada, aquela já cumprida. Ou idêntica ou inferior à pena que iria ser aplicada, nenhuma pena restará ser cumprida”. (Curso Completo de Direito Penal, Paulo José Costa, p. 22).

 

Nota: O Decreto número 5.919 de 3-10-2006: Promulga a Convenção Interamericana sobre o Cumprimento de Sentenças Penais no Exterior, concluída em Manágua, em 9-6-1993, com reserva à primeira parte do parágrafo 2º do art. VII, relativa à redução dos períodos de prisão ou de cumprimento alternativo da pena. (Flávio Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 7º do Código Penal, publicado no site Direito.com, acessado em 18/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Direito Civil Comentado - Art. 737, 738, 739 - DO TRANSPORTE DE PESSOAS - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 737, 738, 739 
- DO TRANSPORTE DE PESSOAS 
- VARGAS, Paulo S. R.
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Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

 (art. 481 a 853) Capítulo XIV – Do Transporte – Seção II

Do Transporte de Pessoas - (art. 734 a 742)

 

Art. 737. O transportador está sujeito aos horários e itinerários previstos, sob pena de responder por perdas e danos, salvo motivo de força maior.

 

No compasso de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a regra em comento nada mais significa senão a obrigação que tem o transportador de cumprir sua prestação, tal como convencionada. Ou seja, incumbe-lhe atender, no deslocamento que propicia ao passageiro, o exato horário previamente estabelecido e, também, o itinerário antecipadamente informado. Isso implica, ao revés, em que, havido atraso ou alteração de trajeto, responde o transportador pelos prejuízos decorrentes, ressalva a prova de que ocorrida força maior.

 

Veja-se, quanto ao atraso, e conforme já acentuado nos comentários ao CC 732, a qe ora se remete, que, já não fosse a força revogadora da superveniência do Código de Defesa do consumidor, lei posterior subjetivamente especial, a previsão dos arts. 230 e 231 do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n. 7.565/86) acerca do transporte nacional efetuado pelo meio aéreo, ao fixar limite mínimo para que o atraso de voo pudesse ensejar indenização, ostenta-se visivelmente incompatível com a disposição do CC 737, ora em comento.

 

É bom não olvidar que, no CC 732, o atual Código estabeleceu a primazia de seus preceitos em relação a dispositivos da lei especial que com ele se mostrassem, como no caso, incompatíveis. Na melhor das hipóteses, também como já se disse nos comentários do CC 732, o limite mínimo de quatro horas de atraso, determinado no Código de Aeronáutica, apenas pode ser admitido, em interpretação sistemática e harmonizadora como Código Civil de 2002, se compreendido como uma hipótese em que a indenização se paga de forma automática, só pelo fato do retardo, sem qualquer excludente, porém com possibilidade de tarifação ou limitação do quantum indenizatório. Mas sempre sem prejuízo de se poder provar dano maior, evidente que com o ônus a tanto atinente, assim correndo-se o risco de nada se conseguir provar.

 

O atraso pode provocar danos materiais e, muito frequentemente, pode provocar também danos morais. A essa verificação importará a aferição das circunstâncias do caso concreto, a extensão e condições do atraso e do passageiro durante sua permanência, valendo diferenciar, a propósito, o que seja mero e pequeno incômodo, contingência própria da vida de relações, do que signifique verdadeiro abalo psíquico, frustração grave de justa expectativa do contratante, real afronta a direito da personalidade.

 

Da mesma forma, a mudança do itinerário pode, conforme a hipótese fática, induzir dano ao passageiro, material e/ou moral, de possível cumulação, valendo não olvidar o padrão de transparência que a boa-fé objetiva impõe nas relações contratuais, particularmente caracterizadas pela adesão, como via de regra se dá nos transportes, assim sobressaindo a necessidade de detida informação sobre as condições do deslocamento, aí incluindo-se o itinerário a ser percorrido, até para possibilitar a mais livre escolha do passageiro diante das opções que existem para o deslocamento pretendido.

