domingo, 19 de junho de 2022

Código Civil Comentado – Art. 252 Das Obrigações Alternativas - VARGAS, Paulo S. digitadorvargas@outlook.com – paulonattvargas@gmail.com Whatsapp: +55 22 98829-9130 –

 

Código Civil Comentado – Art. 252
Das Obrigações Alternativas - VARGAS, Paulo S.
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Parte Especial Livro I Do Direito Das Obrigações

Título I Das Modalidades Das Obrigações

Capítulo IV Das Obrigações Alternativas

(arts. 252 e 256)

 

Art. 252. Nas obrigações alternativas, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não se estipulou.

 

§ 1º Não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte em outra.

 

§ 2º Quando a obrigação for de prestações periódicas, a faculdade de opção poderá ser exercida em cada período.

 

§ 3º No caso de pluralidade de optantes, não havendo acordo unânime entre eles, decidirá o juiz, findo o prazo por este assinado para a deliberação.

 

§ 4º Se o título deferir a opção a terceiro, e este não quiser, ou não puder exercê-la, caberá ao juiz a escolha se não houver acordo entre as partes.

 

Na apreciação do artigo em pauta, Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 252, p. 203-204 do Código Civil Comentado: “Obrigações alternativas são aquelas em que o devedor cumpre a prestação devida se atender a uma dentre duas ou várias opções de conduta possíveis. Tal como estabelece o art. 244, que cuida da obrigação de dar coisa incerta, este dispositivo confere ao devedor a opção de escolher entre as alternativas dadas sempre que não houver disposição diversa”.

 

O § 1º veda ao devedor conjugar partes de prestações diversas para cumprir sua obrigação. As seguradoras, por exemplo, cumprem sua obrigação quando entregam ao segurado, em substituição a um automóvel furtado, outro da mesma espécie ou o valor equivalente (prestações alternativas), mas não podem obrigá-lo a receber um carro mais simples do que o que estava segurado completando o preço em dinheiro. Nos casos em que as prestações forem periódicas, a opção pode se verificar a cada período, nos termos do parágrafo segundo do presente dispositivo, que modificou o parágrafo segundo do art. 884 do Código Civil de 1916, que só se referia a prestações anuais. Essa possibilidade de a opção ser renovada a cada período não é consagrada apenas ao devedor, a despeito do contido no caput, mas a todos os que tiverem a opção da escolha, como observa Nelson Rosenvald (Direito das obrigações. Niterói, Impetus, 2004, p. 101).

 

Posição diversa, porém, é adotada por Washington de Barros Monteiro (Curso de direito civil, 32. ed., atualizada por Carlos Alberto Dabus Maluf. São Paulo, Saraiva, 2004, v. IV, p. 120), que considera que somente ao devedor se confere a possibilidade de fazer a opção periodicamente, o que, no entanto, não se justifica, pois não há razão para tratar as partes diversamente. Também não se pode concluir que, em virtude do que consta do caput, os parágrafos só digam respeito à opção do devedor, pois os parágrafos terceiro e quarto são claramente destinados a qualquer optante (inclusive terceiros), o que remete à conclusão de que não há motivo para restringir a incidência da regra do parágrafo segundo apenas à opção feita pelo devedor. Caso o devedor não exerça seu direito de escolha, o credor poderá se valer do disposto no art. 571 do Código de Processo Civil de 1973, substituído no CPC/2015 pelo art. 800 (nota VD), e aparelhar execução para compeli-lo a optar em dez dias, sob pena de devolver-se a ele o direito de optar. Os parágrafos terceiro e quarto trazem significativa inovação ao tema das obrigações alternativas ao atribuir ao juiz o dever de efetivar a escolha dentre as diversas alternativas sempre que não houver acordo unânime entre os vários optantes ou quando o terceiro a quem foi atribuída a escolha não puder ou não quiser fazê-la.

 

O parágrafo terceiro remete a escolha ao juiz ainda que apenas um dos diversos optantes discorde da escolha, pois exige que ela seja unânime. Não se adotou o critério de admitir a escolha da maioria, como se fez na disciplina da administração do condomínio (art. 1.323 do CC). Também não se disciplinou o modo pelo qual o juiz deve proceder à escolha, parecendo que deve optar pela melhor das opções existentes, e não pela intermediária, pois essa regra só foi prevista para a obrigação de dar coisa incerta (art. 244 do CC). A distinção decorre do fato de que prestações alternativas, ao contrário do que ocorre entre coisas incertas, são certas - cada uma delas - e não estão identificadas somente pelo gênero e pela quantidade. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 252, p. 203-204 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 23/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Em relação à classificação quanto ao modo de execução da prestação, no item 2, p. 626, os autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, reprisam quanto ao que já haviam dito. As obrigações podem ser classificadas em relação à forma de cumprir o objeto (obrigações simples, cumulativas, alternativas e facultativas) e ao tempo de cumprimento (obrigações de execução instantânea, diferida ou de trato sucessivo).

 

No que se refere à forma de cumprimento do objeto ajustado, tem-se: (a) Obrigações simples – aquela cuja prestação se caracteriza por um objeto somente; (b) obrigação cumulativa: aquela cuja prestação exige mais de um objeto; (c) obrigação alternativa: aquela em que as partes contratam dois ou mais objetos diferentes, podendo o devedor ou o credor, conforme o caso, escolher qual deles vai prestar; (d) obrigação facultativa: aquela em que se contratam objetos diferentes, sendo um principal e o outro facultativo. O objeto facultativo somente será prestado conforme a vontade exclusiva do devedor, no momento do adimplemento, sem que haja direito, pelo credor, de exigi-lo, ainda que o principal se torne impossível, porque, em regra, somente este é exigível.

 

Quanto ao tempo de cumprimento, pode-se distinguir: (a) obrigação de execução instantânea: aquela cuja prestação é dada de uma só vez e instantaneamente; (b) obrigação de execução diferida: é a que, embora tenha prestação que deva ser dada de uma só vez, sujeita-se à ocorrência de um termo, (prazo); (c) obrigação de trata sucessivo: aquela em que o cumprimento da prestação se dá em mais de uma etapa, de forma periódica, como no caso de pagamento de parcelas ou a locação (Gomes, 1979, p. 95).

