domingo, 14 de agosto de 2022

Código Civil Comentado - Art. 397, 398, 399 - Da Mora – VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com Whatsapp 22988299130

 

Código Civil Comentado - Art. 397, 398, 399
- Da Mora – VARGAS, Paulo S. R.
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Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título IV – Do Inadimplemento das Obrigações

(art. 394 a 401) Capítulo II – Da Mora –

 

Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor.

 

Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial.

 Na ilustração dos autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Tópico: I.I.2.I. Espécie de mora, p. 743, Comentários ao CC 397: Mora, nos termos do art. 394, é ausência de realização do pagamento no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer, seja por desídia do devedor ou do credor. Por isso a mora pode ser: a) mora solvendi ou mora debitoris: é a mora do devedor, que, de acordo com a previsibilidade contratual pode ser: (a¹) mora ex re: ou mora real, ocorre quando se considera o devedor em mora pelo simples vencimento da obrigação no seu termo, em razão da antiga regra dies interpellat pro homine. A respeito, disciplina o art. 397, caput, que o inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu turno, constitui de pleno direito que em mora o devedor; (a²) mora ex personae ou pessoal ocorre quando não existe termo certo para o cumprimento da obrigação, dependendo, portanto, de interpretação do credor ao devedor. O art. 397, parágrafo único, sobre o tema, considera que não havendo termo, a mora se institui mediante interpelação judicial ou extrajudicial.  

 

A regra da mora real exige que se contenham os seguintes requisitos: a¹) Obrigação Positiva, ou seja, não se fala em mora real se o caso é de obrigação negativa ou de não fazer, caso em que o inadimplemento se caracteriza não por inércia (falta de adimplemento) e sim por ação (realização do fato a que o devedor se comprometeu a abster-se); (a²) obrigação líquida, i.é, a quantia a ser paga deve ser certa e determinada, pois se o valor da prestação não está definido ou carece de determinação por ação das partes, descabe falar em mora ex re.

 

Não obstante a regra de que na responsabilidade contratual, os juros de mora se contam a partir da citação e a correção monetária desde  ajuizamento da ação, a Súmula 580 do STJ deu tratamento diverso quando se tratar de pagamento da indenização ao seguro DPVAT: “Correção monetária nas indenizações do seguro DPVAT por mote ou invalidez, prevista no § 7º do art. 5º da Lei n. 6.194?1974, redação dada pela Lei n. 11.482/2007, incide desde a data do evento danoso.”; (a³) Termo predefinido para vencimento, quer dizer, o título obrigacional deve prever o termo inicial para surgimento do direito do credor de exigir o adimplemento.

 

Em determinados casos, no entanto, não se admite que o devedor seja constituído em mora por simples implemento do termo pré-definido, ainda que a obrigação seja positiva e líquida. Tratam-se de casos em que o tratamento dado pela própria lei é diversificado, a fim de conferir especial proteção ao devedor em situações específicas. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Tópico: I.I.2.1. Espécie de mora, p. 743, Comentários ao CC 397. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na forma como entende Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 397, p. 422-423, Código Civil Comentado, “Se a obrigação é positiva e líquida e tem termo (prazo certo) para ser adimplida, verifica-se a mora na ocasião em que o cumprimento havia de ter sido implementado. A obrigação é positiva quando exige uma conduta comissiva do devedor - dar ou fazer -, pois, nas obrigações negativas, aplica-se à mora a regra prevista no art. 390, compreendida entre as disposições gerais aplicáveis ao inadimplemento absoluto e à mora. A obrigação é líquida nos casos em que for certa ou determinada, sem necessidade da elaboração de cálculo, como estava expresso no art. 1.533 do Código Civil de 1916, que não tem correspondência no Código de 2002 - valendo notar que a necessidade de simples cálculos aritméticos não acarretam iliquidez.

 

Segundo o parágrafo único deste artigo, a interpelação extrajudicial ou judicial do devedor só será necessária nos casos em que não houver termo previsto para o adimplemento. Por essa razão, a jurisprudência que determina indistintamente serem os juros incidentes desde a citação, nos casos de inadimplemento contratual, não parece dar interpretação adequada a este dispositivo.

 

A mora verifica-se com a citação (efeito, aliás, do art. 219 do Código de Processo Civil/1973, art. 240 no CPC/2015, nota VD) nos casos em que a obrigação não é positiva e líquida - pois há necessidade de seu reconhe­cimento ou da fixação de seu valor. Mas, caso se trate de decisão que se limita a reconhecer o inadimplemento no termo previsto, a mora retroage ao momento em que houve o inadimplemento, que haveria de ser o termo inicial para cálculo de juros.

 

O fato de haver uma decisão judicial condenando o devedor não significa que a obrigação já não fosse positiva e líquida, mas apenas que o devedor resistiu de modo injustificado a seu cumprimento, não havendo razão para os juros de mora só fluírem da citação, pois a mora já se havia perpetrado anteriormente, nos termos exatos deste dispositivo.

 

Se a obrigação é positiva e líquida - como a de pagar a mensalidade escolar na data prevista no contrato -, o devedor estará em mora de pleno direito 110 termo estabelecido (o dia do vencimento), independentemente de qualquer outra providência do credor. Mas se não houver termo estabelecido, o devedor só estará em mora após ser constituído por interpelação judicial ou extrajudicial. Essa é a denominada mora ex persona, que depende de providência do credor. Por exemplo, no comodato por prazo indeterminado, o esbulho só se caracteriza depois que o comodante notifica o comodatário, concedendo-lhe o prazo de trinta dias para desocupar o imóvel (mora ex persona).

 

O art. 14 do Decreto-lei n. 58/37 e o art. 32 da Lei n. 6.766/69, que regulam loteamentos e exigem que os adquirentes de imóveis sejam notificados para pagar as prestações, ainda que haja valor certo das parcelas e data fixada para o pagamento, transformaram em mora ex persona o que poderia ser mora ex re. Disposição semelhante a respeito dos imóveis não loteados consta cio Decreto-lei n. 745/69, que cuida da venda de imóveis não loteados.

