quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Direito Civil Comentado - Art. 760, 761, 762 - DO SEGURO - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 760, 761, 762
- DO SEGURO - VARGAS, Paulo S. R.
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Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

 (art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO – Seção I

Disposições Gerais - (art. 757 a 777)

 

 

Art. 760. A apólice ou o bilhete de seguro serão nominativos, à ordem ou ao portador, e mencionarão os riscos assumidos, o início e o fim de sua validade, o limite da garantia e o prêmio devido, e, quando for o caso, o nome do segurado e o do beneficiário.

 

Parágrafo único. No seguro de pessoas, a apólice ou o bilhete não podem ser ao portador.

 

Para o mestre Claudio Luiz Bueno de Godoy, a apólice ou o bilhete são, como se vem acentuando nos comentários aos artigos anteriores, os instrumentos escritos do contrato de seguro. Servem à demonstração de sua existência, ou à sua prova, embora outros documentos a tanto também se prestem (CC758). Devem conter, antes de mais nada, a exata identificação do risco coberto. Como já se salientou na análise do CC 757, o risco, no contrato de seguro, é o acontecimento de ocorrência incerta, ou de data incerta, e independente da vontade exclusiva das partes, que desencadeia, uma vez convertido em fato – o chamado sinistro -, a obrigação do segurador de cumprir sua prestação contratual. Daí dizer-se eu o risco, a rigor, é a previsão de sinistro contra o que se faz o seguro. Assim, a apólice ou bilhete têm de identificar, de forma precisa, qual o risco coberto, que deve se ligar a um fato lícito, não se permitindo cobertura de risco decorrente de atividades ilegais ou imorais.

 

Na apólice e no bilhete devem estar consignadas, também, as datas de início e de término de sua validade. Tal indicação, no caso de prévia proposta, deve ser consonante com o declarado por meio dela, ou, como determina o Decreto-lei n. 73/66, nessa parte com redação dada pelos Decretos-lei n. 168/67 e 296/67, o início da vigência da apólice tem de ser emitida em até quinze dias da aceitação. Trata=se de previsão que poderá servir de indicativo probatório para quando não houver apólice, mas aí sem exclusão de qualquer outra prova atinente a características do caso concreto, sempre levando em conta que o seguro se aperfeiçoa com o consenso e pode ser provado por qualquer outro documento escrito, além da apólice e do bilhete.

 

Desses instrumentos constarão, ainda, o limite da garantia e o prêmio devido, ou seja, o máximo do valor a pagar ao segurado, em caso de sinistro, além da quantia que lhe incumbe pagar para fazer jus a essa cobertura. De resto, o valor do prêmio se fixa também e justamente pelo teto da garantia estipulada. Nesse ponto, é importante não confundir o limite, que é a medida da garantia que presta o segurador, gerindo aqui assentada a perspectiva mutualista do ajuste – o fundo comum da massa de segurados, com o valor do ressarcimento a ser pago em caso de sinistro, que, ao menos para o seguro de dano, corresponderá, pelo princípio indenitário, ao prejuízo experimentado, sempre no limite máximo do importe garantido. O pagamento do prêmio se fará na forma e tempo ajustados pelas partes.

 

Ademais, o instrumento escrito do seguro deve atender às instruções da Susep, especialmente no que tange a suas condições gerais. No entanto, importa não olvidar que cláusulas restritivas devem estar em consonância com a exigência, da legislação consumerista, de redação clara e em destaque (arts. 46 e 54, § 3º), o que muito comumente não ocorre. Mesmo no Código Civil houve especial preocupação com os contratos de adesão (CC 424 e 425), como, em geral, são os de seguro.

 

Salvo no caso de seguro de pessoa, em que ela deve ser identificada, a apólice ou bilhete, além de nominativos, podem ser emitidos à ordem e ao portador. Serão nominativos pela indicação do segurador e do segurado e, quando estipulados em favor de terceiro, do beneficiário. Serão à ordem quando transferíveis por endosso, mas em preto, como o exige o CC 785. Quando emitidos ao portador, sua transferência se dá por mera tradição, não obstante, como ressalva José Maria Trepat Cases (Código Civil comentado, coord. Álvaro Vilaça Azevedo, São Paulo, Atlas, 2003, v. VIII, p. 222), o disposto na Lei n. 8.021/90, que veda o resgate de qualquer título sem identificação do beneficiário.

 

Por fim, é ainda costume diferenciar as apólices simples, que precisam o objeto do seguro, e as flutuantes, inerentes à substituição dos objetos segurados, assim chamadas por sua globalidade. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 783 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 30/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Para a doutrina de Ricardo Fiuza, Apólice ou bilhete são os instrumentos do contrato, consignando os riscos assumidos, o período de validade da cobertura e o seu respectivo limite, bem como o valor a ser pago pelo segurado, que se denomina “prêmio”, e, ainda, conforme espécie, nominando o segurado e o beneficiário do seguro. A exposição circunstanciada colima em definir a responsabilidade da seguradora e os interesses protegidos pelo contrato.

 

Dizem-se nominativas as apólices que identificam nominalmente a seguradora e o segurado, e, ainda, o terceiro beneficiário, quando existente; figurando aquele que contrata em favor deste último como estipulante. Desde que autorizado o contrato, são transferíveis por cessão do direito.

 

Apólices à ordem são as que operam a transmissibilidade pela forma do endosso. 


Consideram-se apólices ao portador, quando produzem os seus efeitos em favor de quem as detenhas, por transferência informal. Nesse particular, o parágrafo único da norma em exame veda tal espécie de apólice quando se refira a seguro de pessoa, o que repete a parte final do capta do art. 1.447 do CC/1916.  (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 400 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 30/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No lecionar de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, na apólice devem constar as seguintes cláusulas: riscos cobertos (não admite interpretação extensiva), prazo, limite da garantia, prêmio devido.

 

As apólices podem ser nominativas, à ordem ou ao portador (menos a de seguro de vida). Simples ou individuais; flutuantes (sobre coisas fungíveis) ou coletivas.

 

As cláusulas do seguro são gerais, especiais ou particulares. As condições gerais são cláusulas contratuais fixadas pela Susep relativas a cada modalidade de seguro (art. 36, c, Dec.-lei n. 73/66; art. 3º, Dec. n. 60.459/67). Condições especiais são cláusulas que estabelecem modalidades de cobertura para um mesmo plano. Condições particulares ou especificas são cláusulas peculiares a um determinado contrato. (Circular Susep n. 90/99, Anexo I, art. 1º). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 30.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 761. Quando o risco for assumido em cosseguro, a apólice indicará o segurador que administrará o contrato e representará os demais, para todos os seus efeitos.

 

No diapasão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o cosseguro regrado de forma expressa no Código Civil de 2002, o que não se verificava no anterior, é uma das formas de seguro múltiplo, em que se dá uma repartição da responsabilidade do segurador. É a pulverização do risco assumido por mais de uma empresa seguradora. Trata-se de operação econômico-contratual única, apesar de o Código atual permitir a emissão de uma única apólice, mas com uma seguradora líder que opera o seguro e representa as demais.

 

A responsabilidade de cada seguradora é por uma parte do total do seguro, ou seja, não respondem solidariamente pelo importe global, impondo-se que se estabeleça a cota que a cada uma afeta. É, de resto, o que já se continha no art. 668 do Código Comercial, prevendo que, no caso de diversos seguradores, cada um deveria declarar a quantia pela qual se obrigava, tão somente erigindo-se responsabilidade solidária quando faltasse aquela identificação, ressalva que se entende ainda cabível, consentânea com a responsabilidade da cadeia de fornecedores, no CDC, apesar do argumento de que esse dispositivo comercial se aplique apenas ao seguro marítimo (art. 777), e mesmo que a solidariedade não se presuma, devendo vir disposta na lei ou em manifestação de vontade (art. 265). Por isso muitos defendem, na regra geral, a inexistência de solidariedade no cosseguro (v.g., Raul Teixeira. Os reflexos do novo Código Civil nos contratos de seguro. Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 66), na ausência de fixação expressa das cotas de cada seguradora, só se podendo admitir o fracionamento em partes iguais (art. 257).