 

 Na obrigação alternativa, a regra é que a escolha da prestação a ser realizada (concentração) cabe ao devedor (art. 252, caput), mas as partes podem convencionar o contrário. Apesar disso, o devedor não pode obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte em outra (art. 252 § 2º). A regra geral de que a escolha, do silêncio do contrato, cabe ao devedor, opera reflexos em outros campos, como no direito processual, já se tendo decidido, por exemplo, que “tratando-se de condenação alternativa, a escolha, à falta de diferente estipulação na sentença, cabe ao devedor” (TJSP, RT 400:182).  (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 2. Classificação quanto ao modo de execução da prestação p. 626-627, Comentários ao CC. 252. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 23/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No lecionar da equipe de Guimarães e Mezzalira, a obrigação alternativa é, no início, relativamente, indeterminada, mas se determina antes ou, simultaneamente, à execução do vínculo obrigacional. Nessa modalidade obrigacional, há apenas um vínculo obrigacional e pluralidade de prestações. O devedor libera-se da obrigação assumida cumprindo quaisquer uma das prestações previstas, à sua ou à escolha do credor, conforme estipulado pelas partes. As prestações podem ter natureza de dar, fazer ou não fazer. De se notar que a obrigação alternativa difere da obrigação de genérica, na medida em que, enquanto na primeira existem duas ou mais prestações conhecidas e individuadas, na segunda há apenas a determinação de gênero.

 

As obrigações alternativas diferem-se também daquelas denominadas facultativas. Enquanto nas obrigações alternativas, há pluralidade de prestações, que, posteriormente, são concentradas, nas obrigações facultativas, há apenas uma prestação (obrigação simples), com a convenção de que o devedor libera-se do vínculo, facultativamente, executando ato diverso. Como se verá (CC, arts. 253 e 254), tais distinções são cruciais, em se tratando de inexequibilidade das prestações.

 

O ponto fulcral das obrigações alternativas centra-se na escolha da prestação a ser executada. É por meio desse ato (exercício de direito potestativo, na dicção de Pontes de Miranda, Francisco C. Fontes do Direito Civil Brasileiro, Rio de Janeiro: Forense, pp 256-266), a ser praticado pelo devedor ou credor, que a obrigação alternativa tornar-se-á simples e determinada. A escolha é definitiva e irrevogável, exceto se as partes houverem convencionado a possibilidade de retratação. Assim, uma vez efetuada a escolha, a obrigação concentra-se. Isso quer dizer que não haverá ao credor a possibilidade de cobrar qualquer uma das prestações possíveis antes da escolha, nem mesmo ao devedor a possibilidade de se liberar do vínculo efetuando o pagamento com as alternativas existentes antes da concentração. É, justamente nessa jaez, que o parágrafo 1º do artigo 252 veda o cumprimento da obrigação com partes de cada uma das prestações alternativas preacordadas. Exemplificativamente, não pode uma seguradora obrigar o segurado a receber um veículo mais simples do que o acordado na apólice completando a diferença em dinheiro – ou ela entrega o veículo contratado, ou o equivalente em dinheiro. A escolha, vale dizer, pode ser deixada para o momento da execução da obrigação, não havendo a necessidade de que seja efetuada com longa antecedência ao cumprimento da obrigação. Nessa hipótese, vindo o devedor a descumprir a obrigação no termo afixado, o direito de escolha passa então ao credor (do mesmo modo que, não tendo o credor, quando lhe couber, efetuado a escolha no momento assinalado, tal prerrogativa transfere-se ao devedor). Nessa hipótese, o credor poderá se aparelhar do procedimento executivo (CPC, art. 800), para compelir o devedor a efetuar a escolha ou para que ele mesmo já a efetue em petição inicial.

 

A escolha é exercida por meio de simples declaração de vontade. Não há qualquer requisito formal ao ato, podendo ser praticado por comunicação escrita, notificação judicial ou, simplesmente, pela entrega da coisa ao credor (caso a escolha seja do devedor). Não havendo convenção entre as partes, a lei defere ao devedor a escolha da prestação a ser cumprida.

 

Em se tratando de obrigações alternativas periódicas, a concentração poderá ser realizada a cada novo período. A doutrina diverge quanto à possibilidade de que tal hipótese aplique-se nas hipóteses em que a escolha for de prerrogativa do credor: (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 252, p. 203-204 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado; e Rosenvald, Nelson. Direito das obrigações, Niterói: Impetrus, 2004, p. 101), defendem sua aplicabilidade; Monteiro, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2004, v. IV, p. 120, no entanto, entende a questão de maneira oposta.

 

Cabendo a escolha a diversos devedores ou a diversos credores, estes deverão, à unanimidade, efetuar o ato de concentração da prestação. Não o fazendo, caberá então à parte contrária assinalar prazo para que a escolha seja efetuada, findo o qual poderá, caso a providencia exigida não tenha sido adotada, recorrer ao judiciário, para que este execute a concentração da obrigação alternativa. A lei não traz critérios para que o juiz efetue a escolha. Bdine Jr., no entanto, acima citado, sugere que sempre se escolha para melhor das prestações.

 

Caberá também ao juiz efetuar a concentração da obrigação alternativa, na hipótese de a escolha ter sido delegada a terceiro e este não querer ou não poder efetuá-la. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 252, acessado em 23/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sábado, 18 de junho de 2022

Código Civil Comentado – Art. 250, 251 Das Obrigações de Não Fazer - VARGAS, Paulo S. digitadorvargas@outlook.com – paulonattvargas@gmail.com Whatsap: +55 22 98829-9130 –

 

Código Civil Comentado – Art. 250, 251
Das Obrigações de Não Fazer - VARGAS, Paulo S.
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Parte Especial Livro I Do Direito Das Obrigações

Título I Das Modalidades Das Obrigações

Capítulo III Das Obrigações de Não Fazer

(arts. 250 e 251)

 

Art. 250. Extingue-se a obrigação de não fazer, desde que, sem culpa do devedor, se lhe torne impossível abster-se do ato, que se obrigou a não praticar.