 

A Súmula n. 76 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça proclamou o entendimento de que “a falta de registro do compromisso de compra e venda de imóvel não dispensa a prévia interpelação para constituir em mora o devedor”. Nesses casos, a notificação transforma a mora em inadimplemento absoluto e impede a purgação no prazo de resposta. Diante do teor da referida súmula, nem mesmo a regra do art. 219 do Código de Processo Civil, que confere à citação força de constituir o devedor em mora, é suficiente para dispensar a notificação do comprador.

 

Ao se referir apenas a interpelação judicial ou extrajudicial, o parágrafo único do artigo cm exame não elimina a adequação da notificação e do protesto - expressões utilizadas no art. 960 do Código Civil de 1916, que não foram repetidas no diploma legal em vigor - para constituir o devedor em mora, pois as expressões são genéricas e compreendem toda e qualquer forma capaz de levar ao devedor a notícia formal de descumprimento da obrigação.

 

Segundo Judith Martins-Costa, invocando Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, interpelação, notificação, protesto ou citação judicial podem constituir o devedor em mora (Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. II, p. 289). Renan Lotufo, contudo, em face da distinção formal de interpelação, notificação e protesto no Código de Processo Civil - Seção X, Capítulo II, do Título Único do Livro III - sustenta o contrário (Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 448). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 397, p. 422-423, Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Seguindo a lição da equipe de Guimarães e Mezzalira: “Para que se configure a mora do devedor (mora solvendi ou devendi), três requisitos são necessários: exigibilidade imediata da obrigação, inexecução culposa e constituição em mora. A esse respeito, vale destacar que é o requisito da exigibilidade que requer que a obrigação seja líquida (valor da prestação já apurado) e certa (a prestação já contém todos os seus elementos específicos)”.

 

A necessidade de constituição em mora variará conforme a obrigação seja ex persona ou ex re. Na primeira, inexiste um termo certo para que o devedor realize a prestação ou que o credor a receba. Assim, para que a mora se constitua, haverá a necessidade de que haja a interpelação da parte inadimplente e seus efeitos terão início ex nunc (isto é, contados a partir da intimação). De outro lado, a mora ex re constitui-se automaticamente, sem que haja a necessidade de interpelação da parte em mora. São hipóteses de mora ex re: (i) o descumprimento de obrigações negativas, quando há o dever de não praticar determinado ato; (ii) nos casos de prática de ato ilícito, em que o dever de reparar surge na data em que houve a violação do direito (CC, art. 398); e (iii) violação de obrigação positiva e líquida, no seu termo, em decorrência da regra dies interpellat pro homine.

 

Pereira destaca: a regra dies interpellat pro homine não deve ser absoluta em todos os casos, ressaltando a necessidade de que haja seu temperamento, quando houver necessidade de que sejam praticados atos específicos pelas partes. Assim, ilustrativamente, destaca negócio de compra e venda de imóvel, em que, a despeito do vencimento do termo assinalado, é necessário que o credor interpele o devedor, para indicar o registro onde será passada a escritura definitiva, para que apresente determinados documentos etc. O autor menciona ainda as dívidas quesíveis, em que o devedor não poderá ser constituído em mora, enquanto não se positiva a atitude do credor de ir procurar pela prestação devida. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, p. 319).

 

O protesto de título de crédito também é admitido como forma de constituição em mora. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 397, acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 398. Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou.

 

No lecionar de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 397, p. 422-423, Código Civil Comentado: “Haverá mora ex re quando houver prática de ato ilícito. Este artigo do Código Civil fixa como o momento da prática do ato, aquele em que o devedor é considerado em mora. Em consequência disso, a Súmula n. 54 do Superior Tribunal de Justiça deixou assentado que os juros moratórios fluem do evento danoso nos casos de responsabilidade aquiliana”. Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 398, p. 427, Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

O que consta na doutrina do relator Ricardo Fiuza, tão somente ateve-se ao que foi afirmado na anotação ao art. 394, na afirmação constituída do pressuposto da mora solvendi na inexecução culposa da obrigação pelo devedor. Sem culpa do devedor, não se há que falar em mora. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao Art. 398, p. 215, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf. Vários Autores 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Por conta do entendimento da Equipe de Guimarães e Mezzalira, o artigo trata, expressamente, de hipótese legal de mora ex re. A esse respeito, vide comentários ao art. 397.

 

“Súmula STJ 154. Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual”. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 398, acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Código Civil Comentado - Art. 394, 395, 396 - Da Mora – VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com Whatsapp 22988299130

 

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Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título IV – Do Inadimplemento das Obrigações

(art. 394 a 401) Capítulo II – Da Mora –

 

Art. 394. Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.

 Veja as considerações de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 394, p. 415-416, Código Civil Comentado: Os requisitos para caracterizar a mora do devedor são os seguintes: exigibilidade da prestação, i.é, o vencimento de dívida líquida e certa; inexecução culposa; e constituição em mora quando expersona, pois em mora ex re no dia do vencimento já se considera o devedor inadimplente.

 

O cumprimento imperfeito da obrigação e o atraso em seu adimplemento caracterizam mora. Assim, haverá mora não apenas quando ocorrer atraso no cumprimento da obrigação, mas também quando ele ocorrer em lugar ou de forma diversa daquela estabelecida pela lei ou pela convenção.

 

Acrescente-se que a quantidade não se inclui entre as hipóteses de defeitos capazes de caracterizar a mora, porque, no que diz respeito a ela, haverá inadimplemento parcial ou total, e não mora (Lotufo, Renan. Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 442). A culpa é requisito para identificação da mora, ainda que isso não esteja consignado expressamente no art. 394 do Código Civil. A culpa como elemento da mora encontra fundamento no art. 396. No Direito brasileiro, a mora objetiva - sem culpa -, não é possível, na medida em que ela se distingue do mero retardamento - este sim, corresponde ao mero atraso, independente da culpa (Lotufo, Renan. Op. cit., p. 442).

