CPC
LEI 13.105 E LEI 13.256 COMENTADAS
VARGAS, Paulo S.R.
LEI
13.105, de 16 de março de 2015 Código de
Processo Civil
PARTE GERAL
LIVRO I – DAS NORMAS PROCESSUAIS CIVIS
TÍTULO ÚNICO – DAS NORMAS
FUNDAMENTAIS E DA APLICAÇÃO DAS NORMAS PROCESSUAIS
CAPÍTULO I – DAS NORMAS
FUNDAMENTAIS DO PROCESSO CIVIL
Art.
1º. O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os
valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República
Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.
LEI 13.256 de 04.02.2016
Art. 1º. Esta lei altera a Lei 13.105 de
março/2015 (CPC), para disciplinar o processo e o julgamento de recurso
extraordinário e do recurso especial.
1. ESTRUTURAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS
PROCESSUAIS DE ACORDO COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
Segundo Daniel Amorim
Assumpção Neves, (P. 1, Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por
artigo – 2016, Editora Juspodivm), mesmo a doutrina mais entusiasmada, como o
art. 1º do CPC 2015, reconhece que em uma perspectiva normativa o dispositivo
prevê uma obviedade: as normas
processuais previstas no Código e em outras leis extravagantes – devem ser
criadas e interpretadas de acordo com os valores e as normas fundamentais
estabelecidas na Constituição Federal.
Ainda
que se possa elogiar o dispositivo legal por consagrar expressamente a força
normativa do texto constitucional, ainda sob o enfoque de Daniel Amorim (P. 1, Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm),
o seu conteúdo não traz qualquer novidade ou mesmo inovação. Trata-se,
insista-se, do óbvio, inclusive não sendo exclusividade da norma processual a
exigência de que sejam construídas e interpretadas de acordo com a Constituição federal, sendo essa uma realidade
aplicável para qualquer espécie de norma legal.
Conclui
o Autor, às pp. 2: Mas como no direito brasileiro algumas vezes é preciso se
dizer o óbvio de forma expressa para que os operadores comecem a notar e a
aceitar a obviedade, o art. 1º do CPC é importante por consagrar de forma
expressa o direito processual constitucional. Dessa forma, ao afirmar que o
Código de Processo Civil deve ser interpretado de acordo com a Constituição
Federal o dispositivo ora analisado exige que as dúvidas interpretativas sejam
resolvidas a favor da otimização dos valores e das normas fundamentais
previstas no texto constitucional. (Daniel Amorim Assumpção Neves, P. 2, Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
2. O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO RESPEITA A
PREVISÃO DE SEU ART. 1º?
Não deixa de ser curiosa a
opção do legislador de já no primeiro dispositivo do Código de Processo Civil
consagrar o amplo e irrestrito respeito ao texto constitucional e no decorrer
do diploma legal criar previsões que são flagrantemente contrárias ao texto
constitucional. Alguns exemplos demonstram de forma clara tal paradoxo. (Daniel
Amorim Assumpção Neves, P. 2, Novo Código de Processo Civil Comentado artigo
por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
O
art. 927 do CPC cria uma série de hipóteses de precedentes vinculantes, o que
tem duvidosa constitucionalidade, considerando-se que esse tipo de eficácia
depende de norma constitucional, como ocorre com a súmula vinculante e com o
controle concentrado de constitucionalidade. O inciso IV do dispositivo ora
analisado é o mais intrigante, ao prever que as súmulas de direito
constitucional, editadas pelo Superior Tribunal Federal e as súmulas de direito
infraconstitucional, editadas pelo Superior Tribunal de Justiça têm eficácia vinculante.
Não são súmulas vinculantes essas previstas no inciso II do art. 927 do CPC,
mas têm o mesmo efeito vinculante. O sistema agora passa a ter súmula
vinculante prevista em texto infraconstitucional. (Daniel Amorim Assumpção
Neves, P. 2, Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016,
Editora Juspodivm).
