quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 118, 119, 120 - Da Representação - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 118, 119, 120
Da Representação - VARGAS, Paulo S. R.
 
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo II – Da Representação
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 118. O representante é obrigado a provar às pessoas, com quem tratar em nome do representado, a sua qualidade e a extensão de seus poderes, sob penas de, não o fazendo, responder pelos atos que a estes excederem. 1.

1.        Prova dos poderes de representação

Nem sempre será de fácil verificação a existência e a extensão dos poderes de representação que o representante afirma ter. É de todo natural, por essa razão, que antes de contratar com alguém que se apresenta como tendo poderes para representar alguém, a contraparte queira se certificar da existência e da extensão desses poderes. Seria extremamente difícil, por outro lado, que esse interessado em contratar alguém por meio de seu representante, conseguisse, por si só, perquirir a existência desses necessários poderes de representação para a realização do negócio jurídico. É justamente por força dessa imposição de garantir a segurança das relações jurídicas que o legislador impôs ao representante a obrigação de provar às pessoas com quem contratar em nome do representado a sua qualidade e a extensão de seus poderes, sob pena de, não o fazendo, responder pelos atos que a estes excederem. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 06.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 119. É anulável negócio concluído pelo representante em conflito de interesses com o representado, se tal fato era ou devia ser do conhecimento de quem com aquele tratou. 1

1.        Representação contrária aos interesses do representado

Inversamente do que ocorre na hipótese prevista no art 117, em que o legislador presume a existência de conflito de interesse entre o representante e o representado que contrata consigo mesmo, a regra geral é a que se deve presumir que ao contatar, o representante está agindo na defesa dos interesses do representado. Por essa razão, não se exige do interessado qualquer certificação de que o negócio que está celebrando com o representante atende aos interesses do representado. Todavia, se de algum modo esse interessado veio a ter ciência, ou deveria ter, de que o negócio que pretende realizar afronta os interesses do representado, esse negócio será anulável. Note-0se que para se amoldar à hipótese do presente artigo é necessário que o representante celebre os negócios no exercício dos poderes de representação que recebeu. Se assim não for, será o caso de ineficácia em relação ao representado (CC, art 118), e não de anulabilidade. Por outro lado, é pressuposto inafastável para a anulação do negócio que o interessado tenha ciência ou devesse ter ciência da existência desse conflito. Mesmo existindo o conflito, se dele o interessado não tinha ou não deveria ter ciência, o negócio não poderá ser anulado.

2.        Prazo decadencial de anulação

Sendo a anulação uma forma de desconstituição de uma relação jurídica, o prazo para que o representante exerça esse seu direito potestativo é decadencial. Nesta hipótese, fixou o legislador o prazo de cento e oitenta dias a contar da conclusão do negócio ou da cessação da incapacidade, o prazo de decadência para pleitear-se a anulação prevista neste artigo. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 06.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

É de se destacar o art 119 do CC, que prescreve: “É anulável o negócio concluído pelo representante em conflito de interesses com o representado, se tal fato era ou devia ser do conhecimento de quem com aquele tratou”. O parágrafo único estabelece o prazo decadencial de cento e oitenta dias, a contar da conclusão do negócio ou da cessação da incapacidade, para pleitear-se a anulação prevista no caput do artigo.

Observa-se que a condição estabelecida na lei para que o negócio se considere anulável é o conhecimento, pelo terceiro beneficiado, do conflito de interesses entre representado e representante. Não se admite que, estando de boa-fé, seja ele prejudicado por ato danoso deste último. Resta ao representado, neste caso, valer-se do disposto no art 118, para se ressarcir dos danos eventualmente sofridos.

O conflito de interesses entre representante e representado decorre, em geral de abuso de direito e excesso de poder. O primeiro pode ocorrer em várias situações, inclusive pela atuação do representante com falta de poderes, que caracteriza o falso procurador. Configura-se também quando a representação é exercida segundo os limites dos poderes mas de forma contrária à sua destinação, que é a defesa dos interesses do representado. O excesso de poder se configura quando o representante ultrapassa os limites da atividade representativa.