 

Do retardamento, porém, resultam efeitos jurídicos. O principal deles é que gera presunção de culpa do devedor, de modo que, se houver atraso, é lícito presumir que haja culpa, cabendo ao devedor o ônus de provar que não agiu com culpa (Lotufo, Renan. Op. cit., p. 442). Judith Martins-Costa, todavia, sustenta que a culpa não integra o conceito de mora (Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. II, p. 232). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 394, p. 415-416, Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Em relação ao descumprimento das obrigações, dizem os autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Tópico: I. Inadimplemento das Obrigações, p. 739, Comentários ao CC 394:

 

I.1. Disposições gerais sobre o descumprimento: Por inferência lógica, toda obrigação, qualquer que seja sua fonte, nasce para que seja cumprida ou adimplida. A consequência natural do surgimento do vínculo é o convencimento do devedor quando a necessidade de satisfazer a prestação em favor do devedor.

 

Como já visto no capítulo anterior, as formas pelas quais se fazem extinguir o vínculo é, de consequência, a obrigação, através dos diversos meios previstos pelo ordenamento jurídico.

 

Não é natural, portanto, que a obrigação fique sem cumprimento. É como se tivesse um rompimento de ordem jurídica toda vez que alguém falta ao cumprimento da prestação, o que, embora possa parecer importante apenas para o credor, culmina por interessar a toda a sociedade, tendo em vista a necessidade de dar efeito pedagógico ao direito e às suas normas sancionatórias.

 

Por isso, o descumprimento da obrigação importa, nos termos do art. 389, na responsabilidade contratual do devedor, que deverá pagar ao credor perdas e danos, mas juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos e honorários de advogado.

 

Existe discussão a respeito do alcance da expressão honorários de advogado contida no dispositivo legal.

 

Em primeiro plano, aderimos ao posicionamento de que se tratam, aí, dos honorários contratados entre cliente e advogado, e não aos honorários de sucumbência definidos pelo art. 85 do Código de Processo Civil de 2015 (CPC-1973, art. 20). É que, a bem da verdade, o honorários sucumbenciais são devidos para o caso de demanda judicial, enquanto a norma de direito material vigora no plano material, em que ocorre cobrança judicial, enquanto a norma de direito material vigora no plano material, em que ocorre cobrança extrajudicial promovida por profissional de advocacia. Os gastos que o credor teve para promover essa cobrança, por questão de justiça, devem ser mesmo ressarcidos, já que se trata de ato necessário ao recebimento provocado pela desídia do devedor em dar cumprimento à sua obrigação.

 

Por outro lado, registra-se, também, a discordância dos autores, quanto ao Enunciado 161 da III Jornada do CJF, que concluiu que “os honorários advocatícios previstos nos arts. 389 a 404 do Código Civil apenas têm cabimento quando ocorre a efetiva atuação profissional do advogado”.

 

A disposição é importante para não se desvirtuar a norma, pois não se pode confundir a atuação do advogado com a de cobradores profissionais e de firmais de cobrança. Veja-se que o dispositivo legal visa garantir retribuição ao profissional do direito, de forma específica.

 

Importante também abrir aqui um parêntese para refletir a respeito da incidência do art. 51, XII do Código de Defesa do Consumidor – nas relações de consumo – quando se pretende cobrar, em detrimento do consumidor, honorários de advogado por cobrança do cumprimento da sua prestação. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Tópico: I. Inadimplemento das Obrigações, p. 739, Comentários ao CC 394. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Segundo apreciação da equipe de Guimarães e Mezzalira, a mora se dá com o retardamento injustificado por uma das partes do liame obrigacional, no que se refere ao cumprimento e/ou ao recebimento da prestação que ainda seja possível e útil. É também chamada de inadimplemento relativo (vide comentários ao artigo 389).

 

Comumente se trata da mora do devedor (mora solvendi ou debendi), dado ser esta mais usual. Nesse caso, surge a presunção relativa de culpa do devedor, o qual tem o ônus de provar que não agiu de forma descuidada. No entanto, é possível também que haja a mora do credor no recebimento da prestação (mora credendi ou  accipiendi). Para que esta se configure, é necessário que a obrigação já esteja vencida e haja recusa injustificada do credor para seu recebimento, bem como que tenha este sido constituído em mora. Nesse caso, o devedor fica exonerado de responsabilidade pelo atraso e liberado de juros e cláusula penal (se houver). Assim, ao reverso da mora do devedor, em que há um agravamento da situação do devedor, na mora do credor, há uma atenuação do ônus imposto ao sujeito passivo da relação obrigacional, o qual seque responderá pelos riscos da coisa, nas hipóteses de forma maior e caso fortuito.

 

Para que se configure a mora do credor, é necessário que o devedor tenha efetivamente, ofertado a prestação ao credor, de modo a ficar, ostensivamente evidenciada a recusa injustificada. Para tanto, é fundamental que se distingue a obrigação quesível da portável (CC, art. 327). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 394, acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.

 

Parágrafo único. Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos.

 

No entendimento de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 395, p. 418, Código Civil Comentado: “Haverá mora quando a obrigação não for cumprida no tempo, no lugar e da forma estabelecidos, mas ainda puder ocorrer o adimplemento com proveito para o credor. Ele receberá a prestação, com juros, atualização monetária, honorários de advogado e cláusula penal. Mas se o atraso ou o cumprimento imperfeito da obrigação vierem a tornar a prestação inútil ao credor, ele poderá recusá-la e exigir perdas e danos, nos termos do disposto no parágrafo único deste dispositivo”.