 

Ocorrência lamentavelmente comum que se tem dado, sobretudo no transporte aéreo, é o chamado overbooking, resultado da venda de bilhetes em número superior ao de assentos, como forma de prevenção contra desistências, que, se não sucedem, levam à necessidade de recolocação de alguns passageiros em voos não raro com horários e percursos diversos, por exemplo, com conexões que a contratação original não envolvia. Evidente que o caso é de indenização pelos prejuízos causados, não excluída ou afastada pela ocasional autorização administrativa dos órgãos reguladores.

 

A responsabilidade pelos danos decorrentes de atraso e mudança de itinerário, de acordo com a lei, somente se elide pela ocorrência de força maior. A respeito das excludentes no contrato de transporte, remete-se ao exame já detidamente efetuado nos comentários ao CC 734 e 735, apenas reiterando, quanto à força maior e caso fortuito, conforme já acentuado no comentário ao CC 734, que eles devem ser externos para afastar a responsabilidade objetiva do transportador, e que isso não ocorre quando se trata de defeitos mecânicos do veículo de transporte. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 760 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Enquanto para Fiuza o transportador tem de cumprir os itinerários e obedecer aos horários previstos no contrato ou regulamentos é salvo motivo de força maior, responder pelos danos que decorrerem de atrasos ou mudanças de percurso. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 390 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na esteira de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a jurisprudência divide-se quanto à necessidade prova de danos pelo consumidor quando há descumprimento de horário pelo transportador. Admite-se que o dano moral é damnun in re ipsa, pois sua configuração não depende de prova exaustiva; pode ser presumida a partir de certas condutas). Nesse sentido: REsp n. 659.760-MG, Rel. Min. Aldir Passarinho Jr., j. 4.04.2006.

 

O simples atraso no voo, de per si, já caracteriza a prestação de serviço como inadequada, posto que o contrato de transporte é de resultado, sendo irrelevante a demonstração dos danos suportados pelos passageiros em razão de seus próprios interesses, origina-se a responsabilidade civil da companhia aérea em indenizar o incômodo causado ao seu passageiro. A obrigação de indenizar das companhias aéreas é objetiva, pois se trata de companhia concessionária de serviço público de transporte aéreo (§ 6º, art. 37, CF), tanto no que tange aos danos patrimoniais, quanto aos danos morais (...). Apelação parcialmente provida. Decisão: Conhecer. Dar parcial provimento. Unânime” (Apelação Cível, n. 2000015000380 APC/DF, 3ª Turma Cível do TJDFT, Rel. Campos Amaral, j. 10.04.2000, p. DJU 17.05.00, p. 30). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 20.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 738. A pessoa transportada deve sujeitar-se às normas estabelecidas pelo transportador, constantes no bilhete ou afixadas à vista dos usuários, abstendo-se de quaisquer atos que causem incômodo ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o veículo, ou dificultem ou impeçam a execução normal do serviço.

 

Parágrafo único. Se o prejuízo sofrido pela pessoa transportada for atribuível à transgressão de normas e instruções regulamentares, o juiz reduzirá equitativamente a indenização, na medida em que a vítima houver concorrido para a ocorrência do dano.

 

Na esteira de Claudio Luiz Bueno de Godoy, por sua natureza bilateral, o contrato de transporte, uma vez aperfeiçoado, enseja obrigações a ambas as partes. Pois, das obrigações básicas do passageiro, a par do pagamento do preço do bilhete, cuida o artigo em comento. Conforme seus termos, o passageiro é obrigado, durante o transporte, a atender as instruções legais, administrativas e regulamentares que visam a garantir a segurança do deslocamento e a tranquilidade dos demais passageiros. Assim, deve-se abster o passageiro da prática de qualquer ato que, como genericamente está na lei, dificulte ou impeça o normal deslocamento, a regular prestação do serviço de transporte. Apenas que, quanto a específicas instruções para determinada forma de transporte, devem ser objeto de regular informação ao passageiro, corolário do dever de transparência que a boa-fé objetiva exige venha a permear as relações contratuais (CC 422). Repete-se, de maneira genérica é dever do transportado não agir de modo a perturbar os outros passageiros e a prejudicar o normal transcurso do transporte.

