Código Civil
Comentado - Art. 397, 398, 399
- Da
Mora – VARGAS, Paulo S. R.
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Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título IV
– Do Inadimplemento das Obrigações
(art. 394
a 401) Capítulo II – Da Mora –
Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva
e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.
Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui
mediante interpelação judicial ou extrajudicial.
A regra da mora real
exige que se contenham os seguintes requisitos: a¹) Obrigação Positiva, ou
seja, não se fala em mora real se o caso é de obrigação negativa ou de não
fazer, caso em que o inadimplemento se caracteriza não por inércia (falta de
adimplemento) e sim por ação (realização do fato a que o devedor se comprometeu
a abster-se); (a²) obrigação líquida, i.é, a quantia a ser paga deve ser
certa e determinada, pois se o valor da prestação não está definido ou carece
de determinação por ação das partes, descabe falar em mora ex re.
Não obstante a regra
de que na responsabilidade contratual, os juros de mora se contam a partir da
citação e a correção monetária desde
ajuizamento da ação, a Súmula 580 do STJ deu tratamento diverso quando
se tratar de pagamento da indenização ao seguro DPVAT: “Correção monetária nas
indenizações do seguro DPVAT por mote ou invalidez, prevista no § 7º do art. 5º
da Lei n. 6.194?1974, redação dada pela Lei n. 11.482/2007, incide desde a data
do evento danoso.”; (a³) Termo predefinido para vencimento, quer dizer,
o título obrigacional deve prever o termo inicial para surgimento do direito do
credor de exigir o adimplemento.
Em determinados
casos, no entanto, não se admite que o devedor seja constituído em mora por
simples implemento do termo pré-definido, ainda que a obrigação seja positiva e
líquida. Tratam-se de casos em que o tratamento dado pela própria lei é
diversificado, a fim de conferir especial proteção ao devedor em situações
específicas. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo,
em Manual de Direito Civil, Volume Único, Tópico: I.I.2.1.
Espécie de mora, p. 743, Comentários ao CC 397. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 29/05/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Na forma como
entende Hamid Charaf Bdine
Jr, comentários ao CC art. 397,
p. 422-423, Código Civil Comentado, “Se a obrigação é positiva e líquida e tem termo (prazo
certo) para ser adimplida, verifica-se a mora na ocasião em que o cumprimento
havia de ter sido implementado. A obrigação é positiva quando exige uma conduta
comissiva do devedor - dar ou fazer -, pois, nas obrigações negativas,
aplica-se à mora a regra prevista no art. 390, compreendida entre as
disposições gerais aplicáveis ao inadimplemento absoluto e à mora. A obrigação
é líquida nos casos em que for certa ou determinada, sem necessidade da
elaboração de cálculo, como estava expresso no art. 1.533 do Código Civil de
1916, que não tem correspondência no Código de 2002 - valendo notar que a
necessidade de simples cálculos aritméticos não acarretam iliquidez.
Segundo o parágrafo único deste artigo,
a interpelação extrajudicial ou judicial do devedor só será necessária nos
casos em que não houver termo previsto para o adimplemento. Por essa razão, a
jurisprudência que determina indistintamente serem os juros incidentes desde a
citação, nos casos de inadimplemento contratual, não parece dar interpretação
adequada a este dispositivo.
A mora verifica-se com a citação
(efeito, aliás, do art. 219 do Código de Processo Civil/1973, art. 240 no
CPC/2015, nota VD) nos casos em que a obrigação não é positiva e líquida
- pois há necessidade de seu reconhecimento ou da fixação de seu valor. Mas,
caso se trate de decisão que se limita a reconhecer o inadimplemento no termo
previsto, a mora retroage ao momento em que houve o inadimplemento, que haveria
de ser o termo inicial para cálculo de juros.
O fato de haver uma decisão judicial
condenando o devedor não significa que a obrigação já não fosse positiva e
líquida, mas apenas que o devedor resistiu de modo injustificado a seu
cumprimento, não havendo razão para os juros de mora só fluírem da citação,
pois a mora já se havia perpetrado anteriormente, nos termos exatos deste
dispositivo.
Se a obrigação é positiva e líquida -
como a de pagar a mensalidade escolar na data prevista no contrato -, o devedor
estará em mora de pleno direito 110 termo estabelecido (o dia do vencimento),
independentemente de qualquer outra providência do credor. Mas se não houver
termo estabelecido, o devedor só estará em mora após ser constituído por
interpelação judicial ou extrajudicial. Essa é a denominada mora ex persona,
que depende de providência do credor. Por exemplo, no comodato por prazo
indeterminado, o esbulho só se caracteriza depois que o comodante notifica o
comodatário, concedendo-lhe o prazo de trinta dias para desocupar o imóvel
(mora ex persona).
O art. 14 do Decreto-lei n. 58/37 e o
art. 32 da Lei n. 6.766/69, que regulam loteamentos e exigem que os adquirentes
de imóveis sejam notificados para pagar as prestações, ainda que haja valor
certo das parcelas e data fixada para o pagamento, transformaram em mora ex
persona o que poderia ser mora ex re. Disposição semelhante a respeito dos
imóveis não loteados consta cio Decreto-lei n. 745/69, que cuida da venda de
imóveis não loteados.
