Código Civil
Comentado - Art. 400, 401
- Da
Mora – VARGAS, Paulo S. R.
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Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título IV
– Do Inadimplemento das Obrigações
(art. 394
a 401) Capítulo II – Da Mora –
Art. 400. A mora do credor subtrai o devedor
isento de dolo à responsabilidade pela conservação da coisa, obriga o credor a
ressarcir as despesas empregadas em conservá-la, e sujeita-o a recebê-la pela
estimação mais favorável ao devedor, se o seu valor oscilar entre o dia
estabelecido para o pagamento e o da sua efetivação.
De acordo com a ponderação inteligente
de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 400, pp. 429-430, Código Civil Comentado:
“É preciso observar
que, se a culpa é necessária para caracterizar a mora do devedor, o mesmo não
acontece em relação à do credor, como se verifica da leitura deste artigo.
Desse modo, se o devedor oferece a prestação no tempo devido e o credor não a
recebe, este estará em mora, independente de culpa. Nessa hipótese, o devedor
deixa de responder pelos riscos da coisa. Imagine-se que alguém se compromete a
entregar um veículo ao comprador na Praça José Bonifácio, em Piracicaba. O
comprador atrasa-se para o encontro em razão de um acidente de trânsito que o
impede de chegar ao local no horário que combinaram os contratantes. No exemplo
imaginado, se o carro fosse furtado em poder do vendedor, o prejuízo seria
suportado pelo comprador que se atrasou involuntariamente”.
A culpa do credor é irrelevante para a
caracterização de sua mora e o obriga a indenizar os prejuízos do devedor
relativos à conservação e a outros danos que suportar, pois a menção às
despesas de conservação não é taxativa, mas apenas exemplificativa. Ademais, se
o valor do bem oscilar entre o dia previsto para o pagamento e o de sua
efetivação, o credor pagará o preço mais favorável ao devedor.
Ocorre mora do credor quando ele não
receber a prestação no tempo e do modo devidos. Para que ela se verifique são necessários
os requisitos seguintes: o vencimento da obrigação, pois antes disso ela não é
exigível e o devedor não pode liberar-se de seu cumprimento; a oferta da
prestação; a recusa injustificada do credor em receber.
O devedor isento de dolo deixa de ter
responsabilidade pela conservação da coisa se ocorrer mora do credor, como está
consignado neste dispositivo. O dolo do devedor estará caracterizado se ele
abandonar o bem em face do atraso do credor. A lei exige que o devedor tenha
cuidados mínimos com o objeto da prestação, conferindo-lhe direito de reembolso
pelas despesas de conservação. A oscilação de preço do produto ocorre, por
exemplo, quando o comprador de certa quantidade de gado atrasa-se para
retirá-lo da fazenda do vendedor, verificando-se o aumento do preço da arroba
desde a data em que devia ter apanhado os animais. Caso isso ocorra, o
comprador pagará o preço do produto vigente na data da retirada efetiva do
gado.
O dolo referido no artigo não
corresponde à intenção de lesar, mas a ausência de providências acautelatórias
que evitem dano ao bem em seu poder. Segundo Rizzato, não se compreendem nessas
providências despesas vultosas, “como pinturas de prédios, constante revisão de
um equipamento, substituição de peças e outras conservações que reclamam altos
custos, insuportáveis pela sua condição econômica” (Rizzardo, Arnaldo. Direito
das obrigações. Rio de janeiro, Forense, 2004, p. 486).
Se a mora é simultânea, uma elimina a
outra, ocorrendo compensação entre elas. As duas partes devem ser consideradas
como se não estivessem em mora e nenhuma pode exigir perdas e danos da outra.
Mas se as moras são sucessivas, permanecem os efeitos anteriores de cada uma.
Ambas as partes respondem por perdas e danos do período em que estiveram em
mora: o credor, pelos prejuízos que se verificaram enquanto ele recusou o
recebimento do pagamento, e o devedor, pelos que se consumaram quando o
primeiro concordou em receber e ele não quis pagar.
Na apreciação do relator Ricardo Fiuza,
como consta de sua doutrina, p. 216 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado: O art. 400 estabelece os
efeitos da mora accipiendi, a saber: a) o devedor, desde que não
tenha agido com dolo para provocar a mora, não responderá pelos riscos com a
conservação da coisa; b) as despesas que o devedor tiver com a
conservação serão ressarcidas pelo credor; c) se o valor da prestação
oscilar entre o dia estabelecido para o pagamento e o dia do efetivo
recebimento, o credor estará obrigado a receber pelo valor mais favorável ao
devedor d) o devedor pode desobrigar-se, consignando o pagamento.