 

Mora e inadimplemento absoluto são espécies do gênero inadimplemento, mas diferem segundo a existência de utilidade da prestação para o credor. No presente artigo, cuida-se de sanção à conduta daquele que provoca prejuízos ao credor por não cumprir sua obrigação no tempo, no lugar e da forma devidos. Caso haja inadimplemento absoluto, a solução é a que está consagrada nos arts. 389 e seguintes do Código, a cujos comentários são aqui reportados. Por exemplo, um bolo de casamento encomendado e não entregue não servirá para os noivos, de modo que o confeiteiro estará inadimplente em caráter absoluto. No entanto, o arrendatário de um veículo poderá efetuar o pagamento das prestações em atraso, se o credor ainda tiver interesse em recebê-las, acrescidas de correção monetária e dos juros legais. Nessa hipótese, haverá simples mora do devedor. Apesar dessa distinção, nos dois casos serão devidas as perdas e danos previstas neste artigo e no art. 389.

 

A mora, tanto quanto o inadimplemento absoluto, só autoriza a condenação do devedor em perdas e danos se ele tiver agido com culpa, que também nessa hipótese é presumida. A rigor, o dispositivo indica que a inutilidade da obrigação ao credor acarretará o inadimplemento absoluto. Sobre correção monetária, juros e honorários de advogado, ver comentário ao art. 389. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 395, p. 418, Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Na crítica dos autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Tópico: I.I.I. Do Inadimplemento Absoluto, p. 741, Comentários ao CC 395: No caso de inadimplemento absoluto por invalidade da prestação em relação ao interesse do credor, a solução será a restituição das partes ao estado anterior (devolução ao credor do que eventualmente tenha despendido) mais perdas e danos. A respeito, disciplina o art. 395, parágrafo único do Código Civil: “Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá rejeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos”.

 

Saliente-se, no entanto, que a verificação do interesse do credor não decorre de disposição sua, mas sim da avaliação objetiva da viabilidade econômica do cumprimento, ainda que tardio da prestação. No geral, o princípio da conservação do negócio jurídico estende seus efeitos também no campo das obrigações, razão por que, em não se caracterizando a inviabilidade da prestação, assiste ao devedor o direito de adimplir o seu dever, nos termos do art. 475 do Código civil (cf. Farias e Rosenvald, 2007, p. 393).

 

Além disso, não há que se falar em inadimplemento absoluto nas obrigações pecuniárias, já que, via de regra, o dinheiro não perece, salvo as exceções legais em que a lei permite ao credor considerar desfeito o contrato pela falta de cumprimento das obrigações contratuais do devedor, como na locação (Lei 8.245/91, art. 9º, III) e na propriedade fiduciária (CC 2002, art. 1.364), por exemplo. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Tópico: I.I.I. Do Inadimplemento Absoluto, p. 741-742, Comentários ao CC 395. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Trocando em miúdos, para a equipe de Guimarães e Mezzalira: Na mora, o devedor fica obrigado a indenizar o credor, seja pagando os juros moratórios ou convencionais, seja ressarcindo-lhe das perdas e danos que houver lhe causado. No entanto, a indenização moratória não substitui a prestação devida, a qual ainda poderá ser exigida, caso seja útil ao credor.

 

Se a prestação tornar-se inútil ao credor, o descumprimento equivale ao inadimplemento absoluto e o credor poderá exigir a satisfação integral das perdas e danos. Contida a obrigação em um contrato, poderá o credor, nessa hipótese, pedir-lhe a resolução (CC, art. 475). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 395, acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 396. Não havendo fato ou omissão imputável ao devedor, nao incorre este em mora.

 

Na visão de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 396, p. 420, Código Civil Comentado: Este artigo assegura que a culpa do devedor é essencial para caracterização da mora, na opinião de Renan Lotufo (Código Civil comentado. São Paulo, Saraiva, 2003, v. II, p. 445), da qual diverge Judith Martins-Costa (Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. V, t. II, p. 264). O essencial, porém, é que, se o cumprimento imperfeito ou extemporâneo da prestação não decorrer de fato ou de omissão imputada ao devedor, não haverá mora. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 396, p. 420, Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Veja-se a explanação Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Tópico: I.I.2. Espécie de mora, p. 742, Comentários ao CC 396: O inadimplemento relativo (mora) ocorre da mora debitoris, ou seja, é a hipótese em que o devedor, por não cumprir a obrigação no tempo, lugar e forma devidos, nem por isso impossibilita a prestação, devendo, a partir da mora, cumprir a própria obrigação, mas acrescida de perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos e honorários de advogado.

 

No caso, por exemplo, do não pagamento de uma prestação em dinheiro na data aprazada. Aqui, ainda subsiste interesse útil do credor no cumprimento da obrigação. O critério, portanto, para diferenciar uma situação da outra, é o da subsistência de utilidade na prestação para o credor (Venosa, 2008, p. 294).

 

A distinção entre as duas espécies (inadimplementos absoluto e relativo) é importante porque, no inadimplemento relativo (mora), o devedor pode elidir os seus efeitos, cumprindo a obrigação, ainda que em atraso, hipótese em que pode deixar de surgir prejuízo para o credor, no inadimplemento absoluto, a impossibilidade ou inviabilidade da prestação conduz fatalmente à conversão em perdas e danos, para que não se possibilite o locupletamento ilícito do devedor que já recebeu a prestação da outra parte e tornou impossível o cumprimento da sua com o seu inadimplemento. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único, Tópico: I.I.2. Espécie de mora, p. 743, Comentários ao CC 396. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No dizer da equipe de Guimarães e Mezzalira, o dispositivo em questão se coaduna com a regra instituída pelo artigo 393, excluindo a responsabilidade do devedor por caso fortuito ou força maior. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 396, acessado em 29/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Código Civil Comentado - Art. 392, 393 - Do Inadimplemento das Obrigações – VARGAS, Paulo S. R. - vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com

 

Código Civil Comentado - Art. 392, 393
- Do Inadimplemento das Obrigações – VARGAS, Paulo S. R.
- vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com

CCC II - Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título IV – Do Inadimplemento das Obrigações

Capítulo I – Disposições Gerais –

(art. 389 a 393)

 

Art. 392. Nos contratos benéficos, responde por simples culpa o contratante, a quem o contrato aproveite, e por dolo aquele a quem não favoreça. Nos contratos onerosos, responde cada uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas em lei.

