Código Civil
Comentado – Art. 462
- Do
Contrato Preliminar – VARGAS, Paulo S. R.
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Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título V
– Dos Contratos em Geral - Capítulo I – Disposições
Gerais -
Seção VIII – Do Contrato Preliminar (art. 462 a 466)
Art. 462. O contrato preliminar, exceto quanto à
forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.
No entender de Nelson Rosenvald, comentários ao CC
art. 462, p. 521-522, Código
Civil Comentado, “contrato
preliminar pode ser conceituado como aquele em que as partes se comprometem a
efetuar, posteriormente, um segundo contrato, que será o contrato principal. A
autonomia privada permite que, por meio de duas relações obrigacionais
sucessivas de efeitos diversos, possam as partes produzir negócios jurídicos.
Com o contrato preliminar as partes não se obrigam apenas a prosseguir
negociações, mas a exigir a conclusão de um contrato com certo conteúdo.
A distinção entre os dois modelos
contratuais é facilitada pela identificação do objeto: enquanto no contrato
principal o objeto consiste na obrigação de dar, fazer ou não fazer, no
contrato preliminar se traduz na obrigação de concluir o contrato principal, ou
seja, uma obrigação de fazer em momento futuro.
Não é tão incomum a celebração de
contratos preliminares. Muitas vezes os parceiros preferem se conhecer melhor antes
do passo final, elidindo consequências jurídicas de uma convenção definitiva.
Em outros casos, existem dificuldades momentâneas que impedem a celebração
imediata do contrato principal, sejam elas de ordem econômica ou pessoal.
Nessas situações, nada impede que duas ou mais pessoas ajustem o contrato,
convencionando os direitos e deveres recíprocos e os termos essenciais da
operação econômica, porém protraindo o acordo definitivo e a produção de
efeitos jurídicos e econômicos para um momento posterior.
O contrato preliminar não pode ser
enfrentado como uma categoria intermediária entre as negociações preliminares e
o contrato definitivo. Cuida-se de figura autônoma. Enquanto as tratativas são
levadas a efeito independentemente de qualquer compromisso, pois as partes não
sabem se irão ou não contratar, o contrato preliminar demanda um acordo de
vontades e uma relação jurídica concluída, de natureza patrimonial. Já há o
consentimento dos pré-contratantes, cuja finalidade é a segurança do negócio
substancial que se tem em mira. A fase negociatória é concluída positivamente,
porém as partes optam pela não celebração do contrato definitivo. Com o
contrato preliminar, as partes não se obrigam a prosseguir nas negociações, mas
a concluir certo conteúdo, pronto e acabado, pois elas já “fecharam o negócio”.
Ademais, no período entre as negociações
preliminares e o contrato preliminar, as partes costumam celebrar pequenos
acordos, usualmente denominados de minutas ou cartas de intenção. Elas
demonstram que os parceiros já não mais se encontram em um estágio primário.
Porém, os acordos parciais não geram a obrigação de celebração do contrato
definitivo, pois não acordaram ainda no que tange às cláusulas em aberto. Nada
obstante, se decidirem por contratar, vinculam-se aos termos das minutas
parciais.
Também existe certa proximidade entre os
contratos normativos e os preliminares. O contrato normativo não obriga as
partes a uma futura contratação, mas, caso deliberem em tal sentido, os termos
da futura avença não poderão fugir do conteúdo por aquele disciplinado. Seria o
caso do contrato coletivo de trabalho. Ele não disciplina diretamente os
contratos individuais de trabalho, mas fixa cláusulas gerais de contratação,
cuja estipulação é imprescindível entre empregador e empregado. Diversamente, o
contrato preliminar dá ensejo à obrigatória realização do contrato principal e
per si à sua razão de ser quando este é firmado. Já o contrato normativo não
desaparece, pois continuará regulando uma série indefinida de futuros contratos.
O Código Civil de 1916 não cuidou dos
contratos preliminares. Tal fato é justificável se percebermos que o trato da
matéria se acentua com a própria aceleração do tráfego jurídico dos últimos
cinquenta anos. O nosso legislador cuidou da matéria especificamente no campo
da promessa de compra e venda, por meio da edição do Decreto-lei n. 58/37 e da
Lei n. 6.766/79. Todavia, a abordagem autônoma da temática no título destinado
aos contratos em geral demonstra que os contratos preliminares podem ter em
vista a realização de qualquer tipo de contrato definitivo, até mesmo em sede
de doação.
Na linha consensualista, o Código Civil
é enfático na defesa do princípio da liberdade de forma para os contratos
preliminares. Em outras palavras, dotado dos requisitos de validade a que alude
o art. 104 do Código Civil (agente capaz, objeto lícito e possível), é negócio
jurídico perfeito e independente da relação principal que procura garantir.
Essa diversidade de fundamentos e efeitos justifica a liberdade de contratar
sem a exigência da forma pública, independentemente do valor das obrigações
ajustadas para o futuro, mesmo em sede de compra e venda (art. 108 do CC).