No caso do mútuo feneratício, a mora do
credor faz cessar afluência dos juros, é o que aqui se entende. A posição,
entretanto, não é unânime. Beviláqua registra as divergências: “O Código Civil
Brasileiro refere-se à atenuação da responsabilidade do devedor, declarando que
ele, somente responde por seu dolo, após a mora do credor; mas não fala na
cessação dos juros, como faz o alemão, art. 301. Se a dívida é produtiva de
juros, cessam estes, desde a mora do credor. Todavia é tão racional esta
isenção de juros durante a mora do credor que se pode considerá-la incorporada
ao nosso direito, independentemente de disposição expressa. E certo que, em
relação ao ponto, a opinião dos doutos é divergente.
Assim é que Windscheid (Pand,
II, § 346, nota ‘7) acha que eles são devidos, como frutos da coisa, porque o
devedor goza do capital. Momento, porém, frisa, a diferença entre os frutos
propriamente ditos e os juros do capital, e faz sentir que não se devem cobrar
juros de uma quantia, que o devedor devia conservar à disposição do credor,
para entregar a qualquer momento. Aliás, havendo consignação, cessam os juros
(art. 796)” (Clóvis Beviláqua, Código Civil comentado, cit., p. 118-9). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza
– comentários ao Art. 400, p. 216, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf. Vários
Autores 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 30/05/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Como lembra a Equipe de Guimarães e
Mezzalira, tais efeitos são decorrência direta da recusa injustificada do
credor em receber a coisa, no termo aprazado. Nessa hipótese, diversamente do
que se dá na mora do devedor, não há a necessidade de que haja culpa do credor.
Basta apenas e tão somente que este retarde o recebimento da prestação ou não a
receba da forma devida, bem como que o devedor não tenha agido com dolo.
Exemplificativamente, pode-se mencionar
a hipótese de o credor que deixou de comparecer no local e hora combinado com o
devedor, em razão de acidente de trânsito (exemplo acima de Bdine Jr.), e a
coisa objeto da prestação foi furtada por terceiro. Nesse caso, o credor seria
responsável pelos prejuízos sofridos pelo devedor. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães
e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC
400, acessado em 30/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Art. 401. Purga-se a mora:
I - por parte do devedor, oferecendo este a
prestação mais a importância dos prejuízos decorrentes do dia da oferta;
II - por parte do credor, oferecendo-se este
a receber o pagamento e sujeitando-se aos efeitos da mora até a mesma data.
Conceituando Hamid Charaf Bdine Jr,
comentários ao CC art. 401,
p. 430-431, Código Civil Comentado: “Purgar ou emendar a mora é o modo pelo qual se procede à
sua cessação. Aquele que está em mora pode purgá-la, cumprindo a obrigação
descumprida e indenizando a outra parte. A purgação só pode ser feita se ainda
trouxer resultado útil ao credor. Do contrário, haverá inadimplemento absoluto”.
Segundo o autor, este artigo aponta as
hipóteses em que a purgação da mora poderá ser feita pelo credor ou pelo
devedor. A purgação da mora pelo devedor realiza-se mediante oferta da
prestação atrasada mais o valor dos prejuízos dela resultantes. Os prejuízos a
serem ressarcidos são os conhecidos, pois os ainda não conhecidos podem ser
cobrados em ação autônoma, mas não impedem a emenda da mora. Em relação ao
credor, a purgação verifica-se quando ele aceita receber o pagamento e
sujeita-se aos efeitos da mora.
A purgação pode ocorrer a qualquer
momento, desde que ainda seja útil ao credor. Desse modo, é possível concluir
que a consignação é ação destinada a prevenir e a emendar a mora. A purgação da
mora não se confunde com a sua cessação. Esta última não depende de um
comportamento do moroso, pois resulta da própria extinção da obrigação em
decorrência de outro fato que não seja imputável a ele. E o que ocorre quando
as dívidas fiscais do devedor são anistiadas. Nesse caso, cessa a mora,
produzindo efeitos pretéritos, pois os efeitos já produzidos serão afastados.
Na purgação da mora, os efeitos produzidos não são pretéritos, porque estes
últimos se conservam. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art.
401, p. 430-431, Código
Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord.
Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual.