O
ar. 987, caput, do CPC prevê o
cabimento de recurso especial e extraordinário contra a decisão do Incidente de
Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR, enquanto os arts. 102, III, caput, e 105, III, caput, ambos da Constituição Federal, preveem que só são cabíveis
tais espécies de recursos quando houver decisão da causa. E obviamente
incidente processual não é uma causa, pelo menos não era até o advento do
Código atual. (Daniel Amorim Assumpção Neves, P. 2, Novo Código de Processo
Civil Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
Compreendo
que se entender pela inconstitucionalidade do dispositivo seria trágico para a
realidade forense e para os objetivos traçados pelo legislador para o IRDR. A solução
ainda que tecnicamente discutível, será alagar o conceito de “causa” para fazer
nele caber o julgamento do IRDR. O histórico desse entendimento, entretanto,
não é favorável, como denuncia o enunciado da Súmula 513 do STF: “A decisão que
enseja a interposição de recurso ordinário ou extraordinário não é do plenário,
que resolve o incidente de inconstitucionalidade, mas a do órgão (Câmaras,
Grupos ou Turmas) que completa o julgamento do feito.” (Daniel Amorim Assumpção
Neves, P. 2, Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016,
Editora Juspodivm).
Ademais,
como bem colocado pela melhor doutrina, um problema colateral de entender-se
que o IRDR é uma “causa” é a constitucionalidade do próprio IRDR, que passaria
a ser uma causa de competência originária do tribunal de segundo grau sem
previsão expressa na Constituição Federal (art. 108 da CF), nem nas Constituições
Estaduais (art. 125, § 1º, da CF). (Daniel Amorim Assumpção Neves, P. 2, Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
3.
ACESSO À ORDEM JURÍDICA JUSTA
A visão moderna do princípio
da inafastabilidade da jurisdição, consagrado no art. 5º, XXXV, da CF é
representada pela ideia de “acesso à ordem jurídica justa”, ou, como preferem
alguns, “acesso à tutela jurisdicional adequada”. Segundo lição corrente na
doutrina, essa nova visão do princípio da inafastabilidade encontra-se fundada
em quatro ideais principais, verdadeiras vigas mestras do entendimento. (Daniel
Amorim Assumpção Neves, P. 2 e 3, Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
Em primeiro lugar, deve-se
ampliar o máximo possível o acesso ao processo, permitindo-se que eventuais
obstáculos sejam mínimos, senão inexistentes. Esse amplo acesso cresce em importância
quando referente ao aspecto econômico da demanda e aos direitos
transindividuais. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 3, Novo Código de Processo
Civil Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
No tocante ao acesso dos
necessitados econômicos, que não têm condição econômica de acessar o Poder
judiciário, o sistema pátrio vale-se da assistência judiciária ampla para os “pobres”
na acepção jurídica do termo e os Juizados Especiais, que com seu princípio de
gratuidade (art. 1ª da Lei 9.099/1995), ao menos até a sentença, facilitam o
acesso de muitos. Isso sem falar na nobre disposição de alguns Tribunais na
instalação de Juizados itinerantes, permitindo o maior acesso de pessoas que
não encontram viabilidade em se locomover até a sede do juízo e na ainda
incipiente atuação da Defensoria Pública. . (Daniel Amorim Assumpção Neves, p.
3, Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016, Editora
Juspodivm).
Por outro lado, a criação da
tutela jurisdicional coletiva, com seus diplomas legais específicos, em
especial a Lei de Ação Civil Pública e o Código de Defesa do Consumidor,
permitiu que os direitos difusos e coletivos finalmente pudessem ser tutelados
pelo Poder Judiciário. Com a estrutura da tutela individual, em especial no
tocante às regras de legitimação e coisa julgada, é impossível a tutela
jurisdicional desses direitos, naturalmente frustrando a promessa de
inafastabilidade. Esse acesso também atinge os direitos individuais homogêneos,
ainda que de forma diferente. Estes até encontram guarida nas regras da tutela
individual, mas são tantos e de tão diversas naturezas os obstáculos para a
demanda individual, que naturalmente a tutela coletiva desses direitos auxilia
na ampliação do acesso ao processo. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 3, Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
Uma vez ampliado o acesso,
deve=se observar o respeito ao devido processo legal, em especial a efetivação
do contraditório real e do princípio da cooperação. Significa dizer que as
partes devem desempenhar um papel fundamental durante o processo, com ampla
participação e efetiva influência no convencimento do juiz. De nada adiantará a
ampliação do acesso se tal participação não for incentivada e respeitada no