 

Aliás, a propósito, vale não olvidar previsão da lei especial de regulação do transporte aéreo, compatível com o novo Código Civil e por isso com plena aplicabilidade, dispondo sobre verdadeiro poder de polícia ao comandante da aeronave (arts. 165 e ss. da Lei. n. 7.565/86), podendo mesmo ordenar o desembarque de passageiro de qualquer forma inconveniente, porquanto infringente das obrigações mencionadas anteriormente. Aliás, a mesma prerrogativa é reconhecida por Sílvio de Salvo Venosa a qualquer preposto do transportador que seja responsável pelo deslocamento, sempre a bem da segurança do serviço, afinal um dos deveres de quem o presta (Direito civil, 3.ed. São Paulo, Atlas, 2003, v. III, p. 490).

 

Por fim, o parágrafo único do dispositivo em comento trata da indenização dos danos sofridos pelo passageiro e/ou pela bagagem durante o transporte, mas para cuja eclosão tenha este contribuído. Ou seja, cuida-se da culpa concorrente da vítima, que deve levar à proporcionalização da indenização. Tem-se causa de redução da indenização de responsabilidade objetiva do transportador. E aqui impende repetida menção à questão da concorrência normativa da legislação consumerista, que não faz qualquer remissão à culpa concorrente, mas apenas à culpa exclusiva da vítima como excludente da responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços (art. 14).

 

Porém, consoante já se vinha entendendo, mesmo sob a égide do Código de Defesa do Consumidor, a redução da indenização imposta pela concorrência da culpa da vítima constitui medida de prestígio à própria boa-fé objetiva, que inúmeros deveres anexos ou laterais impõe ao fornecedor. Ou seja, de ambos os contratantes, mesmo nas relações intrinsecamente desiguais, se exige padrão de comportamento solidário e leal que, a rigor, decorre mesmo de imperativo constitucional (CF 3º, I). Significa dizer que não seria leal, solidário, equitativo que a vítima se beneficiasse de uma indenização completa quando, mesmo objetiva a responsabilidade do outro contratante, tivesse contribuído, com sua conduta culposa, para a ocorrência dos danos que veio a sofrer. Por isso, a previsão de culpa concorrente no CC/2002, a rigor, não se mostra verdadeiramente incompatível com o Código de Defesa do Consumidor. Além disso, no parágrafo em comento, essa concorrência de culpa acaba ostentando plena coincidência com a regra geral a respeito editada no capítulo da responsabilidade civil (CC 945 e seu comentário).

 

Por fim, duas últimas ressalvas. Primeiro, a de que, hoje, seja conforme o parágrafo presente, seja de acordo com o CC 945, quando se alude à redução equitativa da indenização, concorrendo culpa da vítima, não se reparte necessariamente em porções iguais o valor da reparação, mas sim proporcionalizado de acordo com o grau de contribuição da vítima para o prejuízo experimentado. Segundo a de que, havida exclusiva culpa da vítima, causa única do dano ocorrido, não haverá indenização a ser paga pelo transportador, já que quebrado o correspondente nexo de causalidade daquele prejuízo com o serviço do transporte. E, malgrado ausente expressa a alusão do CC/2002 à culpa exclusiva enquanto causa excludente, ao contrário do que está no CDC 14, § 3º, II, sua incidência se deduz mesmo da previsão de que a concorrência de culpa da vítima reduz a indenização. Por isso, sua culpa exclusiva afasta, de todo, a indenização, a propósito, remete-se ao que já expendido nos comentários ao CC 734. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 761-762 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Segundo Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, uma das situações que importam a quebra do nexo causal é o fato da vítima, i.é, quando a própria vítima desatende ao dever de cuidado e auxilia de algum modo na ocorrência do dano.

 

Avisos e instruções do transportador reforçam o dever de cuidado dos passageiros e, segundo critério de razoabilidade, podem ser cobrados dos mesmos, com a finalidade de imputar-lhes parte da responsabilidade na causação de dano e até mesmo para isentar o transportador.