A Súmula n. 76 do Egrégio Superior
Tribunal de Justiça proclamou o entendimento de que “a falta de registro do
compromisso de compra e venda de imóvel não dispensa a prévia interpelação para
constituir em mora o devedor”. Nesses casos, a notificação transforma a mora em
inadimplemento absoluto e impede a purgação no prazo de resposta. Diante do
teor da referida súmula, nem mesmo a regra do art. 219 do Código de Processo
Civil, que confere à citação força de constituir o devedor em mora, é
suficiente para dispensar a notificação do comprador.
Ao se referir apenas a interpelação
judicial ou extrajudicial, o parágrafo único do artigo cm exame não elimina a
adequação da notificação e do protesto - expressões utilizadas no art. 960 do
Código Civil de 1916, que não foram repetidas no diploma legal em vigor - para
constituir o devedor em mora, pois as expressões são genéricas e compreendem
toda e qualquer forma capaz de levar ao devedor a notícia formal de
descumprimento da obrigação.
Segundo Judith Martins-Costa, invocando
Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, interpelação, notificação,
protesto ou citação judicial podem constituir o devedor em mora (Comentários
ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. II, p. 289).
Renan Lotufo, contudo, em face da distinção formal de interpelação,
notificação e protesto no Código de Processo Civil - Seção X, Capítulo II,
do Título Único do Livro III - sustenta o contrário (Código Civil comentado.
São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 448). (Hamid Charaf Bdine Jr,
comentários ao CC art. 397,
p. 422-423, Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406
de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf,
vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed.
Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações. Nota VD).
Seguindo a lição da equipe de Guimarães
e Mezzalira: “Para que se configure a mora do devedor (mora solvendi ou
devendi), três requisitos são necessários: exigibilidade imediata da
obrigação, inexecução culposa e constituição em mora. A esse respeito, vale
destacar que é o requisito da exigibilidade que requer que a obrigação seja
líquida (valor da prestação já apurado) e certa (a prestação já contém todos os
seus elementos específicos)”.
A necessidade de constituição em mora
variará conforme a obrigação seja ex persona ou ex re. Na
primeira, inexiste um termo certo para que o devedor realize a prestação ou que
o credor a receba. Assim, para que a mora se constitua, haverá a necessidade de
que haja a interpelação da parte inadimplente e seus efeitos terão início ex
nunc (isto é, contados a partir da intimação). De outro lado, a mora
ex re constitui-se automaticamente, sem que haja a necessidade de
interpelação da parte em mora. São hipóteses de mora ex re: (i) o
descumprimento de obrigações negativas, quando há o dever de não praticar
determinado ato; (ii) nos casos de prática de ato ilícito, em que o dever de
reparar surge na data em que houve a violação do direito (CC, art. 398); e
(iii) violação de obrigação positiva e líquida, no seu termo, em decorrência da
regra dies interpellat pro homine.
Pereira destaca: a regra dies
interpellat pro homine não deve ser absoluta em todos os casos, ressaltando
a necessidade de que haja seu temperamento, quando houver necessidade de que
sejam praticados atos específicos pelas partes. Assim, ilustrativamente,
destaca negócio de compra e venda de imóvel, em que, a despeito do vencimento
do termo assinalado, é necessário que o credor interpele o devedor, para
indicar o registro onde será passada a escritura definitiva, para que apresente
determinados documentos etc. O autor menciona ainda as dívidas quesíveis, em
que o devedor não poderá ser constituído em mora, enquanto não se positiva a
atitude do credor de ir procurar pela prestação devida. (Pereira, Caio Mário da
Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, p. 319).
O protesto de título de crédito também é
admitido como forma de constituição em mora. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e
Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC
397, acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Art. 398. Nas obrigações provenientes de ato
ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou.
No lecionar de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao
CC art. 397, p. 422-423, Código
Civil Comentado: “Haverá
mora ex re quando houver prática de ato ilícito. Este artigo do Código
Civil fixa como o momento da prática do ato, aquele em que o devedor é
considerado em mora. Em consequência disso, a Súmula n. 54 do Superior Tribunal
de Justiça deixou assentado que os juros moratórios fluem do evento danoso nos
casos de responsabilidade aquiliana”. Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC
art. 398, p. 427, Código
Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord.
Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual.
- Barueri, SP, ed. Manole, 2010.
Acessado em 29/05/2022,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
O que consta na
doutrina do relator Ricardo Fiuza, tão somente ateve-se ao que foi afirmado na
anotação ao art. 394, na afirmação constituída do pressuposto da mora
solvendi na inexecução culposa da obrigação pelo devedor. Sem culpa do
devedor, não se há que falar em mora. (Direito Civil - doutrina,
Ricardo Fiuza –
comentários ao Art. 398, p. 215, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf. Vários
Autores 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 29/05/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Por conta do entendimento da
Equipe de Guimarães e Mezzalira, o artigo trata, expressamente, de hipótese
legal de mora ex re. A esse respeito, vide comentários ao art. 397.
“Súmula STJ 154. Os juros
moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade
extracontratual”. (Luiz
Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com,
nos comentários ao CC 398, acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).