Direito Civil
Comentado - Art. 904, 905, 906 - continua
Do Título ao Portador - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial
- Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art.
233 ao 965) - Título VIII – Dos Títulos de Crédito
(Art. 904
a 909) Capítulo II – Do Título ao Portador
–
vargasdigitador.blogspot.com
Art.
904. A
transferência de título ao portador se faz por simples tradição.
Para
Marcelo Fortes Barbosa Filho, o Código Civil
estabeleceu regras para três espécies de títulos de crédito, de acordo com a
forma de circulação. Tal classificação é a mais importante do ponto de vista
prático e uma das mais utilizadas, se bem que o critério escolhido não afete o
direito patrimonial inserido no documento. As três categorias são: título ao
portador, título à ordem e título nominativo.
Nos títulos ao portador, de que trata o presente capítulo, não se
menciona o nome do beneficiário. A circulação se dá, livremente, pela tradição
do documento, por meio da qual é determinável o proprietário, a pessoa que
detém a posse legítima do título, i.é, a transmissão da posse induz a transmissão
da propriedade do documento. O título ao portador é identificado pela inserção
de uma cláusula especial “ao portador”, podendo a transmissão por mera tradição
se viabilizar pela omissão na designação do beneficiário, deixando-se um mero
espaço em branco no local destinado a sua nomeação, ou pela inserção de um
endosso em branco, num título naturalmente à ordem. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 915 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 08/04/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Pela doutrina de
Ricardo Fiuza, o CC/2002, nesta pane, vem a reintroduzir no direito positivo
brasileiro os títulos ao portador. Isto porque a Lei n. 8.021/90 (art. 2º)
extinguiu todos os títulos ao portador, inclusive nas ações das sociedades
anônimas, a pretexto de assegurar a identificação dos constituintes para fins fiscais.
Ressalvada a legislação especial de regência de cada título de crédito, todos
os demais títulos poderão, a partir de agora, ser emitidos sob a modalidade ao
portador, ficando revogada a Lei n. 8.021/90 relativamente a essa questão. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza
– p. 465, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 08/04/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Buscando Wille Duarte Costa, a
transferência do título ao portador de uma para outra pessoa é feita por
simples tradição, qual seja a entrega do título sem quaisquer outras
formalidades mas o título pode ser transferido por endosso nominal ou em
branco. Também, simplesmente pode ser transferido sem qualquer endosso, sendo o
título ao portador ou o último endosse em branco. Nestes casos, o último
endossatário e possuidor é considerado legítimo proprietário do título. Essa
transferência, de qualquer forma, implica na transferência dos direitos
inerentes ao título. (Wille Duarte Costa, Títulos de crédito no Novo Código
Civil) extraída da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal
de Minas Gerais, p. 302, Acesso 08/04/2020. Revista e atualizada nesta data por
VD).
Abalizado
por Maria Bernadete Miranda, a norma tem como base o artigo 2.003 do Código
Civil italiano, que diz: “O possuidor do título ao portador é legitimado ao
exercício do direito neste mencionado mediante a apresentação do título”. (Código
Civil Italiano, artigo 2.003 – “Transferimento
Del titolo e legittimazione del possessore. Il trasferimento Del titolo al portatore si opera com
la consegna Del titolo (1.994, 1.995). Il possessore Del titolo al portatore è
legittimato all`esercizio Del diritto in esso menzionato in base allá
presentazione Del titolo”.).
Os
títulos ao portador têm inserida a cláusula ao portador ou mantém em branco o
nome do beneficiário. Presume-se seu legítimo proprietário aquele que o possui
e sua transferência se dá pela simples tradição (entrega do título). Assim, a
circulação dos títulos ao portador se faz de maneira simples e rápida, porém
revestida de certo grau de periculosidade, em caso de furto ou extravio do
título. Com o advento da Lei Uniforme de Genebra, Decreto n. 57.663/66, em seu
Art. 1º, 6. E 75, 5, ficaram vedadas em nosso direito a Letra de Câmbio e a
Nota Promissória ao portador, permanecendo o cheque ao portador, em razão de
constituir uma simples ordem de pagamento à vista, com emissão autorizada por
lei.