 

A obrigação de não fazer, segundo Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 250, p. 202 do Código Civil Comentado, consiste em impor a alguém uma abstenção. Na hipótese desse dispositivo, essa abstenção se torna impossível sem culpa do devedor. A consequência é a extinção da obrigação. A obrigação de não fazer pode se verificar no compromisso de não demolir determinada edificação existente em um terreno. A obrigação assumida estará extinta se a construção desmoronar em decorrência de fenômenos naturais, pois o desmoronamento tornará impossível cumprir a obrigação de não demolir. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 250, p. 202 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 22/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

A crítica da equipe de Guimarães e Mezzalira, traz a obrigação de não fazer como natureza negativa, consistindo na omissão do devedor em realizar determinado ato. Justamente por se caracterizar em postura omissiva, não há como se admitir a purgação de mora de obrigação dessa modalidade. Em geral, nesse tipo obrigacional, impõe-se ao devedor um non facere dentro de um certo período de tempo.

 

Caso a obrigação torne-se, sem qualquer culpa do devedor, impossível de ser cumprida, o vínculo obrigacional resolve-se e as partes retornam ao status quo ante.  Isso quer dizer que eventual valor recebido pelo devedor em troca da abstenção deverá ser devolvida ao credor. Tal restituição não tem caráter de perdas e danos, mas visa simplesmente ao retorno das partes ao estado anterior à assunção das correspectivas obrigações. Ilustrativamente, pode-se mencionar a obrigação não se demolir determinado prédio, que ficará extinta, caso o prédio se destrua devido a acontecimentos naturais.

 

Direito de Vizinhança. Nunciação de obra nova. Obra de vizinho que já havia sido concluída quando do ajuizamento da ação. Ausência de prejuízo à obra do autor. Construção instável, sem condições básicas de segurança. Demolição de parte da obra pelo réu. Impossibilidade da obrigação de fazer. Conversão em perdas e danos, nos termos do art. 461. § 1º, do CPC. Indenização, porém, indevida. Demolição feita sem consentimento do proprietário ou ordem judicial em virtude do risco que representava. Urgência. Autotutela prevista no art. 251, § único, do CC. Pedido improcedente. Recurso improvido” (TJSP, 32ª Câm. Dir. Priv. Apel. N. 002096-44.2009.8.26.0625, Rel. Des. Hamid Bdine, j. 31.1.2016). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 250, acessado em 22/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

1.2.2. Obrigações de não fazer - Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, descrevem como uma obrigação de não fazer, o devedor se obrigar à abstenção de praticar um ato. Destarte, se tal abstenção se tornar impossível, sem culpa do devedor, a obrigação se extingue.

 

Pode-se ver exemplos de obrigações de não fazer nos direitos de vizinhança (CC 2002, arts. 1.301, 1.309, 1.310 e 1.311) ou no exercício de servidões sobre imóveis (art. 1.383), dentre outros.

 

Por outro lado, se o devedor pratica o ato a cuja abstenção se obrigou, o credor passa a ter direito de exigir que ele o desfaça, ou, ainda, a mandar desfazê-lo à custa do devedor, sendo ressarcido, depois, pelo valor do ato de desfazimento e por perdas e danos. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item b) Obrigação de fazer infungível, p. 626, Comentários ao CC. 250. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 22/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 251. Praticado pelo devedor o ato, a cuja abstenção se obrigara, o credor pode exigir dele que o desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado perdas e danos.

 

Parágrafo único. Em caso de urgência, poderá o credor desfazer ou mandar desfazer, independentemente de autorização judicial, sem prejuízo do ressarcimento devido.

 

Seguindo o ritmo dos autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil: Em caso de urgência, poderá o credor desfazer ou mandar desfazer aquilo que tiver resultado do descumprimento da obrigação negativa, independentemente de autorização judicial, sem prejuízo do ressarcimento devido (art. 251, parágrafo único). Trata-se, portanto, de caso típico de exceção ao princípio da vedação à autotutela, pois permite-se que o credor de uma obrigação de não fazer aja por sus próprias mãos no sentido de desfazer o ato, desde que se trate de situação de urgência. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item b) Obrigação de fazer infungível, p. 626, Comentários ao CC. 251. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 22/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na interpretação de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 251, p. 202-203 do Código Civil Comentado,Diversamente do que ocorre no artigo antecedente, este trata do inadimplemento culposo da obrigação de não fazer. O devedor infringe a obrigação, praticando o ato a cuja abstenção se obrigou - constrói no terreno em que havia servidão de não edificar”.

 

A solução prevista nesse dispositivo é autorizar o credor a exigir que o próprio devedor desfaça o ato, ou desfazê-lo à sua custa, e que, além disso, indenize perdas e danos. No exemplo da construção em terreno sujeito à servidão de não construir, o credor da obrigação pode obter decisão judicial que o autorize a contratar um terceiro para demolir a obra e ainda receber indenização por perdas e danos - que, aqui, como no disposto no art. 249, não é alternativa, mas acréscimo, como registra Renan Lotufo (Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 54).

 

No parágrafo único está disciplinada a autotutela. O texto encontra equivalência no parágrafo único do art. 249. Pode ser aplicado aos casos em que não haja urgência, caracterizada pela gravidade dos danos provocados pelo inadimplemento e pela impossibilidade de obter intervenção judicial imediata.

 

É possível identificar esse caso no exemplo seguinte: um pequeno empresário cede seu direito de manter uma barraca de pastéis em uma feira agropecuária a outro vendedor de pastéis. No instrumento de cessão de direitos, assume a obrigação de não se instalar no local com o comércio de pastéis, pois isso acarretaria redução das vendas do cessionário. No único dia em que a feira se realizaria, o cessionário verifica que o cedente do direito de se instalar está montando sua barraca de pastéis para funcionar no mesmo local. Haverá urgência, pois não existirá tempo de obter intervenção judicial e os danos correspondentes a seu lucro naquele dia serão de difícil reparação, já que o vendedor de pastéis é insolvente. Assim, estarão presentes os requisitos do parágrafo único do art. 251 do Código Civil, que permitem que o credor da obrigação tome as providências a seu alcance para impedir a infração contratual. Poderá, por exemplo, conseguir que a administração da feira agropecuária imponha a abstenção ao dono da barraca de pastéis. Vale registrar, em observação também pertinente para o parágrafo único do art. 249, que o credor que atuar sem a intervenção judicial deverá indenizar os danos que causar ao devedor, se se constatar posteriormente que por alguma razão ele não era credor da obrigação. Nesse caso, ele terá agido com infração ao dever contratual de respeito ao outro contratante, oriundo da boa-fé objetiva (art. 422 do CC) ou com abuso de direito (art. 187 do CC). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 251, p. 202-203 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 22/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Também a equipe de Guimarães e Mezzalira, como Bdine Jr, faz menção à semelhança da estrutura do artigo 249. O artigo 251 também concede ao credor a possibilidade de exigir do devedor que desfaça determinado ato ou a autorização para que tal desfazimento seja efetuado por si ou por terceiro, no caso de descumprimento da obrigação. Em ambas as situações, a parte credora estará autorizada a efetuar a cobrança de eventuais perdas e danos que o descumprimento do devedor tenha lhe gerado.