caso concreto. Essa ampla participação pode ser obtida por intermédio de um
contraditório participativo, mediante o qual o juiz mantenha um diálogo permanente
e intenso com as partes, bem como por meio do contraditório efetivo, sendo as
participações das partes aptas a influenciar a formação do convencimento do
juiz. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 3, Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
A mencionada participação
das partes acarreta ao menos duas evidentes vantagens: a) quanto mais ampla
tiver sido a participação das partes, maiores serão as chances de obtenção de
pacificação social, considerando-se que a parte derrotada que entende ter feito
tudo que havia a fazer para defender seu interesse em juízo tende a se
conformar mais facilmente com sua derrota; b) sendo a participação das partes
ampla, o juiz terá mais elementos para valorar e proferir uma decisão de melhor
qualidade. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 3, Novo Código de Processo Civil
Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
Amplia-se o acesso,
permite-se a ampla participação, mas profere-se uma decisão injusta. É fácil
perceber que nesse caso tanto o acesso como a ampla participação não levaram as
partes a lugar algum. Em razão disso, a terceira “viga mestra” é a decisão com
justiça, ainda que o conceito de justiça seja indeterminado, suscetível de
certa dose de subjetivismo. O que se pode afirmar, com segurança, é que a missão
de decidir com justiça não significa a permissão de julgamento por equidade,
espécie de julgamento reservado às situações excepcionais, expressamente
previstas em lei (art. 140, parágrafo único, do CPC). Trata-se de preferir a interpretação
mais justa diante de várias possíveis, ou, ainda, de aplicar a lei sempre se
levando em consideração os princípios constitucionais de justiça e os direitos
fundamentais. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 3/4, Novo Código de Processo
Civil Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
Por fim, de nada adiantará
ampliar o acesso, permitir a ampla participação e proferir decisão com justiça,
se tal decisão se mostrar, no caso concreto, ineficaz. O famoso “ganhou, mas
não levou” é inadmissível dentro do ideal de acesso à ordem jurídica justa. A eficácia
da decisão, portanto, é essencial para se concretizar a promessa constitucional
de inafastabilidade da jurisdição. A questão da eficácia pode ser enfrentada
por três diferentes perspectivas. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 4, Novo
Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
Na primeira, a necessidade
de tutela de urgência ampla, de forma a afastar concretamente o perigo de
ineficácia representado pelo tempo necessário à concessão da tutela definitiva.
Nesse tocante, o direito brasileiro encontra-se excepcionalmente servido,
contando com a tutela cautelar, garantidora, e a tutela antecipada,
satisfativa, ambas amplas e genéricas, cabíveis em qualquer hipótese e a
qualquer momento desde que preenchidos os requisitos legais para sua concessão.
(Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 4, Novo Código de Processo Civil Comentado
artigo por artigo – 2016, Editora Juspodivm).
Em segundo lugar, a
necessidade de aumentar os poderes do juiz na efetivação de suas decisões, o
que se pode fazer – como o direito brasileiro vem fazendo – por dois caminhos
distintos: (a) disponibilizar ao juiz mecanismos de execução indireta, por meio
dos quais poderá convencer o devedor que o melhor a fazer é cumprir a
obrigação. A execução indireta pode ocorrer de duas formas: ameaça de piora na
situação atual (astreintes, prisão
civil) ou oferecimento de melhora na situação atual (arts. 827, § 1º, e 702, §
8º, ambos co CPC); (b) aumentar as sanções processuais a serem aplicadas pelo
juiz na hipótese de não cumprimento ou criação de obstáculos à efetivação da
decisão judicial, com especial ênfase ao ato atentatório à dignidade da justiça
(contempt of court), previsto no art.
77, § 2º, deste Código.
Em terceiro lugar, cumprir a
promessa constitucional prevista no art. 5º, LXXVIII, e art. 4º também do CPC, que garante às partes uma
razoável duração do processo por meio da adoção de técnicas procedimentais que
permitam uma maior celeridade, naturalmente se afastar as garantias
constitucionais do processo. O raciocínio é bastante simples: quanto mais
demore uma demanda judicial, menores são as chances de o resultado final ser
eficaz, devendo-se atentar para essa realidade no momento da estruturação
procedimental e da fixação das regras para a condução do processo. (Daniel Amorim
Assumpção Neves, p. 4, Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por
artigo – 2016, Editora Juspodivm).