Segundo discernimento de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 392, p. 410, Código Civil Comentado, “Contratos benéficos ou gratuitos são aqueles em que apenas uma das partes obtém vantagens, enquanto para a outra há apenas sacrifício (doações puras, por exemplo). Não se confundem com contratos unilaterais ou bilaterais, expressões utilizadas no artigo correspondente do Código revogado. Nesses casos, o contrato se aperfeiçoa, mas apenas uma ou ambas as partes têm prestações a cumprir - razão pela qual serão unilaterais ou bilaterais. Já nos contratos gratuitos, a parte a quem o contrato aproveita responde por simples culpa, mas só responde por dolo aquela a quem o contrato impõe apenas sacrifício.”

 

A culpa simples - mesmo levíssima - obriga aquele que se beneficia do contrato a indenizar. No entanto, aquele a quem o contrato não beneficia só responde por dolo - conduta deliberadamente destinada a produzir o resultado danoso. Vale observar que a culpa grave se equipara ao dolo. A regra confere tratamento benéfico ao que celebra o contrato sem auferir vantagem. Essa regra tem aplicação, exemplificativamente, ao comodatário e ao motorista que dá carona a terceiro (a questão é objeto da Súmula n. 145 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “No transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave” ). Contudo, em relação especificamente ao denominado transporte de cortesia, que motivou a edição da Súmula n. 145, convém fazer o registro de que parte da doutrina tem considerado que ela já não pode prevalecer, uma vez que o art. 736 do Código Civil afastou sua natureza contratual, e, em razão disso, a responsabilidade do transportador é regida apenas pela regra geral do art. 927 tio Código Civil (vejam-se o comentário feito neste Código por Cláudio Godoy ao art. 736 e o artigo de Ênio Santarelli Zuliani referido em nota específica indicada na sequência).

 

A segunda parte do art. 392 do Código Civil afirma que nos contratos onerosos - aqueles em que há vantagens e sacrifícios recíprocos - qualquer das partes responde por culpa, salvo as exceções previstas em lei. É preciso observar que o art. 392 do Código Civil alterou expressões utilizadas no art. 1.057 do Código Civil, substituindo os termos unilaterais e bilaterais por, respectivamente, benéficos e onerosos. De fato, o tratamento menos rigoroso para as consequências do inadimplemento só se justifica caso se leve em conta a inexistência de vantagem para uma das partes, e não a presença de obrigações recíprocas, que caracteriza distinção entre contratos bilaterais e unilaterais. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 392, p. 410, Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 28/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Na visão do relator, Deputado Ricardo Fiuza: “Nos contratos benéficos ou não onerosos, a exemplo do comodato, só uma das partes se beneficia”. Logo não seria justo, como bem coloca João Luiz Alves, que “a pane, a quem o contrato não aproveita, respondesse pela simples culpa. Em todo o caso, deve responder pelo dolo que se constitui pela violação proposital e deliberada daquilo a que se acha obrigado, pois que ninguém pode voluntária e deliberadamente fugir ao cumprimento do que contratou, ainda que sem intuito de lucro, porque do seu procedimento pode resultar dano a outra parte. O contratante a quem aproveita o contrato unilateral deve responder pela simples culpa, por isso mesmo que o contrato foi celebrado em seu benefício, como no caso do comodatário, responsável pela guarda e restituição da coisa emprestada” (Código Civil anotado. cit., p. 710).

 

Nos contratos onerosos, bilaterais ou sinalagmáticos, nos quais são estabelecidas obrigações para ambas as partes, a exemplo da compra e venda, é coerente que elas respondam não só por dolo, mas também por simples culpa. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao Art. 392, p. 213, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf. Vários Autores 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 27/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Na visão da equipe Guimarães e Mezzalira, o dispositivo em questão distingue o comportamento doloso do culposo, ao impor o dever de indenizar apenas ao devedor que, dolosamente, descumpra contrato benéfico de que não seja favorecido (exemplificativamente, contrato de doação pura).

 

Súmula STJ 145. No transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave”. Parte da doutrina rechaça o entendimento, compreendendo que se aplica a esse caso a regra do artigo 927 do Código Civil. Bdine Jr, comentários ao CC art. 392, p. 410, Código Civil Comentado. In Peluzo, Cezar (coord.): Barueri, Manole, 2015). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 392, acessado em 27/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.

 

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos, não era possível evitar ou impedir.

 

No lecionar de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 393, p. 411-412, Código Civil Comentado, “Nas hipóteses de força maior ou caso fortuito, desaparece o nexo de causalidade entre o inadimplemento e o dano, de modo que não haverá obrigação de indenizar. Trata-se, portanto, de causa excludente da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual.

 

Nada impede, porém, que as partes estabeleçam que a indenização será devida em caso de inadimplemento, mesmo que provocado por caso fortuito ou força maior. Considera-se caso fortuito ou força maior o fato necessário, cujos efeitos eram imprevisíveis ou inevitáveis (parágrafo único deste artigo). Embora a lei não faça distinção entre estas figuras, o caso fortuito representa fato ou ato estranho à vontade das partes (greve, guerra etc.); enquanto força maior é a expressão destinada aos fenômenos naturais (raio, tempestade etc.).