 

Igualmente de modo semelhante ao disposto no artigo 249, permite-se que o credor, em caso de urgência, promova o desfazimento do ato executado pelo devedor, independentemente do ajuizamento de ação judicial. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 251, acessado em 22/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 10 de junho de 2022

Código Civil Comentado – Art. 247, 248, 249 Das Obrigações de Fazer - VARGAS, Paulo S. digitadorvargas@outlook.com – paulonattvargas@gmail.com Whatsap: +55 22 98829-9130 –

 
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Parte Especial Livro I Do Direito Das Obrigações

Título I Das Modalidades Das Obrigações

Capítulo II Das Obrigações de Fazer

(arts. 247 a 249)

 

Art. 247. Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele exequível.

 

Como alerta Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 247, p. 198 do Código Civil Comentado: “Nas obrigações de fazer, a prestação consiste em uma atividade humana (um trabalho físico, intelectual ou mesmo a prática de um ato ou negócio jurídico). Distinguem-se das obrigações de dar porque compreendem essa conduta humana como antecedente lógico de uma eventual obrigação de entrega. Nas obrigações de dar, essa entrega não é precedida de uma atividade humana consistente em fazer. A distinção, portanto, está posta no fazer, que não se identifica quando a obrigação for apenas de dar”. É obrigação de fazer a de um cantor que comparece a determinado local no dia estabelecido para um espetáculo. Do mesmo modo, será de fazer a obrigação do pintor que entrega um quadro na data estabelecida. Neste último caso, a entrega do quadro pode caracterizar uma obrigação de dar, mas será de fazer em razão da atividade artística obrigatoriamente desenvolvida antes da entrega. Mas a obrigação será apenas de dar se a prestação consiste em entregar um veículo cujo preço já tenha sido recebido pelo vendedor. A inexecução da obrigação de dar coisa certa e da de fazer ou não fazer autoriza a aplicação da multa no processo de execução (arts. 621, parágrafo único, e 645 ambos do CPC/1973, correspondendo no CPC/2015 o art. 806 o primeiro, art. 621, sem modificação no 645 do CPC1973, Nota VD ). Assim como os bens (art. 85 do CC), as obrigações de fazer também podem ser fungíveis ou infungíveis. Serão fungíveis sempre que a atividade devida puder ser efetivada por terceiro, e não pelo próprio devedor. Infungíveis, quando isso não for possível, isto é, quando aquele que se obrigou não puder ser substituído por outro que exerça atividade equivalente à sua. Fungível é a obrigação de consertar determinado veículo, pois diversos mecânicos são capazes da mesma tarefa. Mas é infungível a substituição do cantor Ney Matogrosso em um espetáculo, tendo em vista suas características individuais. Nos casos em que a obrigação é fungível, não há necessidade de converter a execução da obrigação de fazer em perdas e danos, pois será possível obter o mesmo resultado previsto originalmente. No entanto, se a obrigação é infungível - tal como são as mencionadas nesse dispositivo -, obrigatoriamente o credor deverá se satisfazer com as perdas e danos decorrentes do inadimplemento. A obrigação de outorga de escritura definitiva, ou de praticar determinado negócio jurídico, deve ser havida como obrigação fungível, pois pode ser suprida por deliberação judicial tal como especificamente previsto no art. 461-A do CPC/1973, correspondendo ao art. 498 no CPC/2015, Nota VD. Com acerto, Gustavo Bierambaum adverte que a conversão em perdas e danos é solução a ser evitada, pois melhor será, cm geral, a obtenção da própria prestação devida, e registra que ela será a preferível sempre que “o cumprimento forçado dessa obrigação não resultar em violência à liberdade do devedor” (“Classificação: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 139). Vale notar, nesse aspecto, que para compelir o devedor ao cumprimento da obrigação de fazer infungível será de significativa valia a multa de que trata o art. 461, § 5º, do CPC/1973, (v. art. 503, 1º e 1.054 relacionados dica do CPC/2015, Nota VD). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 247, p. 198 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 21/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Na visão da equipe de Guimarães e Mezzalira, o artigo em questão trata das obrigações de fazer, cujo objeto consiste em um ato positivo do devedor, em geral relacionado a uma prestação de trabalho, com a exigência de execução material, por vezes envolvendo esforço físico. Diversamente das obrigações de dar, as obrigações de fazer têm como pressuposto conduta humana específica. Exemplificativamente, pode-se mencionar a atividade do marceneiro que produz um móvel u de um cantor que realiza um espetáculo. No entanto, a obrigação pode envolver outrossim atos mais complexos, como, por exemplo, a celebração de um contrato ou de um determinado negócio jurídico – atos a partir dos quais derivam uma miríade de outros efeitos.

 

As obrigações de fazer podem ser constituídas, levando-se em consideração as características pessoais do devedor, por se tratar de qualidades essenciais ao cumprimento da prestação. Tais obrigações são qualificadas como personalíssimas (intuito personae). São ditas ainda infungíveis, em contraposição às prestações que podem ser cumpridas, independentemente, de quem seja devedor. Ilustrativamente, tem-se o quadro pintado por um pintor famoso, hipóteses em que não se visa a uma tela qualquer, mas sim a uma tela elaborada, especificamente, por um determinado artista, mas sim a uma tela elaborada, especificamente, por um determinado artista. Em regra, todas as obrigações são fungíveis. Caso as partes desejem caracterizá-las como personalíssimas, deverão fazer estipulação expressa no título que der origem à obrigação. Pereira, no entanto, defende uma interpretação ampliativa da questão, sugerindo que, ainda que inexista convenção específica, há que se reconhecer a natureza pessoal da obrigação quando assim determinarem as circunstâncias. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações. Rio de Janeiro: Forense, p. 59).