 

Da mesma forma, o cosseguro, sem solidariedade, veio também previsto no art. 4º do Decreto-lei n. 73/66, regulamentado pelas Resoluções CNPS n. 68/2001 e 71/2001, ao lado do resseguro. Este, porém, implica relação diversa, de que, a rigor, não participa o segurado. Isso porque, se no cosseguro várias seguradoras se obrigam perante o segurado, posto que representados por uma delas, no resseguro há uma relação securitária sucessiva entre o segurador originário e um segurador seu. Em diversos termos, para garantir-se contra riscos que repute exacerbados, o próprio segurador, de seu turno, contrata o resseguro, portanto, como se costuma dizer, um seguro do seguro. No entanto, impende acentuar que o segurado não mantém vínculo algum com a resseguradora. A operação de resseguro, no brasil, se faz necessariamente com o Instituto de Resseguros do Brasil, sociedade de economia mista criada pelo Decreto-lei n. 1.186/39, cuja privatização foi deliberada pela Lei n. 9.932/99, de constitucionalidade discutida na ADIn n. 2.223. Há, ainda, a figura da retrocessão, igualmente disposta no Decreto-lei n. 73/66, na verdade o resseguro do resseguro, por ser um resseguro que faz o ressegurador. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 783-784 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 30/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Segundo a Doutrina de Ricardo Fiuza, diz-se cosseguro a operação pela qual o mesmo risco de determinado segurado em um único contrato ser repartido entre duas ou mais empresas seguradoras, dele resultando a apólice que indicará, dentre elas, a seguradora líder que atuará na administração do contrato e representará as demais. Essa distribuição do risco, em parcelas de responsabilidade assumidas, representa hoje uma prática comum no mercado, diante de valores extremamente elevados de diversos seguros, como o do “World Trade Center”, que congregou um grupo de grandes empresas seguradoras. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 400 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 30/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No lecionar de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, cosseguro é o contrato em que o mesmo risco é assumido por mais de uma seguradora, que se obrigam conjuntamente. Uma delas deverá ser indicada como administradora do contrato e representante das demais para todos os efeitos do contrato. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 30.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 762. Nulo será o contrato para garantia de risco proveniente de ato doloso do segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro.

 

Nos ensinamentos de Claudio Luiz Bueno de Godoy, já no antigo Código Civil se dispunha, no art. 1.436, sobre a nulidade do contrato de seguro quanto o risco garantido decorresse de atividade ilícita do segurado, seu representante ou seu preposto. Daí o exemplo sempre citado de contrato de seguro nulo por garantir risco inerente a operações de contrabando. Era, pois, uma extensão da regra geral impositiva da licitude do objeto do negócio jurídico, apenas não se exigindo que, para o seguro, estivesse a ilicitude no objeto em si, mas na assunção de um risco proveniente do ilícito (cf. Clóvis Beviláqua. Código Civil comentado, 4.ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1939, v. V, p. 198). Mais que isso, vale lembrar, como já dito nos comentários nos CC 757 e 760, que, no contrato de seguro, o risco coberto deve residir sempre em um evento futuro e incerto, mas independe da vontade tão só de uma das partes, em verdadeiro repúdio, como é do sistema, à pura potestatividade, sempre foco de desequilíbrio e, assim, de ausência de solidarismo na relação contratual, particularmente naquela em que a lealdade é uma exigência especial.

 

Em outros termos, a ideia foi sempre a de refutar a existência de seguro de interesse potencialmente lesado pela atividade ilícita exclusiva, deliberada, de uma das partes, por exemplo, quando se contrata a garantia de incêndio, posto que dolosamente provocado pelo segurado. Aliás, não é diversa a preocupação subjacente à proibição, a qual está no artigo presente, de que, frise-se, mesmo contratado para garantia de risco não ligado a atividade ilícita, em si, do segurado, possa converter-se o sinistro por conduta deliberada dele emanada. Era já idêntico princípio a inspirar o conceito de agravamento, que estava no art. 1.454 e hoje se repete no CC 768.

 

Toda essa sistemática, porém, gerava, no Código de 1916, duas perplexidades. Uma, a de que, se se referia, no art. 1.436, ao risco filiado a atos ilícitos do segurado, em tese se poderia considerar aí abrangida a mera conduta culposa do segurado, diferentemente de tudo quanto se vem de asseverar acerca do intuito da lei. imagine-se, por absurdo, a nulidade de cobertura securitária para danos provocados em acidente de automóvel, quando este tenha ocorrido por culpa do segurado. Resolve-se a questão na redação do atual Código, que apenas veda seguro para garantia de risco proveniente de ato doloso do segurado. Ou seja, é o ato ilícito intencionalmente praticado pelo segurado ou pelo beneficiário do seguro. De resto, exige-se a mesma intencionalidade para o agravamento de risco (CC 768). Em segundo lugar, o Código anterior aludia ao ilícito, característico do risco coberto, praticado não só pelo segurado, pelo beneficiário ou por seu representante, mas também pelo preposto. A esse respeito, basta pensar, de novo, no acidente de automóvel provocado pelo preposto de empresa segurada, mesmo que por conduta dolosa. Seria nulo o seguro que o cobrisse. Assim, na atual dicção da lei, deliberadamente suprimiu-se a referência a ato doloso do preposto, que, portanto, se previsto como risco coberto, não invalida a contratação securitária.

 

Por fim, sempre levando em conta não só a noção de repressão ao ilícito em si, como, ainda, a de preservação do equilíbrio e da lealdade na entabulação, já acentuava Fran Martins (Contratos e obrigações comerciais, 7.ed. Rio de Janeiro, forense, 1984, p. 414), antes mesmo do atual Código, que a vedação em pauta deve ser aplicada aos casos em que o segurado, mediante conduta intencional, dolosamente converte em ato o evento coberto, mas para seu proveito ou, sempre por sua vontade, para proveito de terceiro, assim não se impedindo o seguro para cobertura de valores que o segurado deva pagar a vítima ocasional, posto que em razão de ilícito intencional contra ela praticado, desde que se trate de risco coberto e, repita-se, não haja conluio com o beneficiário do pagamento para lesão à seguradora. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 784-785 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 30/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Para a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, o que aqui se trata diz respeito à juridicidade do objeto, i.é, do risco a que se refira o contrato, pois não se poderá cogitar que tal risco advenha de operações ilícitas, como as de contrabando, como exemplifica, oportunamente, Maria Helena Diniz, ao tratar da liceidade do requisito objetivo do seguro.

 

O CC de 1916 determina expressamente, em seu Art. 1.436, que nulo será o contrato de seguro quando o risco, de que se ocupa, resulte de atos ilícitos do segurado, do beneficiado pelo seguro, ou dos representantes e prepostos, quer de um, quer de outro. Entretanto, a jurisprudência a ele fez inúmeras restrições ao admitir a responsabilidade da seguradora ao pagamento da indenização no caso de mera culpa do segurado, o que difere do dolo, em que há a vontade consciente de se obter o resultado nefasto. Lembre-se a ponderação de Silvio Rodrigues, quando afirma: “Isso ocorre sistematicamente a respeito de seguro de acidente de automóveis, onde não se exclui da abrangência do negócio aquelas indenizações resultantes de culpa leve do segurado, como ocorre em outros casos de responsabilidade civil”. Agora, a matéria coloca-se pacificada, tornando certo que somente o ato doloso, uma vez reconhecido, será causa de nulidade do contrato. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 400 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 30/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na linha de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a boa-fé objetiva impõe a colaboração recíproca das partes para que uma não cause prejuízos à outra. Impede o comportamento contraditório, que uma das partes se beneficie com a própria torpeza, como ocorreria se o segurado fizesse jus à indenização relativa a evento por ele provocado dolosamente.