 

A característica mais importante dessas excludentes é a inevitabilidade, i. é, a impossibilidade de serem evitadas pelas forças humanas. Os requisitos para a configuração do caso fortuito ou da força maior são os seguintes: o fato deve ser necessário e não determinado por culpa do devedor; o fato deve ser superveniente e inevitável; o fato deve ser irresistível - fora do alcance do poder humano.

 

Entre as excludentes de responsabilidade previstas no Código de Defesa do Consumidor - arts. 12, § 3º, e 14, § 3º -, essas hipóteses não figuram como causas de exclusão de responsabilidade, o que levou alguns autores a afirmarem que elas não impedem a condenação dos fornecedores a pagar a indenização. Mas é preciso verificar que, se o caso fortuito ou a força maior eliminam o nexo de causalidade entre o defeito e o dano, não estarão presentes os requisitos dos arts. 12 e 14 do Código de Defesa do Consumidor, de modo que não será caso de excluir a responsabilidade, mas sim de não haver incidência da regra ao caso concreto. Registre-se que nem mesmo nos casos de responsabilidade objetiva se dispensa o nexo causai como um de seus elementos essenciais.

 

De todo modo, nas relações de consumo, convém registrar, há casos excepcionais que se inserem no risco assumido pelo fornecedor para obtenção do resultado prometido ao consumidor. Trata-se do chamado fortuito interno, compreendido na própria atividade empresarial - risco de delitos para uma empresa de segurança são previsíveis e assumidos pelo fornecedor -, de modo que sua ocorrência não será capaz de eliminar o nexo de causalidade, obrigando o fornecedor a indenizar (Martins-Costa, Judith. Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro. Forense, 2003, v. V, t. II, p. 201). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 393, p. 411-412, Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 27/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Segundo histórico do dispositivo, emenda da lavra do eminente Senador Gabriel Hermes acrescentou o parágrafo único ao art. 393, ausente na redação original do anteprojeto, reproduzindo o de igual teor do art. 1.058 do Código de 1916. Segundo o autor da emenda, “Não há mal, antes conveniência, na reprodução. O texto do parágrafo não contém, propriamente, definição — que a técnica de legislar condena —, mas a qualificação do fato, que caracteriza o caso fortuito, ou a força maior A qualificação do fato, em termos genéricos, como sugerida, cuidando apenas do ‘fato necessário, cujo efeito não era possível evitar ou impedir’, não foge à técnica nem malfere o conteúdo do artigo, antes propicia um referencial impeditivo de interpretação anômala, ou desatenta.

 

De acordo com a doutrina do relator Ricardo Fiuza, “O Art. 393 consagra o princípio da exoneração do devedor, sempre que o desenvolvimento da obrigação não decorrer de culpa ou dolo seus”.

 

*Caso fortuito ou força maior: Foram empregados pelo legislador como sinônimos, mas doutrinariamente não se confundem, muito embora os autores divirjam sobre as diferenças entre os dois eventos. Os conceitos, muitas vezes, chegam a ser diametralmente opostos. Optou-se por seguir a corrente dos que entendem ser o caso fortuito o acidente que não poderia ser razoavelmente previsto, decorrente de forças naturais ou ininteligentes, tais como um terremoto, um furacão etc. (Clóvis Beviláqua, João Luiz Alves, ‘fito Fulgêncio Batista e Carvalho de Mendonça). A força maior, tomando por empréstimo a definição de Huc, seria “o fato de terceiro, que criou, para execução da obrigação, um obstáculo, que a boa vontade do devedor não pôde vencer” (Commenttire théorique et pratique du Code Civil, v. ‘7, p. 143). Exemplos de força maior: a guerra, o embargo de autoridade pública que impede a saída do navio do porto etc.

 

Os efeitos do caso fortuito e da força maior são idênticos: isentar o devedor da responsabilidade pelo descumprimento da obrigação. Salvo se o devedor houver assumido por cláusula expressa a responsabilidade pelo descumprimento mesmo ocorrendo caso fortuito ou força maior.

 

Ressalta, no entanto, Beviláqua que “no caso de mora o caso fortuito ou de força maior não escusa, se aconteceu depois da mora, salvo se o devedor provar que não teve culpa no atraso da prestação, ou que o dano ocorreria, ainda quando a obrigação fosse desempenhada oportunamente” (Clóvis Beviláqua, Código Civil comentado, cit., p. 222). Vide art. 399 deste Código. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao Art. 393, p. 213-214, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf. Vários Autores 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 27/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Segundo comentário da equipe de Guimarães e Mezzalira, a lei não distingue o caso fortuito (casus) da força maior (vis maior) em razão do extenso debate doutrinário existente em torno da diferença entre ambos. Tradicionalmente, diz-se que o caso fortuito é “acontecimento natural, ou evento derivado da força da natureza, ou o fato das coisas, como o raio do céu, a inundação, o terremoto” e a força maior consiste em “fato de outrem, como a invasão do território, a guerra, a revolução, o ato emanado da autoridade (factum principis), a desapropriação, o furto etc.” (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações. Rio de Janeiro: Forense, p. 346. Bdine Jr. dá classificação oposta a de Pereira (Bdine Jr., Hamid Charaf. Comentários ao artigo 393 do Código Civil, Peluso, Cesar (coord.). Código Civil Comentado. Barueri, Manole, 2015). Em termos gerais, para que se verifique a inimputabilidade do devedor, a falta de prestação deve decorrer de obstáculo intransponível ao cumprimento da obrigação, estranho ao poder do devedor e oriundo de acontecimento natural ou fato de terceiro. Assim, o caso fortuito ou de força maior representam excludentes de responsabilidade, vez que rompem com o nexo de causalidade.

 

Destaque-se que tais excludentes de responsabilidade aplicam-se até mesmo aos casos de responsabilidade objetiva – nos quais, relembre-se, é, igualmente, imprescindível a presença do nexo de causalidade. Nas relações de consumo, entretanto, há, excepcionalmente, a responsabilidade pela ocorrência de determinados riscos assumidos pelo fornecedor para atingir determinado resultado (fortuitos internos). Nesse aspecto, pode-se mencionar, ilustrativamente, os riscos de delito para uma empresa de segurança.