Em ambos os casos, o negócio é celebrado sem poder de representação, podendo ser anulado pelo representado, se o conflito de interesses era ou devia ser do conhecimento de quem com ele tratou. (Mairan Gonçalves Maia Júnior. A representação, cit., p. 140-141: Renan Lotufo, Código Civil, cit., p. 337, Apud Direito Civil Comentado – Parte Geral, Roberto Gonçalves, V. I, p. 367, 2010, Saraiva – São Paulo.

Art. 120. Os requisitos e os efeitos da representação legal são os estabelecidos nas normas respectivas; os da representação voluntária são os da Parte Especial deste Código. 1

1.        Normas específicas da representação

Por meio do presente artigo o legislador expressamente reconheceu o caráter geral das regras atinentes à representação presentes neste capítulo do Código Civil, reportando o intérprete à observância das demais normas específicas existentes. No que se refere à representação legal, tais normas estarão dispersas na legislação (CC, arts 1.634, V, 1.690, 1.747, I e 1.774). Por outro lado, quanto à representação voluntária, o legislador expressamente remeteu o intérprete para a Parte Especial deste Código, mais especificamente ao contrato de mandato e demais tipos contratuais que tenham em si uma forma de representação indireta (agência e comissão, por exemplo). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 07.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 115, 116, 117 - Da Representação - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 115, 116, 117
Da Representação - VARGAS, Paulo S. R.
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo II – Da Representação
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Art. 115. Os poderes de representação conferem-se por lei ou pelo interessado 1, 2, 3

1.        Representação

Representação é o ato pelo qual uma pessoa pratica atos em nome próprio, por conta e ordem de outra pessoa, para que em relação a essa pessoa se produzam os efeitos do negócio jurídico. A doutrina costuma classificar a representação em legal, quando decorrente expressamente da lei (exemplo dos pais em relação ao filho menor) e voluntária, quando conferida de uma pessoa a outra por força de um negócio jurídico, cujo exemplo clássico é o do mandato.

2.        Representação, mandato e procuração

Apesar de extremamente afins, não se pode confundir os conceitos de representação, mandato e procuração. Enquanto que na representação é o representante que pratica o ato (ainda que por conta e ordem de outra pessoa), no mandado entende-se que quem pratica o ato é o próprio mandante. No mandato também há representação. A representação é da natureza do mandato. Contudo, o mandato é um contrato celebrado entre mandante e mandatário, por meio do qual o mandante transfere ao mandatário poderes específicos de representação. Há, entretanto, outras espécies contatuais que também transferem poderes de representação (ainda que indireta), como ocorre no contrato de comissão e de agência, por exemplo.  A procuração, por sua vez é o instrumento formal pelo qual se materializa o mandato.

3.        Representação de pessoa jurídica

Apesar de o Código Civil afirmar que a pessoa jurídica é representada pelo administrador ou pelos respectivos órgãos definidos em seu contrato social ou estatuto (art 46, III), modernamente já se reconheceu a falta de técnica no uso dessa expressão. Isso porque, conforme já reconhecido, quando a pessoa jurídica externa sua vontade por meio de um administrador ou de um órgão específico, é a própria pessoa jurídica que está se manifestando, e não o administrador ou esse órgão deliberativo. “Na atuação do órgão da pessoa jurídica, não há uma declaração de vontade de representante que substitua a do representado. A vontade do órgão é a vontade da pessoa jurídica”. (1) (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 06.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Eduardo Ribeiro de Oliveira, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Comentários ao Código Civil: das pessoas, (arts 79 a 137) Vol. II, Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 262

Art. 116. A manifestação de vontade pelo representante, nos limites de seus poderes, produz efeitos em relação ao representado. 1, 2

1.        Efeitos da representação

Desde que externada dentro dos limites de seus poderes, a manifestação de vontade do representante terá a aptidão de produzir efeitos em relação ao representado. É o representado, portanto, que assumirá as obrigações e se tornará titular dos direitos relativos ao negócio jurídico que o representante praticou.

2.        Atuação sem poderes

Caso o representante atue sem poderes ou além dos poderes específicos, o ato não produzirá efeitos em relação ao representado. A hipótese é de ineficácia, somente. O negócio existirá e será válido, respondendo o próprio representante pelos seus efeitos (CC, art 118). O representado poderá, contudo, ratificar o ato assumindo seus efeitos (CC, art 662). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 06.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Há três espécies de representantes: legal, judicial e convencional.