 

Diversamente do que se dá nas obrigações de dar, inexiste, nas obrigações de fazer, execução específica, sob pena de serem violados direitos da personalidade do devedor. Portanto, em se tratando de obrigação personalíssima, a obrigação sempre se converte em perdas e danos, dado que não há como se compelir alguém à prática de um ato específico (hemo ad factum precise cogi poteste). Nada obstante, para se assegurar o cumprimento da obrigação de fazer, poderá ser aplicada multa rotativa (astreintes), da qual o devedor somente estará desobrigado após o cumprimento da obrigação. Descumprindo-a, o devedor deverá ser condenado no pagamento da pena pecuniária, no âmbito de ação cominatória. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 247, acessado em 21/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

As obrigações de fazer, no entendimento dos autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, item 1.2.1. p. 625, o devedor se obriga, perante o credor, à prestação de um fato positivo, ou seja, deve prestar algum serviço ou praticar algum ato convencionado no negócio. Sua classificação obedece à natureza da prestação, podendo esta ser fungível (obrigação impessoal) ou infungível (obrigação personalíssima).

 

A prestação infungível é aquela que somente pode ser dada pelo devedor, seja por se tratar de fato personalíssimo (pintura de um quadro por pintor famoso, contratação de um cantor conhecido etc.) ou por convenção das partes.

 

A prestação fungível é aquela que pode ser dada por terceiro (pintura de paredes, execução de sobra de construção etc.) Caio Mário afirma que “o exame das normas autoriza afirmar que a regra é a fungibilidade da prestação, pois que só expressamente a obrigação se contrai intuitu personarum” (1978, p. 58).

 

Com razão o mestre, mas, como se afirmou, a fungibilidade, ou caráter personalíssimo da obrigação, pode decorrer não só da vontade expressa, como, também, da natureza da obrigação, ekzemple, caso se contrate determinado artista por sua qualidade, ainda que o contrato não o diga expressamente, interpretar no sentido de exonera-lo do cumprimento contraria o preceito do art. 113, que manda dar significado aos negócios conforme a boa-fé. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.2.1. Concentração, p. 625, Comentários ao CC. 247. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 21/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 248. Se a prestação do fato tornar-se impossível sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação; se por culpa dele, responderá por perdas e danos.

 

A apreciação do autor Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 248, p. 199 do Código Civil Comentado, a obrigação de fazer pode tornar-se impossível sem culpa do devedor. Nesse caso, as partes devem ser restituídas ao estado em que se encontravam antes da impossibilidade, sem a obrigação de indenizar perdas e danos. Contudo, haverá obrigação de indenizar perdas e danos se o devedor for o culpado da impossibilidade.

 

Dessa forma, a equipe de Guimarães e Mezzalira entende que impossibilitando-se a prestação de fazer, sem culpa do devedor, a obrigação resolve-se para ambas as partes e retornar-se ao status quo ante. De outro lado, se o devedor der causa à impossibilidade, o credor não poderá exigir dele a execução material da obrigação, mas terá a prerrogativa de cobrar as perdas e danos que tal fato lhe gerou.

 

Jurisprudência. “Civil. Recurso especial. Obrigação de construtor/empreiteiro. Natureza da obrigação. Morte do construtor/empreiteiro. Transmissão da obrigação aos herdeiros e sucessores. Dependência do objeto do contrato. – Quando o que mais importa para a obra é que seja feita exclusivamente por determinado empreiteiro ou construtor, a obrigação desse é personalíssima e não se transmite aos seus herdeiros e sucessores, conforme dispunha o art. 878 do CC/1916 e  agora dispõe a segunda parte do art. 626 do CC/2002. – Quando na contratação de uma obra o fator pessoal das habilidades técnicas do empreiteiro ou construtor não é decisivo para a contratação, a obrigação desse não é personalíssima e, por isso, transmite-se aos seus herdeiros e sucessores, nos termos do art. 928 do CC/1916 e da primeira parte do art. 626 do CC/2002. – Em regram, a obrigação do empreiteiro ou construtor não é personalíssima, porquanto a obra pode ser executada por várias pessoas, como ocorre em geral, a exemplo das obras feitas mediante concorrência pública com a participação de várias construtoras e das pequenas construções feitas mediante a escolha do empreiteiro que oferecer o menor preço. – Na presente hipótese, com a morte do construtor, a sua obrigação transmitiu-se aos seus herdeiros, pois a obra não demandava habilidades técnicas exclusivas do falecido. Recurso especial provido” (STJ 3ª T. REsp nº 703.244-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 15.04.2008). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 248, acessado em 21/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Assim discriminam os autores Sebastião de Assis Neto et al, às pp. 625: a.1) Impossibilidade da prestação do fato: pode ocorrer, no entanto, que o descumprimento da obrigação de fazer decorra de impossibilidade justificada pelo devedor. Nesse caso, aplica-se a solução da exoneração da seguinte forma: a.1.1) Impossibilidade sem culpa do devedor: se a impossibilidade de prestar o fato se der sem culpa do devedor, a obrigação se resolve. A regra, contida no art. 248, atende, portanto, a razoabilidade, pois, de qualquer sorte, o devedor não responde, em geral, pelas hipóteses decorrentes de caso fortuito ou força maior. Assim, verba gratia, se um prestador de serviço tem seus instrumentos de trabalho subtraídos, a impossibilidade da prestação se dá sem culpa sua. A.1.2) com culpa do devedor: se, no entanto, a impossibilidade ocorrer por culpa do devedor (ex.: destruição ou perda dos instrumentos de trabalho do prestador de serviço por culpa ou desídia sua), fica este obrigado a responder por perdas e danos. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item a.1.2. Obrigação de fazer infungível, p. 625-626, Comentários ao CC. 248. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 21/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 249. Se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da indenização cabível.

 

Parágrafo único. Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido.