 

Nesse contexto, o Código Civil estabelece a nulidade de uma cláusula que viesse a permitir a cobrança de indenização por sinistro causado dolosamente pelo próprio segurado ou por seu representante. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 30.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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Comentários ao Código Penal – Art. 16

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Parte Geral –Título II - Do Crime

 

 

Arrependimento posterior - (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Art. 16. Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntario do agente, a pena será reduzida de um a dois terços.

 

Em Natureza Jurídica, cuida-se de causa geral de diminuição de pena, diz Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao Crime Consumado, tentativa e pena – Art. 16 do CP, p. 52-53.

 

Política criminal - No item 15 da Exposição de Motivos da Parte Geral do Código Penal, o legislador justificou a criação do instituto do arrependimento posterior dizendo: Essa inovação constitui providência de Política Criminal e é instituída menos em favor do agente do crime do que da vítima. Objetiva-se, com ela, instituir um estímulo à reparação do dano, nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa.

 

A aplicação da causa geral de redução de pena do art. 16 do CP pressupõe que o delito não tenha sido cometido com violência ou grave ameaça. Embora tenha o réu devolvido à vítima parte da quantia subtraída, inviável o reconhecimento do arrependimento posterior, pois o delito de roubo foi cometido com grave ameaça mediante o emprego de arma de fogo {STJ, HC 115056/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, 5a T., DJe 1/2/2010).

 

Momentos para a reparação do dano ou a restituição da coisa - O instituto do arrependimento posterior só é cabível se ocorrer nas seguintes fases: a) quando a reparação do dano ou a restituição da coisa é feita ainda na fase extrajudicial, i.é, enquanto estiverem em curso as investigações policiais; ou b) mesmo depois de encerrado o inquérito policial, com sua consequente remessa à Justiça, pode o agente, ainda, valer-se do arrependimento posterior, desde que restitua a coisa ou repare o dano por ele causado à vítima até o recebimento da denúncia ou da queixa.

 

Ato voluntário do agente - Não há necessidade, portanto, de que o próprio agente tenha tido a ideia de restituir a coisa ou de reparar o dano para se beneficiar com a redução de pena. Pode acontecer que tenha sido convencido por terceira pessoa a restituir a coisa ou a reparar o dano, sendo seu arrependimento considerado para efeitos de redução.

 

Reparação ou restituição total, e não parcial - Há duas situações distintas que merecem ser objeto de análise. Na primeira delas, que diz respeito à restituição da coisa, esta deve ser total para que se possa aplicar a redução, não se cogitando, aqui, do conformismo ou da satisfação da vítima quanto à recuperação parcial dos bens que lhe foram subtraídos.

 

Na segunda, ou seja, não havendo mais a possibilidade de restituição da coisa, como quando o agente a destruiu ou dela se desfez, para que se possa falar em arrependimento posterior ê preciso que exista a reparação do dano.

 

Extensão da redução aos coautores - No caso de dois agentes que, por exemplo, praticam um delito de furto, pode acontecer que somente um deles (o que detinha em seu poder os bens subtraídos) voluntariamente restitua a res furtiva à vítima. Nessa hipótese, se a restituição tiver sido total, entendemos que ambos os agentes deverão ser beneficiados com a redução, mesmo que um deles não os tenha entregado voluntariamente à vítima. Se a restituição for parcial, corno dissemos, a nenhum deles será aplicada a causa geral de redução, uma vez que, nesse caso, deve operar-se a restituição total da coisa.

 

Se não houver possibilidade de restituição da coisa, para que possa ser aplicada a redução relativa ao arrependimento posterior é preciso que ocorra a reparação do dano. Aqui, seguindo a mesma linha de raciocínio, se um dos agentes a levar a efeito, a redução poderá ser estendida também ao coautor.

 

Apesar de a lei se referir a ato voluntário do agente, a reparação do dano, prevista no art. 16 do Código Penal, é circunstância objetiva, devendo comunicar-se aos demais réus (STJ, REsp. 2642S3/SP, Rel. Min. Felix Fischer, 5a T„ DJ 19/3/2001, p. 132).

 

Diferença entre arrependimento posterior e arrependimento eficaz - A diferença básica entre arrependimento posterior e arrependimento eficaz reside no fato de que naquele o resultado já foi produzido e, neste último, o agente impede sua produção.

 

Deve ser frisado, ainda, que não se admite a aplicação da redução de pena relativa ao arrependimento posterior aos crimes cometidos com violência ou grave ameaça, não havendo essa restrição para o arrependimento eficaz.

 

No primeiro, há uma redução obrigatória de pena; no segundo, o agente só responde pelos atos já praticados, ficando afastada, portanto, a punição pela tentativa da infração penal cuja execução havia sido iniciada.

 

Súmula nº 554 do STF - Diz a Súmula n2 554 do STF: O pagamento de cheque emitido sem suficiente provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal. Numa interpretação a contrario sensu da referida súmula, chegamos à conclusão de que não será possível o início da ação penal se o agente efetuar o pagamento relativo ao cheque por ele emitido sem suficiente provisão de fundos, até o recebimento da denúncia.

 

Saliente-se, contudo, que a referida súmula já havia sido publicada anteriormente à vigência da nova Parte Geral do Código Penal, que inovou nosso ordenamento jurídico com a criação do instituto do arrependimento posterior como causa obrigatória de redução da pena, quando houver reparação do dano ou restituição da coisa, nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça, até o recebimento da denúncia ou da queixa. A indagação que surge agora é a seguinte: Terá aplicação a Súmula n“ 554 do STF, mesmo diante do instituto do arrependimento posterior? A maior parte de nossos doutrinadores entende de forma positiva, opinando pela aplicação da súmula nos casos específicos de cheques emitidos sem suficiente provisão de fundos, ficando as demais situações regidas pelo art. 16 do Código Penal quando a ele se amoldarem.

 

Reparação do dano após o recebimento da denúncia - Se a reparação do dano ou a restituição da coisa é feita por ato voluntário do agente, até o recebimento da denúncia ou da queixa, nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça, aplica-se a causa geral de redução de pena do art. 16 do Código Penal; se a reparação do dano ou restituição da coisa é feita antes do julgamento, mas depois do recebimento da denúncia ou da queixa, embora não se possa falar na aplicação da causa de redução de pena prevista no art. 16 do Código Penal, ao agente será aplicada a circunstância atenuante elencada no alínea b do inciso III do art. 65 do diploma repressivo.

 

Arrependimento posterior e crime culposo - Embora a lei penal proíba o reconhecimento do arrependimento posterior nos crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, isso não impede a aplicação da mencionada causa geral de redução de pena quando estivermos diante de delitos de natureza culposa, a exemplo do que ocorre com as lesões corporais. (Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao Crime Consumado, tentativa e pena – Art. 16 do CP, p. 52-53. Editora Impetus.com.br, acessado em 27/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No ritmo de Victor Augusto em artigo intitulado “Arrependimento posterior”, postado no site Comentários do Index Jurídico, em 17 de janeiro de 2019: Diferente do artigo anterior, no arrependimento posterior ocorre a consumação do tipo penal. O agente, entretanto, voluntariamente repara o dano ou restitui a coisa até o recebimento da denúncia ou da queixa, o que lhe garante a diminuição de parte da sua pena.

 

Essa diminuição faz parte de uma decisão de política criminal que busca amenizar os efeitos do crime através da reparação do dano ocasionado ou restituição dos bens da vítima.

 

O instituto configura uma causa de diminuição de pena (3ª fase da dosimetria) e determina uma redução de um a dois terços da pena.