Legal é o que decorre da lei, ou seja, aquele a quem esta confere poderes para administrar bens e interesses alheios, como pais, em relação ao filhos menores (CC, arts. 115, primeira parte, 1.634, V, e 1.690), tutores, no que concerne aos tutelados (art 1.747, I), e curadores, quanto aos curatelados (art 1.774).

Judicial é o nomeado pelo juiz, para exercer poderes de representação no processo, como o inventariante, o síndico da falência, o administrador da empresa penhorada etc.

Convencional é o que recebe mandato outorgado pelo credor, expresso u tácito, verbal ou escrito (CC, arts 115, segunda parte, e 656) com poderes nele expressos, podendo ser em termos gerais ou com poderes especiais, como os de alienar, receber, dar quitação etc. (art 661).

Regras da representação

O art 116 do Código Civil dispõe: A manifestação da vontade pelo representante, nos limites de seus poderes, produz efeitos em relação ao representado”.

O representante atua em nome do representado, vinculando-o a terceiros com quem tratar. Deve agir, portanto, na conformidade dos poderes recebidos. Se os ultrapassar, haverá excesso de poder, podendo por tal fato ser responsabilizado (CC, art 118). Enquanto o representado não ratificar os referidos atos, será considerado mero gestor de negócios (CC. art 665).

Em consequência: “a), os efeitos do negócio jurídico representativo, concretizado dentro dos limites dos poderes conferidos, repercutem, exclusivamente, na esfera jurídica do representado; b) o vínculo negocial é estabelecido apenas entre o representado e a contraparte, sendo o representante estranho ao negócio jurídico representativo celebrado; c) os efeitos, obrigações e direitos são auferidos e suportados direta e imediatamente pelo dominus negotii; d) as obrigações inadimplidas do dominus negotii não são de responsabilidade do representante, salvo quando este pessoalmente responsabilizou-se pelo cumprimento; e) o dominus negotii é legitimado, ativa e passivamente, para figurar na relação processual tendo por objeto o negócio jurídico representativo, no exercício do jus persequendi in judicio” (Mairan Gonçalves Maia Júnior, A representação no negócio jurídico, p. 131-132, Apud Direito Civil Comentado – Parte Geral, Roberto Gonçalves,  p. 366 - V. I, 2010, Saraiva – São Paulo .

Art. 117. Salvo se o permitir a lei ou o representado, é anulável o negócio jurídico que o representante, no seu interesse ou por conta de outrem, celebra consigo mesmo.1

1.        Anulabilidade do negócio jurídico celebrado consigo mesmo

Seja legal, seja convencional, quem recebe poderes de representação deve agir buscando sempre a satisfação dos interesses do representado. Por outro lado, em todo contrato firmado, mesmo naqueles chamados de relacionais ou de cooperação, as partes contratantes invariavelmente apresentarão interesses contrapostos em relação a determinados aspectos do contrato. Num contrato de compra e venda, por exemplo, será do interesse do comprador pagar o menor preço possível pela coisa. Inversamente, o interesse do vendedor será o de receber o maior preço que puder. Diante de tal evidente conflito de interesses, pressupõe o legislador a anulabilidade do negócio jurídico que o representante, no seu interesse ou por conta de outrem, celebra consigo mesmo. Afinal de contas, em tal caso, paira uma presunção de que o representante não está agindo no interesse do representado. Tal presunção, entretanto, não é absoluta, admitindo o legislador o contrato consigo mesmo caso a lei ou o representante expressamente permitirem.

2.        Substabelecimento dos poderes de representação

Caso seja permitido pelo representado, poderá o representante transferir para terceiros os poderes de representação que recebeu. Naturalmente, entretanto, o primeiro representante que recebeu diretamente os poderes de representação permanece responsável perante o representante, mantendo sua obrigação de não contrariar seus interesses. Por essa razão, permanece anulável o negócio realizado por aquele em quem os poderes houverem sido subestabelecidos. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 06.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 113, 114 Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 113, 114
Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.
 