- Barueri, SP, ed. Manole, 2010.
Acessado em 30/05/2022,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Refletindo o entendimento do relator
Ricardo Fiuza: Purgação ou emenda da mora é a extinção dos efeitos futuros do
estado moroso, em decorrência da oferta da prestação, pelo devedor, acrescida
de todas as perdas e danos até o dia da oferta, ou ainda em face da
prontificação do credor em receber a coisa, pagando todos os encargos advindos
com a sua demora em receber.
A purgação pode ser admitida a qualquer
tempo, mesmo depois de iniciada a ação executiva contra o devedor ou a
consignatória contra o credor. Nestes casos, as perdas e danos incluirão também
os honorários advocatícios e as custas judiciais.
Pode a convenção das partes impedir a
purgação da mora. Sobre o assunto, decidiu a Câmara dos Deputados no período
inicial de tramitação do projeto. Na ocasião, registrou o Deputado Ernani Aires Satyro e Sousa, em seu relatório geral: “Na realidade, muito embora o
Código vigente permita que as partes livremente convencionem a proibição da
purgação da mora, esta deve ser sempre admitida, como preceito de ordem
pública. Nos dias atuais, como restrição de ordem social à autonomia da
vontade, deve prevalecer o princípio que assegura sempre direito à purgação da
mora, nos casos previstos na lei. É sobretudo nos negócios estipulados entre pessoas
de nível cultural e econômico diverso, ou nos contratos de adesão, que consta a
exclusão da purgação da mora em virtude de convenção das partes, com graves
prejuízos ao contraente mais fraco. Muito embora possa haver hipóteses em que a
conclusão do negócio só convenha quando previsto o adimplemento em data certa,
a concessão do direito de purgar a mora resulta de relevantes razões de
natureza social que cabe ao legislador preservar”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – comentários ao Art. 401,
p. 216-217, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf. Vários Autores 16ª ed., São Paulo,
Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado
em 30/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Lecionando a equipe de Guimarães e
Mezzalira: A purgação da mora, tanto do credor quanto do devedor, dá-se com a
assunção pelo inadimplente das respectivas consequências que houver gerado à
contraparte na relação obrigacional. Tal emenda somente poderá ser efetuada nos
casos em que, a despeito do cumprimento não se dar no termo aprazado, a
prestação ainda é útil e aproveitável (termo não essencial – vide comentários
ao artigo 333). A purgação da mora também não poderá ocorrer nos casos em que,
pela lei ou pela convenção, a consequência da mora for a resilição do contrato.
A purgação da mora poderá ocorrer ainda
quando o afetado por ela renunciar aos direitos que possam lhe advir da
situação. Essa renúncia poderá ser expressa ou tácita. Nessa segunda hipótese,
a renúncia deverá ser verificada de acordo com as circunstâncias do caso,
especialmente quando o comportamento daquele a quem a mora aproveitar tiver
comportamento incompatível com os direitos detidos em face da parte inadimplente.
“A parte embargante, entendendo serem
excessivos os cálculos apresentados pelo exequente, deveria ter realizado o
pagamento dos valores que acreditava serem devidos – parte incontroversa -,
desvencilhando-se, de tal modo, da incidência de correção monetária e de juros
de mora sobre referido montante. Inteligência dos arts. 394 e 395 do CC/2002” (STJ, 5ª T. REsp n. 767498 – RJ, Rel.
Des. Arnaldo Esteves Lima, j. 9.3.2006).
Nesse caso, o devedor deverá oferecer a
prestação acrescida dos juros moratórios e eventuais danos emergentes e lucros
cessantes que houver causado ao credor. Em se tratando de termo não essencial e
não havendo lide pendente, a purgação da mora será admitida sem a necessidade
de anuência do credor. Já tendo o credor ajuizado demanda em face do devedor, a
emendatio morae sem anuência do sujeito ativo da relação obrigacional
somente será admitida, nos casos em que houver expressa disposição legal (ex.:
na hipótese de ação de despejo por falta de pagamento prevista na lei do
inquilinato – lei n. 8.245 de 18.10.1981) (Pereira, Caio Mário da Silva. Teroria
Geral das Obrigações. Rio de Janeiro: Forense, p. 316).
No caso de purgação da mora do credor,
além de arcar com eventuais prejuízos acarretados ao devedor, ele ficará ainda
sujeito a receber a coisa no estado em que se encontrar. (Luiz Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários
ao CC 401, acessado em 30/05/2022, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
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