 

De acordo com o julgamento apreciativo de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 249, p. 200-201 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, este artigo trata das obrigações fungíveis – as que podem ser executadas por terceiro -, admitindo que a recusa ou a mora do devedor autoriza o credor a obter a prestação por intermédio da atuação de outra pessoa. A execução do serviço por terceiro haverá de ser custeada pelo que seria pago ao credor. Observe-se que, além da remuneração do terceiro, o devedor inadimplente deverá pagar a indenização das perdas e danos que provocou. Importante alteração desse artigo em relação ao seu equivalente do Código de 1916, é que neste a execução por terceiro impedia a cumulação com o pedido de perdas e danos, enquanto o dispositivo em vigor expressamente autoriza a cumulação. É preciso observar que não se autoriza o credor a postular a devolução do dinheiro pago e, além disso, a condenação do inadimplente a pagar ao terceiro; o presente artigo autoriza a indenização de outros prejuízos que o inadimplemento lhe cause - decorrentes do atraso na conclusão da obrigação de fazer, por exemplo -, mas jamais que se enriqueça à custa do inadimplente.

 

E haveria enriquecimento se ele recebesse de volta o que pagou e ainda obrigasse o inadimplente a pagar ao terceiro o adimplemento da obrigação. Assim sendo, se o terceiro que executar a tarefa devida por ele cobrar preço superior ao que ele recebeu, a diferença correrá por sua conta, na medida em que corresponde a prejuízo do credor, que receberia o serviço pelo preço inferior acordado com o devedor inadimplente.

 

Outra importante novidade está consagrada no parágrafo único desse dispositivo, que deve ser compreendido e interpretado com cautela. Cuida-se da autotutela que já era prevista no Código Civil de 1916 em relação à proteção possessória (art. 502), repetida no parágrafo primeiro do art. 1.210 do Código Civil em vigor. A autotutela é um meio de proteção de direito que dispensa a intervenção judicial. Para ser utilizado, depende da presença dos seguintes requisitos: a) que o caso justifique a urgência; b) que o credor se utilize apenas dos meios necessários indispensáveis para evitar o dano decorrente do inadimplemento do devedor; e c) que não haja condições de obter a intervenção judicial.

 

Tais requisitos resultam da necessidade de limitar à justiça privada as hipóteses excepcionais. Dessa forma, se o cumprimento da obrigação não precisar ser imediato, ou se houver possibilidade de obter a intervenção judi­cial, não há razão para que o credor faça justiça por suas próprias mãos. Se o credor se exceder na execução do fato, não levando em conta que deve fazê-lo do modo menos gravoso para o devedor, poderá haver abuso de direito tal como definido no art. 187 do Código Civil (Cambler, Everaldo Augusto. Comentários ao Código Civil brasileiro. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. III, p. 109). É possível imaginar determinadas hipóteses em que a urgência do cumprimento da prestação torne imperiosa a execução do fato imediatamente: determinado município contrata empresa para executar serviços de reparo no esgoto municipal. Contudo, embora a necessidade do reparo já fosse conhecida, a empresa contratada atrasa o cumprimento de sua tarefa e, em certo fim de semana, o agravamento do problema compromete o bairro residencial servido pela rede de esgoto a ser consertada. A urgência e a impossibilidade de intervenção judicial, bem como os danos consideráveis suportados pelos munícipes, autorizam a municipalidade a mandar outra empresa executar a tarefa devida pela empresa inadimplente, que estará obrigada a suportar o preço pago para o terceiro executor, ressarcindo a credora. Também seria adequado invocar exemplo frequente em nossos tribunais.

 

Aquele em que determinado consumidor não é atendido pelo hospital conveniado com seu plano médico. Em decorrência da urgência do procedimento, poderá exigir tratamento de terceiros, carreando as despesas correspondentes ao administrador do plano, obrigado a lhe dar a indispensável cobertura. Dispositivo equivalente a esse será encontrado no parágrafo único do art. 251 do Código Civil, que se distingue do presente apenas porque se refere à obrigação de não fazer.

 

A regra em exame expressamente autoriza a cumulação dos pedidos de execução e de indenização, sem utilizar a conjunção “ou” do art. 881 do Código Civil de 1916, o qual parecia indicar que as alternativas eram excludentes, i.é, ou o credor postulava a execução ou a indenização, embora seja possível que a execução forçada da obrigação não exclua eventuais prejuízos decorrentes do inadimplemento. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 249, p. 200-201 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 21/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Sob orientação da equipe de Guimarães e Mezzalira, em se tratando de obrigação de fazer fungível, embora não se possa obrigar o devedor a prestar, efetivamente, aquilo a que se obrigou, o devedor terá a prerrogativa de ter a prestação cumprida por outrem à custa do devedor ou ainda se sub-rogar no equivalente ao valor da prestação descumprida. Importante destacar que, em ambos os casos, o credor terá o direito de ser ressarcido de eventuais perdas e danos que a inexecução da obrigação lhe gerou. Entretanto, há que se observar que, embora haja ao credor a faculdade de optar pela conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, prerrogativa semelhante inexiste ao devedor. Em outros termos, diversamente do que há ao credor, não subsiste qualquer alternativa ao devedor na escolha entre cumprir a obrigação de fazer ou arcar com as perdas e danos decorrentes da inexecução: A conversão da obligatio faciendi em perdas e danos dá-se apenas na medida em que seu cumprimento específico importe em alguma espécie de violência física ao devedor. Não sendo esse o caso, é a execução da obrigação de fazer que deve prevalecer. Como exemplo de tanto, pode-se mencionar a possibilidade de que o juiz supra a obrigação do devedor e emita a declaração de vontade suficiente para a celebração de determinado negócio jurídico. Nesses casos, a sentença sub-roga-se no lugar do ato devido.