 

A respeito da questão, Pereira destaca que “não se pode munir o julgador de um padrão abstrato a que ajustar o fato, para decretar a exoneração do devedor. Ao contrário, cada hipótese terá de ser ponderada segundo as circunstâncias que lhe são peculiares, e em cada uma ter-se-á de examinar a ocorrência do obstáculo necessário e inevitável à execução do devido. Pode até acontecer que o mesmo evento, que facultou a um devedor o cumprimento, para outro já se erija com aquelas características de impedir a prestação”. (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, p. 348).

 

A despeito do caso fortuito e da força maior, pode subsistir responsabilidade ao devedor em casos de: (i) convenção expressa terre as partes nesse sentido; (ii) mora do devedor, exceto se este demonstrar que não teve culpa no atraso ou que o dano teria ocorrido ainda que a obrigação tivesse desempenhada tempestivamente; (iii) substabelecimento a terceiro, a despeito de vedação do mandante, exceto se se provar que o dano teria acontecido, independentemente do substabelecimento; (iv) gestão de negócios, quando são firmadas operações arriscadas pelo gestor ou quando este preterir interesses do gerido em benefício seu; (v) tradição de coisas que se vendem marcando ou assinalando, quando as coisas já tiverem sido postos à disposição do credor; e (vi) nos casos de risco profissional, quando previstos em lei. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 393, acessado em 27/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Código Civil Comentado - Art. 390, 391 - Do Inadimplemento das Obrigações – VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com

 

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VARGAS, Paulo S. R.
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Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título IV – Do Inadimplemento das Obrigações

(art. 389 a 393) Capítulo I – Disposições Gerais –

Art. 390. Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o dia em que executou o ato de que se devia abster.

No lecionar de Hamid Charaf Bdine Jr, Se a obrigação for negativa - daquelas em que se exige do devedor um não fazer-, estará caracterizado o inadimplemento desde o momento em que o ato que não devia ser praticado se verificou. Observe-se que todos os comentários ao artigo anterior, a respeito do inadimplemento bem como da mora, valem para essa hipótese, pois nem sempre o inadimplemento das obrigações de não fazer é absoluto. É possível imaginar hipóteses em que a obrigação negativa seja continuada (não fazer concorrência, por exemplo) e, nesse caso, a prestação será do interesse do credor mesmo após um determinado inadimplemento. No exemplo mencionado, o inadimplemento contratual pode ser interrompido, o que interessa ao credor, sem necessidade de considerar-se o inadimplemento absoluto. No entanto, segundo o dispositivo em exame, aquele que não pode fazer concorrência ao fundo de comércio que alienou a terceiro está em mora e é inadimplente desde o dia em que vende produtos cio mesmo ramo. Gustavo Bierambaum, porém, sustenta que somente a obrigação positiva admite a mora: “Classificação: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 122. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 416. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em seu histórico O artigo em tela não foi alvo de nenhuma espécie de alteração, seja por parte do Senado Federal, seja por parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. Trata-se de meta repetição do Art. 961 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria redacional.

Mas na Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, No Código Civil de 1916 o dispositivo estava equivocadamente inserido na Seção VI do Capítulo II do Título II do Livro III, que tratava da mora. Não se confunde inadimplemento com mora. No primeiro caso a obrigação é descumprida; no segundo, ocorre apenas retardamento do cumprimento da obrigação.

Justificava Beviláqua a inserção desse dispositivo no regramento da mora, ao argumento de que nas obrigações negativas a mora confunde-se com a inexecução. Com todo respeito ao mestre, entendemos que andou bem o novo Código em procedendo ao reposicionamento do artigo, que trata de inadimplemento e não de mora, ainda que os efeitos de ambos se confundam no caso concreto. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 589, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 27/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Marco Paulo Denucci Di Spirito, em seu artigo Breves comentários acerca do novo direito das obrigações - Singelo paralelo entre os processos de reforma do BGB e do Código Civil brasileiro, publicado novembro de 2002, estende-se sobre Direito das Obrigações e contratos e das Teoria das Obrigações, muito além do artigo 390 em comento, revisando com acuidade, a seguir o CC 389Empregou a lei a expressão "índices oficiais regularmente estabelecidos", que merece ser analisada.

 

Sabendo-se que inexistem palavras inúteis na lei, cabe sacar da letra do dispositivo a mens legis. Assim, note-se que todo índice de juros ou de correção monetária, para decorrer ex lege, deverá ser estabelecido, evidentemente, de acordo com a Lei. Então, a expressão "regulamente estabelecidos" não se refere a estar ou não em consonância com a lei. Entender de maneira diversa seria altercar em favor da redundância! O índice que se tem em foco decorre ex lege, e seria estultice imaginar que o legislador queria repisar um requisito inafastável, como que a dizer: "o índice legal deverá ser estabelecido de acordo com a lei". A solução, portanto, está na palavra ‘regular’. Consta no Dicionário Houaiss que ‘regular’ pode significar aquilo que está em consonância com as regras e as leis ou o que está de acordo com sua natureza. Descartada a primeira hipótese, o CC 389 só pode ter empregado a expressão "regularmente estabelecidopara destacar que não seria aplicável qualquer índice. Estariam afastados, portanto, aqueles que não se prestam unicamente à finalidade precípua para a qual foram criados, porque trazem em seu bojo parcela embutida de natureza diversa. Pensar contrariamente equivale a desprezar as palavras "regularmente estabelecidos". O Código Civil de 2002 veio inovar ao prever o pagamento de honorários do advogado na forma de regra geral, incrustada no Livro das Obrigações. A intenção manifesta da norma é de valorizar o ofício advocatício.