A
partir da entrada em vigor da Lei n. 8.021, de 12 de abril de 1.990, temos uma
ressalva a fazer sobre o cheque, pois a referida lei, em seu artigo 2º, III e
parágrafo único, proíbe a emissão de cheque ao portador para valores superiores
a cem Bônus do Tesouro Nacional – BTN, artigo este que foi posteriormente
revogado pela Lei n. 9.069,, de 29 de junho de 1965, que dispõe sobre o Plano
Real, o Sistema Monetário Nacional, estabelecendo as regras e condições de
emissão do Real, e as condições para conversão das obrigações para o Real.
Determina
também a Lei n. 8.021, de 12 de abril de 1990, em seu artigo 2º, II, que: “A
partir da data de publicação desta Lei fica vedada: II – a emissão de títulos e
a captação de depósitos ou aplicações ao portador ou nominativos-endossáveis.”
Ante o exposto, diremos que os novos
títulos criados a partir da entrada em vigor deste Código poderão ser emitidos
ao portador, o que não ocorrerá com os títulos típicos, que continuarão sendo
regulados por lei especial. (Comentários aos Títulos de Crédito no Código Civil
Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 Maria Bernadete Miranda – Revista
Virtual Direito Brasil – Volume 2 – nº 1 – 2008, acessado
em 08/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
905. O
possuidor de título ao portador tem direito à prestação nele indicada, mediante
a sua simples apresentação ao devedor.
Parágrafo
único. A
prestação é devida ainda que o título tenha entrado em circulação conta a
vontade do emitente.
Como
esclarece Marcelo Fortes Barbosa Filho, a
titularidade do crédito numa obrigação cartular derivada de um título ao
portador provém pura e simplesmente do exercício da posse legítima sobre a
coisa móvel correspondente ao documento. A posse do título, cuja presença é
evidenciada pela exibição da cártula, indica, em qualquer circunstância, a quem
deve ser feito o pagamento. Ainda que tenha entrado em circulação contra a
vontade do emitente, o título ao portador restará adstrito ao cumprimento da
obrigação criada, desde que o possuidor esteja de boa-fé e, portanto,
desconheça a presença de um vício atinente à origem do documento, tal como
realçado pelo parágrafo único. (Marcelo Fortes
Barbosa Filho, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 915 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 08/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Por Fiuza, sabe-se
que o possuidor do título, regra geral, é o último detentor do título ao
portador que tenha sido transferido por mera tradição (CC 904). Assim, é ele o
credor legitimado para exigir do devedor o pagamento da obrigação cambial,
mediante a simples apresentação do título de crédito ao devedor. Aquele que
detém a posso do título é considerado como credor legitimado. Ainda que o
título, após sua emissão, tenha sido colocado em circulação, ou seja,
transferido, contra a vontade do emitente, ajustada perante as partes
vinculadas ao negócio ou contrato subjacente, essa exceção não pode ser oposta
contra o portador legitimado, que é terceiro de boa-fé, cabendo ao devedor
realizar o pagamento. O devedor somente pode opor-se ao pagamento da obrigação
no caso de o título apresentar vício de forma. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 466, apud Maria
Helena Diniz Código Civil Comentado
já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 08/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na análise de Wille Duarte Costa, legitimado o
possuidor do título, ele pode exercer o direito decorrente e cobrar o valor do
título mediante simples apresentação ao devedor, ou ajuizando a ação cabível,
se não receber diretamente o valo do título. O devedor poderá ser acionado.
Havendo mais de um, todos poderão suportar a ação própria. Lembra-se que Mauro
Brandão Lopes opinou dizendo que os títulos atípicos não são passíveis de
protesto e nem têm ação de execução (execução por título extrajudicial). Lopes,
Mauro Brandão. Observações sobre o Livro I, Título VIII («Dos Títulos de
Crédito»). Anteprojeto de Código Civil. 2a edição revisada, Brasília:
Ministério da Justiça, 1973, p. 93.).
Em qualquer hipótese, o emitente é o
devedor principal. Pela emissão, entrega o título a alguém. Este pode ser
desapossado do título por qualquer motivo (assalto, apropriação indébita,
perda, extravio e quaisquer fatos que possam levá-lo a perder o título).
Então, se o título chegar às mãos de terceiro e se este for possuidor de
boa-fé, o possuidor poderá receber o valor do título sem que o devedor possa
opor qualquer defesa. (Wille Duarte Costa, Títulos de crédito no Novo Código
Civil) extraída da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal
de Minas Gerais, p. 302-303, Acesso 08/04/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
Corroborando com os demais Maria
Bernadete Miranda, o portador do título tem o direito de receber a quantia nele
indicada, através da simples apresentação dele ao devedor. O emissor não poderá
exonerar-se de pagá-lo a qualquer detentor como também não terá o direito de
verificar a legitimidade do portador, pois o seu dever será simplesmente pagar
o título a quem lho apresentar.