 

Dado que a autotutela, em regra, não é admitida no sistema nacional, o credor terá de recorrer ao poder jurisdicional, para fazer cumprir eventual prestação de fazer a que o devedor se recuse a executar. Todavia, o parágrafo único do artigo 249 excepciona essa regra geral, permitindo que o credor, em caso de urgência (i.é, quando não houver tempo suficiente para que se aguarde a prolação de uma sentença, sem prejuízo de seu direito), busque o cumprimento da prestação de fazer por si ou por terceiro, com ulterior possibilidade de cobrar perdas e danos do devedor. Note-se que, se o credor se exceder na execução de tal ato, ele poderá ser apenado por abuso de direito, na forma do artigo 187 do Código Civil. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 249, acessado em 21/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na linha de raciocínio dos autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, comentários ao CC art. 249, p 626, item b) Obrigação de fazer fungível: se o fato puder ser prestado e o devedor se recusar a prestá-lo ou incorrer em mora, o credor pode mandar executá-lo às suas custas, ou seja, caso o credor já tenha pago a sua contraprestação, terá o direito à restituição. Além disso, terá o credor, ainda, direito à indenização por perdas e danos. Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de autorização judicial, mandar executar o fato, sendo depois ressarcido pelo devedor (art. 249).  (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item b) Obrigação de fazer infungível, p. 626, Comentários ao CC. 249. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 21/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 8 de junho de 2022

Código Civil Comentado – Art. 245, 246 Da Obrigação de Dar Coisa Incerta – VARGAS, Paulo S. - digitadorvargas@outlook.com – paulonattvargas@gmail.com - Whatsap: +55 22 98829-9130 Facebook: VARGAS DIGITADOR

 

Código Civil Comentado – Art. 245, 246
Da Obrigação de Dar Coisa Incerta

VARGAS, Paulo S. - digitadorvargas@outlook.com
paulonattvargas@gmail.com -
Whatsap: +55 22 98829-9130
Facebook: VARGAS DIGITADOR

Parte Especial Livro I Do Direito Das Obrigações

Título I Das Modalidades Das Obrigações

Capítulo I Das Obrigações de Dar

Seção II - Da Obrigação de Dar Coisa Incerta

(arts. 243 até 246)

 

Art. 245. Cientificado da escolha o credor, vigorará o disposto na Seção antecedente.

 

Dando continuidade à sua apreciação ao artigo anterior, Hamid Charaf Bdine Jr, nos comentários ao CC art. 245, p. 195 do Código Civil Comentado, explica: “Após a escolha do bem a ser entregue, ele estará individualizado e deixará de ser incerto. Em consequência, as regras que se aplicam à solução do cumprimento da obrigação são aquelas da seção antecedente destinadas às obrigações de dar coisa certa”. O dispositivo deixa assentado que somente após a cientificação do credor tornar-se-á certa a coisa objeto da obrigação. O art. 876 do Código Civil de 1916 estabelecia a própria escolha como momento a partir do qual incidiam as regras da seção anterior, o que permitia a interpretação de que o devedor podia fazer a escolha e aplicar as regras da obrigação de dar coisa certa antes mesmo de o credor saber qual bem especificamente lhe seria entregue. Outra questão que o dispositivo pode suscitar é o fato de ele cuidar apenas da identificação da escolha ao credor, sem disciplinar os casos em que a faculdade de escolher é dele, e não do devedor. É certo, porém, que nesse caso a escolha do credor tornará certa a obrigação apenas a partir do momento em que for cientificado o devedor. Até essa oportunidade, a escolha feita pelo credor não pode ser oponível ao devedor. Do mesmo modo, acrescenta Renan Lotufo, “se a concentração for da competência do credor ou de terceiro aplicar-se-á outra regra, qual seja, ela somente obterá eficácia no instante em que for comunicada ao devedor ou a ambos, quando a escolha for de terceiro. Do contrário, conforme Antunes Varela (Das obrigações em geral, p. 850), o devedor não saberia que coisas lhe podiam ser exigidas, nem o credor com que coisas poderia contar” (Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 44). Não se diga, porém, que a cientificação da escolha referida no presente dispositivo seja suficiente para caracterizar a mora. É possível que o momento da escolha não coincida com o do cumprimento efetivo, de maneira que, a despeito de a escolha ter sido cientificada ao interessado, ele ainda não fará jus à entrega. Assim, se um criador de cães é obrigado a entregar um animal ao adquirente no prazo de noventa dias, o fato de lhe comunicar qual o cão que lhe será entregue não implica que não possa aguardar o decurso do prazo estipulado para fazer a entrega. Nessa hipótese, é válida a escolha e a obrigação passa a ser de entrega de coisa certa. As regras a respeito da mora e do inadimplemento absoluto passam a ser as relativas à obrigação de dar coisa certa (arts. 233 e segs. do CC). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 245, p. 196 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 20/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

No entender da equipe de Guimarães e Mezzalira, o ato da escolha é, conforme determinado no artigo seguinte (art. 246), o divisor de águas nas obrigações de entregar coisa incerta. Antes da individuação, o devedor continua obrigado a cumprir a obrigação, independentemente de qualquer dano que se abata à coisa: após a escolha, havendo a perda da coisa sem que haja culpa ou dolo de sua parte, a obrigação resolve-se. Desse modo, faz-se imperioso que o ato da escolha seja positivado de maneira inequívoca. Não basta que o devedor separe o bem a ser entregue ao credor, mas que, efetivamente, venha a coloca-lo à disposição do credor. Inexistindo indicação diversa em contrato, o credor deverá ser notificado da escolha, por via judicial ou extrajudicial.

 

Com a escolha, a relação obrigacional passa a ser regida pelas normas atinentes às obrigações de dar coisa certa (CC, arts. 233 e 242). Nesse sentido, Pereira destaca que o estado de indeterminação “/c/essará, pois, com a escolha, a qual se verifica e se reputa consumada, tanto no momento em que o devedor efetiva a entrega real da coisa, como ainda quando diligencia praticar o necessário à prestação” (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria geral das obrigações, Rio de Janeiro: Forense, p. 56). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 245, acessado em 20/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na toada dos autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, depois da escolha, a obrigação passa a ser de dar coisa certa, aplicando-se as regras a ela atinentes, de acordo com o art. 245; entretanto, tal característica somente ocorre a partir da ciência do credor acerca da escolha. Em função disso, antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito (art. 246). Nesse caso, tem o devedor a obrigação de garantir ao credor a entrega da coisa de acordo com o gênero e quantidade indicados no negócio jurídico. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.3.1. Concentração, p. 620, Comentários ao CC. 245. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 20/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito.