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo I – Disposições Gerais
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Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.1, 2

1.        A boa-fé como critério de interpretação do negócio jurídico

No Código Civil atual, diversos valores sociais foram expressamente reafirmados, dentre os quais o princípio da boa-fé, de extrema relevância pra o direito privado. A doutrina moderna capitaneada no Brasil por Judith Martins-Costa costuma afirmar que a cláusula geral de boa-fé apresenta uma tripla função, ora funcionando como um cânone hermenêutico dos contratos, ora como uma norma geral criadora de deveres jurídicos acessórios e ora como uma limitação ao exercício de direitos subjetivos. O artigo 113 do Código Civil cuida da importância da boa-fé como elementos de interpretação dos negócios jurídicos. Por força dessa regra interpretativa, dentre as diversas e variadas possíveis interpretações de um negócio jurídico deve o intérprete privilegiar aquela que corresponda aos padrões ditados pela boa-fé. Ou seja, à conduta justa e correta que se espera que alguém adote naquelas circunstâncias.

2.        Os usos do lugar de sua celebração

Os usos do lugar em que o contrato é celebrado são de extrema relevância para a interpretação dos negócios jurídicos na medida em que ajudam a determinar a forma como a declaração de vontade é socialmente vista naquela circunstância. Naturalmente, entretanto, tais usos podem varia de acordo com o lugar em que o negócio é celebrado. Basta pensar na medida de área denominada alqueire, que varia de lugar para lugar. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 04.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 114. Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente. 1

1.        Interpretação restritiva dos negócios benéficos e da renúncia

Os negócios jurídicos benéficos são aqueles em que apenas uma das pessoas obtém vantagem com sua celebração, não existindo equilíbrio entre os benefícios e as obrigações assumidas pelas diferentes partes. Basta pensar na doação, em que apenas um dos contratantes recebe todas as vantagens de sua celebração enquanto que à contraparte cabem todas as obrigações. Por sua vez, a renúncia é um ato de disposição e abandono de um direito em favor de outrem. Em ambos os casos, como se vê, há expressa vantagem de uma pessoa em detrimento da outra. Para evitar que esse desequilíbrio seja ainda maior, o legislador estabeleceu um critério interpretativo restritivo para tais negócios jurídicos. Assim, por exemplo, numa situação em que alguém tenha doado um imóvel guarnecido por diversos móveis, sem nada dizer sobre eles, a regra de interpretação restritiva dos negócios jurídicos benéficos força a conclusão de que tais móveis não foram contemplados no objeto da doação.  (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 04.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Negócio jurídico é um ato ou uma pluralidade de atos, entre si relacionados, quer sejam de uma ou de várias pessoas, que tem por fim produzir efeitos jurídicos, modificações nas relações jurídicas no âmbito do direito Privado.

Miguel Reale preleciona que “negócio jurídico é aquela espécie de ato jurídico que, além de se originar de um ato de vontade, implica na declaração expressa da vontade, instauradora de uma relação entre dois ou mais sujeitos tendo em vista um objetivo protegido pelo ordenamento jurídico. Tais atos, que culminam numa relação intersubjetiva, não se confundem com os atos jurídicos em sentido estrito, aos quais não há acordo de vontade, como, por exemplo, se dá nos chamados atos materiais, como os da ocupação ou posse de um terreno, a edificação de uma casa no terreno apossado etc. Um contrato de compra e venda, ao contrário, tem a forma específica de um negócio jurídico...”. Antônio Junqueira de Azevedo, depois de criticar a teoria voluntarista, que dá ênfase à manifestação da vontade como elemento fundamental do negócio jurídico, e também a teoria objetivista, que vislumbra no negócio jurídico antes um meio concedido pelo ordenamento jurídico para produção de efeitos jurídicos que propriamente um ato de vontade – dissensão está agravada com o debate entre a teoria da vontade (Willenstheorie) e a teoria da declaração (Erkla nungstheorie) -, conceitua o negócio jurídico, sob o critério estrutural e encarando-o como fato jurídico concreto, como “todo fato jurídico consistente em declaração de vontade, a que o ordenamento jurídico atribui os efeitos designados como queridos, respeitados os pressupostos de existência, validade e eficácia impostos pela norma jurídica que sobre ele incide.” Para Renan Loturo, “Negócio jurídico é o meio para a realização da autonomia privada, ou seja, a atividade e potestade criadoras, modificaras ou extintoras de relação jurídicas entre particulares.” (Negócio jurídico. Existência, validade e eficácia, p. 16. A representação, cit., p. 140-141: Renan Lotufo, Código Civil, cit., p. 206/207, Apud Direito Civil Comentado – Parte Geral, Roberto Gonçalves, V. I, p. 318, 2010, Saraiva – São Paulo.