 

Atualmente, o pagamento de honorários decorre ex lege, quando configurado o inadimplemento, tornando dispensável qualquer estipulação contratual. O advogado contratado para levar a cabo negociações extrajudiciais, por exemplo, também fará jus a honorários. Dessa forma, devem ser revistas posições como a de Nelson Nery Júnior, para quem "somente em ação judicial são devidos honorários de advogado". Quanto ao CC 390 – O legislador foi técnico ao criar este dispositivo. Muito embora na prática os efeitos da mora e do inadimplemento se confundam, ontologicamente essas figuras são distintas. (Marco Paulo Denucci Di Spirito, em seu artigo Breves comentários acerca do novo direito das obrigações - Singelo paralelo entre os processos de reforma do BGB e do Código Civil brasileiro, publicado novembro de 2002, no site jus.com.br, acessado em 27/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 391. Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor.

No clamor de Bdine Jr, a responsabilidade patrimonial do inadimplente está consagrada neste artigo, segundo o qual todos os bens do devedor respondem pelas perdas e danos decorrentes do inadimplemento da obrigação. Este dispositivo, embora não contenha a ressalva final do art. 591 do Código de Processo Civil (correspondendo hoje ao art. 789 do CPC/2015 com a mesma redação) - “salvo as restrições estabelecidas em lei”, não revogou a legislação que declara impenhoráveis determinados bens do devedor, tal como ocorre com o art. 649 do Código de Processo Civil, (correspondendo, hoje ao art. 833 do CPC/2015)

Embora haja incompatibilidade aparente com a regra ampla do artigo em exame - que estabelece a responsabilidade integral dos bens do devedor pelo inadimplemento -, o certo é que os bens constantes do mencionado artigo - assim como o bem de família (Lei n. 8.009/90) continuariam sendo impenhoráveis ainda que a regra não existisse. Os bens indicados do art. 649 ((correspondendo, hoje ao art. 833 do CPC/2015) não podem ser penhorados; admiti-lo violaria o princípio de proteção à dignidade da pessoa humana consagrado no art. Iº, III, da Constituição Federal. Ora, tais bens são essenciais para assegurar ao devedor uma vida minimamente digna: alimentos, sustento próprio e de sua família e trabalho.

Vale observar, contudo, que os bens relacionados nos incisos IV e V, III do mencionado art. 649 (correspondendo, hoje ao art. 833 do CPC/2015) poderão ser penhorados, salvo se comprometerem o sustento digno do devedor e de sua família, como poderá ocorrer com os vencimentos e os salários e com o imóvel rural (incisos IV e X). Nesses dois últimos casos, se a penhora recair sobre parte de vencimentos ou salários expressivos, não comprometer o sustento e a vida digna do devedor (que perceba, por exemplo, rendimentos elevados), e, eventualmente, destinarem-se a quitar débito de maior valor social (alimentos devidos em razão de ato ilícito, por exemplo), não há por que manter a impenhorabilidade, ainda que parcial. 

Aliás, a jurisprudência de nossos tribunais tem admitido a penhora de faturamento de pequenas empresas das quais, em muitos casos, são extraídos os rendimentos de manutenção das famílias dos sócios - cujas personalidades, é certo, não se confundem com a da sociedade de modo que as mesmas razões que justificam essa providência poderão autorizar a penhora de salários e vencimentos muito elevados.

Observe-se que a flexibilização da impenhorabilidade em alguns casos resulta da incidência do princípio da proporcionalidade à execução. Esse princípio constitucional permite que se afaste o rigor da regra quando desproporcional ao resultado a que se visa. Dessa forma, se assegurar a impenhorabilidade integral de um salário expressivo comprometer a proporção a ser mantida entre a proteção à dignidade e o interesse social no cumprimento das obrigações, será possível flexibilizar a regra do art. 833 do Código de Processo Civil e autorizar a penhora de parte dos rendimentos do devedor - tal como já se admite registre-se, na penhora do faturamento das empresas. Essa medida, certamente, também pode comprometer o sustento do pequeno empresário, sem que por isso se negue a penhorabilidade parcial.

Ora, já que a impenhorabilidade dos bens indicados no art. 649 do Código de Processo Civil (correspondendo, hoje ao art. 833 do CPC/2015) continuaria sendo passível de reconhecimento ainda que o dispositivo não exista, não se pode considerá-lo revogado pelo artigo que ora se examina sob o fundamento de que regra geral posterior é incompatível com a regra geral anterior (art. 2º, § Iº, Lei de Introdução ao Código Civil). Seria ilógico afirmar a revogação da lei anterior para manter a eficácia de seu conteúdo a partir da interpretação direta do art. I o, III, da Constituição Federal.

O bem de família permanece impenhorável, nos termos do disposto expressamente no art. 1.711. Em relação aos bens que guarnecem a residência do devedor, não há ressalva expressa no presente Código, concluindo-se que sua impenhorabilidade decorrerá do disposto no parágrafo único do art. I o da Lei n. 8.009/90 e da proteção decorrente do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, se for o caso. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 416-417. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).


Perdeu aqui o legislador a oportunidade de positivar o moderno princípio de que na execução das obrigações, deve-se primar pelo cumprimento específico, para somente depois se buscar o sucedâneo em perdas e danos. Contudo, conforme bem coloca Luiz Guilherme Marinoni, o Estatuto Processual Civil (art. 461 hoje correspondendo ao art. 498 no CPC/2015, embora com a mesma redação) e o Código do Consumidor (art. 84) já trataram de corrigir o equívoco de que todo inadimplemento deve acarretar, invariavelmente, perdas e danos. (Marco Paulo Denucci Di Spirito, em seu artigo Breves comentários acerca do novo direito das obrigações - Singelo paralelo entre os processos de reforma do BGB e do Código Civil brasileiro, publicado novembro de 2002, no site jus.com.br, acessado em 27/05/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).