 

Como prevê a lei, a benesse depende de alguns requisitos cumulativos: 1) Crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa: a violência física ou moral (grave ameaça) não pode ter sido dirigida a uma pessoa. Se tiver sido empregada contra coisa, o benefício ainda pode ser reconhecido (como no crime de dano). 2) voluntária reparação do dano ou restituição da coisa: o agente deve retornar a vítima ao status quo ante (estado anterior), provendo uma reparação integral do dano gerado. Isso deve ocorrer voluntariamente, não se exigindo espontaneidade. Se a restituição da coisa ocorrer, por exemplo, por ação da polícia, o benefício não será admitido (JESUS, 2014). 3) Antes do recebimento da denúncia: essa postura do agente deve ocorrer antes do recebimento da denúncia ou da queixa. (JESUS, Damásio de. Direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2014). (Victor Augusto em artigo intitulado “Arrependimento posterior”, postado no site Comentários do Index Jurídico, em 17 de janeiro de 2019, acessado em 27/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Segundo as apreciações de Flávio Olímpio de Azevedo, Comentários ao art. 16 do Código Penal, publicado no site Direito.com, são requisitos assinalados no artigo em comento para diminuição da pena que não houve violência contra a vítima e coisa restituída seja por inteiro antes da denúncia, após não se cogita em arrependimento, mas é considerada circunstância atenuante na forma do artigo 65, III, b, do Código Penal, minorando ação delituosa.

 

A jurisprudência exemplifica um caso concreto da aplicação da restituição: tem aplicabilidade à letra do art. 16 do Código Penal, impondo a redução da pena restritiva de liberdade, quando o acusado, responsável pela empresa, poucos dias antes da decretação de sua falência, regularia o recolhimento de contribuições previdenciárias descontadas dos salários e não recebidas. O pagamento em causa, ainda que parcial, pois promovido sem a incidência da multa e dos juros moratórios, incluindo-se no montante recolhido apenas o principal acrescido de correção monetária, antes do recebimento da denúncia, não extinguindo a punibilidade (art. 34, da Lei 9249/95), pelo menos ameniza “em homenagem à conduta do acusado o rigor penal”, como ensina Delmanto. O Superior Tribunal de Justiça. STJ – REsp 450229RS2002/0087780-6.

 

Súmula 554 do STF – O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal. (Flávio Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 16 do Código Penal, publicado no site Direito.com, acessado em 27/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 26 de outubro de 2022

Comentários ao Código Penal – Art. 15 Desistência Voluntária e Arrependimento vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com – digitadorvargas@outlook.com – Whatsapp: +55 22 98829-9130 – VARGAS, Paulo S. R.

 

 Comentários ao Código Penal – Art. 15

Desistência Voluntária e Arrependimento

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– VARGAS, Paulo S. R.

Parte Geral –Título II - Do Crime

 

 

Desistência Voluntária e Arrependimento - (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Art. 15. O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados. (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Quanto à responsabilidade do agente pelos atos já praticados, Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários Art. 15 do CP, p. 49-51, estendendo sua apreciação desde a Desistência voluntária, onde diz o seguinte:

 

Na primeira parte do art. 15 do Código Penal, encontramos a chamada desistência voluntária. A primeira ilação que se extrai desse artigo é que, para que se possa falar em desistência voluntária, é preciso que o agente já tenha ingressado na fase dos atos de execução. Caso ainda se encontre praticando atos preparatórios, sua conduta será considerada um indiferente penal.

 

Se o crime não se consuma por circunstância alheia à vontade do agente, o fato é tentado; não há desistência voluntária. Há tentativa de roubo e não desistência voluntária se, depois de descoberta a inexistência de fundos no caixa da casa comercial alvo da pilhagem, o larápio nada leva desta ou de seus consumidores. Precedentes desta Corte. Em hipóteses como a tal, o agente não leva ao fim o feito que havia planejado por circunstância que lhe corria inteiramente à revelia, sua vontade não concorre para evitar a subtração como planejada; não pode, por isso, ser premiado pela interrupção criminosa para a qual não contribuiu (STJ, REsp. U093S3/RN, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª T., DJe 3/5/2010).

 

Dado início a execução do crime de estupro, consistente no emprego de grave ameaça à vítima e na ação, via contato físico, só não se realizando a consumação em virtude de momentânea falha fisiológica, alheia à vontade do agente, tudo isso, caracteriza a tentativa e afasta, simultaneamente, a denominada desistência voluntária (STJ, REsp. 792625/DF, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., D./27/11/2006, p. 316).

 

Não há falar em desistência voluntária nem em arrependimento eficaz, mas, sim, em tentativa imperfeita, na hipótese em que o agente, embora tenha iniciado a execução do ilícito, alvejando a vítima com disparo, não exaure toda sua potencialidade lesiva ante a falha da arma de fogo empregada, fugindo do local do crime, em seguida (STJ, H C 16348/SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6ª T., DJ 24/9/2001, p. 350).

 

Política criminal - A lei penal, por motivos de política criminal, prefere punir menos severamente o agente que, valendo-se desse benefício legal, deixa de persistir na execução do crime, impedindo sua consumação, do que puni-lo com mais severidade, por já ter ingressado na sua fase executiva. É preferível tentar impedir o resultado mais grave a simplesmente radicalizar na aplicação da pena.

 

Responsabilidade do agente somente pelos atos já praticados - A finalidade desse instituto é fazer com que o agente jamais responda pela tentativa. Isso quer dizer que, se houver desistência voluntária, o agente não responderá pela tentativa em virtude de ter interrompido, voluntariamente, os atos de execução que o levariam a alcançar a consumação da infração penal por ele pretendida inicialmente. Ao agente é dado o benefício legal de, se houver desistência voluntária, somente responder pelos atos já praticados, isto é, será punido por ter cometido aquelas infrações penais que antes eram consideradas delito-meio, para a consumação do delito-fim.

 

Impossível o reconhecimento da desistência voluntária e do arrependimento eficaz se os réus não impediram a consumação do delito, mas, ao contrário, percorreram todas as etapas do iter criminis, tendo, inclusive, ocorrido lesão patrimonial à vítima, a quem não foram restituídos integralmente os pertences (TJMG, AC 2.0000.00.498287-4/000, Rel. Des. Vieira de Brito, DJ 18/2/2006).

 

Arrependimento eficaz fala-se quando o agente, depois de esgotar todos os meios de que dispunha para chegar à consumação da infração penal, arrepende-se e atua em sentido contrário, evitando a produção do resultado inicialmente por ele pretendido.

 

O arrependimento eficaz, ‘ponte de ouro’, na afirmação de von Liszt, situa-se entre a execução e a consumação. Esgotados os meios executórios idôneos, antes de alcançada a consumação, o agente pratica contra-ação para impedir a chegada da meta optada. Há, pois, evidente mudança de orientação subjetiva; o agente abandona o animus inicial de querer o resultado, ou assumir o risco de produzido. Consequentemente, decorre de deliberação de iniciativa do próprio agente. Basta a voluntariedade, ainda que não seja orientada por motivo nobre. A finalidade da lei é preservar o bem jurídico, conferindo ao agente o benefício de responder só pelos atos já praticados (STJ, REsp. 64384/PR, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro. 6ª T.. RSTJ 85, p. 392).

 

Natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz - Para Hungria, (HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal, v. I, t. II, p. 93), essas são causas de extinção da punibilidade não previstas no art. 107 do Código Penal. Defendendo posição contrária à de Hungria, Frederico Marques, citado por Damásio, (JESUS, Damásio E. de. Direito penal - Parte geral, p. 296), concluiu que o caso não é de extinção de punibilidade, mas, sim, de atipicidade do fato, posição à qual nos filiamos.