Determina o parágrafo único que, mesmo
que o título tenha entrado em circulação contra a vontade do emitente, a
prestação será devida e ele deverá pagá-lo. (Comentários aos Títulos de Crédito
no Código Civil Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 Maria Bernadete Miranda
– Revista Virtual Direito Brasil – Volume 2 – nº 1 – 2008, acessado em 08/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Art. 906. O devedor só poderá opor ao portador
exceção fundada em direito pessoal, ou em nulidade de sua obrigação.
Como
esclarece Marcelo Fortes Barbosa Filho, o presente
artigo reproduz o princípio da inoponibilidade das exceções pessoais, segundo o
qual o devedor, num título de crédito qualquer, não pode deduzir, ante um
credor de boa-fé, defesas decorrentes de sua relação para com terceiros.
Persiste, assim, uma proteção específica para o credor diante de vícios que lhe
são desconhecidos. Tal proteção, limitadora das exceções pessoais, não se
aplica apenas aos títulos ao portador, mas a todas as espécies de documentos
dispositivos. Trata-se de uma consequência direta do princípio da autonomia,
conferindo-se maior segurança à posição do credor, que não pode ser
surpreendido por fatos ou atos externos a sua esfera de atuação jurídica. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 916 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 08/04/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Mostra
a doutrina de Fiuza que, a inoponibilidade das exceções pessoais nas operações
relativas a títulos de crédito representa um princípio segundo o qual o devedor
somente pode exonerar-se do pagamento devido, se a causa ou justificação dessa
exoneração disser respeito, diretamente, a suas relações pessoais com o credor.
No tocante a terceiro de boa-fé, como a qualquer portador ou endossatário, as
exceções pessoais entre credor e devedor não podem ser opostas, ainda que a
obrigação originária seja nula ou o contrato que deu causa à emissão do título
não tenha sido concretizado. Assim, a interpretação literal deste dispositivo
pode dar margem a entendimento que não é compatível com a legislação especial
que regula cada um dos títulos de crédito. O art. 17 da Lei Uniforme de Genebra
em matéria de letra de câmbio e nota promissória (Decreto n. 57.663/65),
diploma legal este que define as normas gerais do direito cambial,
expressamente dispõe que “As pessoas acionadas em virtude e uma letra não podem
opor ao portador exceções fundadas sobre as relações pessoais delas como o
sacador ou com os portadores anteriores, ao menos que o portador, ao adquirir a
letra tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor”. No mesmo
sentido, o art. 25 da Lei n. 7.537/85, com relação ao cheque, assim enuncia:
“Quem for demandado por obrigação resultante de cheque não pode opor ao
portador exceções fundadas em relações pessoais com o emitente, ou com os
portadores anteriores, salvo se o portador o adquiriu conscientemente em
detrimento do devedor”. Desse modo, o entendimento a ser dado a este CC 906,
para que possa compatibilizar-se com a Lei Uniforme, é que as exceções pessoais
e a nulidade da obrigação somente podem ser opostas pelo devedor quando o
portador for o próprio credor original, quando a recusa do pagamento da
obrigação somente poderá decorrer de vício de forma do título. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p.
466, apud Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 08/04/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Aponta Wille Duarte Costa, ser esta
uma disposição comum a todos os títulos, de vez que o devedor, qualquer deles,
só poderá opor ao credor o direito pessoal que tenha contra ele, credor. Não
ode, por isso mesmo alegar direito de outra pessoa ou contra outra pessoa para
livrar-se do pagamento. Trata-se aqui na inoponibilidade das exceções
pessoais, princípio pelo qual o devedor não pode opor contra o credor
qualquer defesa que possa possuir contra outros obrigados.
É claro que, se ocorrer nulidade de
sua obrigação como, por exemplo, decorrente da falsificação da assinatura do
devedor, ele não pode e nem deve responder pela obrigação. Também se o título
em si for nulo por um vício de forma, a obrigação do devedor desaparece em
consequência. (Wille Duarte Costa, Títulos de crédito no Novo Código Civil)
extraída da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas
Gerais, p. 303, Acesso 08/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).