 

O artigo 742 confere ao transportador o direito de retenção sobre a bagagem do passageiro, para a garantia de eventuais créditos que tenha contra ele. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 20.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 739. O transportador não pode recusar passageiros, salvo os casos previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o justificarem.

 

Sob o prisma de Claudio Luiz Bueno de Godoy, em primeiro lugar, há serviços de transporte que, mesmo entregues à execução dos particulares por concessão, permissão ou autorização, são públicos e essenciais, assim de prestação continuada e que, portanto, não podem ser recusados. Veja-se, a propósito, o já expendido no comentário ao CC 731, bastando lembrar, como exemplo, o transporte coletivo municipal, tal como está no CF 30, V, que, ademais, deve ser combinado com o CDC 22.

 

Mas, de maneira geral, colocando-se o transportador em estado de oferta pública e permanente, obriga-se à contratação perante um público indistinto de usuários, desde que paguem o bilhete e se mantenham adequados às condições gerais que permitam a escorreita prestação do serviço, de forma segura e sem perturbar os demais passageiros, assim, antes de mais nada, conforme as circunstâncias já mencionadas no artigo anterior, e por isso, exemplificativamente, sendo recusável o embarque de passageiro menor desacompanhado ou não autorizado, na forma e quando o exija a Lei n. 8.069/90 (ECA).

 

Porém, mais ainda, salienta o artigo agora em comento que o transporte poderá ser igualmente recusado se o passageiro, além de não atender às instruções legais ou regulamentares, apresentar-se ao transporte em condições de saúde e higiene que potencialmente afetem ou prejudiquem os demais passageiros. Nesse pondo, de novo incide a concorrência normativa do Código de Defesa do Consumidor, que autoriza a recusa do fornecimento do serviço, no art. 49, II, em conformidade com os usos e costumes. É o que se entende também aplicável de maneira geral ao transporte, porquanto na senda de sua principiologia e posto não se trata, na hipótese fática, de relação de consumo. Pense-se no exemplo do passageiro que não se ostente convenientemente trajado, o que se deve aferir in rebus, conforme a época e o lugar do transporte.

 

Por fim, mas não em diferente sentido, mesmo causas inespecíficas no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor, desde que consonantes com a finalidade de preservar, de maneira geral, a regular prestação do serviço de transporte, devem ser admitidas como fonte de recusa do passageiro. Assim, qualquer hipótese de risco à segurança, não só à saúde alheia ou aos bons costumes. Pense-se, como exemplo, em pessoa que queira embarcar acompanhado de animal perigoso. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 762 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 20/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Na linha da doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, em princípio, não se admite a recusa de contratar por parte do transportador, a não ser nos casos previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o justificarem. Imagine-se o caso de o passageiro se apresentar exalando mau cheiro extremo, incomodando e perturbando os demais passageiros, ou com saúde tão debilitada que só devesse ser transportado em ambulância.

 

Embora este artigo não mencione expressamente, devem ser incluídas outras situações, como a do passageiro que se encontra em trajes menores, indecentemente, ou o que está completamente embriagado ou drogado, ou que porta, na cintura, ostensivamente, arma branca ou de fogo. Isto para não falar em viajante que forçou a entrada em ônibus interurbano, na rodovia Transamazônica, trazendo uma serpente enrolada no braço, alegando que a cobra venenosa era seu animal de estimação, e tinha de viajar em sua companhia. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 390 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o transporte de passageiros é, ordinariamente, atividade que conforma relação de consumo. O Código de Defesa do Consumidor veda a discriminação de consumidores e a recusa de atendimento às suas demandas, na medida da possibilidade do fornecedor (CDC 39, II).

 

O dispositivo em questão concretiza a regra geral relativamente ao contrato de transporte. Em regra, não pode o transportador recusar passageiros. Somente poderá fazê-lo diante de circunstâncias graves que ponham em risco o próprio transporte e os demais passageiros. A menção às condições de higiene e de saúde do interessado no dispositivo é meramente exemplificativa. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 20.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).