 

Diferença entre desistência voluntária e arrependimento eficaz – Conforme se verifica pela própria redação do art. 15, quando o agente se encontra, ainda, praticando atos de execução, fala-se em desistência se, voluntariamente, a interrompe; já no arrependimento eficaz, o agente esgota tudo aquilo que estava à sua disposição para alcançar o resultado, i é, pratica todos os atos de execução que entende como suficientes e necessários à consumação da infração penal, mas arrepende-se e impede a produção do resultado.

 

Não impedimento da produção do resultado - Embora o agente tenha desistido voluntariamente de prosseguir na execução ou, mesmo depois de tê-la esgotado, atue no sentido de evitar a produção do resultado, se este vier a ocorrer, o agente não será beneficiado com os institutos da desistência voluntária e do arrependimento eficaz. (Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao Crime Consumado, tentativa e pena – Art. 15 do CP, p. 49-51. Editora Impetus.com.br, acessado em 26/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Computando-se as apreciações de Rodolfo Coppe, em artigo há 4 meses, intitulado “Anotações sobre a desistência voluntária e o arrependimento eficaz”, postado no site Jusbrasil.com.br, comentários ao art. 15 do CP reflete que o Código Penal, especialmente em sua parte geral, contempla diversos elementos normativos que tendem a “beneficiar” o sujeito ativo da conduta delituosa quando há conduta que vise a obstar a produção do resultado criminoso então almejado.

 

Dentre os elementos, se destacam os institutos em análise, que estão previstos no artigo 15 do Código Penal, que diz que o “agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados”.

 

Como se pode notar, o requisito indispensável é a voluntariedade do agente tanto na desistência em relação ao prosseguimento na ação ou em relação ao impedimento da consumação do resultado, não sendo considerada, para fins do artigo 15 do Código Penal, a conduta oriunda de coação física ou moral.

 

Em relação à desistência voluntária tem-se que o agente, conforme o nome indica, desiste, por livre vontade, de prosseguir na execução do crime, ainda que tenha, ao seu dispor, os meios necessários para a continuidade delitiva.

 

Supondo-se que A pretende tirar a vida de B. A em contato visual de B saca de sua arma de fogo e atinge a perna de B que cai ao chão. A então chega próximo de B com manifesto intento homicida, mas, quando iria disparar tiro de misericórdia, desiste de sua conduta. Pergunta-se, A responderia, no caso, por tentativa de homicídio? A resposta é não. A, no caso, responde pelo crime de lesão corporal, “sendo o ato já praticado”, nos termos da última parte do artigo 15.

 

Ainda se formos avaliar pela disposição do artigo 14, não teríamos a incidência de seu inciso I ou de seu inciso II, tendo em vista a não reunião de todos os elementos da definição legal do crime, assim como pelo fato de que a não consumação se deu pela própria conduta do agente, não “por circunstâncias alheias” à sua vontade.

 

Mas muita atenção, se o agente é impedido quando do início da execução, havendo, com efeito, o aparecimento de circunstância alheia à vontade do agente que o impediu de praticar o crime, tal como o aparecimento da polícia quando da execução do ato criminoso, ter-se-á pela tentativa.

 

No caso do exemplo supra A detinha todos os meios necessários à consumação do crime, que não se consumou por ato voluntário seu. Não se tratando, de ato voluntário, ter-se-ia pela tentativa.

 

arrependimento eficaz, por outro lado, se dá quando o agente, “após ter esgotado todos os meios que dispunha – necessários e suficientes -, arrepende-se e evita que o resultado aconteça (BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal comentado – p. 10. Havendo êxito no arrependimento, o agente não responde pelo crime consumado, respondendo, tão somente, pelos fatos já praticados caso se constituam em crimes.

 

Assim, seguindo o exemplo anterior, se A, com intento de tirar a vida de B lhe desfere um tiro, se arrepende do que fez, presta todos os socorros e evita a morte de B, sendo, portanto, eficaz seu arrependimento, responde A apenas pelo crime de lesão corporal consumada.

 

Agora, se mesmo se utilizando de todos os meios necessários a se evitar o resultado, este ainda se consuma, ter-se-á pela prática do crime consumado, respondendo A pelo crime de homicídio.


Ou seja, enquanto a desistência voluntária o sujeito detém todos os meios, mas desiste do crime, no arrependimento eficaz, todos os meios para a consumação do crime foram esgotados, mas o sujeito se arrepende e procura evitar o resultado. Em ambos os casos, os fatos anteriores são puníveis se constituírem, por si só crimes, e, também, não há que se olvidar do indispensável requisito da voluntariedade, sob pena de não incidência da norma ao caso concreto. (Rodolfo Coppe, em artigo há 4 meses, intitulado “Anotações sobre a desistência voluntária e o arrependimento eficaz”, postado no site Jusbrasil.com.br, comentários ao art. 15 do CP, acessado em 26/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo as apreciações de Flávio Olímpio de Azevedo, Comentários ao art. 15 do Código Penal, publicado no site Direito.com

“Preceitua Celso Delmanto et al, na forma como consigna o CP, art. 14, II, há tentativa quando o crime não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. Por consequência se ele próprio voluntariamente, desiste da conduta que poderia completar, ou se arrepender eficazmente e atua, impedindo que o resultado se produza, há exclusão da punibilidade, respondendo o agente, tão-só, pelos atos que praticara antes”, p. 27.

A menes lege foi no sentido de premiar o arrependimento com menor punição o agente que deixa de persistir na execução do crime não o consumando por vontade própria pelo arrependimento. Exemplificando: O agente resolve matar a vítima com uma faca. No momento da execução desfere um golpe com pequeno ferimento. Mas, apesar do domínio total da vítima, desiste da execução.

Para a jurisprudência, há desistência voluntária, se, depois de ter obrigado a vítima a desnudar-se sob ameaça, desiste do estupro (TJSP, RT.783/630).

Essa interrupção do iter criminis deve ser voluntária, sem interferência de terceiro ou não tenha sido coagido, moral ou materialmente a não consumar o delito. (Flávio Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 15 do Código Penal, publicado no site Direito.com, acessado em 26/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 25 de outubro de 2022

Comentários ao Código Penal – Art. 14 Crime Consumado – VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com – digitadorvargas@outlook.com – Whatsapp: +55 22 98829-9130

 

Comentários ao Código Penal – Art. 14

Crime Consumado – VARGAS, Paulo S. R.
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Parte Geral –Título II - Do Crime

 

 

Crime Consumado - (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Art. 14. Diz-se do crime:

 

- Consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal; (incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Tentativa

 

II – Tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.  (Incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Pena de tentativa (incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Parágrafo único. Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços (incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984).

 

Segundo as apreciações de Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao Crime Consumado, tentativa e pena – Art. 14 do CP, p. 45-49, são estas as fases que compõem o Iter Criminis: a) cogitação (cogitado) -, b) preparação (atos preparatórios); c) execução (atos de execução); d) consumação (summatum opus), e) exaurimento.

 

(Para Cezar Roberto Bitencourt, o iter criminis possui tão somente quatro fases, encerrando-se com a consumação do delito (BITENCOURT, Cezar Roberto; MUNOZ CONDE, Francisco. Teoria geral do delito, p. 464).

 

Consumação - Segundo o inciso I do art. 14 do Código Penal, se diz consumado o crime quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal. Conforme sua classificação doutrinária, cada crime tem sua particularidade. Assim, nem todos os delitos possuem o mesmo instante consumatívo. A consumação, portanto, varia de acordo com a infração penal selecionada pelo agente.

 

Não punibilidade da cogitação e dos atos preparatórios – O inciso II do art. 14 do Código Penal assevera que o crime é tentado quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

 

A lei penal, com a redação dada ao aludido inciso, limitou a punição dos atos praticados pelo agente a partir de sua execução, deixando de lado a cogitação e os atos preparatórios.