 

Na balada dos comentários do artigo anterior, Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 246, p. 196-197 do Código Civil Comentado continua: Até o momento da escolha - ou, mais especificamente, como assegura o artigo antecedente, até a cientificação da escolha -, não há individualização do bem a ser entregue pelo devedor, de modo que não é possível admitir o perecimento ou a deterioração para a resolução da obrigação. Com efeito, até a escolha, o bem indicado pelo gênero e pela quantidade pode ser encontrado para a satisfação da obrigação devida, sendo irrelevante que o bem separado pelo devedor, com o objetivo de dar cumprimento à obrigação, venha a se perder ou deteriorar. É essencial para que a escolha produza efeitos em relação ao credor que ela seja exteriorizada, permitindo que se possa saber exatamente qual o bem que será entregue ao credor (art. 245 do CC). Adverte Caio Mário da Silva Pereira que somente por exceção se poderá dizer que determinado gênero desapareceu completamente (Instituições de direito civil, 20. ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 57). Enquanto houver possibilidade de encontrar quantidade suficiente do gênero da coisa indicada para cumprimento da prestação, o adimplemento será possível. Talvez a regra não possa ser aplicada com extremo rigor em hipóteses específicas, em que, a despeito de a obrigação recair sobre a entrega de coisa incerta e de o ajuste ser celebrado entre as partes, seja possível extrair que a universalidade sobre a qual recairá a escolha integra gênero restrito (Miranda, Pontes de. Tratado de direito privado. Campinas, Bookseller, 2003, t. XXII, p. 134-5). Nesse caso, se todos os bens perecerem ou se deteriorarem sem culpa do devedor, será aplicável à hipótese a solução própria das obrigações de dar coisa certa (arts. 234 e 235 do CC) (Pereira, Caio Mário. Op. cit., p. 57). Caso o perecimento ou a deterioração resultarem de culpa do devedor, as soluções serão as que se estabelecem nos arts. 234, segunda parte, e 236. Basta imaginar que determinada viúva de um marceneiro se obriga a entregar ao credor uma das várias mesas confeccionadas por ele. No entanto, antes da data da entrega, os móveis são furtados, de maneira que a infungibilidade da obrigação irá impedi-la de cumprir tal obrigação, sendo irrelevante que se tratasse de obrigação de dar coisa incerta, determinada apenas pelo gênero e pela quantidade (Cruz, Gisela Sampaio da. “Obrigações alternativas e com faculdade alternativa. Obrigações de meio e de resultado”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 150-1). O tema também foi enfrentado por Gustavo Bierambaum que aponta outra exceção à regra em exame: mercadoria que deixa de ser fabricada entre o momento da celebração do negócio e o da concentração - momento da identificação da coisa, que passa a ser certa - (“Classificação: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 132). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 246, p. 197 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 20/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Nas elucubrações da equipe de Guimarães e Mezzalira, das obrigações de dar coisa incerta, a posição do devedor com relação aos riscos da coisa agrava-se. Sob essa modalidade, até o momento da escolha (ou concentração) – em que os bens a serem entregues serão individualizados -, todos os riscos, até mesmo aqueles de natureza fortuita ou de força maior, ficam por conta do devedor. Efetuada a escolha, passa-0se a aplicar as regras atinentes à entrega de coisa certa (CC, arts. 233 a 242). Essa disciplina é reflexo do princípio segundo o qual o gênero nunca perece genus nunquam perit). Sobre esse aspecto, Beviláqua explicava que “”[s]e a coisa incerta fôr determinada pelo gênero, não perecerá, porque o gênero não perece (genera nor pereunt). Antes de individualizada a coisa pela escolha do credor ou do devedor, conforme a este ou aquele competir fazê-la, não há uma coisa, que se diga objeto da prestação, que se possa, determinadamente, exigir ao devedor. Se alguma do mesmo gênero da prometida perecer, não é a devida, porque ainda nenhuma, precisamente o é. Depois da escolha, a coisa individualiza-se, torna-se certa”. (Beviláqua, Clóvis. Código civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado. Rio de Janeiro, 1984, p. 12).

 

Assim, se o devedor obrigou-se a entregar mil sacas de farinha de trigo, não poderá esquivar-se do cumprimento da obrigação, alegando que não as tem em seu poder ou de que elas tenham se perdido em parte ou no todo. De outro modo, situação idêntica não se repete, caso o devedor tenha se obrigado a entregar quadro de pintor famoso. Nessa hipótese, perdendo-se o quadro, resolve-se a situação, variando-se as consequências conforme as regras para a obrigação de dar coisa certa.

 

Deve-se notar, no entanto, que o princípio segundo o qual o gênero não perece comporta temperamentos. Nos casos em que, embora a obrigação seja genérica, porém o gênero seja limitado (genus limitatum), o perecimento ou a inviabilidade de todos os exemplares daquele acarretará na extinção da obrigação. (Monteiro, Washington de Barros. Curso de Direito Civil, Saraiva: São Paulo 2001, p. 85).

 

Assim, são considerados bens de gênero limitado os bois de determinada fazenda, o vinho de certa vindima, os livros de determinada edição, entre outros. ((Monteiro, Washington de Barros. Curso de Direito Civil, Saraiva: São Paulo 2001, p. 85).

 

Por óbvio, em todos esses exemplos, a extinção, sem culpa do devedor, daquele grupo de coisas entre as quais o objeto da obrigação estava inserido acarreta em sua extinção. A esse respeito, gomes elogia a relação do Código Civil alemão o qual esclareceu que a responsabilidade do devedor nestes casos persistiria enquanto fosse possível uma prestação do gênero. (Gomes, Orlando. Obrigações. Rio de Janeiro: Forense, p. 230). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 246, acessado em 20/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Em função disso, Sebastião de Assis Neto et al, como já apontado acima, antes da escolha não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito (art. 246). Nesse caso, tem o devedor a obrigação de garantir ao credor a entrega da coisa de acordo com o gênero e quantidade indicados no negócio jurídico.

 

Com efeito, obrigando-se o devedor, por exemplo, à entrega de uma tonelada de soja, o objeto da obrigação é coisa incerta, razão pela qual a parte se obriga à entrega genérica da mercadoria, justamente em virtude da disponibilidade de seu estoque. Por isso antes do adquirente escolher a coisa a ser entregue, não pode haver alegação de perda ou deterioração, pois, antes da escolha, o interesse do comprador não é dirigido à mercadoria que tenha eventualmente perecido ou deteriorado, mas sobre algo indicado apenas pelo gênero, quantidade e qualidade. Por isso, o adquirente não pode sofrer com a perda da coisa genérica ainda não especificada (regra genus non perit). (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.3.1. Concentração, p. 620, Comentários ao CC. 246. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 20/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).