No particular, o art. 1.417 do Código
Civil é explícito ao oportunizar a concretização de promessa de compra e venda
por meio das vias alternativas do instrumento público ou particular. (Nelson
Rosenvald, comentários ao CC art. 462, p. 521-522, Código Civil Comentado, Doutrina e
Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo
Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém
o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole,
2010. Acessado em 10/07/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Na apreciação de
Rodolfo Pamplona Filho – “A disciplina do contrato preliminar no novo Código
Civil brasileiro” – publicado em Jus.com.br, em 30 de maio de 2005:
Do ponto de vista do
Direito Positivado, uma das inúmeras inovações do Código Civil brasileiro de
2002 é a disciplina formal do Contrato Preliminar, residente na Seção VII do
Capítulo I – Disposições Gerais – do Título V – “Dos Contratos em Geral” do
Livro destinado ao “Direito das Obrigações”.
A menção ao enfoque
de lege lata se justifica pela circunstância de que tal instituto
jurídico não se constitui propriamente uma novidade para a doutrina nacional
(ou mesmo para isoladas previsões legais específicas) embora o nosso
ordenamento ainda carecesse de uma regulamentação explícita e genérica da
matéria.
Conceituar um
instituto jurídico nunca é uma tarefa definitiva, havendo sempre a
possibilidade de divergências para a fixação dos limites de sentido e
significado de cada palavra.
Sem cair na tentação
das conceituações digressivas, compreende-se o contrato preliminar como uma
avença através da qual as partes criam em favor de uma ou mais delas a
faculdade de exigir o cumprimento de um contrato apenas projetada.
Tal figura já era
conhecida, inclusive no Direito Romano, pois o pactum de contrahendo
compreendia o pactum de mutuando e o pactum de commodando, entre
outros.
Essa possibilidade
de exigência da eficácia imediata de um contato in fieri é também
denominada doutrinariamente, de pré-contrato, promessa de contrato,
compromisso ou contrato preparatório, não devendo ser confundido com o
negócio jurídico ainda não celebrado, cuja eficácia se pretende exigir.
Como observa Orlando
Gomes: "Trata-se de figuras distintas do
respectivo contrato definitivo, havendo, entretanto, quem conteste a
independência dos dois. Sob a influência do Direito francês, segundo a qual a
promessa de venda – que é contrato preliminar no entendimento geral – vale
venda quando haja consentimento das duas partes sobre a coisa e o preço, muitos
autores negam a autonomia do pré-contrato. Pensam outros que, se consiste em
criar a obrigação de celebrar o contrato definitivo, é supérfluo, porque, se
alguém prometeu obrigar-se em dia certo, obrigado estará nesse dia, como se
nele houvesse contraído a obrigação. Exigir que novamente se obrigue é admitir,
como diziam certos canonistas, um circuitus inutilis”.
Da mesma forma, não se deve colocar na
mesma tábula, as negociações preliminares e o contrato preliminar.
De fato, as negociações preliminares –
ao contrário do instituto aqui analisado – não geram direitos, podendo-se, no
máximo, se falar em uma responsabilidade civil pré-contratual, cujos danos são
passíveis de indenização com base no art. 186 do CC-2002 (art. 169, CC-1916).
Toda vez que se
indaga a respeito da natureza jurídica de uma determinada figura, deve o
estudioso do Direito cuidar de apontar em que categoria se enquadra,
ressaltando as teorias explicativas de sua existência.
Assim, fica claro
concluir-se que a natureza jurídica do contrato, por exemplo, é a de
negócio jurídico, uma vez que nesta última categoria subsume-se a referida
figura, encontrando, também aí, a sua explicação teórica existencial (a teoria
do negócio jurídica explica a natureza do contrato).
Indiscutivelmente, na visão do autor
Pamplona, o contrato preliminar é um negócio jurídico, na medida
em que consiste em uma declaração de vontade, emitida em obediência aos seus
pressupostos de existência, validade e eficácia, como propósito de produzir
efeitos admitidos pelo ordenamento jurídico, pretendidos pelo agente (aqui, uma
nota VD: Aparentemente tem o autor Pamplona este parágrafo como “a
verdadeira conceituação da coisa”).
Daí, não é de se estranhar que disponha
o art. 462, in verbis: “O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve
conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.”
Isso porque, como negócio jurídico que
é, o contrato preliminar também se submete a todos os requisitos essenciais do
contrato a ser pactuado.
A exclusão da forma se dá por uma opção
legislativa, de modo a facilitar e estimular a utilização do instituto, como
ordinariamente se procede, tradicionalmente,
quando o contrato definitivo exige a escritura pública e os requisitos do
contrato preliminar são satisfeitos com a lavratura em instrumento particular.