 

Não se pode imputar ao réu que adultera chassi de automóvel para posterior venda, a prática de tentativa de estelionato, porque a execução do crime do art. 171, caput, do Código Penal, inicia-se com o engano da vítima, sendo as condutas anteriores atos meramente preparatórios, que somente serão puníveis quando, de per si, consubstanciem a prática de crime autônomo (STJ, REsp. 818741/BA Relª. Minª. Laurita Vaz, 5ªT., DJ 23/4/2007, p. 302).

 

É atípico e penalmente irrelevante o plano com escopo de caluniar alguém, abortado ainda em fase de execução (STJ, Inq. 256/MS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, CE, DJ 12/11/2001 p. 126).

 

Diferença entre atos preparatórios e atos de execução - Talvez um dos maiores problemas que enfrentamos ao iniciarmos o estudo do Direito Penal seja, justamente, tentar diferenciar os atos preparatórios, não puníveis pela nossa lei, dos chamados atos de execução, uma vez que a linha que os separa é por demais tênue.

 

Várias teorias surgiram, ao longo do tempo, com a finalidade de elaborar essa distinção. A conclusão de que determinado ato praticado pelo agente é preparatório ou de execução tem repercussões importantíssimas. Como visto, a cogitação e os atos preparatórios não são puníveis, uma vez que a lei penal somente se interessa pelo fato quando o agente, ressalvadas as hipóteses de punição dos atos preparatórios como infrações autônomas, inicia os atos de execução.

 

Assim, se considerarmos como preparatório o ato, com ele não se importará o Direito Penal, ao passo que, se o interpretarmos como de execução, sobre ele já terá incidência a lei, podendo-se falar, a partir daí, pelo menos, em tentativa, caso o agente não chegue à consumação por circunstâncias alheias à sua vontade.

 

Dentre as inúmeras teorias que surgiram com a finalidade de definir a tentativa, podemos citar as seguintes:

 

Teoria subjetiva: haveria tentativa quando o agente, de modo inequívoco, exteriorizasse sua conduta no sentido de praticar a infração penal. Esta teoria se satisfaz tão somente com o fato do agente revelar sua intenção criminosa através de atos inequívocos, não fazendo distinção, outrossim, entre atos preparatórios e atos de execução;

 

Teorias objetivas: formal e material. Para a teoria formal-objetiva, concebida por Beling, somente poderíamos falar em tentativa quando o agente já tivesse praticado a conduta descrita no núcleo do tipo penal. A teoria material-objetiva busca ser um complemento da primeira. Segundo Carlos Parma, por intermédio dela se incluem “ações que por sua necessária vinculação com a ação típica, aparecem como parte integrante dela, segundo uma natural concepção ou que produzem uma imediata colocação em perigo de bens jurídicos”. (PARMA, Carlos. La tentativa, p. 56);

 

Teoria da hostilidade ao bem jurídico: Era a teoria preconizada por Mayer. Para se concluir pela tentativa, teria de se indagar se houve ou não uma agressão direta ao bem jurídico.

“Ato executivo (ou de tentativa) é o que ataca efetiva e imediatamente o bem jurídico; ato preparatório é o que possibilita, mas não é ainda, sob o prisma objetivo, o ataque ao bem jurídico” (Apud HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal, v. I, t. II, p. 84).

 

Na verdade, não obstante os esforços expendidos por um grande número de doutrinadores a fim de demarcar a fronteira entre os atos preparatórios e os de execução, tal tarefa, mesmo nos dias de hoje, ainda não foi superada. Há atos que, com toda certeza, reputaríamos como preparatórios ao início da execução da infração penal, como, v.g., a aquisição da arma pelo agente e a procura pelo automóvel mais fácil de ser subtraído, em face da ausência de dispositivos de segurança; há outros que, também com absoluta certeza, entenderíamos como de execução, como no caso de o agente já estar se retirando do interior da casa da vítima levando consigo algumas joias a ela pertencentes, ou mesmo daquele que inicia o acionamento da arma puxando-lhe o gatilho.

 

Embora existam os atos extremos, em que não há possibilidade de serem confundidos, a controvérsia reside naquela zona cinzenta na qual, por mais que nos esforcemos, não teremos a plena convicção se o ato é de preparação ou de execução. Ainda não surgiu, portanto, teoria suficientemente clara e objetiva que pudesse solucionar esse problema.

 

Nos termos do art. 14, inciso II, do Código Penal, só há tentativa quando, iniciada a conduta delituosa, o crime não se consuma por fatores alheios à intenção do agente. Na hipótese em tela, não se verificou qualquer ato de execução, mas somente a cogitação e os atos preparatórios dos acusados que confessaram a intenção de roubar determinada agência dos correios. Descabida, pois, a imputação do crime de roubo idealizado (STJ, CC 56209/MA, Relª. Minª. Laurita Vaz, S3, DJ 6/2/2006, p. 196).

 

O que diferencia os atos preparatórios da tentativa é que nesta já há um início de execução e este ocorre quando se inicia o ataque ao bem jurídico tutelado e quando começa a realização do tipo (TACrim/SP, AC, Rel. Clíneu Ferreira, JTACrim/SP 93, p. 132).

 

Dúvida se o ato é preparatório ou de execução - Se, no caso concreto, depois de analisar detidamente a conduta do agente e uma vez aplicadas todas as teorias existentes que se prestam a tentar distinguir os atos de execução, que se configurarão em tentativa, dos atos meramente preparatórios, ainda assim persistir a dúvida, esta deverá ser resolvida em benefício do agente. Seguindo a lição de Hungria, “nos casos de irredutível dúvida sobre se o ato constitui um ataque ao bem jurídico ou apenas uma predisposição para esse ataque, o juiz terá de pronunciar o non liquei, negando a existência da tentativa” (HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal, v. I, t. Il, p. 85).

 

Para distinguir a diferença entre atos preparatórios para a prática de um crime e atos de execução propriamente ditos, há que se considerar dois fatores essenciais: a idoneidade e a inequivocidade da conduta do agente. Quando ele pratica atos inequívocos e idôneos para o cometimento do delito, aí começa a execução do crime (TJSC. AC, Rei. Ernani Ribeiro. RTJE 114, p. 265).

Elementos que caracterizam o crime tentado - Para que se possa falar em tentativa, é preciso que: a) a conduta seja dolosa, i.é, que exista uma vontade livre e consciente de querer praticar determinada infração penal; b) o agente ingresse, obrigatoriamente, na fase dos chamados atos de execução; c) não consiga chegar à consumação do crime, por circunstâncias alheias à sua vontade.

 

Carcereiro que colaborou com a tentativa de introdução de substância entorpecente em delegacia. Recurso não provido. Somente se pode dizer que há auxílio quando a substância proibida chega às mãos do destinatário final. Se não chegar, os fatos não passam da esfera do delito tentado. No caso, sua conduta ultrapassou a fase dos atos preparatórios, ingressando na esfera da execução do tipo. Contudo, passou disso, i. é, o iter críminis foi interrompido porque ele percebera a movimentação dos delegados de polícia e de investigadores (Ap. Crim. 110.346-3, Rel. Celso Limongi, Ribeirão Pires, 20/1 1/91).

 

Tentativa perfeita e tentativa imperfeita - Podemos distinguir a tentativa em perfeita e imperfeita. Fala-se em tentativa perfeita, acabada, ou crime falho, quando o agente esgota, segundo o seu entendimento, todos os meios que tinha ao seu alcance a fim de alcançar a consumação da infração penal, que somente não ocorre por circunstâncias alheias à sua vontade. Diz-se imperfeita, ou inacabada, a tentativa em que o agente é interrompido durante a prática dos atos de execução, não chegando, assim, a fazer tudo aquilo que intencionava, visando consumar o delito.