domingo, 6 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 110, 111, 112 - Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 110, 111, 112
Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo I – Disposições Gerais
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Art. 110. A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento. 1, 2

1.        A vontade e sua manifestação

Não é a vontade do agente que determina o conteúdo do negócio jurídico e sim a forma como essa vontade é externada socialmente. O ordinário é que a vontade real do sujeito coincida com a vontade que foi publicamente manifestada. Pode ocorrer, entretanto, um descompasso entre a vontade real e a vontade manifestada. Enfrentando essas situações de descompasso duas teorias extremas surgiram. A teoria subjetiva, que funda toda a essência do negócio jurídico na vontade real do sujeito, protegendo-a ante sua exteriorização errônea e a teoria objetiva, mais moderna, a qual reconhece como elemento essencial do negócio jurídico, e não a vontade íntima do sujeito, que não vindo a ser exteriorizada, não adquire relevância jurídica. Eduardo Ribeiro bem observou que o legislador do Código Civil buscou amenizar os extremos dessas duas teorias ora privilegiando a vontade real (CC, art 167), ora protegendo a vontade declarada (CC, art 154). Observa-se de todo modo, que prepondera no Código Civil a chamada teoria da confiança, segundo a qual deve-se preservar a confiança legitimamente criada no destinatário da declaração de vontade de que a vontade declarada corresponde à vontade real do agente. (1)

2.        Reserva mental

A reserva mental ocorre quando o agente voluntariamente declara sua vontade em descompasso com sua vontade real. É a divergência propositalmente causada entre o animus e a declaração. Em tal caso, como regra geral, prevalece o conteúdo da vontade que foi exteriorizada pelo agente. É ela que irá produzir efeitos jurídicos. A vontade real, que o agente voluntariamente guardou para si, será irrelevante para o direito. a situação será diferente, entretanto, se o destinatário dessa declaração tiver conhecimento de que ela não corresponde a real intenção de quem a declarou. Isso porque, neste caso, entende a doutrina que sequer há declaração de vontade, caracterizando verdadeira hipótese de inexistência de negócio jurídico. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 03.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Eduardo Ribeiro de Oliveira, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Comentário ao Código Civil: das pessoas, (art 79ª a 137), Vol. II, Rio de Janeiro, Forense, 2008, p. 229-230.

Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa. 1

1.        O silêncio como manifestação de vontade

Expressão máxima do princípio da liberdade das formas é que até mesmo o silêncio pode ser reconhecido como forma de exteriorização da vontade. Usualmente, entretanto, o silêncio corresponde à mais absoluta ausência de declaração de vontade. Em situações excepcionais, entretanto, se as circunstancias negociais assim permitirem, ou mediante previsão expressa da lei, o silêncio pode ser visto como uma forma de anuência e, portanto, de manifestação de vontade. É o que ocorre, por exemplo, com a assunção de dívida. Diz o parágrafo único do art 299 que: “qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que consinta na assunção da dívida, interpretando-se o seu silêncio como recusa” (CC, art 299, parágrafo único). (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 03.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. 1

1.        Interpretação da declaração de vontade

Diferentemente do que uma leitura apressada desse dispositivo poderia transmitir, ao dizer que “nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”, o legislador acabou mais uma vez prestigiando a vontade declarada em detrimento da vontade real do agente. O conteúdo do negócio jurídico é determinado pela declaração de vontade e pelas circunstâncias com que ela foi declarada, não pelo animus subjetivo e íntimo do agente que a declarou. Basta ver que o legislador expressamente conferiu importância interpretativa à intenção do agente que foi de algum modo consubstanciada na declaração de vontade. A vontade íntima do agente que de forma alguma chegou a ser exteriorizada, que não foi consubstanciada na declaração permanece irrelevante para o direito. O parâmetro interpretativo consagrado pelo artigo 112 é o de evitar-se o apego literal ao sentido da linguagem, insensível às circunstâncias que lhe dão significado. De maneira bastante didática, as regras de interpretação dos contratos foram sistematizadas pela doutrina em três diferentes planos, dos quais o intérprete pode valer-se (i) do sentido literal da linguagem (ponto de partida necessário, porém insuficiente); (ii) da contextualização verbal do contrato (interpretação de determinado comando em consonância com a inteireza da avença), e (iii) de sua contextualização situacional. (1) (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 03.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