Nada
impede, porém, que o contrato definitivo contenha mais cláusulas do que as
pactuadas no contrato preliminar, que, de maneira alguma, se desnatura com tal
possibilidade. Com efeito, a regra legal deve ser interpretada com
razoabilidade para se entender que a exigência é somente quanto aos requisitos
essenciais entenda-se, os elementos de (existência e validade do negócio
jurídico), e não quanto ao inteiro conteúdo do pactuado.
Na classificação primária,
percebe-se que o contrato pode ser unilateral ou bilateral. (Rodolfo Pamplona
Filho – “A disciplina do contrato preliminar no novo Código Civil brasileiro” –
publicado em Jus.com.br, em 30 de maio de 2005, acessado em 10/07/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Como terceira conceituação e
exemplificação, Marco Túlio de Carvalho Rocha, apud Direito.com, nos
comentários ao CC. art. 462.
Contrato preliminar é o que tem como
objeto a estipulação de outro contrato. O objeto do contrato preliminar e,
portanto, uma obrigação de fazer.
O histórico dos fundamentos legais do
contrato preliminar, traz o Código Civil de 1916, art. 1.088 (revogado) – O
descumprimento do contrato pelo vendedor não possibilitava ao comprador a
execução específica, porque entendia-se que ninguém poderia ser constrangido ao
cumprimento de uma obrigação de fazer: nemo cogi potest ad factum.
Decreto-lei n. 58/1937 – dispôs sobre a
venda de imóveis loteados para pagamento em prestações; possibilitou a
averbação (registro, segundo a Lei n. 6.015/73) do compromisso de compra e
venda no registro de imóveis, criou a adjudicação compulsória com rito sumário,
cuja sentença vale como título para o registro (art. 16); o art. 22 deste
Decreto-lei, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 6.014/73 resume os
efeitos do compromisso de compra e venda de imóveis não loteados.
Lei n. 649/1949 – estendeu as
disposições do Decreto-lei n. 58/37 aos imóveis não-loteados e às vendas à
vista; configurou como compromisso de compra e venda, irrevogável e
irretratável, toda promessa sem cláusula de arrependimento.
Decreto-lei n. 745/1969 – exige a
interpelação prévia do comprador para a resolução do compromisso de compra e
venda de imóveis não loteados, mesmo que nele conste cláusula resolutiva
expressa.
Lei n. 6.766/6.766/1979 – instituiu o
pré-contrato de promessa de compra e venda (art. 27; qualquer instrumento que
demonstre a vontade das partes de virem a realizar o contrato de compra e
venda, art. 27, §1º), que possibilita sejam aplicáveis às partes as cláusulas
estabelecidas no contrato-padrão (art. 18, VI) se o vendedor se recusar a
firmar o compromisso de compra...
Partes. As partes devem preencher as
mesmas exigências relativas ao contrato definitivo.
Forma. Na ausência de determinação
legal, o contrato preliminar pode se realizar por qualquer forma. Deve ser
escrito, no entanto: a) para efeito de prova, se de valor superior a 10
salários mínimos (art. 227 do Código Civil; b) para efeito de registro (art.
463, parágrafo único, e art. 1.417 do Código Civil).
Deve conter todos os requisitos
essenciais ao contrato definitivo (indeferimento de adjudicação compulsória por
ausência de elementos essências: STF, RE n. 88.816-RJ, rel. Min. Moreira
Alves).
Súmulas:
66/STF – É inadmissível o arrependimento
no compromisso de compra e venda sujeito ao regime do Decreto-lei n. 58 (nas
vendas de imóveis loteados a cláusula de arrependimento é nula).
167/STF – Não se aplica o regime do
Decreto-lei n. 58 ao compromisso de compra e venda não inscrito o registro
imobiliário, salvo se o promitente vendedor se obrigou a efetuar o registro
[Súmula superada pela jurisprudência do STJ, segundo a qual o registro não é
imprescindível nas relações entre os próprios contratantes: RETJ 25/465,
29/356, 32/309, 42/407, 43/458).
168/STF – Para efeito do disposto no
Decreto-lei n. 58 admite-se a inscrição do compromisso no registro no curso da
ação.
412/STF – no compromisso de compra e
venda com cláusula de arrependimento, a devolução do sinal, por quem o deu, ou
a sua restituição em dobro, por quem a recebeu, exclui indenização maior, a
título de perdas e danos, salvo os juros moratórios e os encargos do processo.
413/STF – O compromisso de compra e
venda de imóvel não dispensa a prévia interpelação para constituir em mora o
devedor.
76/STJ – a falta de registro do
compromisso de compra e venda de imóvel não dispensa a prévia interpelação para
constituir em mora o devedor.
84/STJ – é admissível a oposição de
embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de
compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro.
239/STJ – o direito à adjudicação
compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no
cartório de imóveis. (Marco Túlio de Carvalho Rocha, apud Direito.com, nos
comentários ao CC. art. 462, acessado em 10/07/2022, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
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