 

Tratando-se de tentativa perfeita ou crime falho, em que ela foi esgotada, a diminuição deve ser feita em seu mínimo legal, pouco importando que as circunstâncias judiciais militem em favor do réu (TJMG, AC1.0395.03.004239-8/001, Relª. Desª. Jane Silva, DJ 13/1/2007).

 

É de ser reduzido em apenas 1/3 o quantum da reprimenda nas hipóteses de tentativa acabada, visto que, em tais casos, o agente não é interrompido na execução do delito, mas, finalmente, faz tudo aquilo que estava a seu alcance para obter êxito na empreitada criminosa (TJMG, AC 1.0024.03.105914-0, Rel. Des. Hélcio Valentim, DJ 9/6/2006).

 

Tentativa e contravenção penal - Em virtude da determinação expressa constante do art. 4º do Decreto-Lei nº 3.688/41, não é punível a tentativa de contravenção penal.

 

Tentativa branca - Fala-se em tentativa branca, ou incruenta, quando o agente, não obstante ter utilizado os meios que tinha ao seu alcance, não consegue atingir a pessoa ou a coisa contra a qual deveria recair sua conduta. Em sede de homicídio tentado, na hipótese em que se conjugam as circunstâncias de se tratar de homicídio privilegiado e sob a forma de tentativa branca, é razoável a redução da pena no seu percentual máximo

(STJ, REsp. 117253/DF, Rel. Min. Vicente Leal, 6ª T., RJADCOAS 10, p. 611).

 

Teorias sobre a punibilidade do crime tentado - Para solucionar o problema da punição da tentativa, surgiram, basicamente, duas teorias: a subjetiva e a objetiva.

 

Segundo a teoria subjetiva, o agente que deu início aos atos de execução de determinada infração penal, embora, por circunstâncias alheias à sua vontade, não tenha alcançado o resultado inicialmente pretendido, responde como se a tivesse consumado. Basta, como se vê, que sua vontade seja dirigida à produção de um resultado criminoso qualquer, não importando se efetivamente ele venha ou não a ocorrer. Aqui será aplicada ao agente a pena cominada ao crime consumado, não incidindo, outrossim, redução alguma pelo fato de ter permanecido a infração penal na fase do conatus.

 

Já a teoria objetiva, adotada como regra pelo nosso Código, entende que deve existir uma redução na pena quando o agente não consiga, efetivamente, consumar a infração penal. Quer dizer, a pena para a tentativa deve ser menor do que aquela aplicada ao agente que consegue preencher todos os elementos da figura típica. Tal regra, contudo, sofre exceções, como no caso em que o legislador pune a tentativa com as mesmas penas do crime consumado, prevendo-a expressamente no 'tipo, a exemplo do art. 352 do Código Penal. Por essa razão, ou seja, por causa da ressalva contida no parágrafo único do art. 14, é que podemos concluir ter o Código Penal adotado a teoria objetiva temperada, moderada ou matizada, i. é, a regra é que a pena correspondente ao crime tentado sofra uma redução. Contudo, tal regra sofre exceções, conforme previsto pelo próprio artigo. Assim, embora adotando-se uma teoria objetiva, ela não é pura, mas, sim, como dissemos, temperada, moderada ou matizada.

 

Tentativa e redução de pena - O percentual de redução não é meramente opção do julgador, livre de qualquer fundamento. Assim, visando trazer critérios que possam ser aferidos no caso concreto, evitando decisões arbitrárias, entende a doutrina que quanto mais próximo o agente chegar à consumação da infração penal, menor serão o percentual de redução; ao contrário, quanto mais distante o agente permanecer da consumação do crime, maior será a redução.

 

Por ocasião da análise do quantum a ser arbitrado à tentativa (CP, art. 14, II), cabe verificar o caminho inverso do iter criminis, no sentido de que quanto mais próximo da consumação, menor deve ser a redução. Assim sendo, em tendo o acusado se aproximado das vias finais de consumação do crime, deve-se reduzir a reprimenda em proporção inferior ao limite máximo estabelecido pelo art. 14, parágrafo único, do Código Penal (TJSC, ACr 2009.024655-5, Relª. Desª. Salete Silva Sommariva, DJSC 21/7/2010, p. 389).

 

A redução prevista no art. 14, parágrafo único, do Código Penal deve corresponder ao trecho do iter criminis percorrido pelo Réu

(STJ, REsp. 755445/RS, Relª. Minª. Laurita Vaz, 5ª T, DJe 04/ 12/2008).

 

Tentativa e dolo eventual - Questão extremamente complexa é a possibilidade de ser admitida a tentativa nas hipóteses de dolo eventual. Ao contrário do que possa parecer, mesmo tratando-se de dolo (eventual), o raciocínio não flui de forma tranquila como acontece quando estamos diante do dolo por excelência, que é o dolo direto, seja ele de primeiro ou de segundo grau. A doutrina espanhola, em sua maioria, entende, no caso em exame, ser perfeitamente admissível o conatus. Muñoz Conde, com o brilhantismo que lhe é peculiar, mesmo admitindo a controvérsia sobre o tema, assevera que, “na medida em que o tipo do respectivo delito admita a comissão dolosa eventual, [...], caberá também a tentativa com esta forma de imputação subjetiva, ainda que o normal na tentativa seja o dolo direto, pelo menos de segundo grau”. (CEREZO MIR, José. Curso de derecho penal español - Parte general, v. 111, p-186). José Cerezo Mir, sem enfrentar o tema com profundidade, afirma que “a tentativa é compatível, segundo a opinião dominante, com o dolo eventual”.

No Brasil, Frederico Marques também entende como perfeitamente admissível a tentativa no dolo eventual. (BITENCOURT, Cezar Roberto; MUNOZ CONDE, Francisco. Teoria geral do delito, p. 450).

 

No mesmo sentido, aduz Fernando Galvão que “os crimes que se realizam com dolo eventual admitem tentativa. No plano objetivo, sendo possível fracionar a conduta, a tentativa é perfeitamente compatível com o dolo eventual. Se o dolo eventual é caracterizado pela postura subjetiva de assumir a ocorrência do resultado, o comportamento é tendencioso à realização de tal objetivo e pode haver a interrupção que autoriza uma responsabilidade diminuída”. (GALVÃO, Fernando. Direito penal - Parte geral, p. 720).

 

Apesar da força do pensamento dos mencionados autores, acreditamos ser o dolo eventual completamente incompatível com a tentativa. Bustos Ramirez e Hormazábal Malarée não admitem essa hipótese, dizendo que “não é possível a tentativa com dolo eventual, pois o dolo eventual tem a estrutura de uma imprudência a que, por razões político-criminais, se aplica a pena do delito doloso". (BUSTOS RAMIREZ, Juan J.; HORMAZÁBAL MALARÉE, Hemãn. Lecciones de derecho penal, v. II, p. 269).

 

Independentemente do paralelo que se tente traçar entre o dolo eventual e a culpa consciente, o fato é que, nos casos concretos, o raciocínio da tentativa toma-se inviável. A própria definição legal do conceito de tentativa nos impede de reconhecê-la nos casos em que o agente atua com dolo eventual. Quando o Código Penal, em seu art. 14, II, diz ser o crime tentado quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente, nos está a induzir, mediante a palavra vontade, que a tentativa somente será admissível quando a conduta do agente for finalística e diretamente dirigida à produção de um resultado, e não nas hipóteses em que somente assuma o risco de produzi-lo, nos termos propostos pela teoria do assentimento. O art. 14, II, do Código Penal adotou, portanto, para fins de reconhecimento do dolo, tão somente, a teoria da vontade.