(1)      Francisco Paulo de Crescenzo Marino. Contratos coligados no direito brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2009, p. 146.

sábado, 5 de janeiro de 2019

DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 107, 108, 109 Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.


DIREITO CIVIL COMENTADO - Arts. 107, 108, 109
Do Negócio Jurídico - VARGAS, Paulo S. R.
 
Livro III – Dos Fatos Jurídicos (art. 104 a 184)
Título I – Do Negócio Jurídico – Capítulo I – Disposições Gerais
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Art. 107. A vaidade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir. 1

1.        Princípio da liberdade das formas

Já se disse que a forma do negócio jurídico é o meio pelo qual o agente capaz exterioriza sua vontade de praticar determinado negócio jurídico. Como regra geral, vige no direito brasileiro o princípio da liberdade das formas, a qual reputa válida todos os meios de exteriorização da vontade. Em alguns casos, porém, a lei exige determinada forma específica para a validade do ato. Em tais hipóteses, a inobservância dessa forma levará à nulidade do negócio (CC, art 166, IV). É o que se verifica ainda quando o Código Civil diz que a validade do negócio jurídico requer a observância da forma prescrita ou não defesa em lei. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 02.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).

É nulo o negócio jurídico quando “não revestir a forma prescrita em lei” ou “for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade” (art 166, IV e V). Em alguns casos a lei reclama também a publicidade, mediante o sistema de Registros Públicos (CC art 221). Cumpre frisar que o formalismo e a publicidade são garantias do direito.

Na mesma esteira do art 166, IV e V, CC, retrotranscrito, estabelece o art 407 do CPC/2015, “Quando a lei exigir instrumento público como da substância do ato, nenhuma outra prova, por mais especial que seja, pode suprir-lhe a falta.” Por sua vez, estatui o art 188 do mesmo diploma: “Os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial.”  Podem ser distinguidas três espécies de formas: forma livre, forma especial ou solene e forma contratual. (Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, Parte Geral, Vol. I, p. 357, Saraiva, 2010).

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país. 1

1.        Forma única

Uma das exceções legais ao princípio da liberdade das formas é a que se refere aos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país. Em tal caso, estipula a lei uma única forma admitida para tais negócios jurídicos. Inobservada essa forma única prescrita em lei, o negócio jurídico será nulo. Contudo, esse próprio artigo 108 expressamente abre a possibilidade de que a lei possa afastar essa obrigatoriedade da escritura pública. é o que acontece com negócios jurídicos de aquisição de imóveis regido pelo regime especial do Sistema Financeiro da Habitação (Lei n. 4.380/64) e os contratos de compra e venda com alienação fiduciária (Lei n. 9.514/97).

Art. 109. No negócio jurídico celebrado com a cláusula de não valer sem instrumento público, este é da substância do ato. 1

1.        Forma especialmente eleita pela vontade das partes

Por ser mais formal, a utilização da escritura pública garante maior segurança jurídica às partes. Em contrapartida, a opção pela utilização da escritura pública acresce custos de transação ao negócio jurídico, já que torna a celebração do negócio mais cara e demorada. Têm as partes, entretanto, liberdade para escolher celebra um negócio jurídico utilizando-se de uma forma mais simples, célere e menos onerosa, ou optar por utilizar uma forma mais segura e custosa. De todo modo, tendo optado pela utilização do instrumento público, a utilização dessa forma será um requisito indispensável para a validade do negócio jurídico. E nem poderia ser diferente, sob pena de esvaziar a própria garantia de segurança jurídica a que buscaram as partes. (Direito Civil Comentado apud Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina. Material coletado no site Direito.com em 02.01.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).