 

Crime de trânsito. Denúncia por homicídio tentado com dolo eventual. Decisão pronunciatória. Necessidade de reforma. Impossibilidade lógica de admitir-se a tentativa no dolo eventual. Desclassificação do delito (TJRS, REsp. 70028712321, Rel. Des. Manuel José Martinez Lucas, DJ W7/2009). (Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao Crime Consumado, tentativa e pena – Art. 14 do CP, p. 45-49. Editora Impetus.com.br, acessado em 25/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Seguindo as apreciações de Flávio Olímpio de Azevedo, Comentários ao art. 14 do Código Penal, publicado no site Direito.com, baseando-se na fala de Miguel Reale Junior: “No crime consumado há uma congruência entre a conduta paradigmaticamente descrita na norma e conduta concreta efetivada”. A conduta sempre apresenta duas faces, a interna e externa. A intenção delitiva exterioriza-se na realidade de ações ou omissões, que, ao alcançarem o objetivo pretendido, fazem surgir o evento jurídico previsto na norma penal incriminadora. (
Código Penal Comentado, coordenador Miguel Reale Junior, ed. Saraiva, p. 53).

 

Enfim, restará consumado o crime quando todos os elementos que compõe os exigíveis pelo tipo penal devem acontecer. Exemplo clássico é homicídio matar outrem. Crime. A morte é o evento da consumação do delito.

 

Pena tentativa – Crime tentado é conforme define o inciso segundo do artigo em momento não concretizado por fatores externos que independem da vontade do agente (é tentativa imperfeita).

 

O iter criminis – são as fases preparatórias percorridas pelo agente para realização do delito: cogitação e deliberação pelo agente e após execução que sempre é punível.

 

A pena para tentativa é a mesma prevista para crime consumado, mas aplicado o redutor de 2/3. Haverá redução ou majoração da pena baseado nesse redutor dependendo do caminho percorrido no iter criminis. Se tiver na fase final do delito é considerada a majoração e ao contrário, se tiver no início da execução, a pena será menor, v.g., na tentativa de homicídio, o agente acerta vários tiros na vítima; a valoração da pena. Em outra hipótese, ele erra todos os tiros, a diminuição da pena. (Flávio Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 14 do Código Penal, publicado no site Direito.com, acessado em 25/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Segundo entendimento de Alberto Bezerra, nas apreciações da jurisprudência atualizada, postado em blog petições online.com.br, comentários ao art. 14, começando pelo conceito de crime consumado:


Conceito de crime consumado: é o tipo penal integralmente realizado, ou seja, quando o tipo concreto se enquadra no tipo abstrato. Exemplo: quando A subtrai um veículo pertencente a B, com o ânimo de assenhoreamento, produz um crime consumado, pois sua conduta e o resultado materializado encaixam-se, com perfeição, no modelo legal de conduta proibida descrito no art. 155 do Código Penal.

Conceito de tipo penal e sua estrutura: é a descrição abstrata de uma conduta, tratando-se de uma conceituação puramente funcional, que permite concretizar o princípio da reserva legal (não há crime sem lei anterior que o defina). A existência dos tipos penais incriminadores (modelos de condutas vedadas pelo direito penal, sob ameaça de pena) tem a função de delimitar o que é penalmente ilícito e o que é penalmente irrelevante, tem, ainda, o objetivo de dar garantia aos destinatários da norma, pois ninguém será punido senão pelo que o legislador considerou delito, bem como tem a finalidade de conferir fundamento à ilicitude penal. Note-se que o tipo não cria a conduta, mas apenas a valora, transformando-a em crime. O tipo penal vem estruturado da seguinte forma: a) título ou – nomen juris”: é a rubrica dada pelo legislador ao delito (ao lado do tipo penal incriminador, o legislador confere à conduta e ao evento produzido um nome, como homicídio simples é a rubrica do modelo de comportamento “matar alguém”). Sobre a importância do título, escreve David Teixeira de Azevedo que “o legislador, ao utilizar o sistema de rubricas laterais, fornece uma síntese do bem protegido, apresentando importante chave hermenêutica. A partir da identificação do bem jurídico protegido é que se extrairá do texto legal sua virtude disciplinadora, concluindo quanto às ações capazes de afligir ou pôr em risco o objeto jurídico” (Dosimetria da pena: causas de aumento e diminuição, p. 34); b) preceito primário: é a descrição da conduta proibida, quando se refere ao tipo incriminador, ou a da conduta permitida, referindo-se ao tipo penal permissivo. Dois exemplos: o preceito primário do tipo incriminador do art. 121 do Código Penal é “matar alguém”; o preceito primário do tipo permissivo do art. 25 do Código Penal, sob a rubrica “legítima defesa”, é repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou de terceiro, usando moderadamente os meios necessários; c) preceito secundário: é a parte sancionadora, que ocorre somente nos tipos incriminadores, estabelecendo a pena. Ex.: no crime de homicídio simples, o preceito secundário é “reclusão, de seis a vinte anos”.

Elementos do tipo penal incriminador: sendo ele o modelo legal abstrato de conduta proibida, que dá forma e utilidade ao princípio da legalidade (não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem lei anterior que a comine), fixando as condutas constitutivas dos crimes e contravenções penais, convém esmiuçar o estudo dos seus componentes. O tipo incriminador forma-se com os seguintes elementos: 1º) objetivos, que são todos aqueles que não dizem respeito à vontade do agente, embora por ela devam estar envolvidos. Estes se subdividem em: a1) descritivos, que são os componentes do tipo passíveis de reconhecimento por juízos de realidade, i é, captáveis pela verificação sensorial (sentidos humanos). Assim, quando se estuda o tipo penal do homicídio, verifica-se que é composto integralmente por elementos descritivos. Matar alguém não exige nenhum tipo de valoração ou interpretação, mas apenas constatação. Matar é eliminar a vida; alguém é pessoa humana; a2) normativos, que são os componentes do tipo desvendáveis por juízos de valoração, ou seja, captáveis pela verificação espiritual (sentimentos e opiniões). São os elementos mais difíceis de alcançar qualquer tipo de consenso, embora sua existência tenha justamente essa finalidade. Quando se discute, no crime de ato obsceno (art. 233), o conceito de obscenidade, sabe-se que este último termo não tem outra análise senão valorativa. A obscenidade, no cenário dos crimes contra os costumes, encontra variadas formas de visualização, motivadas por opiniões e por condições de lugar e tempo. Enfim, o elemento normativo produz um juízo de valor distante da mera descrição de algo. Podemos apontar, ainda, os juízos de valoração cultural (como a referida obscenidade nos crimes contra os costumes) e os juízos de valoração jurídica (como o conceito de cheque, no estelionato). Nas palavras de ROXIN, “um elemento é ‘descritivo’ quando se pode perceber sensorialmente, vale dizer, ver e tocar o objeto que designa. Neste sentido, o conceito de ‘ser humano’, ao qual se referem os tipos de homicídio, é um elemento descritivo. Pelo contrário, fala-se de um elemento ‘normativo’ quando somente existe no âmbito das representações valorativas e, por isso, somente pode ser compreendido espiritualmente. Assim ocorre com o conceito de alheio em meu segundo exemplo inicial [furto]. O fato de uma coisa ser propriedade de alguém não se pode ver, senão apenas entender-se espiritualmente conhecendo os contextos jurídicos” (La teoría del delito en la discusión actual, p. 197); 2º) subjetivos, que são todos os elementos relacionados à vontade e à intenção do agente. Denominam-se elementos subjetivos do tipo específicos, uma vez que há tipos que os possuem e outros que deles não necessitam. Determinadas figuras típicas, como o homicídio (“matar alguém”), prescindem de qualquer finalidade especial para se concretizarem. Logo, no exemplo citado, pouco importa a razão pela qual A mata B e o tipo penal pode integralizar-se por completo. Entretanto, há tipos penais que demandam, expressamente, finalidades específicas por parte do agente; (fonte: NUCCI, Guilherme Souza. Código Penal Comentado, 16ª edição. Forense, 01/2016). Alberto Bezerra, nas apreciações da jurisprudência atualizada, postado em blog peticoesonline.com.br, comentários ao art. 14, acessado em 25/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).